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APRENDER ALÉM DOS MUROS DA ESCOLA MODELO TRADICIONAL DE EDUCAÇÃO EM CHEQUE

2. E DUCAÇÃO , M ENTORING E T ECNOLOGIA

2.1 APRENDER ALÉM DOS MUROS DA ESCOLA MODELO TRADICIONAL DE EDUCAÇÃO EM CHEQUE

A escola como conhecemos hoje, em linhas gerais, tem sua origem no século XVI. Ao longo dos anos alguns aspectos centrais foram se estruturando e estabeleceu-se um saber a ser difundido, o qual se traduziu em um modelo curricular de disciplinas, níveis de aprendizagem, processos e ferramentas de avaliação.

As novas possibilidades e imposições que se apresentam ao modelo educacional colocam em evidência o professor. Situação que desperta o interesse sobre a posição ocupada por este profissional em um cenário de inúmeras ofertas e demandas por informação, conhecimento, produção. Processos participativos, integradores, ágeis e também, dispersivos, superficiais.

Transmitir conteúdo, pura e simplesmente, no antigo modelo emissor – receptor é inviável. Vislumbra-se a perspectiva de mediar plataformas de distribuição de conteúdo. Uma posição que, se tecnicista, pode rapidamente tornar este professor distante, dispensável.

Momento então de ―inventar‖, ou resgatar, um lugar de inspiração e provocação. Não só dar as regras do jogo, mas jogar junto, participar da brincadeira. Inventar e se (re) inventar.

O entendimento e a valorização da ideia de que aprendizagem não se resume a uma fase da vida (infância e juventude) e, tampouco, é processo que se restringe a um único ambiente (tradicionalmente, a escola) é cada vez mais presente e se convencionou denominar ―lifelong learning‖. As mudanças ocorridas nas últimas décadas colocam em evidência a noção de uma educação contínua, cada vez menos diacrônica e expandindo-se para os mais diversos ambientes, situações, tempos. Um cenário de intensificação de novas necessidades e possibilidades.

Na transmissão do conhecimento é possível observar a intensa influência do modelo socrático. Se na tradição sofista havia um detentor do saber (que era comunicado a partir do lugar do orador), Sócrates irá propor o diálogo, sustentado na crença de que cada indivíduo possui um saber, independente de ter isso claro para si. Seu método, conhecido como maiêutica, tem como proposta trazer à luz aquilo que o indivíduo sabe a partir do questionamento e da reflexão - a ―arte de perguntar.‖

Uma posição aparentemente sustentada na valorização da singularidade e da responsabilização do indivíduo pela construção do conhecimento e autoria do saber. Proposta de autonomia, mas que traz embutido o ideal de um que sabe mais, posto que está apto a fazer as melhores e mais corretas perguntas.

Rancière (2005), em suas incursões pelo método apresentado por Jacotot, discute a premissa socrática algo que, na visão do autor, ―emburrece‖, pois ao interrogar, de alguma maneira direciona. Um sábio que se dirige a um simples outro.

Apontando essa questão para a direção da psicanálise, Lacan trata de um saber que constitui o sujeito, portanto algo do registro do inconsciente, que não é completo e se revela como conhecimento - que é da cultura, portanto, do imaginário e do simbólico. Mas algo deste saber nunca se explica, ou se entende: o duro do real.

Caminhos diferentes para se discutir as muitas questões da educação, da aprendizagem.

Nunca como nas últimas duas décadas, crianças e jovens foram expostos à tão intensas e rápidas transformações em seu cotidiano. Mudanças estas que não têm sido acompanhadas pelo sistema de ensino, que vai se adaptando de maneira quase sempre lenta e relutante ou, em algumas situações, superficialmente, sem a observação do que acontece na sociedade (por exemplo, escolas que medem seu sucesso e capacidade educativa pelo número de computadores que possuem).

Uma nova estrutura que requer não só dos educadores e da família, mas de todos os segmentos da sociedade (empresas, organizações, governos) uma disposição para discutir e participar destas transformações.

Observam-se avanços em relação ao modelo tradicional no que se refere a metodologias e utilização de recursos tecnológicos. O aperfeiçoamento e refinamento dos

meios de avaliação têm proporcionado o aprimoramento dos processos educacionais, assim como incentivado novas experimentações. (FORMIGA; LITTO, 2009).

Especialmente a partir dos anos 1990, é possível observar o incremento da implantação de programas voltados ao desenvolvimento de indivíduos e grupos envolvendo diferentes instituições (empresas, escolas, organizações da sociedade civil), utilizando o acesso e integração promovidos pelas mídias digitais e não mais restrito aos ambientes e estruturas convencionais.

O que quebra o monopólio do professor em relação à informação, pois entre outros fatores, torna, ao menos aparentemente, o acesso às informações mais disponível.

A cibercultura oferece uma infinidade de sentidos e possibilidades de acesso a um conhecimento que se constitui em rede, a partir de múltiplas experiências e relações. Por vezes, cria-se a armadilha da facilidade de se encontrar algo pronto, podendo levar a uma acomodação - o fast, o consumo rápido. Uma ilusão, já que jamais haverá um acesso à totalidade. Mas também, incentiva e permite o questionamento, a confrontação e a ampliação de conceitos, ideias, opiniões.

Durante séculos a escola (e também, a família e os ambientes religiosos) foram os únicos espaços para crianças e jovens apreenderem o mundo. Um referencial limitado – e limitante. ―A criança, em sua família e na escola, vê-se colhida entre a sedução e a punição como método educativo.‖ (MANNONI, 1977, p. 34).

No ciberespaço abrem-se perspectivas diferentes e novas. Ainda que povoado de riscos e possibilidades/promessas ilusórias, descola-se em muito do padrão institucionalizado, criando oportunidades de construção de outros ambientes e de experimentação de idéias e conhecimentos. Não ao acaso a web está recheada de projetos inovadores criados por jovens de menos de dezoito anos, que ainda não chegaram à universidade – e a seu discurso de regras prontas e fechadas.

O uso das TICs, a cibercultura e o ciberespaço permitem e exigem que se crie conhecimento por caminhos muito diferentes dos propostos pela escola. Ambientes em que se contrapõem a diluição do tempo-espaço e os horários rígidos, a grade de disciplinas; espontaneidade, curiosidade, exploração muitas vezes barradas pela especialização (por exemplo, momento de falar de física e não de português).

Uma mudança que não se dá de maneira fácil, imediata, considerando que a grande maioria de professores e gestores está em processo de aproximação da cultura digital, um universo ainda em muito desconhecido.

Para alguns, este pode ser o momento de se fortalecer na posição daquele que interage, troca, experimenta, inspira e cria com seu aluno. Para muitos, porém, o apelo instrumental é forte, quase uma defesa frente ao medo despertado pelo desconhecido.

Ficar preso ao caráter instrumental acaba sendo uma saída, ainda que momentânea. Tentativa de preparar-se para o enfrentamento com alunos que dominam estes recursos mais do que ele? Podemos pensar aqui no jogo de poder, ranço do modelo tradicional da educação hierarquizada, em que o professor é o que sabe e o aluno o que recebe e acata a informação. E o risco do professor se colocar em uma posição competitiva, de quem lida melhor com a tecnologia, preso à crença de ser o detentor de um saber fechado e pronto.

Recentemente, alunos publicaram em um blog 16 os resultados de exercícios de livros didáticos. Para uma escola padronizada, que cobra respostas prontas e fechadas é até certo ponto previsível que isso ocorra; estabelece-se uma relação quase mercantil, nos moldes tradicionais de um ―preço fechado‖ - um aluno operário criado pelo modelo taylorista da escola. (REICH, 2002).

Em contrapartida, a entrada irreversível da tecnologia no cotidiano das escolas (e da sociedade em geral) aumenta - e requer - um novo olhar sobre a construção das relações interpessoais. O professor que se coloca apenas como mediador de um processo, um instrutor preso ao passo a passo do manual, rapidamente perderá seu lugar, pois que o aluno não só já chega com conhecimento e experiência no uso dos dispositivos como adquire novas habilidades muito mais rapidamente nas trocas que estabelece nas redes sociais, na consulta a sites, blogs, entre outros inúmeros caminhos possíveis. Trata-se de colocar a tecnologia para agir sobre a informação, e não apenas informação para agir sobre a tecnologia. (CASTELLS, 2008).

É aqui que se coloca o questionamento do como o professor pode estar com seu aluno.

A proposta de um aprendizado permanente ao longo da vida reforça e indica a importância de um novo lugar para o professor. Thomas e Brown (2011) ao discorrerem sobre

os novos caminhos possíveis para a aprendizagem, considerando a realidade do século XXI em que a tecnologia está o tempo todo ―criando e respondendo por mudanças‖, partem da ideia de que se trata de um processo não mais atrelado à escola, sala de aula ou professor – não nos moldes conhecidos. Segundo os autores, não é o fim destes ambientes, mas ao contrário, essa nova cultura de aprendizagem pode trazer outras facetas de educação em todos os estágios da vida. O modelo antigo se propunha a ensinar sobre o mundo; na era digital, com tantas e diversos caminhos e possibilidades, a proposta é aprender através do engajamento no mundo.

Ainda que desde sempre o ser humano tenha estruturado sua permanência e desenvolvimento no mundo graças a um contínuo aprendizado, a era digital incrementa essa dinâmica e também, exige uma maior disposição para experimentações, decorrentes da própria exposição a tantos e tão mutantes cenários e conteúdo. Entendemos então, que se abre uma perspectiva de ampliação da construção de relações pautadas pela inspiração, troca e trabalho mútuo.

Modelos mais abertos, em que se parte do saber universal para o saber singular enfrentam uma forte barreira ou desafio que é a questão da avaliação: como aquele aluno que encontrar respostas para uma equação matemática sem demonstrar a equação poderá ser avaliado? Como o professor irá estabelecer critérios personalizados e individuais em turmas com cinquenta alunos?

O relatório Teaching and Learning International Survey - TALIS 2009 17 mostra que um número significativo de docentes se ressente, em sua prática cotidiana, de espaços de diálogo e orientação. A demanda de professores por mais programas de desenvolvimento é identificada em 55% da amostra global, sendo que no Brasil este número sobe para 85%. A ausência de programas de mentoring e de discussões regulares é relatada por 25% dos entrevistados da amostra global; porcentagem que no Brasil sobe para 70% dos professores pesquisados.

Na análise qualitativa dos dados, o TALIS indica que o Brasil está no grupo de países em que professores ocupam maior tempo com atividades não inerentes à sala de aula

17 Relatório de apresentação de resultados da pesquisa internacional de ensino e aprendizagem ―Creating Effective Teaching and Learning Environments‖ desenvolvida e coordenada pela Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).

(administrativas / disciplinares) o que pode nos levar a refletir sobre o quanto este fator pode interferir na relação com o aluno no que se refere a estar disponível para interagir de maneira mais individualizada.

Aspecto que fica mais destacado quando lembramos que, principalmente nas escolas públicas, as turmas são constituídas por uma média de trinta alunos, podendo chegar a cinquenta. Há sem dúvida a necessidade de um novo modelo educacional, institucional.

Há, no entanto, um fator que permeia essa discussão: o uso das TICs nos processos de aprendizagem ainda ocorre de maneira irregular e heterogênea considerando que a realidade das escolas brasileiras (e de diversos países) é marcada pela desigualdade de recursos, limites de infra-estrutura, assim como os investimentos na formação dos professores.