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Aprendizagem holística

No documento ANDRÉIA PIRES CHINAGLIA DE OLIVEIRA (páginas 49-54)

1. REVISÃO DE LITERATURA E FUNDAMENTAÇÃO

1.2 INTERAÇÕES MUSICAIS EM JOGOS CANTADOS

1.2.2 Aprendizagem holística

Assim, as crianças transmitem os jogos e adquirem habilidades por meio da observação e tentativa de desempenho no jogo como um todo. De acordo com Marsh (2008, 2013), habilidades de desempenho em pares nunca foram isoladas para serem ensinadas em segmentos de desenvolvimento individuais, fragmentados e separados, mas foram ensinadas no âmbito holístico do jogo por completo. Portanto, a aquisição da canção no jogo ocorre através da junção e da soma de música,

texto e movimento durante repetidas interpretações de um todo musical. Portanto, as habilidades das crianças para aprenderem um jogo são holísticas.

Em muitas etnias, por exemplo, Marsh (2008) observou que as crianças não separam as partes de um jogo ou música para aprendizagem. As crianças sempre aprendem canções e movimentos que acompanham a performance como um todo, tocando uma música, ou gravam um jogo repetidamente em sua totalidade, muitas vezes, de forma a aprendê-lo.

As crianças podem escolher o seu próprio nível de participação, a partir da observação, da experimentação de alguma forma limitada de participação, tais como os movimentos, ou através de uma participação plena no jogo para cantar ou tocar ao lado de outros com os instrumentos: “as crianças aprendem novo repertório pela modelagem e imitação auditiva, oral, cinestésica e tátil” (MARSH, 2013, p. 22 tradução da autora), isto é, estando por perto ouvindo e observando os modelos sonoros e visuais fornecidos por outras crianças e juntando-se ativamente no jogo e desenvolvem habilidades visuais, auditivas e cinestésicas ao mesmo tempo.

As crianças não parecem exigir que uma habilidade ou gênero de jogo seja aperfeiçoado antes de passar para uma nova habilidade ou para um novo jogo. Ao invés disso, Marsh (2008) diz que eles criam desafios para si mesmos através da elaboração e adoção de fontes externas novas, variantes de movimento, música ou texto. Estas variantes poderiam, então, ser transmitidas para outros jogadores de diferentes configurações de amizade ou ser imitadas por observadores que assistiram ao desempenho das crianças que estavam jogando. Nesse caso, as crianças aprendem não só com os adultos, mas umas com as outras, em grupos, ou ainda sozinhas, numa organização “auto dirigida”.

Dessa forma, no pátio escolar as crianças não necessariamente consideram o nível de dificuldade de um jogo ou de uma música para jogar da mesma forma como um adulto.

As crianças estão conscientes dos níveis de dificuldade, especialmente em relação aos padrões de movimento e, às vezes, elas podem usar esse conhecimento para elevarem a aprendizagem de um colega mais jovem ou menos hábil. Em muitos casos, entretanto, as crianças vão decidir sobre repertório e aprendê-lo de forma eficaz, porque lhes interessa, independentemente do nível de dificuldade.

Para Marsh (2008) nas práticas geradoras das crianças não há dicotomia entre processo e produto, pois o repertório está em constante evolução. Dentro da segurança social dos seus grupos de amizade, as crianças se envolvem de forma colaborativa na geração de variantes.

Marsh (2008) afirma que na seleção de fórmulas para uso em jogos, as crianças recorrem a diversas matérias-primas de seu ambiente auditivo. Músicas, textos e fórmulas de movimentos são, portanto, derivados dos meios de comunicação, da sala de aula e de músicas ou jogos realizados por outras crianças ou adultos. Como eles combinam fórmulas em suas brincadeiras, as crianças consideram conscientemente adequação formal, rítmica e melódica e demonstram um sofisticado conjunto de processos inovadores. Estes incluem, então, a reorganização das fórmulas, a elaboração através da adição de um novo material ou a expansão de material conhecido, a condensação através da omissão ou contração de fórmulas e a reformulação de material, por exemplo, através da substituição de palavras novas ou movimentos.

Além disso, a autora constatou que as crianças manipulam criativamente materiais da música popular quando realizam esses jogos, incorporando-os na invenção de novos jogos em suas performances nos pátios escolares. O desempenho da música popular incluiu os elementos visuais e auditivos que são rapidamente absorvidos e imitados por crianças em seu jogo. Gravações de músicas eletrônicas fornecem modelos que as crianças podem usar para ouvir, visualizar e repetir. Tal como acontece com a aprendizagem

dos jogos no pátio escolar as canções e coreografias também são aprendidas de forma holística.

Segundo Marsh (2013), as crianças não se apropriam apenas do texto e da canção, mas podem ainda se apropriar das

performances e de estilos de determinado ídolo popular. Em

um jogo registrado por Marsh (2013), em uma escola de West Yorkshire, duas meninas de 11 anos de idade, uma de Bengali e um Punjabi, discutem preferências musicais e demonstram suas músicas favoritas, começando com a música Like a Prayer da cantora Madonna, realizada como um jogo de palmas. Elas, então, passam a reproduzir a canção do filme Bollywood e dançam uma sequência aprendida a partir de vídeos em casa com excepcional precisão estilística. A menina de Bengali que lidera o canto muda seu estilo vocal sem esforço igualando Madonna e as características da canção Bollywood. As duas meninas de desempenho recriam os movimentos para acompanhar a dança na sequência do filme. Assim, a canção

Bollywood também foi transformada em um jogo de palmas

que incorporou movimentos de sequência de dança do filme. Uma vez que estas fontes geradas por adultos são transportadas para o campo de jogos, elas são imediatamente reapropriadas e submetidas aos esforços criativos das crianças. Assim, Marsh (2008) afirma que ao utilizar este material para fins criativos, as crianças exercem propriedade e controle sobre ele e não são destinatários passivos da cultura adulta.

Para a autora, o que fica claro a partir da análise da composição das crianças nas performances nesses ambientes dos pátios escolares, é seu alto nível de habilidade inovadora. Como as crianças estão envolvidas em um ciclo contínuo de criação e variação dentro e entre várias performances, este processo pode ser visto como uma síntese das estratégias de improvisação e composição.

Marsh (2013) ainda aborda que “as diferentes formas de realizar um jogo desenvolvem competências e podem ser aceitas como legítimas formas de prática de performance”

(MARSH, 2013, p. 17, tradução da autora). E ainda, “alguns dos aspectos ritmicamente complexos dos jogos de pátio podem ser utilizados como ponto de partida para o trabalho musical” (MARSH, 2013, p. 24, tradução da autora).

Marsh (2008) constatou em seus estudos que a grande variedade de estratégias de composição em uso nos pátios escolares ultrapassam os dispositivos de composição usuais disponíveis para uso em sala de aula na escola. Enquanto nos pátios escolares as crianças são capazes de manipular materiais musicais complexos utilizando uma vasta gama de técnicas, em sala de aula a limitação de materiais para composição é agravado pelas técnicas limitadas disponíveis para uso e expectativas dos professores.

A autora aborda, então, algumas sugestões sobre como os professores podem incorporar e facilitar a criatividade nos jogos na sala de aula como, por exemplo, permitir que as crianças manipulem e alterem o repertório ao longo do tempo como eles fazem criativamente no recreio. A criação de várias versões de músicas, jogos e peças instrumentais promove propriedade e o desenvolvimento de habilidades de composição e performance.

Se os professores aumentarem a complexidade e diversidade de materiais e técnicas disponíveis para a composição da sala de aula e improvisação, é provável que os resultados de composição melhorem e que as crianças sejam capazes de demonstrar o seu potencial ao máximo. Nesse sentido, Marsh (2008) explica que eles podem manipular os contornos melódicos de uma peça, aumentar ou diminuir a duração das frases, ou reorganizar uma série de fórmulas rítmicas, melódicas ou textuais.

No documento ANDRÉIA PIRES CHINAGLIA DE OLIVEIRA (páginas 49-54)

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