• Nenhum resultado encontrado

APRESENTAÇÃO E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS PRELIMINARES DA PESQUISA

A PRODUÇÃO ACADÊMICA ENTRE 2000-2014 Karla Patrícia Holanda Martins

APRESENTAÇÃO E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS PRELIMINARES DA PESQUISA

Até este momento da pesquisa (2014), a discussão dos resultados encontrados pôde ser feita com base nas palavras-chaves de todos os documentos mapeados. Para fins de análise, selecionaram-se as 10 (dez) palavras-cha- ves mais frequentes para cada tipo de publicação em cada uma das cinco regiões brasileiras. Observou-se, no entanto, que a palavra-chave “Psicanálise” se encontrava em maior número em todos os níveis de análise (aproximadamente 50% dos documentos). Assim, foram incluídas as 10 (dez) palavras-chaves subsequentes, resultando, por isso, em um

total de 11 palavras.

Pensamos que a explicitação do campo epistemológico em que essas pesquisas se inserem, sejam elas bibliográficas ou não, indica algo significativo. Qual incidência poderia assi- nalar? Seria um modo de afirmação em um campo exterior ao de sua origem, a saber, a saúde mental e/ou coletiva? A uni- versidade apontaria a sua responsabilidade pela transmissão do saber psicanalítico?

A construção deste capítulo configura uma análise qua- litativa preliminar. O refinamento desta última encontra-se em andamento, em etapa de tratamento de dados para futura apreciação por meio do software livre Iramuteq, que permite a análise de dados textuais e de discurso, produzindo uma teia significante na qual podem ser observadas as principais relações entre as palavras-chaves e as utilizadas nos resumos, facilitando a interpretação dos dados. A discussão aqui será apresentada, inicialmente, por regiões e depois a nível nacio- nal, obedecendo à sequência: Nordeste, Norte, Centro-Oeste, Sul e Sudeste.

Distribuição dos resultados por regiões brasileiras

Região Nordeste

Três programas de pós-graduação atenderam aos cri- térios da pesquisa nesta região, a saber: o da Universidade de Fortaleza (Unifor), o da Universidade Federal do Ceará (UFC) e da Universidade Católica de Pernambuco (Unicap). No total, foram encontrados 123 documentos, sendo 42 arti- gos científicos, 80 dissertações de mestrado e 1 tese de dou- torado, número que corresponde a 10,91% do total de docu- mentos encontrados.

No que se refere às palavras-chaves dos artigos, pode ser ressaltado o descritor “relação mãe-criança” (compreendendo expressões semelhantes como “relação mãe-bebê” e “relação mãe-filho”), que se encontra, principalmente, na interface com as questões da constituição psíquica e da alimentação, esta última representada pelas problemáticas da desnutrição e obesidade infantil. Outro descritor que se destaca é “corpo”, geralmente relacionado aos temas da psicossomática e/ou do câncer, refletindo, possivelmente, um pioneirismo desta

inserção no contexto dos hospitais e do esforço para estabele- cer um diálogo com o saber e as práticas médicas. A palavra “clínica” aparece associada ao sofrimento psíquico e à saúde mental; por vezes, vem acompanhada de uma preocupação em situar a dimensão do diagnóstico numa perspectiva crítica ao saber psiquiátrico.

Não há citação aos autores do campo psicanalítico entre as principais palavras-chaves. A única referência nominal a um autor é feita a Michel Foucault. Seu trabalho se associa a reflexões sobre os ditos “modos de subjetivação”, “identi- dade social” e “corporeidade”. Quando alguns trabalhos se ocupam de uma crítica ao saber e às práticas médicas, não ape- nas no âmbito da psiquiatria, recorrem às teses foucaultianas. Nas dissertações, predominam as temáticas relativas ao “corpo”. Outro tema de destaque é “relação mãe-criança”, apontando uma possível preocupação com as temáticas rela- cionadas à infância. Destaca-se, ainda, a palavra “sujeito”, explorada principalmente na sua relação com a clínica das psi- coses e da toxicomania; a sua presença, no contexto dos res- pectivos trabalhos, indica um compromisso com a questão da singularidade. Todavia, observa-se certa imprecisão na utiliza- ção do termo “sujeito”, nem sempre coincidindo com “sujeito do inconsciente”. A dimensão da singularidade aparece rela- cionada às especificidades do trabalho institucional, principal- mente, no confronto com a hegemonia do saber médico.

Com relação às teses de doutorado, devemos destacar que as três universidades têm programas de doutorado muito recentes, de modo que, a partir do recorte temporal da pes- quisa, somente uma tese foi registrada até dezembro de 2014.

De um modo geral, a produção da região Nordeste se des- taca pelo diálogo com o campo da Medicina, contribuindo com discussões sobre o lugar do sujeito, o adoecimento relacionado

às patologias orgânicas, por exemplo, ao câncer. Além disso, pode ser identificado um grupo de temáticas sobre a relação mãe-criança, a constituição do sujeito e a clínica das psicoses, fomentando o debate entre a psicanálise e a saúde mental.

Região Norte

Apenas um programa de pós-graduação preencheu os critérios de triagem estabelecidos pela pesquisa, o da Universi- dade Federal do Pará (UFPA). Ao todo, foi registrada a publi- cação de 42 documentos, sendo 21 artigos científicos, 20 disser- tações de mestrado e 1 (uma) tese de doutorado. Os números correspondem a 3,84% do total de documentos encontrados.

No conjunto de artigos, verificou-se que as dez palavras- -chaves de maior incidência são: “psicopatologia”, “AIDS”, “dispositivos clínicos”, “melancolia”, “desamparo”, “gozo”, “inquietante”, “saúde mental”, “sexual” e “sofrimento”. As temáticas abordadas nas dissertações transitam, igualmente, entre temas mais relacionados ao contexto da Medicina e do sofrimento psíquico advindo de situações de internações hos- pitalares e de doenças consideradas crônicas. Encontram-se, ainda, entre as temáticas relacionadas, considerações sobre a angústia, a melancolia e o desamparo. A temática da única pesquisa de doutoramento localizada concerne à saúde do trabalhador. Por fim, ressalta-se o contexto clínico em que as pesquisas foram desenvolvidas (nos hospitais gerais, em sua maioria), com exceção da trabalhada no âmbito do doutorado.

Região Centro-Oeste

Apenas um programa de pós-graduação se enquadrou nos parâmetros da pesquisa, o da Universidade de Brasília

(UnB), com um total de 13 publicações, sendo 8 artigos, 3 dis- sertações de mestrado e 2 teses de doutorado, representando 1,13% da produção nacional.

Entre as principais palavras-chaves dos artigos científi- cos, destacam-se produções relacionadas ao materno, repre- sentadas por “gravidez” e “maternidade”. O campo privile- giado de intervenção é o hospital. Não foram identificadas menções a autores psicanalíticos nesse tipo de publicação, nem nas demais. Nas dissertações e nas teses, foram encon- trados campos de estudo mais heterogêneos, tendo em vista que cada palavra-chave só ocorreu uma vez. Mesmo assim, podem-se destacar muitas palavras pertinentes à questão dos transtornos alimentares, tais como: “compulsão alimentar”, “obesidade”, “anorexia infantil”, “interação alimentar mãe- -bebê” e “recusa alimentar”.

De modo abrangente, pode-se destacar que as temáti- cas relativas ao Centro-Oeste discutem questões relacionadas ao campo da medicina, tendo o hospital como espaço de atu- ação privilegiado.

Região Sul

Aqui também somente um programa foi registrado a partir das atribuições da pesquisa, sendo a Universidade Esta- dual de Maringá (UEM) a única representante, com um total de 12 publicações, sendo 7 artigos científicos e 5 dissertações

de mestrado, somando 1,05% da produção nacional. Não foi

registrada nenhuma tese de doutorado.

Nos artigos científicos, destaca-se o descritor “histeria”, que aparece relacionado à cultura e à feminilidade, no con- texto da anorexia e da bulimia. Outro destaque é para a proble- mática do materno, representado pelos significantes “função

materna” e “amamentação”, relacionados também à “clínica com bebês” e às possibilidades de uma clínica da intervenção precoce. Nas dissertações, o campo também é heterogêneo, mas destaca-se o descritor “teoria da Sedução Generalizada” (conceito cunhado pelo psicanalista Jean Laplanche) relacio- nado à melancolia, à sexualidade e à psicossomática. A única referência nominal a autores nas palavras-chaves é a Bion.

As produções dessa universidade de Maringá configu- ram um campo limitado, não sendo possível identificar o pri- vilégio para um recorte de atuação.

Destaque-se que as produções das quatro regiões acima debatidas representam apenas 16,93% das produções recor- tadas pela pesquisa. Supomos que a alta concentração na região Sudeste aponta para fatores de antiguidade dos pro- gramas, que, por sua vez, remetem ao processo histórico-eco- nômico brasileiro.

Região Sudeste

O conjunto de documentos da região Sudeste representa, aproximadamente, 83,07% do total recolhido pela pesquisa, lan- çando um desafio para a análise qualitativa dos resultados dessa região, que são provenientes de 7 programas de pós-graduação: Universidade de São Paulo (USP), Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC- -Rio), Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Univer- sidade Federal de Uberlândia (UFU) e Universidade Federal de São João Del Rei (UFSJ). Trata-se de 952 documentos, sendo 504 artigos científicos, 313 dissertações de mestrado e 139 teses de doutorado. Desse modo, não sendo possível ainda analisar mais detalhadamente esses resultados, sem lançar mão de softwares

de análise de conteúdo, optou-se por levantar questionamentos apenas em torno das 11 principais palavras-chaves.

Com relação às palavras-chaves dos artigos, existe alta ocorrência dos descritores “psicose”, “saúde mental”, “reforma psiquiátrica”, “autismo”, o que permite apontar uma preocupa- ção com o trabalho clínico no contexto da pós-reforma psiquiá- trica. Nesse contexto, a psicanálise pôde contribuir, sobretudo, com uma clínica que considerasse as especificidades dos fenô- menos da psicose e sua estrutura, testemunhando quão danosa poderia ser a pasteurização de projetos terapêuticos (ainda que singulares) quando não considerados os dados de estrutura e as especificidades com que cada um lida com seu sofrimento.

As dissertações já apresentam referências aos autores utilizados, sendo “Freud” e “Lacan” os autores que se des- tacam. Não mais se destaca um campo privilegiado em que ocorrem as práticas, mas permanece a ênfase no âmbito das psicoses, do autismo e da saúde mental.

Por outro lado, conceitos como “gozo” e “transferên- cia” aparecem indicando as formas singulares com que cada sujeito se relaciona com seu sofrimento, como formula a sua demanda e, também, como responde à oferta de tratamento. Consideradas essas coordenadas de uma clínica do singu- lar, pode-se fazê-la avançar ali onde esta se degradou – na expressão de Gastão Wagner –, cedendo aos jogos de força entre os discursos normatizadores, entre eles o discurso jurí- dico da cidadania e o da medicina, expressos nos imperativos

de saúde, bem-estar e qualidade de vida.3 Trata-se aqui de um

3 Sobre os riscos de as teorias cederem de seus termos e conceitos em favor da boa

aceitação pelo discurso moral vigente em uma época, Freud já afirmara: “nunca se sabe aonde conduz esse caminho; primeiro cedemos nas palavras, e depois, pouco a pouco, também na coisa” (FREUD, 2011, p. 45).

compromisso em pensar a clínica teoricamente sustentada, o que se articula com as indicações dos textos freudianos em que a questão do sofrimento psíquico foi pensada na sua mais íntima articulação com a Cultura e a Política, sem que isso eje- tasse, entretanto, o sujeito, suas determinações inconscientes e sua responsabilidade.

Quanto às teses de doutorado, Lacan aparece com mais referências do que Freud. Pode-se questionar se isso ocorre em virtude da atribuição de certo nível de complexidade à leitura de Lacan em relação à de Freud, que foi mais utilizada nas dissertações. Outra referência teórica é Donald Winnicott. O campo de maior destaque ainda é o da psicose, que, possi- velmente, está associado a outros descritores muito frequen- tes como “corpo”, “sujeito” e “ato”.

Em linhas gerais, é importante reiterar que a região Sudeste concentra a maior parte da produção nacional den- tro do intercâmbio proposto pela pesquisa, principalmente, porque a maior parte dos programas de pós-graduação dessa região se consolidou há mais tempo e apresenta extensiva produção. Além disso, algumas dessas universidades foram importantes espaços de difusão e transmissão da psicanálise no país, estando muitos de seus representantes, inclusive, envolvidos no processo que culminou na reforma psiquiátrica brasileira; cabe, ainda, ressaltar sua contribuição para consoli- dar o trabalho de extensão à comunidade dos serviços presta- dos em suas clínicas-escolas.

Assim sendo, seus programas produzem maciçamente nos grandes campos em que a Psicanálise se articula na contemporaneidade, principalmente a Saúde Mental. Pode ser observada também uma predominância de referências à escola francesa de psicanálise, seja pela alta fre quência de descritores “Lacan”, como também pelo aparecimento

de outros descritores muito próprios à sua teorização, por exemplo, psicose e gozo. Outro descritor que aparece com destaque é “adolescência”, contrastando com a predominân- cia, nas demais regiões, do tema da infância, mais tradicional- mente estudado. Deve-se, por fim, frisar que uma análise mais detalhada da região Sudeste só será possível com o uso de recursos eletrônicos de análise de conteúdo, devido à exten- são dos dados encontrados nesse recorte.

A seguir, apresentamos alguns dados referentes às pesquisas realizadas nos Centros de Atenção Psicossociais – CAPS. A delimitação do campo em questão apoia-se na

importância derefletir sobre os possíveis efeitos do discurso

e das práticas inspiradas pela psicanálise nesse âmbito, trans- versalizados pelas mudanças nos campos da reforma psiqui- átrica e sanitária no Brasil. As referências retomadas abaixo já fazem parte da análise realizada a partir da leitura de resu- mos e dos trabalhos na íntegra, neste caso, privilegiando os trabalhos acadêmicos que dão testemunhos de suas práticas clínicas nos Centros de Atenção Psicossociais.

A pesquisa em psicanálise nos Centros de Atenção Psicossocial

Nos anos 1990, a psicanálise começa a consolidar seu per- curso institucional na atenção secundária a partir da reforma psiquiátrica e de novos modelos de assistência à saúde men- tal, tendo como principais dispositivos os Centros de Atenção Psicossocial (CAPS). Rinaldi (2005) aponta que o movimento psicanalítico brasileiro, a partir do final do século XX, passou a ocupar-se mais significativamente do trabalho em instituições públicas de cuidado à saúde, como CAPS, hospitais, ambula- tórios de saúde mental, entre outros. Esse interesse teve como

consequências para o psicanalista a mudança de seu tradicio- nal lócus de trabalho, o consultório privado, “para um espaço em que ele está entre vários, ao lado tanto dos profissionais que fazem parte da equipe quanto dos sujeitos a quem se dirige o tratamento” (RINALDI, 2005, p. 88).

Com relação ao material concernente ao CAPS (artigos, dissertações e teses publicados entre 2000 e 2014), verificou- -se que há 38 artigos, 52,05% dos documentos, 24 dissertações, equivalentes a 32,87%, e 2 teses, ou seja, 2,73% das produções, que partiram de uma prática em um Centro de Atenção Psi- cossocial ou que versam sobre esse serviço da atenção secun- dária. Constatou-se também que a região Sudeste se destaca na produção em foco, com um acúmulo de 87,67% da produção nacional. Foi possível perceber, ademais, uma predominância da produção em análise qualitativa, evidenciando-se que a natureza dos trabalhos recai sobre o método de pesquisa teóri- co-clínico, isto é, produções construídas a partir de uma atua- ção nos Centros de Atenção Psicossocial (CAPS).

Para a viabilização de uma análise qualitativa mais detalhada das 73 produções, foi necessária a criação de três categorias de análise, que surgiram da caracterização dos aspectos do estudo: 1) Dispositivos clínicos e metodológicos de pesquisa; 2) Objetos de estudo e intervenção; 3) Relações entre a Psicanálise e o discurso médico no campo da saúde mental. O primeiro tópico diz respeito às estratégias de atua- ção ou construção de uma prática profissional que embasaram a teorização do trabalho, como a utilização de casos clínicos, estudos de caso, supervisão institucional, oficinas terapêuti- cas, análise de prontuários, apresentação de paciente, acom- panhamento terapêutico e residências terapêuticas. Já no segundo ponto, concentram-se os mais diferentes objetos de estudo sob os quais as produções se debruçam, tais como: a

toxicomania, a psicose, o autismo, a perversão e a histeria. Na terceira e última categoria, localizam-se as contribuições, aproximações e divergências entre a prática psicanalítica e o fazer médico psiquiátrico, incluindo-se aqui temáticas como a clínica ampliada, a clínica do sujeito e a atenção psicossocial.

Na categoria “Dispositivos clínicos” (categoria 1), as práticas interdisciplinares são as mais frequentes nos estudos realizados, estando em 41 produções, ou seja, em 56,16% das produções que versam sobre o CAPS no Brasil.

Desse modo, é evidente que a prática nos Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) tem demandado o exercício de pensar a construção de novos dispositivos de trabalho clí- nico, mas também um esforço em direção à construção de um diálogo com os demais profissionais da saúde atuantes na atenção secundária. Assim, desafia-se o nível teórico e reto- mam-se os conceitos fundamentais de inconsciente, sujeito e transferência, na perspectiva de redesenhar, na dita clínica ampliada, o que tem sido batizado como “a clínica do sujeito”. A prática psicanalítica e a aplicabilidade de seus fun- damentos entre outros profissionais e saberes se aproximam do que Lacan (1967) postulou a respeito do conceito de psi- canálise em extensão. Assim, ao analisar o referido banco de dados, é evidente a interrogação recorrente na grande maio- ria dos trabalhos sobre o seu lugar nas instituições. O analista é convocado, portanto, entre outras possibilidades, a atuar dirigindo sua escuta clínica ao advento do singular, a apostar como instrumento da prática na construção do caso clínico, a participar de uma atuação na equipe de profissionais e a dialogar com os demais envolvidos na definição dos projetos terapêuticos individuais.

O lugar que o analista pode construir apresenta-se múl- tiplo, embora haja disponibilidade de uma construção em

parceria que necessita de uma capacidade de interlocução com outros saberes. Há um apontamento permanente para o esforço em não ceder ao inespecífico, em continuidade com o que já fora apontado por Figueiredo (1997, p. 168): “O psi- canalista não é especial. É específico. Só assim ele convém”. Aqui se frisam as mais diversas interrogações e afirmações que lhe cabem, seja da ordem de identificar e trazer às pala- vras o excludente em sua práxis, seja de realizar uma aposta em uma intervenção que priorize a lógica do desejo em um tratamento multiprofissional.

Assim, a problemática que mais se destaca quando se formula o problema “sobre o lugar da psicanálise (e do psi- canalista) nas instituições de saúde mental” refere-se à escuta do singular, à construção de vias de acesso à produção subje- tiva e ao advento do discurso que possibilite um reposiciona- mento do sujeito frente ao seu tratamento. Ao analista recai o desafio de suportar o intratável e estar atento às sutilezas de uma escuta clínica sensível e encorajada diante do sofrimento psíquico do sujeito e de suas manifestações, considerando as formações inconscientes.

A escuta realizada pelo analista é o instrumento basilar para fazer advir esse sujeito, que “não é uma coisa tão óbvia”, surgindo nos fenômenos da linguagem, nas descontinuida- des e interstícios do discurso e na maneira particular como esse discurso se articula para cada um. O sujeito, portanto, não é alheio aos fenômenos ditos psicopatológicos que o aco- metem, uma vez que esses fenômenos são também eventos de linguagem. Seja no sintoma, no caso da neurose, seja no delírio e nas manifestações alucinatórias, no caso da psi- cose, é nessas formações que devemos escutar a verdade do sujeito, mesmo quando ela não pode ser reconhecida como tal (RINALDI, 2005).

Sob o ofício de analista se sobrepõem cuidados com o material clínico, que deve ali ser trabalhado sigilosamente ao nível transferencial, mas também com a disponibilidade de compartilhar com seus pares profissionais materiais funda- mentais na construção de um projeto terapêutico singular.

Dentro do paradigma da construção de uma intervenção terapêutica singular, a metodologia do caso clínico destaca-se, na distribuição das frequências, com 36 produções, isto é, com uma porcentagem de 49,31% da produção nacional analisada. Desse modo, faz-se pertinente uma interrogação acerca da relevância e da predileção por esse tipo de metodologia inse- rida na prática clínica.

A escolha é justificada pelos autores em virtude de o caso clínico evidenciar o caráter singular dos processos de