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Considerada um país em desenvolvimento, a Argentina é um bom exemplo de preocupação com a sua política ambiental para licenciamento da indústria petróleo e gás natural, principalmente sendo o gás natural a sua principal produção de combustível fóssil. A primeira lei ambiental data de 1891, em grande parte do século XX, as suas abordagens eram direcionadas na gestão de parques nacionais e em recursos específicos como água, terra e minério, e não as questões de forma integrada (Amengual, 2011).

Em 1973 durante o governo do presidente Juan Domingo Perón, em virtude da atenção mundial ao meio ambiente, foi criada a primeira Secretaria de Recursos Naturais e Ambiente Humano- SRNAH. Na mesma época ocorria a criação de agências noutros importantes países como o Reino Unido e os Estados Unidos, em 1972, que criou a EPA. Contudo, essa ação pioneira perdeu força com a sua morte em 1974 e consequente golpe em 1976, onde o exército desmantelou a secretaria de meio ambiente (Gutiérrez & Isuani, 2013).

A política ambiental manteve-se durante os próximos 30 anos, definida pelo desenvolvimento desigual, comparada a outras pastas do governo. Nas décadas de 1970 e 1980, a Argentina se tornou signatária de muitos acordos internacionais, e aprovou leis que regiam questões ambientais específicas (Amengual, 2011).

Somente em 1991, ocorreu a recriação da SRNAH, lançando num caminho contínuo de altos e baixos, até que em 1993 foi incorporado na Nova Constituição os direitos ambientais (Gutiérrez & Isuani, 2013).

A constituição também trouxe no seu art.º 43, uma inovação para época, que foi a autorização de indivíduos e ou grupos a intentar ações em nome de danos coletivos criados pela degradação ambiental, muito diferente do que ocorreu durante a ditadura. A partir deste fato as ONGs ambientais na Argentina ganham importância (Amengual, 2011). Durante todo o período da ditadura militar, não houve movimentações ambientais e nem sociais, já que as ONGs só surgiriam durante o período democrático, principalmente as organizações sociais ambientais. Apesar de não ter uma participação tão direta e legal quanto as ONGs americanas, tinham um importante papel de manifestação ambiental representando a sociedade, o que não foi suficiente para mudar o curso da política ambiental do país, porém levou o Estado (nos seus três níveis) a prestar mais atenção às

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demandas e posições de organizações ambientais sociais da política ambiental nos níveis tanto regulatórios como na organização (Gutiérrez & Isuani, 2013).

Diferentemente do seu vizinho Brasil, que chamava atenção de ONGs internacionais, a Argentina teve como protagonista social na luta e lobby no congresso para uma legislação ambiental mais forte em nível nacional, ONGs nacionais, que obtiveram maior força após o retorno da democracia, final dos anos 80 e início dos anos 90 (Amengual, 2011).

As ONGs Argentinas eram organizações amplamente pluralistas e heterogéneas, assim como nos EUA, mas diferentemente deste, não foram regulamentadas e nem contavam com apoio de partidos políticos (Amengual, 2011).

De 1989 a 2009 foram identificados 5 perfis ambientais nas gestões nacionais na Argentina. O primeiro perfil durante o governo de Carlos Menem, denominado pelo autor como promocional, teve como foco a criação de agências ambientais, mais a título ilustrativo sem nenhuma efetividade, para atender a crescente demanda do público em cima das questões ambientais (Bueno, 2010).

Paralelo a essa trajetória ambiental, também na década de 90, a Argentina chegou a ocupar a 3.ª posição como maior produtor de petróleo e gás da América Latina (Ficando atrás apenas do Brasil e da Venezuela), isso demonstrava que havia grande necessidade de uma reforma ambiental que abrangesse esse setor (Kawamura, 2014).

O avanço das leis ambientais no papel e o avanço na produção de recursos não renováveis, não estavam compatíveis, uma vez que faltavam funcionários treinados para cumprir leis, ou mesmo empresas para receber resíduos (Amengual, 2011).

Outro grande problema para o avanço da política ambiental na Argentina foram as recorrentes aprovações e sanções de leis nacionais sob quadros orçamentários de proteção mínima, o que demonstrava que mesmo com regulamentos ambientais eficientes, faltavam condições de implementar esses regulamentos, e esse foi um problema que envolveu os três níveis de governos (Gutiérrez & Isuani, 2013).

A Argentina se apresenta com uma divisão entre o ente máximo que é o Estado Nacional e mais 23 províncias e a cidade autónomo de Buenos Aires (CABA), que possui regime autónomo com chefe de governo e legisladores. As províncias sancionam as suas próprias constituições e também mantêm todos os poderes não delegados pela Constituição Nacional no nível central, além do controlo original dos recursos naturais (Cáceres, 2017). As províncias, desde meados dos anos 80, demonstram um avanço na elaboração de leis ambientais (Cetrángolo, Chidiak, Curcio & Gutman, 2004). Possuem autoridades próprias

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que, juntamente com o Secretário Federal, compõem o Conselho Federal de Meio Ambiente - COFEMA, criado sob a Política Nacional de Meio Ambiente - NEP (Siboldi & Fanelli, 2019).

O COFEMA se caracteriza por agrupar as autoridades ambientais das províncias da Nação e da CABA, mas não possui representantes de outros setores, nenhum mecanismo de participação cidadã nas suas decisões (Cáceres, 2017).

Apesar do poder das província e municípios de implementarem padrões ambientais mais rígidos do que o governo federal, ocorre exatamente o contrário, essas tendem a diminuir os padrões nacionais ou simplesmente não cumprem a legislação nacional, ou mesmo a sua própria legislação, a fim de aprovar os orçamentos mínimos de proteção ambiental ou dificultar a sua implementação de forma que a política atenda aos objetivos declarados (Gutiérrez & Isuani, 2013).

Para Nolon, 1996, ao comparar a Argentina aos Estados Unidos, destacou a falta de equilíbrio adequado de autoridade e responsabilidade entre os governos nacionais, provinciais e municipais, bem como entre os setores público e privado, para se ter garantia de implementação da legislação.

Apesar da analogia entre a relação de poderes entre o governo federal e o estadual dos EUA e Argentina, o que se vê é que nos EUA o modelo progrediu para refletir um governo federal com poderes amplos, de formulador de políticas, através de mandatos e doações, sobre os estados. Já o federalismo argentino progrediu de uma maneira muito menos centralizada, concedendo vários poderes de formulação de políticas às províncias (AmCham - American Chamber of Commerce in Argentina, 2018).

Essa relação do governo federal e das províncias na Argentina nem sempre foi clara, principalmente a jurisdição sobre diferentes partes da legislação ambiental. Uma vez que nenhum dos três poderes assumiram a responsabilidade de fazer cumprir os regulamentos, somados a acontecimentos de corrupção na agência federal, levou ao fracasso a implantação em prática da política ambiental nos anos 90 (Amengual, 2011).

Certamente, houve uma tendência por parte das províncias na Argentina de não adoção das leis aprovadas pelo congresso federal nas diferentes áreas ambientais (Nolon, 1996).

Tais atos refletiram na existência de “instituições fracas” na Argentina, o que ecoou na permissão de uma descrição considerável na maneira como as regras são aplicadas entre agências, áreas políticas e regiões (Amengual, 2016).

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As províncias precisavam ser motivadas a participar da criação do sistema nacional exigido pela constituição, o que lhe daria o máximo controlo sobre a implementação e a aplicação das normas básicas estabelecidas no artigo 41 da constituição nacional (Nolon, 1996). No final da década de 90, devido a todos esses acontecimentos, a secretaria foi rebaixada e transferida para o Ministério de Desenvolvimento Social, funcionários qualificados e treinados foram perdidos em outras funções do ministério, deixando claro a dificuldade de implementação da política ambiental pelo governo federal (Amengual, 2011).

Em 1992 com a promulgação da Lei n.º 24 145 foi transferido o domínio público dos depósitos de petróleo e gás natural do Estado Nacional para as Províncias, conjuntamente com a realização de vendas e privatizações de estatais responsáveis pela exploração, produção e transporte (Cáceres, 2017).

Entre 1999 a 2001 um segundo perfil ambiental postergado ficou evidente, na administração do então presidente Fernando de La Rúa, apesar da participação da Argentina em foros internacionais, não havia uma iniciativa de implementação das políticas internacionais, com uma evidente desaceleração das políticas ambientais internas e externas, tanto no discurso quanto nas ações (Bueno, 2010).

Já com a posse do presidente Eduardo Duhalde, em 2002, uma gestão regulatória tomava lugar, com destaque para política ambiental interna (Bueno, 2010).

Após todos esses atrasos ocorridos, a regulamentação ambiental prevista na constituição só veio ocorrer em 2002, quando foi sancionado um pacote de leis cuja peça central era a Lei n.º 25 675 de 2002 a Lei Geral do Meio Ambiente (Gutiérrez & Isuani, 2013).

A maioria dessas leis ainda não foi codificada, mas estabelece que o estado nacional deve implementar os padrões mínimos de proteção ambiental, pela Lei Geral do Meio Ambiente e as províncias também podem emitir regulamentos além da legislação nacional (Siboldi & Fanelli, 2019).

A partir da promulgação da nova constituição Argentina, em 1994, houve uma separação explícita das competências entre o estado nacional e as provinciais em questões ambientais (Cetrángolo & et al., 2004).

Diante disso, enquanto o estado nacional decreta que as províncias adotem legislação ambiental complementar às leis federais sobre padrões mínimos de proteção, também há o reconhecimento expresso do domínio contínuo das províncias sobre os seus próprios recursos naturais (AmCham, 2018).

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Porém, isso não resolveu o problema de aplicação jurisdicional, já que os princípios de acordo com o quais as províncias conservam todo o poder não delegado ao estado nacional, enquanto lhe é garantido o domínio original dos recursos naturais existentes no seu território, vai contra o poder do estado nacional de determinar orçamentos mínimos para proteção ambiental, já que estes serão aplicados de acordo com os regulamentos provinciais complementares (Cetrángolo & et al., 2004).

Sob o mesmo ponto, Amengual (2011) afirma que apesar de as províncias não estarem devidamente equipadas para enfrentar esses altos níveis de violações e mudanças regulatórias severas, principalmente devido a sua autonomia, observou-se que o fato de atuarem de forma direta no licenciamento ambiental proporcionava uma maior proximidade da população local e a adoção de políticas voltadas para suas características. Com o seu próprio regime regulatório de licenças, em geral, os regulamentos provinciais seguem o regime federal, mas em alguns casos os padrões de proteção foram elevados, a fim de atender aos requisitos locais, portanto, variavam de província para província.

Ademais, o regime na Argentina não possui incentivos especiais para atender às preocupações ambientais associadas à exploração e produção de petróleo e gás natural. No entanto, existem sanções pelo não cumprimento dos requisitos ambientais (Siboldi & Fanelli, 2019).

No mandato de Nestor Kirchner, 2003 a 2006, ele deu continuidade a política ambiental regulatória do seu antecessor, dando ênfase aos pacotes de regulações voltadas para programas e projetos ambientais, além disso, manteve um discurso diplomático aplicado a leis ambientais de alto impacte na opinião pública. A partir de 2006, ocorre uma mudança no perfil ambiental do governo nacional, se tornando mais promocional, com mudanças estruturais importantes nos órgãos governamentais e decisões sem a devida publicação (Bueno, 2010).

O Ministério se manteve sob alçada do Ministério da Saúde e somente a partir de 2006 o Ministério ficou sob dependência direta do Chefe de Gabinete de Ministros, retomando o status de secretário de Estado, juntamente multiplicaram as aprovações de fundos orçamentários da secretaria, elevando finalmente a política ambiental como uma política de estado (Cáceres, 2017).

Com a recente estrutura do Ministério do Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável e o COFEMA como articulador da política ambiental com as províncias, como se não bastasse o fato da exploração do petróleo e gás natural ser tratada em outra agência

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centralizada, neste caso o Ministério de Energia e Mineração, como consequência houve o aumento da fragmentação setorial e institucional da questão ambiental (Cáceres, 2017). Segundo Work Bank Group (2016) embora politicamente influente, o COFEMA esbarra numa série de obstáculos para o seu pleno funcionamento que são: não possui poderes regulatórios formais para garantir o cumprimento das suas regulamentações; não possui recursos dedicados para financiar o seu mandato, a existência de Conselhos Federais de Mineração e a ausência de um mecanismo eficaz de coordenação e colaboração que forneça uma abordagem holística para lidar com questões de política ambiental.

As atividades de petróleo e gás na Argentina estão sujeitas a regras ambientais gerais e regulamentos específicos relacionados a derramamentos de óleo, queima de gás, restrições de segurança e outros (Siboldi & Fanelli, 2019).

Apesar de a produção líquida de petróleo ter caído nos últimos anos, a Argentina ganhou destaque pelo aumento da produção e exportação de gás natural, sendo o maior produto da América do Sul e o 20.ª maior do mundo (Indexmundi, 2020).

Esses dois recursos já são bem conhecidos e utilizados pelos governos de forma estratégica, desta forma, o governo utiliza de meios para controlo económico, foi assim que o governo argentino decidiu implementar a partir de 2003 um complexo sistema de regulamentação de petróleo e gás natural (Kawamura, 2014).

Historicamente existe uma tensão pelo domínio do petróleo e gás natural entre o governo nacional e as províncias, considerado como recurso estratégico até o início dos anos 90, mas mudando de status durante o governo neoliberal de Menem (Barneix, 2016).

Em 2006, uma nova lei de domínio de hidrocarbonetos foi aprovada, a Lei n.º 26 197, que concorda que os depósitos de petróleo e gás natural são patrimónios inalienáveis e imprescritíveis do Estado nacional ou dos estados provinciais, de acordo com o âmbito territorial9 onde eles estão (Cáceres, 2017).

A Argentina ainda conta com um Escritório anticorrupção, relacionado diretamente à atividade de exploração de petróleo e gás natural, reflexo de atos corruptivos de governos anteriores, esse escritório é uma agência que se reporta ao Ministério Justiça e Direitos

9 segundo Cáceres (2017) a divisão territorial da Argentina em relação ao exploração de petróleo e gás natural

foi acordado que o Estado nacional pertence aos "depósitos de hidrocarbonetos encontrados das DOZE (12) milhas náuticas, medidas até o limite externo de plataforma continental e aos Estados provinciais os depósitos hidrocarbonetos encontrados nos seus territórios, incluindo os localizado no mar adjacente às suas costas até uma distância de doze (12) milhas náuticas.

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Humanos e cuja atual Secretária, exigiu ativamente a transparência e divulgação dos acordos firmados com empresas de exploração estrangeiras (Cáceres, 2017).

A corrupção nos diferentes níveis de governo e implementação prática de políticas ambientais têm sido alvo de uma série de ações e decisões judiciais, o intuito é diminuir o lobby político das regulamentações e fazer com que o padrão mínimo, promulgada na Reforma Constitucional de 1994, sejam cumpridos, seja a nível nacional ou nas províncias. O Judiciário tem desempenhado um papel cada vez maior na interpretação e no cumprimento da implementação prática da legislação ambiental (Word Bank Group, 2016). Por fim, a norma atribui mais uma função central ao estado nacional e provinciais, que seria estabelecer uma legislação ambiental uniforme, com objetivo de aplicar melhores práticas de gestão ambiental para tarefas de exploração produção e transporte de petróleo e gás natural (Cáceres, 2017).

No mandato de Cristina Kirchner, 2007 a 2015, ela deu continuidade à política ambiental promocional do seu antecessor, mas com uma ténue delicadeza nas mudanças estruturais e um estilo diplomático mais alto para tratar as questões ambientais internacionais (Bueno, 2010).

Em 2014, Cristina sancionou a lei de hidrocarboneto n.º 26 741, estabelecendo que entre as suas diretrizes que a política de petróleo é o poder do Estado nacional e deve ser o mesmo em todas as províncias, a lei ainda permitia o uso de técnicas para exploração, vetadas noutros países, e que causavam impactes sociais e ambientais (Barneix, 2016).

A sanção desta lei causou repulsa no capital estrangeiro, justamente pelo impacte negativo causado pelas técnicas de exploração e produção (Barneix, 2016).

Em 2015 com a criação do novo Ministério do Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável, substituindo a Secretaria de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável, houve um maior desempenho no desenvolvimento de políticas ambientais a fim de melhorar os acordos com tecnologias tão impactantes (Work Bank Group, 2016).

Do mesmo modo, ocorreu a implementação e gestão de assuntos ambientais, incluindo disseminação de informações, e o estreitamento com organizações não governamentais (ONGs) relacionadas ao meio ambiente colocando a Argentina na modernização do debate pluralista das políticas ambientais e aumentando a força para lidar com as políticas económicas impostas pelo governo (Work Bank Group, 2016).

Já o Governo de Maurício Macri começou com uma política ambiental mais aberta a participação pluralista, o que não se estendeu, já na primeira crise ambiental, com um

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derramamento de cianeto numa Mina, o governo mudou a sua postura e impôs sanções que configurou uma nova relação entre o governo, as províncias, a sociedade civil e a mineração (Nápoli, 2016).

O governo Macri não fez muito pela pasta ambiental, apesar de ter criado espaços institucionais, como o Ministério do Meio Ambiente e uma instituição específica do Ministério da Energia e Minas, a fim de promover um cenário de planeamento energético com uma matriz mais diversificada e menos dependente de combustíveis fósseis, por outro lado, proporcionou uma agenda ambiental separada dos aspetos sociais e económicos, enfraquecendo a pasta ambiental (Nápoli, 2016).

Mais uma vez as províncias precisam tomar o seu lugar na gestão ambiental e na pluralidade na participação da política ambiental.

Portanto, há um reconhecimento da importância da atuação das províncias na regulamentação das leis ambientais da exploração de petróleo e gás natural, as práticas e procedimentos ambientais aprimorados aumentam o êxito da tomada de decisões políticas. Contudo, implementar uma política ambiental que funcione plenamente será um caminho longo.

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V- Existe algum paralelo entre a experiência brasileira no âmbito acima

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