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ANEXO 33: Matéria em CartaCapital – “Do Fora Temer ao Diretas Já”

2 OS USOS DA ARGUMENTAÇÃO

2.3 A DINÂMICA ARGUMENTATIVA DE BRETON

2.3.1 Argumentos de Enquadramento e de Vínculo

Se Perelman e Olbrechts-Tyteca (2005) têm o mérito de se dedicaram às técnicas argumentativas, Breton (1999) tem o mérito de reduzi-las e simplificá-las. Entretanto, mesmo assim, Breton (1999) expõe que a definição das estratégias argumentativas é complexa, pois

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uma mesma sentença pode ser um apelo à autoridade e, ao mesmo tempo, comparativo ou metafórico. Em contrapartida, o autor aponta que, apesar das dificuldades, é possível fazer uma análise devido aos “dominantes” que nos ajudam a distinguir a qual estratégia argumentativa aquela sentença pertence.

Antes de apresentar suas estratégias argumentativas, Breton (1999), disserta sobre a dinâmica argumentativa, momento no qual a argumentação é entendida a partir de dois momentos necessários para sua concretização. Para o autor, cada momento teria seu próprio conjunto de argumentos possíveis de se utilizar. Sobre a dinâmica argumentativa, Breton (1999), propõe etapas. Primeiro, o orador:

Figura 4: Esquema da dinâmica argumentativa (BRETON, 1999, p. 64)

1) Mobiliza sua opinião, isolando- a provisoriamente do contexto na qual ela é produzida; 2) Identifica o seu ou os seus auditórios; 6) Liga a opinião proposta ao contexto de recepção assim modificado. 5) Intervém no contexto de recepção do auditório para modificá-lo a fim de “abrir um lugar” dentro dele

para sua opinião;

4) “Encaixa” sua opinião em um ou vários argumentos; 3) Identifica o contexto no qual seu argumento será recebido; Utiliza argumentos de Vínculo Utiliza argumentos de Enquadramento Fonte: Elaboração própria com base em Breton (1999, p. 64)

A argumentação se concretizaria, então, segundo o autor, a partir de um duplo-gatilho argumentativo, processo no qual primeiro se “enquadra”, depois se “liga”. O primeiro passo deste processo, o de enquadrar, seria o fato de construir um “real comum” entre o orador e o auditório, em outros termos, o fato de intervir no contexto de recepção, isto é, estabelecer uma espécie de “acordo prévio” que ainda não é o raciocínio argumentativo, mas sim um “preparo do auditório”. O segundo passo, o “ligar” seria, de fato, “construir um vínculo entre este acordo e a opinião proposta” (BRETON, 1999, p. 67).

Segundo o autor, o duplo-gatilho escancara a dinâmica da argumentação: primeiro se modifica a opinião de alguém, para depois oferecer a opinião que se quer se seja aceita: “[...] dirigimo-nos aos outros, primeiramente para que eles mudem sua visão das coisas, em seguida, para lhes mostrar que a nova opinião proposta está de acordo com a nova visão das coisas” (BRETON, 1999, p. 67). Mesmo que o autor evidencie o duplo-gatilho

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argumentativo, ele acredita que, na prática, não há como separar estas duas etapas. A dinâmica dos dois momentos da argumentação termina por ser, para o autor, uma espécie de dinâmica invisível, visto que tecnicamente é impossível separar esses dois níveis de argumentação.

Para esse processo de duplo-gatilho são designadas, segundo o autor, respectivas estratégias argumentativas que são as de Enquadramento e as de Vínculo. Consoante às primeiras, têm-se as estratégias argumentativas de autoridade que podem se manifestar pela competência, experiência e testemunho; as de pressupostos comuns ou valores e pontos de vista que se manifestam pela opinião comum, valores e pontos de vista, e reenquadramento que abarca definição, apresentação, associação e dissociação.

Figura 5: Argumentos de Enquadramento (BRETON, 1999)

Argumentos de Enquadramento Pressupostos comuns ou Valores e pontos de vista Autoridade Reenquadramento Competência Experiência Testemunho Opinião comum Valores Pontos de vista Definição Apresentação Associação e Dissociação Descrição Qualificação Amplificação Expolição

Fonte: Adaptado de Breton (1999, p. 143)

Vistos os argumentos de Enquadramento, aqueles que, segundo Breton (1999), são a primeira etapa da argumentação, agora, passa-se aos argumentos e Vínculo, que compreendem a segunda etapa.

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Fazem parte dos argumentos de Vínculo os argumentos dedutivos e os analógicos. Respectivamente: ou se deduz que uma opinião faz parte da realidade enquadrada, ou “proporemos que a realidade enquadrada constitui um dos termos de uma analogia e o outro termo é a opinião” (BRETON, 1999, p. 114). Ainda de acordo com o autor, os argumentos de vínculo podem ser eficazes por si mesmo, porém, a importância de primeiro enquadrarmos advém da capacidade de estabelecer um acordo prévio com o auditório, ou seja, possibilitar o mapeamento do contexto de recepção. O autor concede o exemplo de alguém que fale: “Seja um estrategista como Napoleão”, no entanto, se o auditório reconhecer Napoleão como um ditador, o argumento de vínculo perderá sua eficácia. Por isso a importância de primeiro mapear se o auditório aceita Napoleão como estrategista. As estratégias argumentativas de Vínculo dividem-se entre as dedutivas, que se manifestam pela onipotência, quase-lógico, reciprocidade e causal e as analógicas, que se manifestam pela comparação, metáfora e exemplo.

Figura 6: Argumentos de Vínculo (BRETON, 1999)

Argumentos de Vínculo Dedutivo Analógico Onipotência Quase-lógico Reciprocidade Comparação Metáfora Exemplo Simples Analógica Modelo Iluststração Causal Transtividade Identidade Divisão

Fonte: Adaptado de Breton (1999, p. 143)

Não existe somente uma dinâmica argumentativa possível, mas por mais que existam dinâmicas variadas, elas possuem alguma semelhança entre si. Charaudeau (2009) sugere uma “mecânica argumentativa” e delimita uma “atividade cognitiva quadruple”, relacionada ao falante na hora de argumentar: problematizar, tomar posição, elucidar e provar. O primeiro passo é relacionado ao campo temático que o falante vai abordar, isto é, mostrar qual o

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“marco de questionamento” que a argumentação irá girar em torno. O segundo passo é justamente tomar posição, defender sua proposta em uma determinada direção, deixar transparecer em relação a quais aspectos se está a favor ou contra. O terceiro passo, que pode se juntar ao quarto, é o ato de proporcionar argumentos que ajudarão o falante a fundamentar e, de fato, provar seu ponto de vista. A argumentação, para Charaudeau (2009), é definida como

[...] uma atividade cognitiva geral, dirigida para o interlocutor, mediante a qual o emissor põe em marcha uma organização discursiva cujo objetivo é impor ao interlocutor um marco de questionamento, uma tomada de posição e argumentos de prova, com o objetivo que este não encontre nenhum contra-argumento e acabe por compartilhar a opinião do sujeito que argumenta (CHARAUDEAU, 2009, p. 280, tradução nossa).

Observa-se, na argumentação de Charaudeau (2009), que o aspecto dialogal da argumentação de Grácio (2012) não é tão recorrente. Para o primeiro autor, a argumentação parece ser muito mais uma imposição de um ponto de vista, relacionada, de certo modo, ao poder da fala do que propriamente um diálogo. Partindo da concepção de Charaudeau (2009), sugere-se que a mídia é um orador interessado em fazer o auditório aderir a sua opinião, em relação a isto, o próximo capítulo se dedica a pensar a mídia como um ator político que visa a um cálculo estratégico para a adesão às suas ideias.

2.4 A MÍDIA COMO ATOR POLÍTICO: ARGUMENTAÇÃO NA ESFERA MIDIÁTICA