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3 A TEORIA DAS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS

3.4 As abordagens da Teoria das Representações Sociais

A TRS apresenta significativas contribuições teórico-metodológicas de outros pesquisadores, que a partir de Moscovivi, mantêm contato com a referida teoria desde a década de 60, no então recém-criado Laboratório de Psicologia Social, cujo fundador era o próprio criador da TRS (ALMEIDA, 2005). São eles: Denise Jodelet, Willem Doise e Jean- Claude Abric, entre outros.

Assim, tais autores se dedicaram às correntes teóricas distintas, que complementam a TRS, auxiliando em seu desenvolvimento, na medida em que se constituem em formas diferenciadas de investigar as RS.

A abordagem culturalista, de Denise Jodelet, prima pela ênfase da articulação entre as dimensões sociais e culturais que, por sua vez, conduzem as construções mentais e coletivas. Destacamos que as RS “[...] nos guiam no modo de nomear e definir conjuntamente os diferentes aspectos da realidade diária, no modo de interpretar esses aspectos, tomar decisões e, eventualmente, posicionar-se frente a eles de forma defensiva” (JODELET, 2001, P. 17). Assim, segundo Jodelet (2006), as aplicações possíveis de serem feitas mediante o paradigma das RS, nos diversos níveis que constituem a vida coletiva, social e individual, tornam a busca de um suporte em uma perspectiva cultural extremamente necessária.

Almeida (2005) confere à Jodelet o mérito de manter atual a proposição original de Moscovici, bem como a sistematização e divulgação da TRS. Em sua orientação teórico- metodológica, Jodelet faz alusão à necessidade do estudo das RS assegurarem quatro questões que dizem respeito a: apreensão dos discursos que sustentam a representação de dado objeto;

compreensão dos comportamentos e práticas sociais relacionados às representações; análise de documentos e registros que institucionalizam discursos, comportamentos e práticas sociais; e a análise também dos discursos difundidos pela mídia que exercem influência tanto na manutenção de RS quanto na sua transformação.

A abordagem societal, fundamentada por Willem Doise, propõe a integração dos modos de funcionamento da sociedade e dos indivíduos, por considerar que os processos disponíveis aos sujeitos para funcionar em sociedade são orientados por dinâmicas sociais, em particular, aquelas que dizem respeito às dimensões interacionais, posicionais ou de valores e crenças em geral (DOISE, 2002).

Tal perspectiva recorre a quatro níveis de análise utilizados na Psicologia Social que, de modo geral, teorizam a forma com que os sujeitos organizam suas experiências com o meio ambiente. O primeiro nível de análise se remete ao estudo dos processos intraindividuais, que abordam a maneira pela qual os sujeitos organizam suas experiências com o ambiente em que está inserido; o segundo considera os processos interindividuais e situacionais, ou seja, os sistemas interacionais; o terceiro faz referências às distintas posições dos sujeitos em suas interações (grupos de status diferentes); e o quarto nível, alude aos sistemas de crenças, representações, avaliações e normas sociais.

No item seguinte abordaremos a abordagem estrutural de Abric, a qual será explicitada com maiores detalhes, por se tratar do aporte teórico-metodológico adotado na pesquisa.

3.4.1 A abordagem estrutural

Em 1976, Abric, sob supervisão de Moscovici, propôs a Teoria do Núcleo Central como uma hipótese explicativa da organização interna das RS, a qual tem por objetivo investigar os conteúdos sócio cognitivos que se organizam e se estruturam em torno do sistema central (ou núcleo central) e periférico. Tal teoria, entretanto, veio a ser consolidada apenas dez anos depois (ABRIC, 2003).

Segundo Abric (1998), para todas as RS existe um núcleo central por estas se constituírem em uma manifestação do pensamento social, o que se subentende que apresenta crenças historicamente determinadas e fundamentais à cultura e aos modos de vida dos sujeitos, isto é, valores associados ao objeto em questão.

O núcleo central é composto por um número limitado de elementos, que assegura três funções dinâmicas e essenciais a ele: a função geradora, que dá significado à representação; a

função organizadora, alusiva à organização interna das RS, responsável por explicar como determinados elementos assumem mais relevância e outros menos, permanecendo na periferia; e a função estabilizadora, referente ao momento de fixação das RS, que dá ao grupo um sentimento de pertencimento.

Tais funções, portanto, que asseguram a significação, a consistência e a permanência da representação, fazem com que o núcleo central seja resistente à mudança, pois qualquer modificação deste núcleo acarreta uma transformação completa da representação. Vale salientar, no entanto, que apenas a apreensão do núcleo central não é suficiente para definir uma representação, o que a define é a sua organização. Ou seja: duas RS podem ter o mesmo núcleo e serem distintas, devido a sua organização de conteúdo, que se diferencia.

O sistema periférico se relaciona diretamente com o núcleo, por se apresentar como uma parte flexível, adaptativa da representação, composta por características mais maleáveis, que podem ser facilmente acessadas. Suas funções se referem a: concretização, que demonstra como a representação está ancorada na realidade; regulação, que permite a adaptação da representação quando diante de um elemento novo; prescrição de comportamento, que funciona como guia de conduta às ações dos sujeitos; proteção do núcleo central, que considera elementos novos e contraditórios com o núcleo, sem, no entanto, questionar a validação de uma representação; e modulações personalizadas, que diferenciam o conteúdo da representação de acordo com as características individuais dos sujeitos nos grupos (ABRIC, 1998).

Abric (2003) contribui ao campo da TRS também com propostas de procedimentos metodológicos a serem utilizadas em pesquisas. Uma das formas de coleta de dados é o método da associação livre, o qual possibilita o acesso às RS por meio da enunciação livre de ideias e palavras. A ordem de evocação, nesse método, não se faz importante, devido ao fato dos conteúdos relevantes aparecerem após ser estabelecida uma relação de confiança, com a redução dos mecanismos de defesa. Assim, Abric julgou por bem considerar a ordem de importância, na qual o próprio sujeito estabelece a hierarquia das palavras.

Aos questionários de associação livre, são apresentadas duas etapas: na primeira, o pesquisador pede que os sujeitos produzam as primeiras palavras que lhes veem à mente a partir de uma expressão indutora; e, em seguida, solicita-se uma hierarquização das palavras evocadas, em função de sua importância na relação com o objeto de estudo.

Na análise dos dados da presente pesquisa, as RS apreendidas nos questionários de associação livre são evidenciadas por meio de um quadro que diferencia em seus quadrantes:

o núcleo central; a primeira periferia; os elementos contrastantes; e a segunda periferia, bem como as palavras às quais estes se referem, sua frequência e ordem de evocação.

No núcleo central, apresentam-se basicamente os sinônimos associados ao objeto, os elementos que caracterizam melhor o objeto de estudo. A primeira periferia alude aos elementos periféricos mais importantes, enquanto que a segunda periferia faz referências aos elementos pouco presentes e pouco importantes no campo da representação. Já os elementos contrastantes dizem respeito àqueles temas enunciados por poucos sujeitos, mas que os consideram de grande importância. Ressaltamos, aqui, que esta última configuração pode ser reveladora da existência de um grupo menor, portador de representações diferentes, cujo núcleo central seria formado pelos elementos presentes neste quadrante (dos elementos contrastantes), em conjunto com os outros elementos que formam o núcleo central. Em contrapartida, pode-se encontrar, também neste quadrante, um complemento da primeira periferia (ABRIC, 2003).

4 MÉTODO