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As (in)certezas que se encontram no lugar onde as verdades são guardadas

Quando Michael Foucault questiona o sentido (ou a ausência dele) encontrado nas perguntas formuladas ao psiquiatra nos tribunais, evidenciando a sua pouca relação com o Código Penal, este autor demonstra a função de defesa social da psiquiatria naquilo que considera como “caça aos degenerados”.

Essas três perguntas, sem significado do ponto de vista médico, sem significado do ponto de vista patológico, sem significado do ponto de vista jurídico, têm ao contrário um significado bem preciso numa medicina do anormal, que não é uma medicina do patológico e da doença; numa medicina, por conseguinte, que continua a ser, no fundo, a psiquiatria dos degenerados. (FOUCAULT, 2001, p. 404)

São também três os quesitos apresentados aos peritos psiquiatras do IML. O primeiro indaga sobre a verdade de um diagnóstico cumprindo a função de eliminar aqueles/as que seriam os/as falsos/as (transexuais). A resposta ao segundo quesito está condicionada ao diagnóstico estabelecido anteriormente, uma vez que indaga sobre a indicação da cirurgia. As respostas a este quesito demonstram que os peritos compartilham da crença prevalente entre os seus pares de que a cirurgia é o único recurso eficaz para o tratamento da transexualidade.

113 Ofício nº. 401/02 MPDFT/PRÒ-VIDA de 17 de junho de 2002, que integra o processo de CSA e Ofício nº. 390/02 GAB/HUB de 09 de outubro de 2002, que integra o processo de S.E.M.

2) Se a cirurgia de redesignação sexual lhe é recomendada?

RESPOSTA: Sim. Este tipo de intervenção cirúrgica, associado ao tratamento hormonal, é o que tem sido indicado em tais casos.114

Por fim, no último quesito, o perito autorizaria ou não o indivíduo a falar sobre si mesmo. O Promotor solicita que o perito se pronuncie sobre a capacidade de cognição (consciência) e voluntariedade (liberdade plena para decidir) do sujeito para receber esclarecimentos e autorizar a mencionada cirurgia. Nos laudos em que foi negada a condição de transexualidade às pessoas estas também foram consideradas inaptas para consentirem no procedimento.

A história pessoal e curva de vida são restritas a um conjunto de informações gerais sobre história de nascimento e condições do parto; antecedentes pessoais e familiares de doenças; escolaridade e desempenho escolar; histórico ocupacional.

Em três laudos, confeccionados por diferentes peritos, a história de vida foi separada da história da identidade de gênero. Com essa separação, o caráter patológico do que acreditam ser o transexualismo assume dimensão hiperbólica. Os peritos estabelecem uma cisão entre a pessoa e a “doença”, prática já denunciada em textos de antropólogos que elegeram o campo da saúde como espaço de investigação.115 A pessoa é substituída pelo

diagnóstico e, assim, todas as ações decorrentes do diagnóstico são dirigidas à patologia reconhecida. Esse esfacelamento do sujeito, em que a “doença” atinge um status autônomo, ocorre também em outras situações conforme identificou Fernando Seffner (2001, p. 386). Se, ao ser diagnosticado como transexual a pessoa se despersonaliza na suposta doença, então a proposta é acionar uma cura. Estamos de volta para a questão inicial: a necessidade da cirurgia de transgenitalização.

Na investigação do curso evolutivo da patologia em questão, os peritos esquadrinharam a infância em busca dos indícios de um longo e duradouro sentimento de pertencimento ao outro sexo. Ganham destaque as brincadeiras de infância e o desejo pelas roupas do sexo oposto. No repertório dos laudos, a ênfase nos relatos das brincadeiras da infância adquire a coloração de uma rígida distinção de gêneros em que as brincadeiras que exigem força física e coragem são destinadas ao masculino e aquelas dirigidas ao mundo

114 Processo de G.B.S., Laudo Psiquiátrico nº. 610/2001 SPL. P.04.

115 Antropologia Médica, Antropologia da Medicina, Antropologia da Saúde e Antropologia do Corpo são algumas das denominações que agregam antropólogos preocupados com os processos que envolvem a saúde e doença.

doméstico integram o feminino.116 Detalhes das brincadeiras que são valorizados pelos especialistas que reproduzem as falas das entrevistadas como se produzissem “provas” de uma patologia que pode ser identificada desde a primeira infância. Ressalta o apoio às certezas de Harry Benjamin (1997), para quem, a crença de pertencimento ao outro sexo é desde a infância e é também inabalável, posto que deriva de uma condição estrutural. O desejo pelas roupas e as brincadeiras é apenas testemunho evocado para garantir a verdade da transexualidade.

A eleição do par e a expressão dos desejos e afetos também foram transferidas para esse tópico, pois foram decodificadas, nessa perspectiva, como sinais da patologia. “Quanto à vida afetiva, esta é descrita no item ‘História da Identidade de Gênero’.”117 As questões relacionadas ao afeto e às práticas sexuais são acopladas à Identidade de Gênero e se tornam sintomas, sendo que o desejo heterossexual é a norma que deve ser perseguida para satisfazer as regras estabelecidas pelo standart do Instituto Harry Benjamin. A interdição da homossexualidade será discutida em tópico específico.

O diagnóstico de Transexualismo ou Transtorno de Identidade de Gênero congela a vida dos sujeitos e a traduz como um elenco de fatos fragmentados e incapazes de movimento. A prova do tempo deve ser realizada em dupla perspectiva: a garantia de um histórico vivido de acordo com o gênero buscado e um plano estruturado de permanecer neste gênero. Nenhuma possibilidade de mudança é considerada, assim o diagnóstico estabelece a permanência do fenômeno que quer caracterizar bem como sua universalidade. Toda a expressão da pessoa se reduz à própria patologia. Talvez fosse esse um dos perigos da adoção do diagnóstico que Judith Butler postula: o diagnóstico não retiraria do sujeito apenas a autonomia para reivindicar seu pertencimento, mas sua própria existência como sujeito (2006a, p. 121).

A necessidade da presença do psicólogo na equipe mínima foi especificada desde a primeira Resolução do CFM no seu artigo 4º. Os critérios construídos e apropriados pela Medicina possibilitam o diagnóstico de “transexualismo”, principalmente associado à existência de uma convicção de “estar no corpo errado” e na certeza de um desejo de alterar o corpo. No entanto, me parece que o acompanhamento desse desejo deve ser escutado e elaborado por outro profissional, a saber, o psicólogo.

116 Para maior discussão sobre as normas de gêneros que organizam as brincadeiras infantis ver: TEIXEIRA, Flavia B. (2001); CRUZ, Tânia M., CARVALHO, Marília (2006) e RIBEIRO, Jucélia S. B. (2006).

A imposição do tratamento psicológico se constitui num paradoxo. É recorrente na literatura a resistência das pessoas (transexuais) ao atendimento psicológico, uma vez que a demanda original pela cirurgia não é o motivo de seu sofrimento e também, seguindo as diretrizes estabelecidas por Harry Benjamin, o tratamento psicológico é inócuo em relação à transexualidade.

Quando trabalhamos com os “transexuais verdadeiros” temos que enfrentar uma situação no mínimo inusitada: na maioria dos casos, estes sujeitos não procuram um terapeuta com uma demanda de ajuda, e muito menos com uma demanda de análise. Ou seja, eles não apresentam nenhum conflito psíquico, no sentindo neurótico: se conflito existe, este deve-se muito mais às questão sócio-culturais. Por isto os relatos de análise de transexuais são relativamente raros. Aqueles que se submetem a um processo terapêutico o fazem para preencher um dos pré-requisitos formais para a obtenção da autorização para serem operados. Não podemos esquecer que, para o “transexual verdadeiro”, o problema desenrola-se muito mais na cena corporal do que na vida psíquica: ele não tem dúvida de sua identidade sexuada: é o corpo que “vai mal”. (CECCARELLI, 2003, p. 40)

Através dos trabalhos publicados por psicólogos, que integram ou em algum momento participaram das equipes que desenvolvem programas de atenção para pessoas (transexuais), visando à realização da cirurgia, observa-se um conjunto de práticas heterogêneas embasadas por correntes teóricas diferentes. O trabalho de Valéria Elias, para quem a clínica psicanalítica não teria o lugar de autorizar ou não o desejo do sujeito, mas ouvi-lo no percurso da construção deste desejo, coloca em questão o lugar deste profissional na equipe. Ela acompanhou, a partir de uma escuta psicanalítica, mulheres (transexuais) que buscaram o hospital universitário demandando a cirurgia de transgenitalização. E reconhece a relação de convencimento que se instaura e identifica nela um dos entraves iniciais no estabelecimento de uma relação transferencial que autoriza a clínica psicanalítica.

Diferente do pensamento cartesiano, de que estamos ali disponíveis para “convencer” a pessoa se “deve” ou “não deve” realizar a cirurgia, de acordo com o que se imagina ser o “bem”, a psicanálise oferece outra possibilidade. Mas como levar essa pessoa a falar de seus medos, de seus desejos, de suas histórias mais secretas, se o que a levou até mim foi a imposição de que realizasse um acompanhamento para desvendar suas “verdades” e suas “mentiras” e, para que eu me pronunciasse se ela “pode” ou “não pode” se livrar do que a incomoda tanto? (ELIAS, 2007, p. 32)

Márcia Arán é pesquisadora de uma das equipes para a realização da cirurgia de transgenitalização no Brasil. Ancorada nas discussões da teoria queer, principalmente nos questionamentos sobre a instabilidade das categorias sexo e gênero proposta por Judith

Butler, ela propõe o repensar da clínica psicoterapêutica.

Temos tido uma experiência muito positiva de agenciamentos, transferências e de possibilidade de criação de um dispositivo analítico, onde a psicoterapia ocorre de forma bastante produtiva e não fica capturada pela exigência institucional da necessidade de confirmação de diagnóstico e nem mesmo pela indicação da cirurgia. As pessoas seguem trajetórias singulares de subjetivação que ultrapassam em muito esta questão. Assim, para concluir, consideramos que, provisoriamente, nesta conjuntura, o diagnóstico de transexualismo permite primeiro, o acesso ao tratamento e segundo, o estabelecimento de um dispositivo de cuidado, qual seja, a necessidade de atendimento por dois anos, que deve consistir na construção subjetiva do significado da cirurgia ou... qualquer outra coisa. Porém, isto não quer dizer que estamos confortáveis nesta posição, pois se o gênero não é uma essência, mas um devir, os seus destinos dependem dos atores políticos e clínicos implicados. Sendo que as possibilidades de subjetivação se fazem de acordo com a contingência histórica em que se apresentam. (ARAN, 2005, p. 4)

Tatiana Lionço também reconhece a limitação inicial deste lugar de imposição do acompanhamento psicológico para obtenção da autorização para a realização da cirurgia, criticando o imperativo da avaliação que a define. A sua tese é um depoimento representativo de como a interlocução com as diferentes subjetividades dos sujeitos e a ampliação do olhar para além da clínica podem contribuir para a despatologização desta experiência (2006, p. 122).

Ao analisar a assistência prestada a transexuais no Hospital Universitário Clementino Fraga Filho, Daniela Murta problematiza a hegemonia da compreensão da condição transexual como uma patologia psiquiátrica, “apesar desta questão ser permanentemente problematizada pela própria equipe de saúde mental” (2008, p. 61). As dificuldades apontadas pela autora para desatrelar a assistência às pessoas (transexuais) do diagnóstico de transexualismo explicariam também o não questionamento da própria Resolução do CFM que determina a exigência e o tempo mínimo para o atendimento psicológico. Não observei nenhum texto em que a psicologia, como área autônoma, reivindicasse o direito de definir as diretrizes para o atendimento psicológico no caso da transexualidade.

Os questionamentos das referidas pesquisadoras representam diferentes posições diante da transexualidade. Considerei pertinente este primeiro recorte porque desloca o entendimento de que exista um consenso calcado na aplicação de testes psicológicos; na determinação de um “verdadeiro transexual” e na autorização mediante o diagnóstico para a realização da cirurgia.

necessidade de se determinar a verdade sobre a transexualidade. Se todas as pesquisadoras que compunham as equipes diziam de uma dificuldade em responder a essa exigência colocada pela equipe, penso no desconfortável lugar ocupado pelos peritos do IML, que deveriam atribuir um laudo sem o acompanhamento do sujeito. O Promotor estabelecia um prazo de cento e oitenta dias para a conclusão do laudo, com a possibilidade de ser dilatado mediante solicitação do perito. Na entrevista de uma das responsáveis por confeccionar os laudos psicológicos no IML de Brasília, o ponto inaugural do diálogo foi: “como foi difícil fazer aquilo”.118 Ela fala do estranhamento que sentiu ao ser intimada para realizar tal função, pois diferia das rotineiras tarefas relacionadas à psicologia forense. Não se tratava de um indivíduo que tivesse cometido delito e deveria responder a uma realidade com que até então não havia se defrontado.

A ausência de conhecimento anterior sobre a transexualidade e o contexto de demanda por este saber colaboram para explicar o tom médico dos laudos sustentados pelos conceitos clássicos derivados do DSM IV e CID 10. O posicionamento dos peritos do IML, em que a preocupação restringia-se à busca pelo diagnóstico diferencial de psicose e a capacidade intelectual do/a examinado/a para o consentimento sobre a cirurgia, indica que o domínio teórico sobre a transexualidade ancorava-se na perspectiva do modelo médico, em que o diagnóstico do quadro de psicose estava restrito a não identificação de sintoma produtivo como, por exemplo, o delírio.

Frederico Abreu reafirma a necessidade do estabelecimento de um diagnóstico diferencial no transexualismo:

(...) apontam para a necessidade de diferenciação desse fenômeno com outros transtornos, em especial com a psicose. Todavia, quando esses manuais falam a respeito da psicose, estão se referindo a um estado psicótico franco, sintomático e não a uma estrutura subjacente (2005, p. 105).

No campo da psicologia, o debate sobre a estrutura de personalidade entre as pessoas (transexuais) não está resolvido. Alguns trabalhos produzidos pela escola psicanalítica recuperam os debates propostos por Catherine Millot (1992) e Henry Frignet (2002) e suas posições quanto ao reconhecimento da transexualidade como integrante de uma estrutura psicótica. Entre os trabalhos acadêmicos produzidos sobre a transexualidade no âmbito da psicanálise, identifico o trabalho de Marina Teixeira (2003), ancorado nesta perspectiva e

compartilhando do referencial teórico lacaniano. Ainda no campo da psicologia, a construção teórica de Robert Stoller (1982) aponta a intensidade da relação mãe-criança como principal fator explicativo para os efeitos feminilizantes dos meninos, mas afasta a transexualidade do pertencimento ao universo da psicose.

A ênfase na relação mãe/criança é também reconhecida por Paulo Ceccarelli (2003), que percebe o transexualismo como a resolução do conflito entre o sexo anatômico de uma criança e o projeto dos pais em relação a ela, tendo em vista a impossibilidade de elaboração do luto da criança imaginada. Mas também não compartilha da perspectiva lacaniana de classificar a transexualidade no terreno das psicoses.

Nenhuma informação parece indicar que os peritos se preocuparam com a relação mãe/filho o que demonstra um afastamento de modelos baseados nas construções etiológicas como a de Robert Stoller119 e/ou outros da escola lacaniana. Nos laudos analisados, pouca atenção foi concedida pelos peritos ao histórico familiar, que embora presente, se restringe à busca por eventos da infância que atestem a adequação ao gênero desejado, semelhante à postura adotada pelos psiquiatras.

A utilização de testes psicológicos foi uma característica comum ao conjunto dos laudos emitidos pelo serviço de psicologia. Segundo Jole Baldaro Verde e Alessandra Graziottin (1997), os testes devem avaliar a capacidade das pessoas de receberem informações e de se adaptar posteriormente às condições de vida desejadas. Nos processos analisados, foram utilizados, em maior escala, os testes de inteligência denominados “Teste de Inteligência não verbal G 36” (BOCCALANDRO, 1966) e o “Teste de Inteligência R1” (OLIVEIRA, 2002). Outro aspecto a ser avaliado, segundo as autoras, é o perfil da personalidade para detectar traços patológicos “em particular às síndromes dissociativas, às manifestações paranóicas ou fóbicas graves e às graves formas depressivas” (BALDARO

119 No Brasil, a obra de Robert Stoller parece despertar interesse, uma vez a maioria de seus foi traduzida para o português. Parte do alcance da obra deste autor pode ser compreendido dada sua influência como psicanalista, corrente bastante difundida nas escolas de psicologia brasileiras. Não passou despercebido que o livro nas mãos do psicólogo que acompanhava o Grupo de Transexuais do HUB, na minha primeira visita, era exatamente “A Experiência Transexual”, de Robert Stoller, e estava com o aspecto bastante gasto, indicativo de ser uma obra de consulta constante. Robert Stoller considera que no estágio mais precoce do desenvolvimento da identidade de gênero há uma fusão do menino à mãe, o que garantiria o sentido de feminilidade em um bebê. O que significa dizer que todos os indivíduos experimentariam inicialmente a feminilidade, exigindo do menino e de sua mãe um esforço de separação no sentido da construção de sua masculinidade. Buscando elementos para caracterizar a universalidade de sua teoria, Stoller recorre a relatos de casos clínicos em que ressalta as evidências da exagerada gratificação primária - realizada pela mãe - que, na sua perspectiva, impede a construção da masculinidade. A universalização de sua teoria sobre a existência da “protofeminilidade” e a supremacia da dinâmica familiar para a determinação da identidade de gênero parecem impactar a leitura dos psicólogos (STOLLER, 1993, p. 35).

VERDE e GRAZIOTTIN, 1997, p. 107). O teste de personalidade mais utilizado foi o Método Rorschach, corroborando a afirmação de Frederico Abreu de que, “no Brasil ainda que não seja uma realidade, a investigação do transexualismo tem o método ocupando um lugar privilegiado em vários autores” (2005, p. 30).

Por não se constituir o foco desta tese, não discutirei os testes que constituem os laudos e sim os resultados das análises transcritos pelos especialistas.

O tempo necessário para a confecção dos laudos é um elemento que se destacou, pois, em alguns deles, considerando a data em que foi realizado o primeiro contato com os peritos para proceder ao exame e o resultado do laudo indicam que houve um único encontro.120 Em outros, fica explícito que foram realizadas duas sessões para a confecção dos laudos.121 Nos demais processos, o tempo transcorrido entre a data que informa o primeiro contato e a assinatura do laudo pelos peritos varia entre menos de 30 até 90 dias122, sendo que o laudo que possui o maior lapso de tempo é de 113 dias, mas não deixa antever quantas sessões foram necessárias para sua confecção.123 Considerando que a Promotoria estabelecia um

prazo inicial de 180 dias, sujeito à prorrogação de acordo com a necessidade do perito, questiono a urgência com que as respostas foram emitidas, contradizendo a fala anteriormente colocada sobre a dificuldade encontrada pelos peritos em responder aos mesmos. Os profissionais que compõem as equipes dos diferentes programas são uníssonos em afirmar a necessidade de tempo para o estabelecimento do diagnóstico e/ou a habilitação para a cirurgia, considerando adequada a determinação do CFM de dois anos para o acompanhamento.124

Ao responder sobre a indicação da cirurgia, os peritos nem sempre tiveram uma postura consensual. Em três laudos, os peritos se recusaram a responder a esse quesito da promotoria, alegando que tal procedimento deveria ser atribuído a uma equipe

120 Exame Psicológico nº. 018/2001-SPL de J.C.S. e Parecer Psicológico nº. 030/01 de J.C.S. 121 Exame Psicológico nº. 066/2001-SPL de V.X.M. e Exame Psicológico nº. 161/2001 de R.R.F.

122 Exame Psicológico nº. 023/2001 - SPL de E.M.S., Exame Psicológico nº. 050/2001 - SPL de F.A.P.S e Exame Psicológico nº. 042/2001- SPL de E.P.C.

123 Exame Psicológico nº. 143/2001 - SPL de G.S.B..

124 Mesmo que não compartilhem sobre o lugar e a função do psicólogo na equipe, a necessidade de um acompanhamento pelo período mínimo de 02 anos aparece como consenso nos trabalhos de Valéria Elias (2007), Esalba Silveira (2006), Tatiana Lionço (2006), Alexandre Saadeh (2004), Jaqueline Pinto (2003 e 2008) e Daniela Murta (2007).

multidisciplinar.125 Embora em relação a autorização para realização da cirurgia, os peritos se mostraram por vezes cautelosos, o mesmo não ocorreu quanto à determinação do diagnóstico ou a sua contra-indicação nos casos em que não identificaram como sendo uma pessoa (transexual).126 A utilização dos testes psicológicos para a determinação do diagnóstico se configurou, nesse contexto, como um argumento de autoridade suficiente, excluindo a necessidade de novas entrevistas ou sessões, entendendo que o espaço do IML não seria oferecido para acompanhamento, apenas para confecção de laudos.