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No contexto da Nova Administração Pública (New Public Management) ocorreu, segundo Bergue e Klering (2010, p. 138) a "transposição para o setor público, de tecnologias gerenciais originalmente concebidas e desenvolvidas para a aplicação no ambiente privado" com a intenção de atingir a eficácia, efetividade, qualidade e prestação de contas dos órgãos públicos (accountability) (LUCENA, 2010).

Bergue e Klering (2010) ressaltam que a apropriação de tecnologias gerenciais do setor privado pelo setor público, devido ás transformações que o Estado e

a administração pública têm se submetido, são passíveis da redução sociológica proposta pelo sociólogo baiano Alberto Guerreiro Ramos:

Em seu sentido mais genérico, a redução consiste na eliminação de tudo aquilo que, pelo seu caráter acessório e secundário, perturba o esforço de compreensão e a obtenção do essencial de um dado. [...} No domínio restrito da sociologia, a redução é uma atitude metódica que tem por fim descobrir os pressupostos referenciais, de natureza histórica, dos objetos e fatos da realidade social.

Ramos (1996, apud Bergue e Klering (2010, p. 141)

Bergue e Klering (2010) propõem que os processos de transposição das tecnologias gerencias exógenas passem por um devido filtro crítico-assimilativo á luz da redução sociológica para que os conteúdos das tecnologias sejam devidamente assimilados. Dentre essas tecnologias gerenciais os autores citam a gestão por competências.

De acordo com Carvalho et al (2009) " a noção de competência tornou-se importante referencial nos debates que têm acontecido nos órgãos envolvidos na formulação de políticas de gestão de pessoas".

O desenvolvimento do conceito de competências é embasado nas correntes de pensamento das escolas americana, inglesa e francesa que adotam os enfoques condutista, funcionalista e construtivista respectivamente, conforme dito anteriormente, ou seja, são abordagens desenvolvidas no exterior, em um contexto diferente do brasileiro. Segundo Oliveira (2010), diversos autores brasileiros desenvolvem estudos sobre o termo competência com o intuito de adotar uma vertente que oriunda das concepções europeia e norte americana. A concepção europeia abrange as vertentes do Reino Unido, França e Alemanha que, somadas à vertente dos EUA, que por si só já possuem uma pluralidade de conceitos.

Em 2006, por meio do Decreto 5.707/2006 e Portaria 208/2006 - MPOG o Governo Federal instituiu a Política Nacional de Desenvolvimento das Pessoas com Base na Gestão de Pessoas por Competências - PNDP e os critérios e procedimentos gerais a serem observados para a realização das avaliações de desempenho individual e institucional dos servidores públicos federais (Decreto 7.133/2010). Nesse contexto a PNDP adota a gestão por competências como o eixo principal para a capacitação dos servidores públicos da administração pública federal.

Dentre as finalidades da PNDP destaca-se a necessidade da adequação das competências requeridas dos servidores aos objetivos das instituições. Nesse sentido, as competências são definidas como o conjunto de conhecimentos, habilidades e atitudes necessários ao bom desempenho das funções dos servidores, visando ao alcance dos objetivos da instituição (inciso II do Art. 2o do Decreto 5.707/2006).

A Fundação Escola Nacional da Administração Pública (ENAP), instituída em 1986 é uma escola de governo, do Poder Executivo federal, entidade vinculada ao Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão do Brasil, cuja missão é desenvolver competências de servidores públicos para aumentar a capacidade de governo na gestão das políticas públicas, sendo público prioritário os dirigentes e potenciais dirigentes do governo federal (ENAP).

A ENAP é regida pelas disposições da Lei nº 6.871, de 3 de dezembro de 1980, com as alterações da Lei nº 8.140, de 28 de dezembro de 1990, pelo estatuto aprovado na forma do Decreto nº 6.563, de 11 de setembro de 2008 e por seu Regimento Interno e legislação complementar (ENAP).

Não obstante a administração publica brasileira possuir normas avançadas, ela encontra problemas na consolidação da conduta ética. Dentre os problemas podemos relacionar o não cumprimento das normas, deficiências na educação e treinamento dos agentes públicos, incluindo mesmos daqueles que detém os maiores salários e maior autoridade, na aceitação dos resultados oriundos dos mecanismos de controles, que quando agem tempestivamente, não são levados em consideração e atuação dos órgãos corregedores normalmente impregnados de interesses corporativistas.

A adoção de um modelo de gestão por competências para ser aplicado aos servidores públicos federais depara-se com o problema de essa nova modalidade encontrar resistência, por parte dos servidores, para ser assimilada.

Segundo Pires (2007), do ponto de vista sociológico, a sociedade brasileira não conta com uma ideologia meritocrática forte e rejeita a avaliação funcional, considerada como um elemento de desagregação em um ambiente de trabalho. Nesse sentido, Pires (2007) destaca:

A este respeito, a antropóloga Lívia Barbosa diz que, em relação aos sucessivos planos que foram implementados no país, "a sociedade brasileira culturalmente rejeita avaliação". É percebido como algo negativo, como uma ruptura em um ambiente amigável, homogêneo e saudável, desde que a concorrência, visto como um mecanismo social profundamente negativo, é ausente. Do ponto de vista do sistema

cultural brasileiro, medição e exigência dos resultados são percebidos como atitudes autoritárias, o que faz com que os processos de avaliação de serviços - especialmente as públicas - a ser muito complexa. As pessoas se sentem diminuídas na sua dignidade, quando elas são obrigadas a realizar e/ou serem avaliadas com base nos seus desempenhos.

Pires (2007, p. 14) Logo, à luz das leis da redução sociológica proposta por Ramos (1996, apud BERGUE e KLERING (2010, p. 142)) e mostradas no Quadro 2, Bergue e Klering (2010) correlacionam as idéias e aspectos principais que devem ser levados em conta na administração pública durante um processo de transposição de tecnologias gerencias visando um bom resultado das reformas.

Quadro 2 - Definição das Leis da Redução Sociológica e ideias centrais serem aplicadas na

administração pública.

Definição das Leis Idéias e aspectos principais 1. Lei do comprometimento:

“[...] nos países periféricos, a idéia e a

prática da redução sociológica somente podem ocorrer ao cientista social que tenha adotado sistematicamente uma posição de engajamento ou de compromisso consciente com o seu

contexto” (RAMOS, 1996, p.105).

 Compromisso com a organização e interesse público

 Posicionamento crítico e reflexivo em relação a pressupostos do conteúdo estrangeiro

 Oposição à fixação pelo estrangeiro e assunção direta do conteúdo exógeno

2. Lei do caráter subsidiário da produção científica estrangeira:

“[...] à luz da redução sociológica, toda

produção científica estrangeira é, em

princípio, subsidiária” (RAMOS, 1996,

p.113).

 Permeabilidade da organização a inovações gerenciais

 Subsidiariedade do conteúdo estrangeiro

 Pressupostos que configuram o contexto de origem

 Produção de conhecimento endógeno 3. Lei da universalidade dos enunciados

gerais da ciência

“[...]a redução sociológica só admite a

universalidade da ciência tão-somente no

domínio dos enunciados gerais” (RAMOS,

1996, p.113).

 Conceitos referenciados à organização e ao setor público

 Conjunto central de conceitos gerais  Atitude subordinada

4. Lei das fases

“[...] Á luz da redução sociológica, a

razão dos problemas de uma sociedade particular é sempre dada pela fase em que

tal sociedade se encontra” (RAMOS, 1996,

p.113).

 Consciência das fases experimentadas pelos contextos de origem e destino: ciclos de reformas administrativas  Relação das dimensões sociais,

políticas e econômicas

 Ciclo de rearranjo dos agentes no campo econômico.

Em 2005 e 2009 a ENAP, por meio da metodologia de Mesa-redonda de Pesquisa-Ação, produziu os trabalhos intitulados Gestão por Competências em Organizações do Governo (PIRES et al, 2005) e Escolas do Governo e Gestão por Competências (CARVALHO et al, 2009) respectivamente. Essas obras fazem parte do esforço do governo federal na formulação e implementação de políticas públicas em face das diretrizes da Política Nacional de Desenvolvimento de Pessoal (PNDP).

Os incisos I e II do Artigo 2o do Decreto 5.707/2006 estabelecem que: I - capacitação: processo permanente e deliberado de aprendizagem, com o propósito de contribuir para o desenvolvimento de competências institucionais por meio do desenvolvimento de competências individuais;

II - gestão por competência: gestão da capacitação orientada para o desenvolvimento do conjunto de conhecimentos, habilidades e atitudes necessárias ao desempenho das funções dos servidores, visando ao alcance dos objetivos da instituição. Do inciso I nota-se a relação entre as competências institucionais e as competências individuais com os objetivos da organização, ou seja, o alinhamento estratégico com a missão, valores e objetivos estratégicos da organização.

A gestão por competências no contexto da PNDP abrange o desenvolvimento das três dimensões descritas como o conhecimento (saber adquirido pela pessoa ao longo da visa-saber o que e por que fazer); habilidades (saber como fazer algo) e atitudes (aspectos sociais e afetivos relacionados ao trabalho - quero fazer), denominadas de CHA, que aparecem em todas as definições do termo "competência" conforme descrito por Pires et al (2005).

Brandão e Guimarães (2001) elaboraram um modelo geral de gestão por competências (Figura 2). No modelo apresentado a formulação da estratégia organizacional possui relação com as competências essenciais à organização (core competences), que são as competências responsáveis pela excelência do produto da organização e que proporcionam a vantagem competitiva às organizações. Ocorre uma relação também entre as competências do núcleo organizacional e as competências humanas (atitudes, conhecimentos e habilidades), ou seja, os objetivos individuais necessariamente devem estar alinhados com os objetivos organizacionais para que a organização tenha uma performance eficaz.

As competências individuais fornecem o suporte para o bom desempenho da organização na forma de capital social. Silva (2012) ressalta a importância dos conhecimentos, relacionamentos, experiências e as habilidades das pessoas, que forma um capital social com valor econômico para a organização porque, se integradas e articuladas a seus demais recursos, permitem que elas produzam. O desenvolvimento das competências individuais leva ao desenvolvimento das competências organizacionais responsáveis pela vantagem competitiva da organização, donde obtêm- se o valor superior.

Figura 2 - Modelo geral de gestão por competências.

Fonte: Brandão e Guimarães (2001).

Aliada a dificuldade de conhecer os valores que embasam a cultura organizacional de uma instituição existem as características do Sistema de Ação Cultural Brasileiro (Figura 3). Segundo Oliveira Neto (2013), o sistema é formado pela interação das relações entre os espaços institucional e pessoal, entre os líderes e liderados interligados pelo paternalismo, formalismo, flexibilidade e lealdade pessoal, herança ainda do sistema patrimonialista, que produz uma sociedade pobre e criativa, com baixo nível de crítica.

Figura 3 - Ilustração do Sistema Cultural Brasileiro.

Fonte: Oliveira Neto (2013, p.36).

Considerando o contexto da segurança pública no Brasil, Faiad et al (2012) constata que “os processos de emprego e estabilidade não são necessariamente galgados por vocação, mas sim por necessidade ou por escolha financeira”. Isso significa que a vocação, as atitudes e o comportamento do indivíduo podem não ser alinhados com o perfil profissiográfico adequado para o cargo.

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