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As Convenções e recomendações da OIT sobre o trabalho rural

3 O TRABALHO DECENTE NA ORGANIZAÇÃO

3.1 CONCEITO DE TRABALHO DECENTE

3.1.1 As Convenções e recomendações da OIT sobre o trabalho rural

A Organização Internacional do Trabalho (OIT) já constatou que o trabalho rural constitui uma das atividades mais perigosas devido aos elevados índices de enfermidades e acidentes que caracterizam o setor. Isto se deve, sobretudo, ao fato de que o labor rural se realiza em condições meteorológicas adversas, há atividades pesadas, que demandam extensas jornadas de trabalho e, além de tudo, pela vulnerabilidade dos trabalhadores desse setor.

Paula Werner da Gama ressalta a observação de que:

“entre os rurícolas é mais freqüente a exposição a doenças parasitárias e infecciosas e a produtos químicos e gases venenosos utilizados nos tratamentos dos plantios agrícolas, bem como é maior o índice de acidentes causados pelo maquinário utilizado nas atividades rurais”.124

Existem ainda outros aspectos que diferenciam o meio rural do urbano a justificar a proteção da OIT. Em virtude das grandes distâncias geográficas, a extensão das propriedades agrícolas, a dificuldade de acesso, a precariedade ou mesmo inexistência de transporte público coletivo regular, tudo isso dificulta a fiscalização do Poder Público sobre as condições de trabalho no meio rural. Estes são elementos que propiciam a intermediação de mão-de-obra, a obtenção de trabalho mediante ameaça, a prestação de labor em condições degradantes, o endividamento progressivo, enfim, quanto mais rústicas as atividades, mais elas atuam como exploradoras de mão-de-obra.

Em atendimento ao princípio da justiça social, e tendo em vista essas carências a que estão expostos os rurícolas, a OIT reconheceu a importância de dotar os seus documentos de tutelas expressas em vários de seus documentos, sejam as Convenções ou Recomendações.

Arnaldo Süssekind afirma que “materialmente, a convenção não se distingue da recomendação, configurando-se, entretanto, a distinção no tocante aos efeitos jurídicos que geram”.125 As convenções são tratados multilaterais que, uma vez

ratificados pelos Estados-Membros, integram a respectiva legislação nacional. Por seu turno, as recomendações se destinam a sugerir normas que podem ser

      

124

GAMA, Paula Werner da. O trabalho rural no Brasil e o trabalho decente. Op. cit., p. 214.

125

SÜSSEKIND, Arnaldo [et al.]. Instituições de direito do trabalho. 19 ed. [Atual.] Arnaldo Süssekind e João de Lima Teixeira Filho. São Paulo: LTr., 2000, p. 1481.

adotadas por qualquer das fontes diretas ou autônomas do Direito do Trabalho. De qualquer modo, não obstante algumas distinções, tanto as convenções como as recomendações devem ser submetidas à autoridade nacional competente para aprovar a ratificação da convenção ou para adotar as normas constantes da recomendação.126

É ainda Süssekind quem explica que, no Brasil, a ratificação da convenção depende da manifestação favorável do Congresso Nacional e do Chefe do Poder Executivo, sendo que as suas disposições integrarão o direito positivo nacional doze meses após o depósito da ratificação.127

Na década de 1920, portanto logo nos seus primórdios, a OIT produziu vários documentos sobre o trabalho rural, buscando, sobretudo, estender aos trabalhadores deste setor os direitos previstos para os urbanos.128

Percebe-se a preocupação da OIT com as condições em que se exerce o trabalho rural, desde o início do século XX, principalmente nos países subdesenvolvidos ou aqueles em via de desenvolvimento. A despeito disso, o Brasil, obviamente dominado por uma ideologia escravista, permaneceu durante longos anos discriminando o trabalhador rural e excluindo-o da legislação protetora.

Paula Werner da Gama assinala que o Brasil ratificou a Convenção número 11, que trata do direito de sindicalização, aprovada em 11 de maio de 1923, mas no plano interno começou a vigorar desde 25 de abril de 1958. É importante que se diga que, mais do garantir direitos especiais em matéria sindical aos trabalhadores rurais, aquela Convenção tinha por escopo colocá-los no mesmo nível de usufruto desses direitos com os trabalhadores urbanos. Ainda no mesmo ano de 1958, o Brasil ratificou a Convenção n.º 12, que prevê a indenização por acidente de trabalho na agricultura.129

Em matéria de abolição do trabalho forçado, o Brasil ratificou a Convenção n.º 29, que entrou em vigor no ordenamento jurídico pátrio em 1958, e a Convenção n.º 105, que passou a vigorar no Brasil em 1966. Tudo isso serve para demonstrar a

      

126

Idem. Ibidem, p. 1482.

127

Ibidem, p. 1499. V. CF/88, art. 84, inciso VIII.

128

Para um estudo mais detalhado sobre as Convenções e Recomendações expedidas pela OIT sobre o trabalho rural, v. GAMA, Paula Werner da. O trabalho rural no Brasil e o trabalho decente. Op. cit., p. 218. Cf. tb. SÜSSEKIND, Arnaldo [et alli]. Instituições de direito do trabalho. Op. cit., p. 1506-1508, que relaciona todos os tratados multilaterais da OIT que foram ratificados pelo Brasil, sem posterior denúncia.

129

maturidade do Brasil, porquanto reconheceu a persistência de formas ilícitas de exploração do trabalho no meio rural e iniciou os esforços para combatê-las.

O Brasil ratificou ainda as seguintes Convenções: nº 52, abordando a concessão de férias anuais para as pessoas que trabalham em serviço contínuo, inclusive nas indústrias extrativas de qualquer classe; nº 98, também aplicável ao labor rural, porquanto disciplina o direito de sindicalização e de negociação coletiva;130

nº 99, que, tratando da remuneração na agricultura, estabelece diretrizes para a fixação de salários para o setor; e a Convenção nº 101, que trata das férias remuneradas na agricultura e nas operações conexas.

No que concerne ao setor rural e desenvolvimento local, a XVI Reunião Regional dos Estados Americanos membros da OIT, ocorrida em Brasília – DF, em maio/2006, definiu o seu objetivo de melhorar as condições de trabalho e produtividade das atividades econômicas desenvolvidas no âmbito rural, na região de América Latina e Caribe.131

Ali se estabeleceram as metas de duplicar a produtividade e a renda dos camponeses pobres, além de prover uma melhora substancial das condições de trabalho. Para isso, há o compromisso dos governos da região de colocar em ação planos locais de desenvolvimento para pequenas localidades rurais. O Diretor Geral da Secretaria Internacional do Trabalho (SIT) afirma que o setor rural concentra, em média, um terço da população trabalhadora da América Latina e Caribe. O comércio de produtos agrícolas não é objeto de acordos na Organização Mundial do Comércio (OMC). Por esta razão, esse é um dos setores mais afetados pela globalização e pelas iniciativas recentes dos tratados de livre comércio. Há de se destacar, ainda, que grande parte da população pobre se concentra no meio rural e é neste que se registram as maiores estatísticas de trabalho infantil e de trabalho forçado.

Trata-se de um esforço conjunto para extirpar o desrespeito aos direitos humanos e os direitos fundamentais dos trabalhadores campônios. É sabido que somente com leis não se podem resolver os problemas deste setor importante da economia.

      

130

SÜSSEKIND, Arnaldo [et alli], op. cit., p. 1509. O autor informa que o Brasil denunciou essa Convenção.

131

OIT. Trabalho decente nas Américas: uma agenda hemisférica, 2006-2015. Informe do Diretor- Geral. ISBN 92-2-818509-0 & 978-92-2-818509-6; 92-2-818510-4 & 978-92-2-818510-2 (versão web pdf), p. 62.

Não se trata de um problema de governo, nem de um problema que envolva determinados grupos. Por isso mesmo é que há de se identificar os pontos de semelhança entre as várias questões que afligem os trabalhadores rurais dos Estados Americanos, para dissolver o impasse dos governos e da sociedade em administrar o fenômeno persistente do trabalho sem condições de dignidade.