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As desvantagens do não reconhecimento da atividade de lóbi a nível nacional e

Apêndice I Entrevista à Dr.ª Susana Coroado

CAPÍTULO 3 Uma investigação no campo do lóbi em portugal

3.7. As desvantagens do não reconhecimento da atividade de lóbi a nível nacional e

A nível nacional, há posições completamente opostas. Enquanto, a Confederação Sindical entende que a regulamentação traria vantagens, a Confederação Empresarial não vê qualquer vantagem. Nuno Biscaya111 da CIP afirma: “Durante anos e anos

sobrevivemos sem a regulamentação do lóbi nos termos em que ela esta a ser enquadrada.” Paulo Marcos112

entende que “O estado atual (…) favorece os concorrentes instalados que têm uma influência desproporcionada no processo legislativos. E, portanto, sobre diversos argumentos, sobre a não oportunidade ou sobre conceitos ético-morais, uns porque são contra, outros porque querem fingir que não existe, na prática não se regulamenta. A atual situação é mais favorável a quem tem mais influência no processo. Não há controlo, registo, mecanismos de supervisão

106

Ver Entrevista Dr. Henrique Burnay – Apêndice H.

107

Ver Entrevista Dr. Pedro Filipe Soares – Apêndice F.

108

Ver Entrevista Dr.ª Assunção Cristas – Apêndice T.

109 Ver Entrevista Dr. Luís Montenegro – Apêndice R. 110

Ver Entrevista Dr. Nuno Magalhães – Apêndice G.

111 Ver Entrevista Dr. Nuno Biscaya - CIP – Apêndice L. 112 Ver Entrevista Dr. Paulo Marcos - USI – Apêndice J.

CAPÍTULO 3 - Uma investigação no campo do lóbi em Portugal

da autorregulamentação.” Não é apenas a nível político, mas a própria “sociedade cívil em Portugal é relativamente fraca, a participação cívica está declinada. Tipicamente esta entropia é um dos problemas da economia portuguesa e da sociedade como um todo. Eu diria, como observador externo, e agora, como participante ativo, que o facto de não existir um mercado, não existir um sistema de preços, de declaração de interesses, etc. faz com que uma organização emergente como é a nossa, tenha dificuldade em penetrar num sistema que protege alguns em detrimento de todos os outros.” Assim, A USI113 depara-se com uma dificuldade pela ausência do mercado regulado e “tenta participar num mercado que por definição não existe e cujas regras

não são suscetíveis de ser percebidas por quem está fora.”

Enquanto, a maior parte dos entrevistados não vê grande desvantagem no facto do lóbi não estar regulamentado. José Miguel Júdice114 por suua vez, refere que há desvantagens “a todos os níveis! A profissão de lóbi é uma profissão muito exigente.

(…) Há muito trabalho, há muita experiência, há muito “know-how”... Ora bem, se Portugal quer ser defendido, não era pior que não tivesse apenas que contratar lobbyists estrangeiros, que pelo menos tivéssemos portugueses competentes e preparados para ajudar. A defesa do Estado pela ordem externa ganha com a existência de lobistas (…)Eu acho que o processo de decisão política, no meu entendimento, é melhor se for bem informado e se for informado pelos próprios

[lobistas] a qualidade da decisão política melhora imenso se houver lóbi organizado

(…) Porque nada está definido, é uma trapalhada! Portanto, era melhor que dissesse, o que é que é tráfico de influências e o que é que é lóbi. Porque não estar definido, é um caos, é um perigo!”, reforça a ideia de que “há pessoas que são contratadas por empresas, apenas porque têm acesso fácil a um ministro. Acho que isso é mais desonesto, do que contratar um empresa de lóbi! e afinal, há alguns que tiram proveito, além disso.” Júdice115 defende a criação de regras, visto que “…se não se pode acabar

com uma coisa, mesmo que nós não gostemos, é melhor regulamentá-la! É melhor criar regras do que não criar regras, porque a sociedade evoluiu assim.” Concluindo, que “A transparência hoje em dia é uma exigência! E a do lóbi organizado é aumentar a transparência!”.

113 Ver Entrevista Dr. Paulo Marcos - USI – Apêndice J. 114 Ver Entrevista Dr. José Miguel Júdice – Apêndice E. 115 Ver Entrevista Dr. José Miguel Júdice – Apêndice E.

A vantagem da legalização do lóbi para Luís Marques Mendes116 é óbvia, resulta do facto de o “ lóbi não estar legalizado em Portugal não significa que este não possa

existir, no nosso país e junto das instituições europeias. Se ele existir legalizado, eu julgo que o processo é mais transparente e, sendo mais transparente, pode ter mais força, designadamente junto das instituições europeias.”

Além de considerarem que a regulamentação do lóbi proporciona um conjunto de vantagens para a democracia, os eurodeputados consideram que o seu não reconhecimento acarreta desvantagens, a nível nacional e no contexto europeu. No contexto nacional, Carlos Zorrinho (PS)117 é da opinião que o não reconhecimento leva a uma maior desigualdade, uma vez que não há um acesso igual aos detentores do poder. “É preciso que a regulamentação crie alguns níveis de equilíbrio, permita

igualdade de acesso às várias forças.” A nível europeu, Marisa Matias (BE)118 tem dúvidas que a não regulamentação acarrete desvantagens para Portugal, porque “o

maior lóbi são os deputados que são eleitos para defender esses interesses em articulação com os interesses europeus, portanto nunca me coloquei essa questão”.

Apesar de Marisa Matias (BE) considerar que a não regulamentação de Portugal não coloca em causa a representação dos interesses nacionais em Bruxelas, porque são os deputados portugueses, que lá estão, que defendem os interesses nacionais, a eurodeputada reconhece que “há uma grande quantidade de países em que as

associações de utentes não estão organizadas o suficiente. Portugal é um dos casos”.

De acordo com Carlos Zorrinho119 (PS) são inúmeras as empresas que são lobistas em Bruxelas, mas que não praticam a atividade em Portugal. Expõe: “essas

empresas têm representantes em Bruxelas, que estão reconhecidos não são lobistas em Portugal, mas são em Bruxelas”. Para o eurodeputado, “do ponto de vista europeu, os nossos atores económicos e sociais usam lóbi, não lóbi direto, mas lóbi indireto”, uma

vez que “Portugal não é dos países maiores, nem dos países com mais peso”.

Enquanto os eurodeputados entendem que a representação nacional é feita pelos próprios eurodeputados, a CIP120 não vê nenhuma desvantagem na ausência de representação a nível europeu, no entanto é importante salientar que “a CIP está

inscrita, nós também somos uma confederação europeia…”. O coordenador da USI,

116

Ver Entrevista Dr. Luís Marques Mendes – Apêndice S.

117 Ver Entrevista Dr. Carlos Zorrinho – Apêndice M. 118

Ver Entrevista Dr.ª Marisa Matias – Apêndice N.

119 Ver Entrevista Dr. Carlos Zorrinho – Apêndice M. 120 Ver Entrevista Dr. Nuno Biscaya - CIP – Apêndice L.

CAPÍTULO 3 - Uma investigação no campo do lóbi em Portugal

Paulo Marcos121 tem uma perspetiva oposta, uma vez que considera que Portugal fica mal representado, assim refere: “temos um défice de representação lá fora. Eu acho

que, a nossa capacidade de influência é diminuta, não somos formatados a exercer o nosso magistério de influência nos órgãos europeus. Esta falta de prática em Portugal, ou pelo menos de um mercado regulado de lóbi leva a que nos seja muito mais difícil participar neste processo. Digo a nível europeu, onde isto é muito mais transparente, regulado e comummente aceite e profissionalizado. Nós, candidatos a fazer passar algum ponto de vista setorial ou nacional, defrontamo-nos com ‘players’ muito especializados com os quais nós não temos preparação técnica, política para puder dialogar de igual para igual”.

O mesmo interlocutor salienta a desvantagem a nível financeiro, “por isso somos

um país que tem menos fundos comunitários per capita, do que aquilo que seria razoável, mesmo comparando com a economia grega, que não é muito diferente da nossa, vemos que na maior parte dos setores, o apoio per capita na Grécia chega a ser duas vezes e meia maior que o português”. Paulo Marcos122 conclui que a nossa inexperiência de lóbi resulta num prejuízo económico efetivo, “isto pode ser relevante

para Portugal, esta perda de transparência e da ausência de mercado faz com que a economia portuguesa perca centenas de milhões de euros por ano”. Esta afirmação é

comprovada com um estudo sobre “Portugal nas Decisões Europeias” de 2014 em que a representação de interesses portugueses não tem capacidade de influênciar a tomada das decisões nível europeu, devido à “ausência de tradição de lobbying, uma redução da densidade sindical, níveis moderados de fragmentação das associações patronais ...” (Trechsel e Rose, 2014, p. 192).

Susana Coroado123 faz referência precisamente a este “estudo de Alexander

Trechsel e Richard Rose que foi financiado pela Fundação Francisco Manuel dos Santos, sobre a defesa dos interesses de Portugal na União Europeia, mostra que Portugal ainda não defende bem os seus interesses. Há pouco lóbi português na União Europeia, exatamente porque não há prática e, não havendo prática, depois as pessoas não sabem bem como fazer as coisas e estão pouco despertas para isso.” Ainda mais,

de acordo com investigadora esta situação conduz a um defice de representatividade para a defesa dos interesses em geral.

121

Ver Entrevista Dr. Paulo Marcos - USI – Apêndice J.

122 Ver Entrevista Dr. Paulo Marcos - USI – Apêndice J. 123 Ver Entrevista Dr.ª Susana Coroado – Apêndice I.

Algumas das principais vantagens a nível nacional apontadas por Joaquim Martins Lampreia124 são “ uma maior transparência na sociedade civil. Sabe-se quem é

que influenciou ou tentou influenciar, sabe-se como é que as coisas funcionam… por outro lado, havendo regulamentação tem um segundo efeito que é a abertura do mercado a profissionais.” Além do mais, afirma: “externamente seriamos mais competitivos e internamente seriamos mais transparentes.”

A falta de experiência e desconhecimento contribuiem para mistificar o que é uma prática corrente na União Europeia. “Aquilo que devia ser natural cá, era ser feito

de uma forma organizada, saber-se como é que é suposto fazer. Nós costumamos reunir, a Comissão de Assuntos Económicos, a Comissão de Emprego, ouvimo-nos sempre. Nós trabalhamos regularmente, isso é, que devia ser! A falta de enquadramento prejudica a capacidade de replicar o modelo de fora de Portugal. Nessa medida, esse prejuízo existe” explica Henrique Burnay.125

Quanto às desvantagens do não reconhecimento do lóbi a nível nacional, Luís Montenegro (PSD)126 considera que tudo depende da “transparência das decisões” e “é

no fundo demostrar que aquela decisão tem uma determinada finalidade e que produz um determinar resultado que é benéfico para a comunidade”. Se alguns eurodeputados

e organizações consideram que a não regulamentação do lóbi não acarreta desvantagens para Portugal, quando comparado com outros países que têm essa regulamentação. Nuno Magalhães (CDS/PP)127, defende uma opinião contrária e considera que “Portugal está em desvantagem em relação a outros países que podem fazê-lo de forma

legítima e legal, porque está regulamentado no seu país e em Portugal não está!”. Luís

Montenegro128 (PSD) está neste ponto, em concordância com o deputado do CDS, pois é da opinião que a legalização do lóbi em Portugal traria vantagens para o país, a nível europeu. Refere:“se a circunstância de se poder regulamentar a atividade terá um

efeito positivo nesse domínio, talvez. Porque isso significa que os pontos de vista nacionais, poderão ter uma representação naquilo que é a capacidade de persuasão das instituições europeias”. Já a presidente do CDS/PP, Assunção Cristas,129 não encontra quaisquer problemas ao nível da representação de Portugal em Bruxelas, uma

124

Ver Entrevista Dr. J. Martins Lampreia – Apêndice O.

125

Ver Entrevista Dr. Henrique Burnay – Apêndice H.

126 Ver Entrevista Dr. Luís Montenegro – Apêndice R. 127

Ver Entrevista Dr. Nuno Magalhães – Apêndice G.

128 Ver Entrevista Dr. Luís Montenegro – Apêndice R. 129 Ver Entrevista Dr.ª Assunção Cristas – Apêndice T.

CAPÍTULO 3 - Uma investigação no campo do lóbi em Portugal

vez que “a verdade é que as entidades que sentem necessidade de se fazerem ouvir, a

nível europeu, recorrem a lóbi que o exerce a nível europeu. Até porque, normalmente, quem exerce a defesa dos interesses portugueses são as entidades públicas”. Também

Pedro Soares130 (BE) não crê que Portugal esteja fragilizado em Bruxelas, em função da não regulamentação do lóbi, pois “o que interessa é discutido no Conselho Europeu,

onde Portugal tem um acento do primeiro-ministro a par da mesa de outros ministros. Não é resultado de atividades lobistas, não é resultado de grupos de pressão na Europa, mas sim, vontade de uns países e duns governos relativamente aos outros”.