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6.6 A COMERCIALIZAÇÃO DE PRODUTOS ORGÂNICOS

6.6.3 As Feiras Livres como forma de comercialização de produtos

globalizado onde as grandes superfícies de varejo imperam no comércio de mercadorias, as feiras livres têm resistido ao tempo” e apresentam-se “como uma alternativa ao sistema mercadológico excludente e inibidor do desenvolvimento da economia local”. Araújo e Morais (2006) explicam que possivelmente as feiras “nasceram” com o surgimento do próprio núcleo populacional.

As feiras livres20 representam, segundo Ricotto (2002), um fenômeno social que assegura a possibilidade de construção de uma sociedade diferenciada, baseada na democracia autêntica, com ênfase na autonomia de seus membros. Araújo e Morais (2006, p.247) explicam que a feira se institui, antes de tudo, em:

[...] um espaço de mobilidades comerciais e sociais onde, por meio das diversificadas dinâmicas, ergue-se uma rede de sociabilidades vivenciadas pelos agentes sociais no âmbito dos territórios construídos. No interior das feiras e em suas redondezas é tecida uma complexidade de relações econômicas, sociais e culturais.

Barbosa e Araújo (2005 apud Daniel, 2007) comentam que as feiras adquiriram, historicamente, uma importância muito grande que ultrapassa seu papel comercial, transformando-se num entreposto de trocas culturais e de aprendizado, onde pessoas de várias localidades agregavam-se estabelecendo laços de sociabilidade em muitas sociedades. Segundo Barbosa e Araujo (2005 apud Daniel, 2007), a feira constitui um grande cenário de expressões artísticas e culturais do povo brasileiro, um espaço onde podem ser identificados e visualizados aspectos

20 Entende-se por feira “o local onde produtores ou comerciantes instalam equipamentos ou carros

em que expõem produtos, geralmente de origem agropecuária, não possuindo equipamentos técnicos ou sistemas de conservação dos produtos, notadamente situadas em praças e/ou logradouros públicos, destinando-se à venda direta ao público consumidor”. (Zoldan, 2004)

definidores de uma região e localidade que evidenciam valores, costumes, formas de viver, laços de sociabilidade e convivência.

Godoy e Anjos (2007) explicam que a feira livre caracteriza-se por ser uma atividade de comercialização direta, onde o consumidor realiza o diálogo através da mercadoria (no caso da feira ecológica diretamente com a própria unidade familiar), uma vez que as atividades de troca normalmente são realizadas por algum componente da família. Busca-se assim, a integração entre as realidades urbana e rural, na qual o comércio de alimentos não é visto como um fim em si, mas como o meio de alcançá-la. O que se defende através da feira é a valorização das relações humanas e não só a dos produtos (LOVATO et al, 2006)

Para Godoy e Anjos (2007), a feira livre ecológica é um eficiente canal de comercialização e instrumento muito útil na viabilização dos pequenos agricultores familiares. Werges e Simon (2007) acreditam que esta forma de comercialização pode contribuir para estimular mudanças internas nos sistemas produtivos, favorecendo o processo de conversão de agricultores familiares convencionais para a produção orgânica. Exemplificando este potencial, em Chapecó, Santa Catarina, conforme Lovato et al (2006), do total de 2600 famílias de agricultores, mais de 300 já estão envolvidas direta e indiretamente com as feiras.

Na perspectiva econômica, Lovato et al (2006) citam a Feira Ecológica de Passo Fundo como referência, e relatam que para os feirantes houve ganhos na renda da família , que o ingresso semanal de recursos permitiu melhorar o fluxo de caixa das unidades produtivas e também resultou na redução de custos na produção. A melhoria social trazida pela feira é um aspecto relevante, pois ela gerou trabalho e renda devido à diversificação produtiva e novos serviços que foram criados, como são os casos da agroindústria artesanal familiar e das atividades de comercialização.

Lovato et al (2006) argumentam que outras vantagens tem a ver com a possibilidade dos agricultores estabelecerem o preço final dos seus produtos e o fato que geralmente o preço recebido ser maior e as vendas pagas à vista. A venda direta, também permite conhecer os hábitos dos consumidores e estabelecer com ele uma relação de confiança e amizade, que normalmente favorece a fidelidade da clientela. Esta forma de comercialização promove ainda um resgate da auto-estima do agricultor, que se sente respeitado como cidadão. Como desvantagens para o agricultor, Lovato et al (2006) citam o tempo despendido nas vendas, que deixa de

ser empregado na produção e os custos com transporte de pessoas e mercadorias para os locais de venda.

Por parte do consumidor, Lovato et al (2006) justificam que nas feiras os preços são mais compatíveis com os orçamentos de membros de classes sociais menos abastadas. Os produtos em geral são frescos, colhidos na sua maioria no mesmo dia ou no dia anterior à feira. Além disso, o consumidor conhece quem os produziu, tem atendimento pessoal com troca de idéias e informações, pode efetuar encomendas dos produtos da maneira como mais gosta e tem a oportunidade de acessar produtos diferentes daqueles normalmente encontrados nos supermercados. Este relacionamento com o produtor permite atender as necessidades dos consumidores agregando-as ao processo produtivo e aumentando a satisfação dos mesmos.

Para o consumidor, segundo Godoy e Anjos (2007), a feira representa um espaço onde impera a honestidade e a qualidade, sobretudo biológica dos alimentos. Este fato é reforçado por Martinez (2006), ao afirmar que os motivos que levam os consumidores a procurarem as feiras agroecológicas são, por ordem, “a qualidade (produto fresco e sem veneno), o preço (mais barato), e a oportunidade de conversa, do “bate-papo”, da solidariedade. Como desvantagens, Lovato et al (2006) citam a pouca diversidade de produtos ofertados, a sazonalidade dos produtos agrícolas, a quantidade dos produtos ofertados ser muito variável. Isto ocasiona também um esforço complementar de deslocamento para adquirir outros alimentos (não ecológicos) por parte dos consumidores.

A maior parte dos produtos comercializados em feiras são em geral hortaliças, mas também produtos provenientes da agroindústria familiar. Oliveira et al (1999), exemplificam que, em Florianópolis, 32% dos entrevistados compram produtos da agroindústria familiar em feiras ou sacolão, sendo os produtos mais consumidos, por porcentagem de entrevistados, o queijo (85%) e o mel (83%), seguido por salame (46%), nata (55%), biscoitos e bolachas (73%), pães e bolos (49%), farinha de mandioca (50%), geléias e doces em conserva (46%), lingüiça e salsichão (47%), dentre outros.

Todavia, Fonseca et al (1999) relatam que o público consumidor tem diminuído sistematicamente nos últimos anos em detrimento da expansão das redes de supermercados e varejões. Wuerges e Simon (2007) alegam que a criação de feiras-livres agroecológicas é imprescindível como alternativa para popularizar a

produção e o consumo de orgânicos, e acreditam ser necessário viabilizar políticas públicas e parcerias inter-institucionais, governamentais e não-governamentais com vistas a instrumentalizar uma proposta de desenvolvimento local/regional com base agroecológica que inclua a manutenção e o crescimento desta forma de comercialização.

6.7 HÁBITOS DE CONSUMO E TENDÊNCIAS DE MERCADO

Estudar o mercado de produtos orgânicos na Ecofeira, sua dinâmica e o seu potencial de crescimento implica em compreender os hábitos de consumo do brasileiro. Para Silva et al (2005) o consumidor representa a etapa final do agronegócio e destino final do sistema de produção. Desta forma, o estudo dos mercados consumidores e do comportamento do consumidor é uma das mais importantes ferramentas para a elaboração de planos mercadológicos. Tendo em vista esta afirmação, a seguir serão relacionados e discutidos temas referentes a estes aspectos.