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CAPÍTULO 2 A SITUAÇÃO EM PORTUGAL

2.1 Evolução Histórica do Abastecimento de Água e Saneamento

2.1.5 As fusões e reversões de 2014 a 2017

No Programa do XIX Governo Constitucional para vigorar no país de 2011 a 2015, constavam alterações significativas no ordenamento institucional do setor da água, saneamento de águas residuais e Resíduos Urbanos (RU).

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Essas alterações ao sistema vigente até às eleições de 2011, derivaram, fundamentalmente do Programa do Partido Social Democrata (PSD), partido maioritário na coligação que governou o país nessa legislatura.

Relativamente aos RU os Programas (PSD e Governo) previam a venda/privatização da Empresa Geral de Fomento (EGF), sub-holding do Grupo AdP para os RU, acionista maioritária, por parte do Estado, em todos os SMM do setor.

Quanto ao Abastecimento de Água e concretamente quanto ao futuro da AdP, pode ler-se no Programa do PSD26 para a XIX Legislatura:

3. Serviços de Utilidade Pública

….No caso das Águas de Portugal, prevê-se uma revisão do seu modelo societário (atualmente participado pelo Estado e por várias autarquias ao nível das empresas regionais da holding), estudando uma eventual concentração de sociedades, com vista a obter ganhos de eficiência e a definição de um programa de alienações parciais.

PSD, (2011:156)

Esta orientação geral de concentração de sociedades com vista a obter ganhos de eficiência e a definição de um programa de alienações parciais, deu depois origem a programas, tarefas e ações mais detalhadas.

Em Março de 2012, a AdP apresentou aos seus quadros um Documento de Estratégia onde se definiam tarefas e datas para a referida concentração de sociedades e programa de alienações parciais.

Nesse documento de estratégia27 era preconizado:

Fomentar a abertura a privados e concorrência nos setores, com a abertura a ser realizada num espaço de 1 a 2 anos através da concessão de sistemas integrados, nas águas, ou da abertura do capital, nos resíduos e também que o número de regiões deveria maximizar a escala e a viabilidade económica, ao mesmo tempo que deve garantir a coexistência de diversos players nos setores.

26 “Mudar Portugal – Recuperar a credibilidade e desenvolver Portugal” – Programa Eleitoral do PSD para as

eleições legislativas de 2011, página 156.

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Reunião de Quadros da AdP de Março de 2012. Texto posteriormente divulgado na Comunicação Social pela AdP.

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Quanto ao primeiro ponto e concretamente quanto à reorganização da EGF para a sua privatização total e imediata, após a referida reorganização, as tarefas passavam quase simplesmente pela resolução das dívidas das Autarquias e pela resolução com a ERSAR do Défice Tarifário;

Quanto ao novo modelo para o Abastecimento de Água ele assentava em 3 Fases, a saber:

Fase 1: Fusão de Sistemas Multimunicipais (SMM) em “alta”;

Fase 2: Verticalização com a integração das baixas nos SMM criados na Fase 1; Fase 3: Concessão a privados mediante a atribuição de subconcessões.

Para além destas Fases com tarefas internas ao Grupo AdP, para o setor do abastecimento de água e águas residuais, também se colocavam as questões das dívidas das autarquias e do Défice Tarifário, para tornar as novas empresas economicamente viáveis e financeiramente saudáveis. Estas últimas tarefas (Dívidas e Défice) passavam por medidas legais da Assembleia da República ou do Governo, a serem implementadas pela Entidade Reguladora.

Foram definidas todas as tarefas para um horizonte de 3 anos e nesse período, de facto, a EGF foi privatizada, por venda a um dos concorrentes privados do Concurso Internacional então aberto pela AdP28.

Quanto ao Setor das Águas (AA e Saneamento de águas residuais), e quanto à primeira tarefa (Fusões) foram extintas várias sociedades, por fusão e constituídas 3 novas sociedades, a saber:

- Águas do Norte29;

- Águas do Centro Litoral30;

- Águas de Lisboa e Vale do Tejo31.

Mantendo-se do quadro institucional anterior as seguintes sociedades:

28 http://www.jornaldenegocios.pt/empresas/detalhe/governo_assina_contrato_de_venda_da_egf. [31.07.2015] 29 Decreto-Lei Nº 93/2015 de 29 de Maio. DR Nº 104. 30 Decreto-Lei Nº 92/2015 de 29 de Maio. DR Nº 104. 31 Decreto-Lei Nº 94/2015 de 29 de Maio. DR Nº 104.

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- Águas da Região de Aveiro (AdRA); - EPAL;

- Águas de Santo André;

- Águas Públicas do Alentejo (AgdA); - Águas do Algarve

A primeira empresa (AdRA) é uma parceria Estado/Autarquias para a gestão da rede de distribuição de 10 municípios da região de Aveiro; a EPAL, empresa totalmente estatal, para o Concelho de Lisboa, como responsável da distribuição em “baixa”, e também como abastecedora de mais de 20 municípios e EG da área metropolitana de Lisboa Norte; finalmente a AgdA é também uma parceria Estado/Autarquias mas neste caso para a “alta”, e como as autarquias associadas na AgdA (mais de 20) não concordaram num processo de fusão com as Águas do Algarve e com as Águas de Santo André, ficaram as três empresas (AgdA, Águas do Algarve, Águas de Santo André) com as mesmas atribuições e áreas geográficas de influência que já tinham.

Todas as restantes empresas de AA e de águas residuais, foram integradas nas 3 novas empresas já referidas (Norte, Centro Litoral e Vale do Tejo).

Com estas Fusões ou Agregações, como também foi conhecido o processo, o Grupo AdP passava de cerca de 20 empresas em “alta” para 7 e a AdRA para a área da distribuição.

De notar que também a EPAL e as Águas de Santo André, por razões históricas diversas, têm tarefas em “alta” e “baixa”.

A privatização da EGF e a saída prevista para novas funções da ERSAR criaram um clima nada propicio aos desígnios do Governo quanto ao setor da água.

Assim, quanto à segunda tarefa (Verticalização) apesar dos múltiplos esforços da AdP, o governo somente conseguiu chamar para o processo de Verticalização (juntar as tarefas de “alta” e “baixa” numa mesma entidade, numa dada região) 5 municípios que passaram a rede de distribuição para as Águas do Norte, num outro contrato de Parceria Estado/Municípios, semelhante à AdRA.

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Após o processo de fusões, o mapa do país no que respeitas aos SMM e também às Parcerias Estado/Municípios é o que consta da Figura 2.5 que como se pode ver é bem diferente da Figura 2.2 deste mesmo ponto do trabalho.

Figura 2.5 - Mapa dos SMM e Parcerias após as agregações de 2015

Fonte: Portal da AdP

Saiu entretanto nova legislação dando novos poderes ao regulador32 no sentido de iniciar uma possibilidade de cobrança coerciva das dívidas das autarquias, naquilo que a Lei define como emissão da Fatura Detalhada.

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O processo de Verticalização foi um insucesso generalizado, muito devido à forte contestação das autarquias (sócias e quase únicas clientes das participadas da EGF) à venda da EGF e à fusão de empresas que estava a decorrer, e isso dificultou imenso o processo de Verticalização, comummente aceite como uma das condições de Sustentabilidade e Eficiência do setor.

A Associação Nacional de Municípios Portugueses (ANMP), a Junta da Área Metropolitana de Lisboa, a maioria das Câmaras do Grande Porto, onde a autarquia do Porto e as Águas do Porto estavam incluídas, puseram processos em tribunal impugnando a venda da EGF e todo o processo de fusões, que apesar de tudo acabou avançando, ainda que não se cumprindo qualquer dos prazos iniciais e com uma forte contestação Municipal.

As eleições legislativas de 4 de Outubro de 2015, trouxeram mudanças significativas para o setor da água. Após intensas negociações o PS consegue acordos parlamentares que lhe permitem formar Governo e então o XX Governo Constitucional arranca com o programa deste partido, que em muito diverge do programa do Governo de 2011 a 2015, e também do programa do PSD.

Do Programa do Partido Socialista33 para o período 2015-2019 retiramos o seguinte resumo, quanto aos processos recentes ou em curso, no setor ambiental:

 Travar o processo de privatização da EGF, com fundamento na respetiva ilegalidade e desde que tal não implique o pagamento de indemnizações ao concorrente escolhido pelo governo PSD/CDS, de modo a inverter a excessiva concentração e a forte distorção da concorrência existentes no setor dos resíduos;

 Promover o redimensionamento e a reestruturação do Grupo Aguas de Portugal, em diálogo com os municípios, a partir de uma base zero, isto e, independentemente do modelo de organização territorial proposto pelo governo PSD/CDS, cuja racionalidade e eficácia são muitíssimo questionáveis;

 Integrar o ciclo urbano da agua, no sentido de uma articulação entre o fornecimento de agua e o saneamento básico, da tendencial e progressiva verticalização dos sistemas em alta e em baixa e da agregação dos sistemas municipais, reforçando o seu cariz empresarial e integrando competências, como a partilha de estruturas, permitindo uma maior racionalização na afetação dos recursos.

PS, (2015:6)

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O último ponto focado e aqui referido não é contrário ao definido pelo Governo do anterior, mas os caminhos para atingir o mesmo o objetivo de Verticalização e de agregação dos sistemas é totalmente antagónico.

Esse caminho de agregações em “baixa”, está em negociação com dezenas de municípios, e entretanto algumas das fusões realizadas em 2015, e sempre contestadas pelas autarquias, foram desfeitas.

Assim, já em 2017, foram de novo criadas (ou recriadas) as seguintes empresas: - Águas do Douro e Paiva34, no Grande Porto, por cisão das Águas do Norte;

- SimDouro35, também no Grande Porto, e também por cisão das Águas do Norte; - Simarsul36, na Península de Setúbal, por cisão das Águas de Lisboa e Vale do Tejo; - Águas do Tejo Atlântico37, igualmente por cisão das Águas de Lisboa e Vale do Tejo.

Na Figura 2.6 pode-se ver o “novo mapa” de Portugal Continental, quanto aos SMM e Parcerias para a Água, com a inclusão novamente das Águas do Douro e Paiva.

De notar que as últimas 3 empresas criadas de novo em 2017 se referem a tratamento de águas residuais sendo que só as Águas do Douro e Paiva têm como função a captação e tratamento de água, na sua componente em “alta”.

Para além da reversão de 4 das fusões realizadas, o atual governo assumiu compromissos38 com as autarquias do interior quanto à evolução tarifária, e está a negociar possíveis novas parcerias para os sistemas em “baixa” com dezenas de Municípios, mas fundamentalmente está a incentivar o associativismo para a função de distribuição, e tem apelado a que as EG tenham, no mínimo entre 80.000 a 150.000 habitantes, para terem dimensão e capacidade técnica para os desafios da Eficiência e Sustentabilidade.

34 Decreto-Lei Nº 16/2017 de 1 de Fevereiro. 35

Idem nota anterior.

36

Decreto-Lei Nº 34/2017 de 24 de Março.

37 Idem nota anterior. 38

Intervenção do Sr. Ministro do Ambiente nas Comemorações do Dia Mundial da Água de 2017, em Torres Vedras, e Apresentação oral do Sr. Secretário de Estado do Ambiente na mesma sessão. Documento disponível no Portal da APDA [02.04.2017].

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Figura 2.6 - Mapa dos SMM e Parcerias de Abastecimento de Água, após as reversões de 2017

Fonte: Adaptado do Portal da AdP

Estes números, significam que cada EG deverá ter, em média, cerca de 5 vezes mais clientes do que a atual situação média do país, segundo a APDA (2016).

Outra das decisões do atual governo e referidas pelos dois governantes do setor presentes na sessão de comemoração do Dia Mundial da Água, a 22 de Março em Torres Vedras, é a prioridade e até condição para acesso a mais fundos comunitários, é que as EG e em especial os Municípios, apresentem candidaturas ao PO SEUR visando a elaboração de Cadastros da Rede.

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Este mesmo ponto foi frisado pela Gestora do PO SEUR na sua intervenção nesta mesma sessão39 e novamente no 2º Fórum iPerdas40 realizado na LNEC a 5 de Abril, o Sr. Ministro do Ambiente apelou à preparação de candidaturas a Fundos Comunitários do PO SEUR para a realização de Cadastros de Rede, e apelou de novo a um esforço de associativismo e agregação de Municípios para se ter também em “baixa”, EG com uma dimensão que permita um salto qualitativo na organização do setor.