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As plataformas eletrônicas como um instrumento para o consumo

PARTE I COMÉRCIO ELETRÔNICO

4.1. As plataformas eletrônicas como um instrumento para o consumo

O desenvolvimento e expansão do comércio eletrônico, como já visto, propiciou o surgimento de inúmeros estabelecimentos virtuais interessados nas vantagens e celeridade proporcionada por essa modalidade de celebração de negócios. Grandes empresas de venda a retalho também abriram seus estabelecimentos virtuais, de modo a não ficar de fora dessa modalidade de negociar que registra índices de crescimento em percentual bem superior ao próprio crescimento econômico mundial.

Todavia, as novidades não pararam por aí. Na medida em que a internet favoreceu uma expansão considerável do comércio eletrônico em escala global, não apenas grandes conglomerados empresariais vislumbraram na rede mundial de computadores uma importante ferramenta para a expansão de seus mercados e celebração de novos negócios, como também pequenos empreendedores e até mesmo pessoas individuais viram uma oportunidade de ofertar seus produtos a um mercado infindável, a custos muito menores do que aqueles que teriam de suportar caso recorressem ao comércio tradicional.

Não se trata de nova modalidade comercial, na medida em que já se conhecia até a economia compartilhada entre indivíduos, com a colaboração ou oferta de bens subutilizados por outrem, mediante, ou não, uma intermediação de um profissional do comércio211. No entanto, o que antes era feito através de pequenos empreendedores e até mesmo por particulares, interessados em se desfazer de algum bem que não mais lhe apresentava alguma utilidade, de forma individual, com meios de divulgação muito mais singelos, como distribuição e afixação de panfletos nas pequenas comunidades, tudo com um alcance geográfico por demais limitado, agora passou a ser também feito de forma massificada, similar ao que ocorre no grande comércio de retalho, com suas ofertas a poder ser visualizadas por indivíduos que não estavam localizados apenas na comunidade em que tais

211 Cf. J

OÃO E.GATA, A economia de partilha. Revista de Concorrência e Regulação, ano VII, n. 26, abril- junho de 2016, p. 194, para quem a economia colaborativa é uma reencarnação de uma prática antiga em sociedades humanas. No mesmo sentido, cf. MONICA BERNARDI, Un´introduzione ala sharing economy. Ebook, Fundazione Giangiacomo Feltrinelli, 2015, p. 3.

92 pequenos empreendedores e particulares estavam inseridos, como também em todo o País e até mesmo por mercados internacionais. Tudo isso só foi possível com o desenvolvimento e popularização da internet, bem como de novas tecnologias, como os smartphones, que diminuíram significativamente não apenas os custos de divulgação das ofertas, como também da própria celebração dos negócios212, os quais passaram a ser celebrados instantaneamente, independentemente da localidade em que os interessados estejam, como também do tempo em que se encontrem.

Muitos autores defendem a utilização do termo economia de partilha ou consumo colaborativo para realçar essa modalidade de negociação onde pessoas, a aproveitar a redução dos custos e consequente facilitação de novos negócios propiciada pela oferta através da rede mundial de computadores, com a ajuda de plataformas eletrônicas de intermediação, vendem, arrendam, trocam ou compartilham bens, serviços e recursos de sua propriedade, para fins de reduzir dispêndio de recursos financeiros e de tempo, como também de resíduos ao meio ambiente213. Destacam como incentivos dessa nova economia digital, além dos avanços tecnológicos já acima ressaltados, uma mudança no comportamento social, consistente na necessidade de aliviar o consumo excessivo214, com uma otimização da utilização dos recursos naturais215 e consequente redução da degradação ambiental.

Ocorre que até para a utilização da rede mundial de computadores como meio de oferta massificado de produtos ou serviços é preciso também de investimentos consideráveis. Implica custos não apenas para criação e design do site, como também sua hospedagem e programação. Ciente desses custos que não poderiam ser suportados pelos particulares ou pequenos empreendedores, bem como das oportunidades de negócios proporcionadas por esta

212 Cf. G

UIDO SMORTO, I contratti dellla sharing economy. Il Foro Italiano, vol. 221, aprile de 2015 (estratto), p. 4.

213 Sobre a economia de partilha ou consumo colaborativo, cf. A

LEX STEPHANY, The business of sharing:

making it in the new sharing economy. Palgrave Macmillan: New York, 2015, p. 9; CAROLINE MELLER HANICH

e ARDYLLIS SOARES, Economia compartilhada e proteção do consumidor ..., passim; CLAUDIA LIMA MARQUES,

A nova noção de fornecedor no consumo compartilhado: um estudo sobre as correlações do pluralismo contratual e o acesso ao consumo. Revista de Direito do Consumidor, vol. 111, maio-junho de 2017, pp. 247-

268; GUIDO SMORTO, Verso la disciplina giuridica della sharing economy. Mercato Concorrenza Regole, vol. 17, n. 2, 2015, pp. 245-278; JOANA CAMPOS CARVALHO, A proteção do consumidor na sharing economy …, pp. 115-129; JOÃO E.GATA, A economia de partilha ..., passim; MONICA BERNARDI, Un´introduzione ala sharing

economy. Ebook, Fundazione Giangiacomo Feltrinelli, 2015; RACHEL BOTSMAN e ROO ROGERS, What´s mine is

yours: the rise of collaborative consumption …, pp. 67 e ss.; VICENZO LUISE e LETIZIA CHIAPPINI, Sharing

economy e nuove forme di precarietà: problematiche, resistenze e possibiliti soluzioni, 2017.

214 Cf. V

ICENZO LUISE e LETIZIA CHIAPPINI, Sharing economy e nuove forme di precarietà…, p. 85.

215 Cf. M

93 modalidade de comércio eletrônico, a economia compartilhada também propiciou o surgimento de novos locais de comércio. Grandes empreendedores vislumbraram a possibilidade de novos negócios, ao organizar estabelecimentos virtuais, marcas, sites e agentes, tudo no intuito de possibilitar uma concentração de oferta de produtos e serviços e de procura por estes em um único espaço digital216. Logo se desenvolveu a ideia das plataformas eletrônicas de intermediação, como forma de atrair pessoas interessadas tanto no fornecimento de bens e serviços, como também na sua aquisição. Afloraram assim verdadeiros mercados virtuais onde produtos ou serviços não eram ofertados por apenas um único produtor, mas sim por vários pequenos comerciantes ou até particulares217, tudo em um mesmo estabelecimento virtual, de modo a reduzir os custos inerentes com a divulgação de produtos e serviços e a consequente atração de consumidores, haja vista ser muito mais barato unir todos os interessados em um único mercado218. A lucratividade da plataforma eletrônica estaria diretamente relacionada com a notoriedade e confiabilidade de sua marca perante o mercado, além da quantidade de negócios nela realizados219, haja visa que muitas delas cobram um percentual por cada transação efetuada no estabelecimento virtual.

No mercado virtual desenvolvido por uma plataforma eletrônica, diversamente do que ocorre em um mercado de comércio tradicional, o usuário interessado não precisa sair de casa ou do seu trabalho para procurar por produtos e serviços, além do que poderá fazer sua procura mediante simples cliques em seu computador ou smartphone, tudo a qualquer hora do dia, sem a necessidade sequer de se deslocar fisicamente a nenhum dos espaços dos pequenos empreendedores usuários do mesmo mercado para fins de escolher o produto desejado. Todos os produtos, independente de quem seja o usuário ofertante, estarão disponíveis em fração de segundos, através de cliques nos espaços destinados à pesquisa. Além disso, no próprio estabelecimento virtual desenvolvido pelo titular da plataforma poderá celebrar-se

216 Cf. C

LAUDIA LIMA MARQUES, A nova noção de fornecedor no consumo compartilhado: um estudo

sobre as correlações do pluralismo contratual e o acesso ao consumo …, p. 250.

217 G

UIDO SMORTO, Verso la disciplina giuridica della sharing economy …, p. 262, destaca a possibilidade do particular oferecer diretamente no mercado bens e serviços cujo fornecimento era, até um passado próximo, oferecido apenas por profissionais do comércio.

218

Cf. JOÃO E.GATA, A economia de partilha …, p. 198.

219 V

ICENZO LUISE e LETIZIA CHIAPPINI, Sharing economy e nuove forme di precarietà …, p. 86, destacam que a plataforma eletrônica gera seu próprio valor não diretamente de um lucro do bem, que não é de sua propriedade, mas da capacidade de poder aceder ao mercado os usuários interessados em negociar bens e serviços e de lhes por em contato em tempo real. Sustentam ainda que o ganho da plataforma não advém de um lucro sobre um negócio singular, mas do número de transações realizadas no âmbito da plataforma.

94 diretamente o contrato, mesmo não sem qualquer contato estabelecido com o proprietário do produto ofertado, tudo mediante simples interação com o sistema eletrônico desenvolvido para operar no âmbito da plataforma eletrônica.

A expansão e o desenvolvimento dessa economia de partilha estão, portanto, diretamente relacionada com a utilização da internet como ferramenta para o comércio eletrônico, bem como pela disponibilização das plataformas de intermediação online, que possibilitam ligar de forma mais eficiente a oferta e a procura de bens e serviços220. Referidas plataformas foram desenvolvidas justamente para servir como um importante instrumento a essa modalidade de comércio eletrônico. Mais do que um simples ponto de encontro entre interessados, as plataformas on line representam o exercício de uma verdadeira empresa por parte de seu titular, na medida em que o mesmo está a exercer profissionalmente uma atividade econômica221, na qual é empregada uma organização de todos os seus fatores produtivos em busca promoção da circulação de bens e serviços pelo mercado222, tudo mediante uma retribuição pecuniária. Referida atividade, aliás, também não representa qualquer novidade na atividade comercial, na medida em que a intermediação, se não é atualmente a atividade mais importante do comércio, certamente é a mais antiga223.

A procura cada vez mais acentuada por essa modalidade de comércio fez surgir grandes empresas destinadas à exploração de plataformas de intermediação, nos mais variados ramos do comércio. Destacam-se, dentre outras, plataformas como a Amazon, Ebay, OLX e Mercado Livre, no âmbito do comércio de retalho; Airbnb, Booking, Hotéis.com, nos serviços de hospedagem e alojamento; como também o Uber, Cabify e 99Táxi, no ramo do transporte de pessoas. Até mesmo grandes lojas de departamento, como FNAC.pt e Worten.pt, que já haviam expandido seus comércios também para a rede digital, ampliaram seu estabelecimento eletrônico para instituírem seus Marketplaces, de forma a também permitir que outros

220

Cf. JOANA CAMPOS CARVALHO, A proteção do consumidor na sharing economy …, p. 118.

221 Cf. C

HRISTINE RIEFA, La protection des consommateurs sur les plates-formes de courtage en ligne:

point de vue d´outre-manche …, p. 315.

222

Cf. CLAUDIA LIMA MARQUES, A nova noção de fornecedor no consumo compartilhado: um estudo

sobre as correlações do pluralismo contratual e o acesso ao consumo …, p. 251.

223 Vale destacar que o Direito Comercial, como ciência autônoma do Direito Privado, ganhou destaque

principalmente com a expansão da atividade mercantil, proporcionada ainda na Idade Média com o surgimento das grandes cidades comerciais, além da expansão marítima e terrestre, o que estimulou a expansão da atividade comercial para além de pequenas feiras ou mercados para novos territórios. Cf. TULIO ACARELLI, Origem do

95 indivíduos pudessem expor seus produtos e serviços no seu próprio espaço virtual, a aproveitar todo o conhecimento e confiança que a marca detém no mercado.

4.2. As modalidades de intermediação proporcionadas pelas plataformas