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As repercussões do movimento em favor da formação do prático reflexivo

Entre os teóricos estudados, Elliot e Zeichner demonstram preocupação com a apropriação e, ou, utilização e vulgarização indiscriminada do conceito de prático reflexivo, principalmente, quando apropriado por órgãos oficiais. Corre-se o risco de o conceito ser utilizado e interpretado de forma a sobrecarregar os professores, responsabilizando-os pelo fracasso da educação, eximindo-se outras partes de qualquer responsabilidade e compromisso. Assim, eles não deixam de alertar contra as tendências que utilizam o conceito de prático reflexivo para manter, de forma sutil, a subserviência dos professores.

Outro risco, apontado por Zeichner, é imaginar que o professor reflexivo e a prática reflexiva são a salvação da educação ou dos problemas educacionais. Não se pode esquecer que o professor reflexivo é falível e que, inclusive, pode ocorrer que a reflexão, se realizada individualmente, sirva para justificar práticas arraigadas e autoritárias de um professor conservador. Refletir sobre a prática pode levar à conservação desta. O que distingue essas conseqüências é o desejo de mudar e de inovar, diretamente relacionado às escolhas éticas, políticas e ideológicas. A reflexão individual dificilmente possibilitará ao professor responder satisfatoriamente às demandas de sua prática, pois o conhecimento da cultura do aluno, da comunidade, o tipo de autonomia para decidir sobre os problemas a serem enfrentados exige uma discussão e um compromisso de todas as pessoas envolvidas no ato educativo. Assim, refletir sobre os problemas da sala de aula, relacionando-os com a realidade de vida dos alunos e com o contexto sócio-político cultural e econômico, junto a outros professores e direção escolar, num clima de partilha, cooperação, responsabilidade e compromisso social, além de fortalecer o trabalho docente, integra o corpo profissional que, acreditamos, terá maiores possibilidades de inovar o espaço escolar e transformá-lo em ambiente democrático e justo para alunos e professores.

André (2001) adverte sobre a apropriação do movimento em favor do prático reflexivo no texto oficial: as Diretrizes Curriculares para a Formação Inicial de Professores da Educação Básica de Nível Superior (2001) incluem a pesquisa como elemento essencial na formação profissional do professor, pondo em relevância aspectos como postura reflexiva; domínio de procedimentos de investigação e de registro da prática; a produção e a socialização do conhecimento pedagógico. Ressalta, ainda, a importância de que o professor “tenha acesso aos conhecimentos produzidos pela investigação acadêmica” (ANDRÉ, 2001,

p.19). O documento do CNE deixa dúvidas sobre a concepção de pesquisa que está sendo focalizada, não relaciona pesquisa às condições sociais e políticas do ensino, abordando, de forma restrita, o processo ensino-aprendizagem. O texto traz uma nítida separação entre pesquisa acadêmica ou científica e a pesquisa do professor.

Os riscos para o processo de formação de professores advindos de uma postura acrítica da abordagem do professor reflexivo/pesquisador são apontados por Miranda (2001): (a) primeiro, de que se converta em mais uma retórica legitimadora da reforma educacional, pondo mais responsabilidades sobre os ombros dos já esgotados e injustiçados professores, responsabilizando-os mais uma vez pelos seus insucessos; (b) segundo: por insistir em um processo de reflexão orientado para a ação, que visa a resolver problemas imediatos da prática docente; corre-se o risco de confirmar uma prática adaptativa com relação aos problemas existentes e de reflexão passar a ser sinônimo de resolução de problemas na escola; (c) terceiro: ao negar a teoria como parte necessária do processo de autonomia que se pretende implantar, pode-se reduzir, em lugar de elevar, as reais possibilidades de reflexão crítica do professor; (d) quarto: o suposto de que o conhecimento é importante, porque é útil e imediatamente traduzível na prática do professor, reduz muito as possibilidades desse professor se aproximar de uma discussão teórica que não seja orientada para um fim imediato; (e) quinto: corre-se o risco, que não parece muito distante, de que toda essa questão contribua para desqualificar a universidade como instância formadora de professores; (f) sexto: como suporte da reforma curricular dos cursos de formação de professores, o exercício da pesquisa se converte em ação esvaziada de significados se não lhe for garantida uma formação teórica sólida, preocupada não com os aspectos imediatos da vida escolar, mas também com as outras grandes questões da cultura e da sociedade contemporânea.

capítulo 4

Os sujeitos da pesquisa

Neste capítulo, apresenta-se uma síntese dos dados coletados na aplicação do questionário que permitiram o mapeamento das características do grupo de formadores. Optou-se por apresentar um perfil do grupo, não caracterizando os sujeitos formadores, na

intenção de impedir quaisquer identificações dos mesmos. Acreditamos que os processos pelos quais as formadoras significam e re-significam a experiência prática do mundo profissional, integram as suas concepções de mundo, de educação, de escola, de profissão, de magistério e interferem em sua prática social. Ao se considerar que “os sujeitos professores não são apenas profissionais. Embora o magistério seja parte significativa de sua experiência e identidade, eles vivenciam em seu cotidiano outras práticas e espaços sociais, como a família, o lazer, a cidade” (TEIXEIRA, 1999, p. 181). É necessário reconhecer que as formadoras, assim como os demais professores, estão num processo de desenvolvimento profissional, são atores sociais que fazem as escolas e os projetos de formação: se os formadores forem diferentes, os projetos desenvolvidos também o serão. Assim, considera-se que os formadores possuem um sistema próprio de atitudes e normas, e enfrentam dificuldades e desafios no exercício de sua profissão. Essas experiências permitem um fazer- se e refazer-se, num permanente construir-se.

À semelhança de outros países, tal como a França (BIREAUD, 1995) verifica-se, atualmente, que a formação do professor universitário não tem recebido a merecida atenção. Paradoxalmente, enquanto a universidade tem-se preocupado com a formação do professor para atuar no Ensino Fundamental e Médio, tem ocorrido pouca discussão sobre a formação de seus próprios professores. Existem universidades federais brasileiras cujo corpo docente é composto predominantemente por professores que têm apenas a graduação e/ou alguma especialização. Os dados do Sistema de Informação sobre as Universidades Brasileiras – SIUB, publicados em 1995, mostram que havia 43.747 docentes atuando no 3º grau nas universidades federais, sendo que 10.796, 24,2%, tinham formação em nível de graduação e 10.134, 22,78%, possuíam alguma especialização. Isso quer dizer que 46,8% dos professores que atuavam nas universidades federais tinham apenas especialização (GONÇALVES; GONÇALVES, 1998).