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As transformações no corpo: os procedimentos estéticos no gospel

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Capítulo 3 – O corpo e as implicações iconográficas no gospel

3.3 As transformações no corpo: os procedimentos estéticos no gospel

Conforme apontou Harry Pross (1972) todo processo comunicativo humano tem seu início e término no corpo. Neste sentindo o corpo é a mídia primária, envolvendo todas as possibilidades comunicativas. A mídia secundária corresponde aos meios que transportam a mensagem como: a imagem, a escrita, o impresso, a gravura, a fotografia e seus desdobramentos. Já a mídia terciaria corresponde aos meios de comunicação que dependem de aparelhos em ambos os lados – do emissor ao receptor – como o telefone, o cinema, o rádio, a televisão, o CD e DVD (PROSS, 1972 apud BAITELLO, 2005). Essa polissemia do corpo abre uma gama de possibilidades na observação e compreensão do fenômeno visual, do consumo e do interesse mercadológico para o aproveitamento não somente do corpo como um objeto, mas como o mais significativo para o consumo,

104 Do original: All through the Middle Ages, the Devil, as we have seen, is represented as being

exceedingly ugly; and to this rule—a moral rather than an aesthetic one—it is very hard to discover exceptions.

o mais belo objecto de consumo: corpo [...] Na panóplia de consumo, o mais belo, precioso e resplandecente de todos os objetos – ainda mais carregado de conotações que o automóvel que, no entanto, os resume a todos (BAUDRILLARD, 2008, p. 168-169).

Na contemporaneidade, os corpos têm se transformado experimentando diversas configurações: a cultura fitness (abaixo na fig.111) que busca o corpo idealizado nas academias, o body building105, as transformações e inserções no corpo produzidas por meio de tatuagens e piercings, além do extensivo uso das cirurgias plásticas e estéticas (fig.112) com o intuito de correções nas mais diversas partes do corpo humano, por exemplo: boca, nariz, olhos, seios, pernas, abdômen etc., num sentido de recusa às imperfeições, excessos, resíduos e sobras dos corpos. (ORTEGA, 2008)

Figura 111 Corpos Fitness Figura 112 Cirurgia Plástica Estética

Fonte: (STEROIDCENTRALUK, 2017) Fonte: (REVISTA SAUDE, 2017)

Os processos de transformação do corpo também estão presentes nas artes. Ao longo do tempo, a imagem e a autoimagem do corpo como representação artística vêm sendo reinterpretada conforme os padrões de cada época. O corpo é relevante na construção das imagens visuais para o mercado da moda, pois ele alimenta uma produção de corpos fitness que atendem à demanda artística que contempla o mercado e consumo da estética. Sendo assim, na contemporaneidade, a preocupação estética passa a estar presente na conceituação, estando intrinsicamente ligada com a construção do imaginário de beleza, conforme aponta Malena Contrera (2010), de que o imaginário se baseia a partir do capitalismo e dos conteúdos midiáticos abstraídos do contexto da

105 Body Building é um conceito disseminado nas academias, semelhante ao fisiculturismo. Hoje, o

conceito é utilizado para definir a transformação do corpo através de exercícios físicos e de dieta. Em alguns casos há o abuso dos limites fisiológicos humanos com o uso de esteroides anabolizantes androgênicos para alcançarem seus objetivos, cf. (ESTEVÃO e BAGRICHEVSKY, 2004).

experiência direta criando uma esfera imaginária desconectada do concreto e do real: a

Mediosfera (CONTRERA, 2010).

As características na contemporaneidade sobre a relação corpo-imagem partem desde a beleza produzida através da maquiagem, tratamentos cosméticos, transformações realizadas por intermédio das tecnologias médicas no âmbito das cirurgias plásticas, alcançando os recursos estéticos das tecnologias digitais de construção e edição de imagens. Softwares como Photoshop106 e o Iclone 6107, tem a capacidade de edição de imagens fotográficas como a criação de simulacros de corpos virtuais.

Figura 113 Britney Spears editada no Photoshop Figura 114 Simulacro de ser humano feito no Iclone 6

Fonte: (Comunicart, 2017) Fonte: (Reallusion, 2017)

Na figura 113, se observa uma foto da artista Britney Spears. Do lado esquerdo mostra a imagem original sem tratamento digital, e no lado direito apresenta a imagem tratada digitalmente através de processos digitais capazes de remover manchas, rugas, sinais de expressão, além de alterar cor e luminosidade. Já na figura 114, os aparatos tecnológicos na era digital ampliam a discussão sobre o simulacro e produção de figuras humanas através de softwares.

No gospel o corpo tem se apresentado sob novas configurações, buscando o ideal artístico apregoado pelo consumo, se ressignificando em diferentes áreas de suas artes.

106 Software produzido pela Adobe System fundada em 1982, que é um programa gráfico que lhe permite

criar e editar vários tipos de imagens, incluindo retoques, mudanças de cores, a criação de obras de arte a partir do zero. Ele tornou-se uma das ferramentas mais conhecidas na área de edição de imagens. Cf.

http://www.photoshop.com/.

107 O Iclone 6 permite a criação de figuras humanas de todas as raças e faixas etárias. Cf. Https://www.reallusion.com/contentstore/iClone/pack/Realistic_Human_100/default.aspx

Figura 115 CD Shirley Carvalhaes Figura 116 Shirley Carvalhaes sem edição digital

Fonte: (Shirley Carvalhaes, 2017) Fonte: (Letras.Mus, 2017)

No caso das artes gospel, o paradigma do belo é instituído pelas regras do consumo. Na figura 115 é a capa do CD da cantora Shirley Carvalhaes e a figura 116 é uma foto da mesma cantora, podendo se observar ao comparar ambas imagens que a capa do CD (fig. 115) passou por três momentos: a preparação do ato fotográfico através da pose e ângulo da foto; a preparação do corpo através do cabelo e maquiagem; e por fim, o tratamento imagético através de softwares de edição de imagens onde se vê o retoque retirando imperfeições no rosto e pescoço, como também tratamento de cores e luz (fig.115A). Se percebe que as imagens produzidas ou editadas digitalmente partem de uma irrealidade corpórea, que não é uma ressuscitação do real, pois já não é real, mas hiper-real. Não possuindo o sentido de reprodução, mas de simulação (BAUDRILLARD, 1991).

Com isso, o simulacro hiper-real, produz na sociedade o colapso visual no processo de identificação dos corpos e cada vez mais abrindo passagem para as imagens como “representação de representações” (BAITELLO, 2005, p. 48). Em suma, os cenários da moda e da beleza são impulsionados pela valorização do corpo-real ou simulacro, para as transformações e ressignificações em conformidade com o capitalismo artista conforme aponta Lipovetsky e Serroy (2015),

O critério da beleza, necessariamente subjetivo, não pode ser o que permite qualificar o estado do capitalismo artista, mas sim a organização objetiva de sua economia, na qual as operações de estilização e de moda, sedução e cosmetização, divertimento e sonho se desenvolvem em grande escala nos níveis da elaboração, da comunicação e da distribuição dos bens de consumo. (SERROY, 2015, p. 67).

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