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CAPÍTULO 3 A LÓGICA DO CAMPO UNIVERSITÁRIO UEPG PARA O

3.2 AS CONDIÇÕES SOCIAIS EXISTENTES NO SUBCAMPO DAS

3.3.2 As Trincheiras Assumidas no Campo Universitário UEPG

Diante dos processos de reformulação curricular apresentados é possível perceber um foco de discussão centrada no DEMET, com agentes posicionados em trincheiras: a favor do DEMET e contra o DEMET. A essência da discussão que deveria ser o Estágio Curricular Supervisionado das licenciaturas na UEPG não aconteceu. O tempo para se discutir sobre a reestruturação141 do ECS dentro da instituição resumiu-se em manifestos, processos tendenciosos, ataques pessoais e articulação entre agentes em posição decisória na estrutura universitária, para garantir a supremacia de um ponto de vista. Com relação ao ECS a discussão restringiu-se a enunciados feitos, tais como: promover a integração entre estágio, prática enquanto componente curricular e demais disciplinas do curso; processo formativo que se desdobra em atividades de ensino, pesquisa científica, de experiência profissional; trabalho de inserção dos licenciandos em ambientes, como forma de aprendizagem profissional; desenvolvimento de reflexão crítica, visando aperfeiçoamento e contínua ação na prática; relação pedagógica dialógica com as instituições campo de estágio; campo de conhecimento que envolve aspectos teóricos e práticos; momento do licenciando avaliar os saberes e conhecimentos docentes adquiridos ao longo de sua formação inicial; estágio enquanto responsabilidade de todos os professores formadores das licenciaturas, entre outras (Insertos retirado dos processos apresentados anteriormente).

A questão que não foi discutida estava em como transformar estas ideias que pautavam o conflito em um debate saudável em que cada Curso à luz de seus referenciais, necessidades, perspectivas e engajamento na licenciatura desenvolvesse a “mudança de atitude” em relação à formação para docência. O conflito ficou personificado na existência de uma unidade departamental, e isso incomodava um grupo de professores orientadores de estágio que perceberam o esvaziamento das discussões, divagando para vagas de concurso e carga horária disponível para cada unidade departamental. No desenrolar da luta concorrencial estabelecida, alguns professores

141 Reorganizar o ECS das licenciaturas na estrutura da instituição envolvendo também uma proposta de

readequação na estrutura organizacional interna do ECS com objetivos, encaminhamentos e propósitos bem definidos e discutidos entre todos os envolvidos no ECS (professor formador orientador de estágio, comunidade, licenciandos e demais órgãos competentes). Com a finalidade de aumentar a eficiência do ECS na formação para docência em médio e curto prazo, redefinindo: o conceito de ECS da licenciatura na instituição; perfil do professor formador orientador de estágio; distribuição de carga horária; registros de controle do ECS; necessidades da comunidade onde o ECS ocorre e melhorias nas condições de desenvolvimento do ECS sob o ponto de vista dos estagiários, professor orientador e professor supervisor de ECS ( A AUTORA, 2018).

orientadores de estágio simplesmente aceitaram o que estava sendo imposto. Enquanto outros insistiam que o lugar para consolidar uma proposta de estágio supervisionado com responsabilidade e amadurecimento, seria com discussões que aparasse todas as arestas sobre o tema no interior dos colegiados dos cursos, a partir das conquistas adquiridas no estágio curricular das licenciaturas dentro da instituição. Reflexões sobre questões utilizadas no combate a uma unidade departamental estavam sendo negligenciadas, pois são preocupantes afirmações, tais como: a integração ocorre a partir da convivência cotidiana; o estágio é uma dimensão do conhecimento para o qual todos os professores são competentes a princípio, porque são licenciados; não existe o saber algo separado do saber ensinar algo; dicotomização entre bacharelado e licenciatura na condição de força legal; entre outros (Insertos retirado dos processos apresentados anteriormente). Tais questões quando questionadas por um grupo de professores orientadores de estágio, no sentido de refletir se representava a opinião de todos os cursos, eram tidos como “resistentes”, “conservadores”e “emotivos”.

Os ditos professores orientadores “resistentes” buscavam refletir sobre o fato de que conviver extrapola a noção de espaço, no sentido de compartilhar um mesmo ambiente. É viver em harmonia no sentido da interação social. No caso do ECS, significa consolidar a integração acadêmica necessária para a orientação, supervisão e avaliação do estágio em conformidade com os princípios norteadores que regem a licenciatura em seu todo. A insistência em estar em um mesmo espaço físico não elimina a carência de um planejamento interdisciplinar, no sentido de duas ou mais disciplinas da grade curricular relacionar seus conteúdos para viabilizar ao licenciando construir e aprofundar um conhecimento, não significa que não possa coadunar de um mesmo espaço. O ECS, enquanto disciplina, não é a “falha” do curso. Trata-se de um espaço/tempo do curso que viabiliza evidenciar as possíveis dissonâncias entre o que se aprende no curso e o que se faz necessário dominar para exercer a docência. Neste sentido, o que se precisa rever é a estratégia de ensino e aprendizagem assumida pelo curso no preparo do licenciando para desenvolver os conteúdos específicos da área de atuação, em consonância com o desenvolvimento dos saberes necessários para superar os desafios profissionais da docência. Em outras palavras, “[...] se faz necessário garantir uma problematização pedagógica nas disciplinas de conteúdo „específico‟, e, paralelamente, um questionamento „específico‟ nas disciplinas pedagógicas”. Numa ação integrada na formação de professores (DANIEL, 2009, p. 50).

Esse raciocínio relativo à formação de licenciado não garante o exercício das funções e competências referentes ao professor orientador de estágio para mediar à inserção do licenciando na realidade da atuação profissional. O orientador deve amparar o licenciando na reflexão necessária entre a teoria e prática e vice versa, para que este atinja as condições necessárias como incitador do processo de ensino e aprendizagem dos alunos sob sua responsabilidade. O professor orientador de estágio não transmite técnicas, modelos e prescrições, nem tão pouco deve exercer domínio de seus orientandos quanto à forma de pensar e conduzir um processo de ensino e aprendizagem, atitude marcante de uma concepção positivista. Existe a necessidade de um preparo específico do professor orientador de estágio na condução do estágio de seus licenciandos em relação às ações de “[...] observar, descrever, registrar, interpretar e problematizar e, consequentemente, propor alternativas de intervenção e de superação” (PIMENTA, 2001, p. 76). Sem deixar de considerar a presença de um terceiro elemento, o professor supervisor de estágio, profissional em serviço, que enriquece o processo de estágio com a complexidade da rotina instituída na realidade do exercício da docência, cujo espaço no auxílio na formação do licenciando é delimitado pelo professor orientador de estágio. Equacionar estas relações é o diferencial do professor orientador de estágio, e cabe a este formador “[...] saber trabalhar com as diferentes linguagens, discursos e representações, com as descrenças (em relação ao curso, à profissão, às suas escolhas profissionais, à didática) e crenças” do professor em formação inicial e em serviço (DANIEL, 2009, p. 92). Tais questões compõem a identidade do professor formador orientador estágio, que são desenvolvidas junto aos seus pares, e os fortalecem profissionalmente. Admitir e respeitar a especificidade do trabalho desenvolvido pelo professor orientador de estágio no âmbito da licenciatura é pensar o ECS na condição de componente curricular que parte de um projeto coletivo dos cursos de formação de professores.

[...] o estágio prepara para um trabalho coletivo, uma vez que o ensino não é um assunto individual do professor, pois a tarefa escolar é resultado das ações coletivas dos professores e das práticas institucionais, situadas em contextos sociais, históricos e culturais (PIMENTA; LIMA, 2012, p.56).

Ressalta-se que não seja apenas o professor formador orientador de estágio o responsável pelo trabalho de unidade entre teoria e prática. Um curso de licenciatura tem por alvo de trabalho orientar da melhor forma possível a formação para a docência

de qualidade. Igualmente, viabilizar ao licenciando domínio de conteúdo específico e a maneira como este deve ser transmitido, nas palavras de Guiomar Namo de Mello: “Fazer a passagem daquilo que o professor aprendeu para aquilo que ele vai ensinar exige esforço, conceituação e uma prática que você só vai forjando com a experiência" (MELLO, 2016). Saber „algo‟ não garante necessariamente saber ensinar este „algo‟, logo uma das questões fundamentais a serem discutidas durante o curso de licenciatura é “o que significa ensinar”.

De acordo com Paul H. Hirst (2001) são muitas as atividades específicas de ensino, por exemplo: desenhar, sem falar nada; narrar uma história; fazer uma experiência diante uma classe; realizar um passeio; assistir um filme; conversar com alguém, entre outras tantas atividades. No entanto nenhuma dessas atividades pode ser reconhecida como ensino. O autor defende que a noção de ensinar está relacionada ao conceito de aprender, e que esta implicação entre ensinar e aprender tem consequência no modo como o professor compreende a profissão da docência, consequentemente, na forma como o professor age em sala de aula. Ensinar nesta perspectiva significa admitir que “[...] não existe ensino sem a intenção de produzir aprendizagem e, assim sendo, não se pode caracterizar o ensino sem caracterizar a aprendizagem [...]”. Hirst (2001) também afirmou que em vista disso, “[...] sem se saber o que é aprender, é impossível saber-se o que é ensinar” (2001 p. 70-71). A razão de ensinar está no aprender. Podemos então concluir que ensinar é uma ação intencional com previsão de que o sujeito que aprende mova uma ação transformadora na realidade. Se esta competência em reconhecer o significado de ensinar não for desenvolvida na formação para a docência, as licenciaturas estarão formando profissionais fadados a entreter seus alunos, os enchendo de “[...]conteúdos que contradizem a própria forma de estar em seu mundo, sem que seja desafiado” (FREIRE, 1975, p. 27-28). Um professor, que por vezes saiba, mas não é capaz de ensinar os alunos a aprender!

Partindo destas considerações justifica-se a diferença fundamental entre os dois tipos de cursos de graduação: bacharelado e licenciatura. O segundo deve ocupar- se em preparar o graduando para atuar como professor na educação básica, ou seja, ensinar conteúdos de uma área de conhecimento, este é o ofício do licenciado. Decorre assim que os cursos de licenciaturas estejam organizados para a investigação educacional, não por força legal recomendada a partir das resoluções do CNE, mas por concepção pelo respeito à identidade própria de um Curso de Licenciatura. A partir da divergência de opiniões não dirimida, estava cada vez mais evidente no conflito

instalado no subcampo das licenciaturas UEPG: a influência do habitus da organização da estrutura do estágio curricular na instituição, do habitus da formação inicial para docência nas licenciaturas UEPG e o habitus de cada curso de licenciatura. Tais disposições permeavam o jogo estabelecido indicando ser pertinente perceber, por parte de ambos os grupos, a existência de questões relevantes para serem definidas no âmbito dos colegiados dos diferentes cursos de licenciaturas, priorizando um processo de construção, visando como produto um novo habitus no subcampo das licenciaturas UEPG. Em outras palavras:

Reitero a necessidade de considerar o habitus um sistema flexível de disposição, não apenas resultado da sedimentação de uma vivência nas instituições sociais tradicionais, mas um sistema em construção, em constante mutação e, portanto, adaptável aos estímulos do mundo moderno: um habitus como trajetória, mediação do passado e do presente; habitus como história sendo feita; habitus como expressão de uma identidade social em construção (SETTON, 2002, p. 67).

Este entendimento permitiria definições harmoniosas com responsabilidade de todos e segurança nas decisões tomadas sobre o ECS da licenciatura. Afastaria as situações conflitantes, legitimando as decisões por meio do comprometimento de todos os sujeitos envolvidos na construção das decisões e não a legitimação da opinião de um grupo pela força legal da maioria. Importante destacar que no conflito em questão, não existiu grupo contrário ao fortalecimento das licenciaturas e sim, propostas de encaminhamentos divergentes. Principalmente em relação à pulverização das disciplinas de estágio das licenciaturas, detentora de uma carga horária imponente na grade curricular, em diferentes unidades departamentais com legitimidade em gerir a carga horária sob sua responsabilidade. As preocupações mencionadas não fizeram parte da pauta de discussão, o que pode ser percebido diante das decisões tomadas nos processos de reformulações curriculares por meio de deliberações normativas, embora o discurso ecoado fosse a defesa da “interação”, “convivência contígua” e “oportunidade de voz e voto”.

Os professores orientadores de estágio, ainda vinculados ao DEMET, encaminharam ao Conselho Universitário – COU/UEPG uma decisão aprovada em reunião departamental, na qual solicitavam que os professores orientadores de estágio só fossem transferidos de unidade departamental por concordância de ambas as partes (requerente e professor/DEMET). Esta decisão departamental consubstanciou-se no processo 05116/2015 de 09/4/2015, arquivado no SECIHLA por despacho da vice-

reitoria datado de 17 de Abril de 2015. No referido processo, em síntese: foram expostas as situações vexatórias pelas quais os professores da unidade vinham passando no âmbito da instituição; foi apresentada uma síntese do papel do departamento em relação ao estágio; foi dada uma ênfase no departamento enquanto unidade administrativa; apresentou-se a necessidade de respeito em relação à trajetória acadêmica desses docentes na instituição; igualmente a necessidade em resguardar a atuação da Coordenação Geral dos Estágios das Licenciaturas; foi solicitado garantia de vagas de concurso para o estágio curricular; igualmente de asseverar a isonomia de direitos aos docentes que optassem permanecer no DEMET (UEPG, 2015). O processo, no entanto nunca chegou ao COU/UEPG. “Consta nos autos do processo” que se reuniram no gabinete da vice - reitoria: vice - reitora; representante da PROGRAD, procurador jurídico, representante do SECIHLA, Coordenador Geral dos Estágios das Licenciaturas; representante da COPELIC; Chefe e chefe adjunto do DEMET, ocasião em que foi discutida uma minuta de Portaria da Reitoria para normatizar o procedimento de realocação de disciplinas referentes ao ECS da licenciatura e seus respectivos professores do DEMET para os departamentos de referência, resultando na Portaria da Reitoria nº 189142 de 16/4/2015. Desta forma o processo protocolado pelo DEMET foi considerado sem finalidade, e com aval da procuradoria jurídica, conforme registros, arquivado no setor de Ciências Humanas, Letras e Artes por determinação da vice - reitoria.