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O DISCURSO DE NICOLAU SOARES DO COUTO ESHER (LAURESTO)

4.1. Aspectos Biográficos (1867-1943)

Nicolau Esher é uma das figuras mais importantes da história da Igreja Presbiteriana Independente do Brasil, igreja à qual se filiou e exerceu diversas atividades leigas. Por leigo, aqui, não devemos entender no sentido estrito da palavra, mas compreender que se trata de alguém que não passa por nenhum ritual de ordenação para desempenhar uma determinada função. A condição de leigo na estrutura dessa igreja não impede que a pessoa seja investida de algumas responsabilidades, inclusive da pregação evangélica. A única restrição constitucional é que ela esteja na condição de membro confessante, isto é, precisa passar pelo batismo e por um processo de confirmação, que ali recebe o nome de profissão de fé. De praxe, o sacramento do batismo é administrado ainda na infância, de acordo com o consentimento dos pais e mais tarde, numa idade de maior entendimento, se programa o ritual da confissão de fé, que, neste caso, não é entendido nesse ramo confessional calvinista como um outro

sacramento. Todavia é condição sine-qua-non para a pessoa ser admitida à comunhão. Embora somente a Santa Ceia seja considerada sacramento, a pessoa que não passa pelo ritual de confirmação não pode, constitucionalmente, receber incumbências oficia is. Isto vale para todos os membros, e à medida que a comunidade entende que alguém do grupo, já quites com estas exigências, tem uma capacidade diferenciada, ela pode elegê- lo para exercer a tarefa para a qual a comunidade entende que a pessoa tem habilitações.

Nesse caso, esta pessoa é elevada à condição de oficial, pois passa por um outro ritual de ordenação e investidura para aquele cargo. Do ponto de vista meramente organizacional, é uma função hierarquicamente subalterna à função de pastor, ainda que os rituais de ordenação sejam semelhantes. Nessa nova condição, este membro, batizado, professo, e agora ordenado e investido, ele recebe o nome de presbítero, ocupando funções administrativas e eclesiásticas, ou então, diácono, mais comumente ligado aos assuntos de administração da beneficência e fomentação de projetos de cunho social. Esse preâmbulo organizacional da igreja a qual serviu Esher, fez-se necessário para uma devida compreensão de suas funções dentro do grupo. Vale dizer, que Esher, sendo filho de pais evangélicos, provavelmente foi batizado na infância, e passou pelo ritual de confirmação no dia 06 de dezembro de 1885, na Igreja Presbiteriana de São Paulo. O Dr. Nicolau, como era também conhecido, não foi presbítero ordenado da igreja em São Paulo, embora tenha sido eleito, não aceitou o cargo, como registra revista Almenara de 24/08/1943, p. 4.

A sua biografia pode ser encontrada em Vicente Themudo Lessa (1939), O

Estandarte (31/07/1943), O Puritano (25/07/1943), Jornal Almenara (24/08/1943)

Ribeiro (1981) e Matos (2004), além dos textos indicados na presente pesquisa. Nascido em 30/071867, sua história liga-se à história dos pioneiros do protestantismo no Brasil, uma vez que sua mãe e sua avó foram introduzidas à fé protestante por José Pereira de Souza Louro, o primeiro convertido por Kalley ao protestantismo, em 1858 (Reily; 1993, p. 102). Da ação missionária de Louro, decorreu o batismo da mãe de Esher, Henriqueta Augusta Soares do Couto, e também da avó, Gabriela Carneiro Leão, esta última, irmã do Marquês do Paraná e do Barão de Santa Maria, Honório Hermeto de Carneiro Leão, o Marquês do Paraná. Leão foi diplomata, Ministro da Justiça em 1832, Senador por Minas Gerais em 1843, e governador de Pernambuco em 1849. No entanto, a conversão de alguém tão próximo dos membros trouxe mais complicadores para que Kalley exercesse o seu trabalho de pregação.

Seu pai, também diácono e presbítero na Igreja do Rio de Janeiro era de origem congregacional, transferiu-se para a Igreja Presbiteriana do Rio de Janeiro, mudou-se para a Inglaterra (1871) e depois para os Estados Unidos, onde se ordenou pastor metodista e episcopal, e aí faleceu, em 1901. Os irmãos, Guilherme e Henrique, Nicolau era o do meio, formaram-se em Odontologia, residiram nos Estados Unidos. Guilherme morre de tifo em 1885, no Recife, e Henrique nos Estados Unidos, no mesmo ano.

Esher foi aluno da Escola Americana em São Paulo (1878), retorna ao Rio de Janeiro onde forma-se em Farmácia (1888) e Medicina (1893).É como médico que se inscreve no Batalhão Acadêmico, por ocasião da Revolta da Armada e depois presta serviço no Hospital de Sangue do Exército. O governador de São Paulo o convoca para acompanhar as forças legalistas, exercendo, entre eles, a missão de cirurgião das tropas que seguiam para o sul para proteger os limites de São Paulo, em Itararé. Como militante cristão, participou da fundação da Associação Cristã de Moços no Rio de Janeiro, sendo seu primeiro presidente em 1893. O mesmo ocorre em São Paulo, quando da fundação da ACM, em 1895, onde foi também seu primeiro presidente. Os dotes jornalísticos de Esher, que até então eram aplicados no jornal “O Cristão”, fundado por ele e seu cunhado, José Luiz Fernandes Braga, em 1892, serão agora canalizados para outros veículos de maior alcance. Em 1905, entra para a equipe de redatores de O Estandarte, permanecendo até 1912, e publicou diversos textos apologéticos e políticos. Em 1900, publica uma coleção de artigos, Religião de Estado, que se torna um importante veículo na divulgação da propaganda de igualdade de cultos perante a lei. O título de seus artigos é variado: “Calix individual na Ceia do Senhor”, “Conferências do Padre Julio Maria”, “Filosofando Liberdade de Pensamento”, “A imagem de Cristo no Juri”, “Divórcio e Vinculo” “Ensino Religioso nas Escola s” “Voto Secreto”, “Integralismo e o crente”, entre outros. Muitos destes artigos foram publicados em pequenas porções nas páginas dos jornais protestantes, e constatamos que alguns não tiveram continuidade, ou sua seqüência interrompida.

Porém, dos seus escritos, o que mais repercutiu foi “A maçonaria e o crente” série de 12 artigos, o primeiro respondendo a uma consulta sobre a incompatibilidade do exercício da fé cristã e a observação dos princípios maçônicos. Esta série polêmica alimentou as tensões que já havia no interior da Igreja Presbiteriana no Brasil, tensão esta, cujo desfecho é a cisão do movimento, em 1903. À Questão Maçônica, juntaram- se outros pontos de atrito como a formação do ministério ordenado brasileiro, o sustento dos missionários estrangeiros pelos nacionais, e questões ligadas às escolas

confessionais. Desta cisma resulta uma igreja presbiteriana que se aliou com os interesses nacionalistas, chamada, posteriormente, de Independente, e outra, que permaneceu ligada aos organismos missionários dos Estados Unidos. Esta última manteve consigo a antiga denominação: Igreja Presbiteriana do Brasil. Na atuação política de Esher, podemos destacar o espírito de liderança e a lógica argumentativa. Foi expoente nas comunidades por onde passou; sem ser oficial ordenado, ocupou os espaços, funcionando como palavra autorizada, no sentido que Bourdieu emprega ao termo. A passagem pela liderança do movimento de juventude evangélica, a Associação Cristã de Moços, contribui para lapidar sua formação na gestão de pessoas e idéias.