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CAPÍTULO 3. POLÍTICA NACIONAL DE RECURSOS HÍDRICOS – PNRH:

3.2 Aspectos institucionais da PNMA

A importância institucional nos processos de implementação e desenvolvimento da PNMA é destacada pelos atores sociais como fundamental para o sucesso da mesma. Argüidos acerca da efetividade das instituições que compõem o SISNAMA, os atores sociais destacam sua baixa efetividade em razão do não-cumprimento das atribuições dessas instituições, pela não efetivação dos instrumentos da PNRH, pela falta de diálogo e pelo espírito corporativista, materializado fortemente pela ação dos setores elétricos, agrícola e industrial. Tal situação, segundo os entrevistados, é conseqüência também do processo de sucateamento das instituições públicas voltadas para a gestão ambiental. Dessa forma, a capacidade operacional permanece debilitada em função da incapacidade técnica e da deficiência de recursos humanos, de conflitos de competências e principalmente em função das pressões governamentais para aprovação célere ou retardada de projetos de seu interesse.

Os órgãos públicos brasileiros do SISNAMA estão rigorosamente desaparelhados para enfrentar o cumprimento do exercício das atribuições legais, com o agravamento de que o governo federal delega funções sem contrapartida de recursos, então a cada dia mais você vê a União delegando aos Estados competências, só que sem recursos [...] Muitas vezes tem Estados sem aparato legal e institucional para fazer frente a esta delegação de competências, [...] Na pratica, simplesmente você está desobrigando o poder público de cumprir o que a legislação federal determina, é uma questão de institucionalidade, de déficit institucional. (Entrevistado I).

Vamos pegar duas instituições executivas, o IBAMA e os órgãos executivos de Minas Gerais; o IBAMA, por não ter condições de atender do modo que deveria atender, ele repassa para o Estado, aí o órgão estadual que já estava sobrecarregado com aquelas atribuições que são inerentes e ainda assumindo aquelas que vieram do IBAMA [...] Exemplo a mineração: muita coisa da mineração está irregular exatamente pela não efetividade do órgão gestor federal, isso o estado recebeu como um presente de grego e finge que está fazendo um trabalho bom, e dependendo de cada setor funciona ou não....o IEF do sul de Minas Gerais tem tentado fazer um trabalho mas tem esbarrado em infra-estrutura enxuta ....para um trabalho muito grande a ser feito...este conflito do órgão federal não ter infra-estrutura não consegue atender o Brasil como um todo fica naquela dúvida, isso eu posso, isto eu não posso.... Tenho tido contato com algumas pessoas dos órgãos estaduais que dizem isto: eu não sei se a responsabilidade é do IBAMA ou se é nossa [...] Esta ruptura deve ser contida principalmente na parte de rios, fauna e flora. (Entrevistado F).

Sob pressão e reduzido ao gerenciamento por atividades de comando-controle as instituições, especialmente os órgãos estaduais, permanecem frágeis e impotentes diante das crescentes demandas sociais que se concretizam em críticas à sua própria eficiência e eficácia

e de suas conseqüências para o retardamento da implantação de empreendimentos que necessitam de licenciamento que se tornou no Brasil o fim e não o meio para o atingimento de uma situação de sustentabilidade social, ambiental e econômica. No confronto entre desenvolvimento econômico ou sustentável, este último só acontece se possível e condicionado à possibilidade e oportunidade de pressão e fiscalização social e por parte do ministério público.

Hoje os órgãos ambientais estão em uma situação bastante precária [...] a FEEMA já foi considerada por todos um bom emprego, interessante, importante [...] hoje se vê que estes órgãos foram se deteriorando, hoje eles acumulam papéis [...] desvirtuou a idéia original, a dificuldade deles lidarem com o ministério público. Há pouca clareza de competência do que é do estado do que é do município, desvirtuou muito a déia original o órgão ambiental que seria um braço técnico, braço de gestão, hoje eles ficam lá acumulando processos [...] o licenciamento praticamente tomou conta dos órgãos ambientais, parece até que é o único instrumento que existe hoje de política ambiental [...] e o tempo todo dos técnicos mal-pagos está por conta desta burocracia. (Entrevistado G).

Este momento presente é muito emblemático porque você vê entidades e órgãos que foram historicamente sucateados, é o caso típico da FEPAM do Rio Grande do Sul, baixos salários, poucos estímulos, pessoas saindo porque são bem capacitados acabam encontrando outros locais de trabalho com maior gratificação financeira. Estes órgãos foram sendo esvaziados sem concursos, a parte de equipamentos se deteriorou, e de repente começam as pressões sobre a FEPAM chamando-a de ineficiente porque tem uma série de EIA-RIMA que interessam ao governo e outros que não são [...] porque não podem ou por que a FEPAM não tem habilidade de analisar [... ] elas estão sucateadas e pior que você não pode culpá-las porque há uma política e ação governamental que não investiu [...] e sempre que houve um confronto entre desenvolvimento e meio ambiente, acabou aquela história de desenvolvimento sustentável [...] é fácil quando tudo pode ser compatibilizado, quando não pode permanece o desenvolvimento mesmo [...] esta situação também é resultado do modelo de ação destes órgãos [...] baseado nos instrumentos de comando e controle [...] isso torna frágeis estas instituições. (Entrevistado B).

Dessa forma, o componente institucional carece de incremento de natureza financeira que se desdobre em recursos humanos técnicos e de suporte político ao desenvolvimento de suas atividades. A autonomia, diante das pressões políticas, poderia ser obtida a partir do fortalecimento institucional frente à sociedade e como resultado de uma ação que avance além dos instrumentos de comando e controle e econômicos. Da mesma forma, a explicitação de objetivos e a definição de atribuições e âmbito de cada instituição eliminaria ou mesmo diminuiria os casos conflitos de atribuições e suas conseqüências danosas ao desenvolvimento de atividades sustentáveis.

Há fatores que limitam o desempenho das instituições... Faltam quadros, muito contingenciamento de recursos e nestes últimos anos. Falta de amarração de controle fiscal [...] A ANA sofre muito problema de contingenciamento porque é mantida por

royalties do setor energia. É uma grande parcela de recursos da agência, mas você já faz uma programação prevendo um contingenciamento, depois tem os cortes orçamentários e quando está em setembro eu não consegui gastar nem 10 % do disponível porque sai uma instrução normativa do TCU ou da Controladoria da União dizendo que para fazer repasse aí para o IGAM em Minas Gerais não pode nenhum órgão do Estado com nenhuma pendência [...] Às vezes o estado fica sem pendências por alguns dias e depois volta [...] Aparece uma pendência no dia seguinte. A ANA fez dois ou três concursos, tem quadro de gente formada com equipamentos, nós teríamos todas as condições para cumprir nossas funções, a ANA não é da administração direta [...] Tem mais flexibilidade mas não estamos cumprindo [...] Os órgãos estaduais são muito fragilizados e para que a PNRH funcione efetivamente ela precisa que também nos estados os órgãos gestores estejam com equipes, com recursos, tenha a decisão política no estado de valorizar a gestão de recursos hídricos, mas isto é uma exceção, o país em função também de limites orçamentários [...] Lei de responsabilidade fiscal [...] A questão de gestão de recursos hídricos está sendo relegada realmente a se sobrar uma coisa... Como não sobra [...]. No caso do Rio Grande do Sul onde você tem praticamente todos os comitês instalados, uma sociedade bastante mobilizada, existe um fundo estadual de recursos hídricos há muito tempo, tem universidades renomadas com massa critica de técnicos [...] Até hoje tem um órgão gestor que nunca teve um concurso, que não tem uma equipe, um estado com um milhão de hectares irrigados com uma demanda enorme por outorga, monitoramento [...] muita dificuldade do pessoal lá de trabalhar. Mas como o Estado tem suas dívidas [...] A área de recursos hídricos fica em segundo ou terceiro plano porque não há monitoramento, fiscalização, mesmo tendo comitês não resolve o problema, não é à toa que deu aquela mortandade de peixes lá no Rio dos Sinos onde tem o comitê mais antigo do país, mas é um grande desafio da PNRH. Se não funciona a parte do Estado as demais [...] usuários e sociedade civil [...]. Não funciona. (Entrevistado L).

O bom funcionamento das instituições no Brasil é condicionado à possibilidade de cobrança social e de mercado. Nesse contexto, observa-se a evolução dos métodos práticas ambientais em organizações produtivas privadas que são, por um lado, pressionadas pela legislação e por outro, pelo mercado. No setor público, especialmente nos órgãos ambientais, observa-se a burocratização dos processos que, entrelaçado a conflitos de competência, dentre outras causas, desencadeiam, além do atraso de projetos, uma situação de sucessivas demandas judiciais e recursos a instâncias diversas, de forma a esgotar as possibilidades de se tomar ou não uma decisão ou de prosseguir um determinado projeto já em andamento. Esse movimento de forma generalizada gera um acúmulo de atribuições que provocam atrasos que impedem a consideração de situações de urgências ambientais como possibilidades de desmatamento, a responsabilização e punição de crimes e infrações ambientais, o andamento de processos de avaliação e licenciamento de atividades impactantes do meio ambiente. Geram-se dessa forma novos impactos sócio-ambientais decorrentes da protelação de decisões conclusivas por parte de órgãos competentes.