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O método é a alma da teoria Lenin

O que impulsiona o pesquisador é a busca de respostas para suas dúvidas e questionamentos em torno de um tema específico, levando-o a definir um objeto para desenvolver seu estudo. Este capítulo apresenta o caminho percorrido para a construção da pesquisa, com o objeto de estudo, objetivos e hipótese, bem como os procedimentos de coleta de dados, critérios de análise, escolha da escola e os sujeitos que participam da investigação.

A presente pesquisa é de caráter qualitativo, fundamentando-se na abordagem regida pelo interacionismo, em oposição à visão positivista que considera o ser humano um ser passivo, cujo comportamento é definido como o resultado de diversos fatores e estruturas internas e externas que atuam de forma concomitante. Incorporando um viés crítico, a perspectiva interacionista defende a ideia de que o homem interpreta continuamente o seu mundo, e a sua forma de existência é definida pela interação com os outros, os objetos culturais, as estruturas e contextos sociais que o cercam e o fazem repensar incessantemente, refazendo suas hipóteses sobre a realidade.

A pesquisa qualitativa não busca medir ou enumerar fatos; seu interesse está em possibilitar a compreensão de certos fenômenos, conforme a perspectiva dos envolvidos na situação a ser estudada, e, assim, subsidiar a interpretação através dos dados descritivos obtidos pelo pesquisador em interação com o objeto. Ao tratar das características da pesquisa qualitativa, Trivinõs (1987) esclarece que sua essência está justamente no significado de determinado fenômeno ou situação, naquilo que representa ou explica sua ocorrência.

Assim, o pesquisador que opta por esta abordagem metodológica está preocupado com a interpretação do mundo real e coloca suas lentes sobre as experiências do homem no contexto de sua história de vida, focalizando suas formas de compreender e atuar neste mundo.

4.1 Objeto de estudo, objetivos e hipótese

Conforme explicitado no capítulo anterior, o interesse pelo estudo das representações docentes coloca-se como uma possibilidade bastante significativa de compreender alguns

aspectos que estão implícitos no cotidiano da escola e podem manifestar-se através da análise das “falas” dos professores. Tendo em vista os desafios propostos pelo novo Currículo da SEE, várias questões se colocaram de forma inquietante, principalmente quando se considera que a forma como a escola se posiciona mediante novos princípios pedagógicos e, a partir daí, conduz o seu trabalho é que vai ser determinante do sucesso ou fracasso de mais uma política elaborada para enfrentar os problemas em torno da qualidade de ensino.

No entanto, dentre as várias questões relacionadas à política de ensino, uma foi especialmente instigante e, de certa forma, abrange muitos aspectos da complexidade envolvida na implementação do novo Currículo: como a proposta do Currículo oficial do Estado de São Paulo para o trabalho centrado nas competências em leitura e escrita no Ensino Médio está sendo incorporada pelos docentes?

A esse respeito, o que está em pauta é a análise do significado e da implementação de mais uma política educacional cujo foco é a erradicação dos problemas relativos ao desempenho linguístico dos alunos.

Por isso, estabeleceu-se como objetivo fazer um mapeamento sobre as Representações docentes acerca de concepções básicas inerentes à proposta pedagógica do Currículo: a leitura e a escrita como prioridade nas diferentes áreas, e a aprendizagem por competências.

Desta forma, situa-se as Representações docentes sobre os princípios do Currículo como objeto de estudo, acreditando que o confronto delas com a proposta pedagógica da SEE-SP possa dar subsídios para compreender os modos de implementação do programa com possíveis implicações para fundamentar a formação continuada dos professores dentro de um quadro de organização do trabalho na unidade escolar.

Como estratégias metodológicas, a opção é por um levantamento teórico sobre o tema da pesquisa pela análise documental acerca do Currículo e as entrevistas semi-estruturadas em torno das concepções docentes eleitas como eixos privilegiados para proceder à coleta de dados. Tais eixos foram definidos justamente porque a prioridade para a leitura e escrita em todas as áreas do Currículo e a aprendizagem por competências se configuram como pontos centrais do Currículo da SEE.

O que justificou esta proposta de pesquisa foi justamente o acompanhamento do processo de implementação do Currículo da SEE desde 2008, quando a apresentação e a introdução da nova proposta suscitaram muitas inquietações no que se refere aos limites e possibilidades de uma nova política curricular com seus princípios pedagógicos como eixos articuladores do trabalho do professor. Ao longo desse período de implementação da proposta na escola foi possível elaborar a hipótese de que a assimilação do Currículo oficial é um

processo complexo, considerando-se os diferentes modos de se articular concepções docentes e princípios organizadores do Currículo.

4.2 Coleta de dados e critérios de análise

Com a finalidade de cumprir seu propósito e já tendo definido seu objeto, hipótese e objetivo, esta pesquisa ancora-se no referencial sócio-histórico, que entende o conhecimento como um processo construtivo situado em um dado contexto, elegendo a entrevista como ferramenta para a coleta de dados. Pela sua dimensão social, a entrevista caracteriza-se pela interação linguística entre pesquisador e sujeito entrevistado, como afirma Freitas (2002, p. 9):

Ela não se reduz a uma troca de perguntas e respostas previamente preparadas, mas é concebida como uma produção de linguagem, portanto, dialógica. Os sentidos são criados na interlocução e dependem da situação experienciada, dos horizontes espaciais ocupados pelo pesquisador e pelo entrevistado. As enunciações acontecidas dependem da situação concreta em que se realizam, da relação que se estabelece entre os interlocutores, depende de com quem se fala. Na entrevista é o sujeito que se expressa, mas sua voz carrega o tom de outras vozes, refletindo a realidade de seu grupo, gênero, etnia, classe, momento histórico e social.

Do mesmo modo, o caráter de interação da entrevista é enfatizado por Ludke e André (1986, p. 33, 34) quando afirmam que “[...] a entrevista representa um dos instrumentos básicos para a coleta de dados [...], uma das principais técnicas de trabalho em quase todos os tipos de pesquisa utilizados nas ciências sociais”. Sua importância está no caráter de interação que permeia todo o processo da entrevista, evitando a conotação da possível hierarquia entre o pesquisador e o pesquisado que se percebe, por exemplo, na observação ou aplicação de questionários, pois

[...] na entrevista, a relação que se cria é de interação, havendo uma atmosfera de influência recíproca entre quem pergunta e quem responde [...]. A grande vantagem da entrevista sobre outras técnicas é que ela permite a captação imediata e corrente da informação desejada, praticamente com qualquer tipo de informante e sobre os mais variados tópicos [...]

Como se realiza cada vez de maneira exclusiva [...] a entrevista permite correções, esclarecimentos e adaptações que a tornam sobremaneira eficaz no obtenção das informações desejadas. Enquanto outros instrumentos têm seu destino selado no

momento em que saem das mãos do pesquisador que os elaborou, a entrevista ganha vida ao se iniciar o diálogo entre o entrevistador e o entrevistado. (LUDKE E ANDRÉ, 1986, P. 34).

Pelo que se depreende da citação acima, a grande vantagem da entrevista sobre as demais técnicas de coleta de dados é que ela possibilita captar de forma imediata a informação que se pretende sobre os vários aspectos da situação ou do caso estudado, inclusive favorecendo o esclarecimento de pormenores importantes envolvidos na sua compreensão. Sabendo que os professores já tinham tido contato prévio com os temas do Currículo, pois vêm passando por processo de capacitação no âmbito da escola e da Diretoria de Ensino desde 2008, a opção metodológica privilegiou a flexibilidade dada pela entrevista individual, semi- estruturada. Com esse instrumento, torna-se possível ao entrevistador enfrentar melhor “discursos prontos”, “verdades já cristalizadas” pelo discurso oficial, abrindo a possibilidade de apresentar novos questionamentos não planejados em seu roteiro, ou não previstos pelos entrevistados. Tem-se, assim, maior liberdade para explorar as concepções em foco.

As questões do roteiro apresentadas no quadro abaixo estão baseadas, portanto, no documento do Currículo ao qual todos têm acesso e com o qual todos trabalham em suas salas de aula. Na verdade, segundo Ludke e André (1986, p. 35, 36), em se tratando de pesquisa sobre o que ocorre no dia-a-dia do sistema escolar como a legislação, o currículo, a formação de professores, entre outros temas,

[...] podemos estar seguros de que, ao entrevistarmos professores, diretores, orientadores, supervisores e mesmo pais de alunos não lhes estaremos certamente impondo uma problemática estranha, mas, ao contrário, tratando com eles de assuntos que lhes são muito familiares sobre os quais discorrerão com facilidade.

A partir da pesquisa piloto elaborada no início de junho de 2011 com dois professores, definimos as questões sobre os eixos de investigação apresentadas no quadro a seguir. A entrevista piloto foi essencial para garantir que as questões colocadas gerariam uma coleta de dados empíricos legítimos à análise do objeto desta pesquisa.

A entrevista foi organizada com base em um roteiro que contemplou os dois eixos de investigação, a saber: “concepções sobre leitura e escrita no Ensino Médio”, e “concepções de aprendizagem por competências”. Assim, as questões elaboradas envolvem aspectos

essenciais dos princípios pedagógicos do Currículo, pois dizem respeito aos saberes docentes imprescindíveis nesse contexto de mudanças, como o que se pensa sobre a leitura e a escrita, em especial no Ensino Médio, o que é um currículo fundamentado na aprendizagem por competências e o que se diz sobre a prática pedagógica baseada em tais pressupostos.

O quadro abaixo sintetiza os eixos de investigação relacionados aos seus objetivos e perguntas da entrevista:

Eixo 2. Concepções de aprendizagem por competências