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5 METODOLOGIA

5.1 Corpora de pesquisa

5.1.3.1 Aspectos teóricos e estruturais

Segundo Moneglia (2011), estudos pragmáticos com uma abordagem corpus-basedtdevem ter como objetivo descobrir quais atos de fala são usados nas interações verbais cotidianas. Comparando pesquisas que se prestam à enumeração e análise dos atos de fala presentes na fala, o autor mostra que aquelas baseadas em corpora que primam pela variação contextual conseguem melhores resultados do que estudos baseados exclusivamente ou primordialmente em critérios sociolinguísticos70.

70 De fato, é de se esperar que a distribuição de atos de fala de tipo assertivo e diretivo sejam diferentes em (a) um diálogo em que um falante ensina o outro a usar um programa de computador e (b) um diálogo em que

No corpustde Português Europeu, a variação contextual – critério que deve servir de base para a elaboração de todo o corpust– tparece ter sido interpretada como a variação dos assuntos tratados pelos participantes nas gravações. Dessa forma, o C-ORAL-ROM de Português Europeu apresenta, de fato, uma ampla variedade temática em seus textos: feminismo, viagens ao exterior, custo de vida em Portugal, ensino de línguas estrangeiras, medicina chinesa e solidão são só alguns dos tantos exemplos presentes.

Os pesquisadores do projetot C-ORAL-BRASIL, aproximando-se mais à proposta inicial do C-ORAL-ROM, entendem que a variação contextual corresponde à variação de contextos de

produção da fala. Ou seja, corresponde à variedade de situações em que os interlocutores se

valem da fala para atingir objetivos comunicacionais diferentes.

Essa diferença pode ser exemplificada observando as gravações publicas tde ambos os corpora. No C-ORAL-ROM de Português Europeu, a maior parte das gravações públicas são entrevistas em que um profissional de uma determinada área fala sobre sua profissão. Esse tipo de situação também está presente no C-ORAL-BRASIL, mas esse corpus té também integrado de um número significativo contextos diferentes: reunião de partido político, aula de auto escola, venda de medicamentos em uma farmácia, venda de calçados em uma sapataria, conversas entre colegas de trabalho durante o expediente e outros.

Como pode ser observado, grande parte das gravações do C-ORAL-BRASIL foram feitas em situações comunicativas de alta acionalidade, em que o foco dos falantes é a realizaçãotde t ações te não a produçãotdatfala tem si71, representando o uso mais cotidiano da fala. Dessa

forma, visto que a espontaneidade da fala está diretamente relacionada a uma fala mais acional e menos preocupada com seus aspectos formais (CRESTI, 2000), o corpustC-ORAL- BRASIL é dotado não só de uma ampla variação de temas das conversas, mas também de grande espontaneidade – elemento central dos corporatdo projeto C-ORAL-ROM.

uma pessoa relata a outra um evento ocorrido no dia anterior.

71 Exemplos de contextos comunicativos considerados de alta acionalidade são uma aula de auto escola, uma situação de compra e venda, uma situação em que um falante ensina o outro a usar um programa de computador etc. Em contrapartida, uma situação em que tem-se um foco maior na produção da fala é um monólogo profissional, cujo falantes preocupa-se excessivamente com os aspectos formais de sua fala para alcançar determinados resultados.

Por fim, chama-se a atenção para outra diferença de interpretação relativa a uma das diretrizes de elaboração dos corpora: na descrição básica de suas arquiteturas, viu-se que ambos compartilham uma estrutura dividida em monólogos, diálogos e conversações. No C-ORAL- ROM de Português Europeu, a definição de monólogo, diálogo e conversação diz respeito, em um sentido mais estrito, à quantidade de indivíduos que participam da gravação. Gravações com um participante e um ouvinte são definidas como monólogos. Gravações com dois participantes são diálogos. Gravações com três ou mais participantes são conversações.

O C-ORAL-BRASIL, por outro lado, em uma maior consonância com os demais corporatdo projeto C-ORAL-ROM, não se baseia exclusivamente no número absoluto de participantes de uma gravação, mas sobretudo no peso que cada participante exerce nos diversos momentos da interação. A primeira consequência disso é que uma dada situação comunicativa pode ter trechos monológicos, trechos dialógicos e trechos conversacionais, e que esses trechos não devem ser classificados indistintamente como monólogos, diálogos ou conversações. Visto isso, e considerando que a duração média dos textos do corpustdeveria ser de 1500 palavras, foram escolhidos como monólogos aqueles trechos de aproximadamente 1500 palavras em que se tinha uma atuação predominante de um dos participantes da interação, o qual construía seu texto oral sem a interferência de outros falantes; foram escolhidos como diálogos tos trechos de aproximadamente 1500 palavras em que sobretudo dois participantes atuavam de forma mais plena; e foram selecionados como conversaçõestaqueles trechos de 1500 palavras em que três ou mais participantes atuavam de forma predominante.

Em função dessa diferença terminológica, muitas entrevistas72tsão classificadas, no corpustde

Português Europeu, como diálogos ou conversações, ao passo que, no C-ORAL-BRASIL e nos demais corporatdo projeto C-ORAL-ROM, são classificadas como monólogos.

Além disso, devido às definições adotadas pelo C-ORAL-BRASIL (e presentes também em outros corporatdo projeto C-ORAL-ROM), a oposição entre monólogo, de um lado, etdiálogot e conversação, de outro, espelha uma crescente de acionalidade da fala: interações monológicas tendem a ser menos acionais que interações dialógicas ou conversacionais (CRESTI, 2000; RASO, 2012). Por esse motivo, essas categorias tornam-se especialmente 72 Chama-se aqui de entrevistas as situações comunicativas em que uma ou mais pessoas realizam perguntas

úteis na compreensão de como a fala se estrutura em contextos de maior ou menor acionalidade.