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Asserção justificada de um Sujeito sobre uma Proposição (AJsp)

No documento Rodrigo Reis Ribeiro Bastos (páginas 77-81)

Capítulo II – Fundamentos teóricos

5- Epistemologia

5.1 Asserção justificada de um Sujeito sobre uma Proposição (AJsp)

Asserção é uma afirmação de concordância ou discordância sobre um dado enunciado ou proposição. Esquematicamente, a asserção funciona como uma caixa de diálogo onde assinala a concordância ou a discordância com relação a um enunciado qualquer. Por exemplo, a frase: “O elemento verdade é irrelevante para o conceito de conhecimento”, é uma asserção positiva acerca do enunciado: irrelevância da verdade para o conceito de conhecimento. Funciona como se estivéssemos respondendo com sim ou não a perguntas específicas. Em forma de pergunta a asserção poderia ser assim: “A verdade é irrelevante para o conceito de conhecimento? ” Respondendo sim ou não a essa pergunta estamos formulando uma asserção. Como você já deve ter percebido formulamos proposições e asserções o tempo todo, mas quase nunca de forma expressa. O discurso quotidiano está repleto de asserções sobre proposições formuladas das formas mais variadas154.

Mas não são todas as asserções que podem ser consideradas como conhecimento. Para isso elas precisam ser formuladas por um sujeito, não podem ser difusas. As vezes as asserções são atribuídas a grupos, a figuras difusas, coletivas, indeterminadas ou sobrenaturais tais como: a sociedade, os alunos da faculdade, deus, “todo mundo”, etc. Esse tipo de asserção não compõe

153 GRECO, John. Compêndio de Epistemologia. São Paulo: Loyola, 2008

154 Não vou entrar na discussão sobre o conteúdo das proposições se elas devem ser sentenças enunciados ou

proposições em sentido estrito. A esse respeito veja: HAACK, Susan. Filosofia das Lógicas. São Paulo: Unesp, 2002. p/p 113 a 126.

77 o conceito de conhecimento, pode, quando muito, ser a fonte do conhecimento que é sistematizado por um sujeito específico. Imagine um pesquisador que estuda o folclore da região sul do Amazonas. Ele não produz o folclore, mas tão pouco o folclore é, por si só, uma forma de conhecimento. O conhecimento será produzido pelas asserções justificadas que o pesquisador (sujeito) vier a formular sobre afirmações elaboradas (proposições) sobre o folclore do sul do Amazonas (objeto do conhecimento). Mais uma vez, não custa deixar claro que essa é a minha visão do que é o conhecimento e não pretendo que ela seja universalmente aceita. Já disse algumas vezes que sou um relativista radical. Não sou pretensioso a ponto de achar que minha visão de mundo seja absolutamente original ou tenha qualquer relevância mas julgo que a exposição detalhada de minhas opções filosóficas e metodológicas é fundamental para a compreensão desse trabalho. Digo isso para ser coerente!

O próximo elemento e talvez o mais importante do conceito de conhecimento é a justificação. Sem justificação não há conhecimento de espécie alguma. Mas o que é justificar? Como a justificação deve ser apresentada? É preciso justificar todas as asserções? Até que ponto deve uma asserção ser justificada? Tentarei responder a essas questões em seguida.

Justificar é construir uma “prova” lógica sobre uma determinada asserção. Essa prova lógica deve ser precedida de três passos: 1) explicitação dos axiomas adotados, sejam eles dogmáticos ou não; 2) explicitação das regras de inferência, isto é, regras pelas quais se passa de uma asserção a outra; 3) esclarecimento, quando solicitado, dos termos usados nas proposições (desambiguação). Uma vez tomados esses três passos o sujeito que pretende produzir conhecimento deve construir a justificação com base neles155156.

A tarefa não é fácil, mas também ninguém disse que seria. Construir conhecimento é uma atividade bem diferente das outras que fazemos no dia-a-dia. Nas conversas que normalmente entabulamos mesmo em ambientes formais como o trabalho ou a igreja os interlocutores quando demandam alguma justificação para nossas asserções o fazem esperando menos rigor na sua formulação. Seria caricato e exaustivo se a cada afirmação que fizéssemos durante o dia expuséssemos, detalhadamente, as premissas, as regras e os significados de todas as palavras. Não conseguiríamos passar do café da manhã! Ao acender a luz você teria que pensar no porque o faz; se é necessidade de enxergar melhor ou se é um medo atávico e ancestral do escuro; como a luz é produzida; como a energia chega até a lâmpada; como a lâmpada

155 GERSTING, Judith L. Fundamentos matemáticos para a ciência da computação. Rio de Janeiro: LTC,

1993, p/p 50 à 55.

78 funciona; como a energia elétrica chega a sua casa; como funciona o contrato de fornecimento de energia elétrica e assim por diante. Simplesmente as coisas não funcionam assim.

No entanto, para o conhecimento a produção de uma prova lógica detalhada é indispensável. É claro que não em todo tipo de conhecimento que encontraremos esses passos demonstrados de forma expressa, no entanto é indispensável que, de alguma forma eles estejam lá. Não há conhecimento sem justificação. E não há justificação racional sem a construção, mesmo que de forma indireta, de uma prova lógica.

A essa altura, meu dileto leitor, você já está imaginando um mundo repleto de formas matemáticas e de “funções de verdade” – aquelas tabelas medonhas que confundem mais do que explicam - mas não é disso que estou falando. Reduzir prova lógica a lógica formal dedutiva é inaceitável, não pretendo fazer isso, nem tão pouco sou ingênuo ao ponto de acreditar na possibilidade da construção de um raciocínio lógico único e universal, completo e coerente nos moldes de Hilbert157. Essa tese aborda, justamente, a constatação dessa impossibilidade e seus efeitos sobre a teoria Kelseniana do direito. É fato que muita gente expressiva e mais inteligente do que eu, já pensou assim. Os positivistas lógicos do Círculo de Viena por exemplo158. De meu turno, quando falo em prova lógica estou pensando em uma justificação coerente dentro de um dado modelo e aceitando as premissas dogmáticas e axiológicas de quem expõe o raciocínio. O que não posso aceitar, em hipótese alguma, é que justificações incoerentes com seus próprios fundamento sejam admitidas como racionais.

Uma justificação que se pretenda empírica, por exemplo, não pode recorrer a elementos sobrenaturais. Uma justificação qualquer, que se pretende por natureza comunicável, não pode conter elementos inefáveis nem invisíveis. Em um exemplo concreto: um juiz que tem sua investidura determinada pelo ordenamento jurídico não pode negar validade a esse ordenamento. E assim, por diante. Mesmo sabendo que, ao fim quando atingirmos os dogmas últimos de um modelo, ele será injustificável, até que cheguemos lá, para que se produza

157 LADRIÈRE, Jean. Les Limitations Internes Des Formalismes. Paris: Gauthier-Villars, 1957, p/p 1 e 2, 158 “The Vienna Circle was a group of early twentieth-century philosophers who sought to reconceptualize

empiricism by means of their interpretation of then recent advances in the physical and formal sciences. Their radically anti-metaphysical stance was supported by an empiricist criterion of meaning and a broadly logicist conception of mathematics. They denied that any principle or claim was synthetic a priori. Moreover, they sought to account for the presuppositions of scientific theories by regimenting such theories within a logical framework so that the important role played by conventions, either in the form of definitions or of other analytical framework principles, became evident. The Vienna Circle's theories were constantly changing. In spite (or perhaps because) of this, they helped to provide the blueprint for analytical philosophy of science as meta-theory—a “second-order” reflection of “first-order” sciences. While the Vienna Circle's early form of logical empiricism (or logical positivism or neopositivism: these labels will be used interchangeably here) no longer represents an active research program, recent history of philosophy of science has unearthed much previously neglected variety and depth in the doctrines of the Circle's protagonists, some of whose positions retain relevance for contemporary analytical philosophy.” Stanford Encyclopedia.of Philosophy - http://plato.stanford.edu/entries/vienna-circle/

79 conhecimento, as justificações devem ser o tanto quanto possível, coerentes com as premissas apresentadas e devem obedecer às regras de inferência estipuladas. Essa exigência não me parece absurda já que cabe a quem justifica escolher os dogmas, os axiomas e as regras de inferência que irá utilizar em sua justificação, por isso, não há necessidade de incoerência. A incoerência, antes de atingidos os dogmas finais, decorre, geralmente, de erro.

Vamos agora enfrentar o espinhoso problema da proposição. O problema começa pela definição corrente de proposição. Segundo os manuais de lógica proposição é uma sentença declarativa que pode ser aferida como verdadeira ou falsa. Essa definição deve ser imediatamente rejeitada. Primeiro porque o conceito de sentença declarativa é vago e impreciso. Depois, e mais importante, os conceitos de verdadeiro e falso são relativos e limitados à lógica dedutiva159.

Eles são relativos e imprecisos na medida em que dependem das opções ontológicas de quem os adota. Um adepto da verdade por correspondência atribuirá o conceito de verdadeiro as afirmações que correspondem a alguma coisa. Como já disse ao falar da ontologia, os elementos aos quais os discursos poderiam, em tese, corresponder são variados e não existe nenhum critério para que se possa escolher entre eles. Já os adeptos da verdade pela coerência darão outra conotação aos termos verdadeiro e falso. A verdade ou falsidade de um enunciado qualquer só faz sentido nos sistemas exclusivamente formais que utilizam como regra de inferência a dedução.

Não me resta outro recurso senão a utilização de uma definição claramente recursiva de proposição onde: proposição é toda afirmação passível de asserção e justificação. Com essa definição excluo da definição os dogmas e as ficções.

No início desse tópico disse que o elemento mais importante do conceito de conhecimento é a justificação. Justificação consiste na apresentação de uma prova lógica que deve conter três elementos: 1) explicitação dos axiomas adotados, sejam eles dogmáticos ou não; 2) explicitação das regras de inferência, isto é, regras pelas quais se passa de uma asserção a outra; 3) esclarecimento, quando solicitado, dos termos usados nas proposições (desambiguação). Abordei, ainda que de forma breve no tópico referente a ontologia, a questão dos axiomas, agora tratarei das regras de inferência.

159 Sobre as diferenças fundamentais entre a lógica dedutiva e indutiva veja: SKYRMS, Brian. Escolha e acaso.

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No documento Rodrigo Reis Ribeiro Bastos (páginas 77-81)