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3. RESULTADOS

3.2. Motivações para o sucesso acadêmico

3.2.1. Atender a expectativas

As falas dos entrevistados sugerem forte relação entre sucesso acadêmico e necessidade de atender aos desejos daqueles que servem como referência ao aluno de sucesso. É nítida a preocupação em manter as elevadas expectativas de colegas e, principalmente, pais. Em muitas falas, as metas próprias confundem-se com aquelas traçadas por essas outras pessoas, ao longo de toda a escolaridade. Denotam pessoas aparentemente autônomas e seguras em relação ao estabelecimento de metas, mas que no íntimo buscam sempre atender a expectativas traçadas por aqueles que atuam como referenciais.

Reconhecer-se bem-sucedido gera compromisso em manter elevados desempe- nhos, a fim de continuar alimentando expectativas. É como se o papel representado o transformasse em um mito, que deve ser alimentado e mantido tão intensamente quanto mais duradouro for o sucesso. Percebe-se medo em ver desmoronado o castelo construído à custa de tanta dedicação. O depoimento abaixo ilustra a necessidade de manutenção de expectativas de colegas. Observa-se que a quebra do padrão de alto rendimento do entrevistado gerou certa frustração entre colegas, o que lhe ocasionou incômodo também. Percebe-se ainda, embora de modo sutil, necessidade de justificar ao entrevistador o baixo rendimento obtido, nesse caso em função da falta de afinidade pelo componente curricular.

[Você tem essa preocupação constantemente, de não decepcionar o outro?]

É involuntário, né? Acho que é um mecanismo que eu criei... é porque sempre eles ficam: ‘oh, é o Fulano, ele sempre tira notas boas’... e você quebrar isso é muito chato, porque se eu fosse um aluno, sei lá, de desempenho menor, aí isso não ia me afetar em nada. Já aconteceu isso no 1º ano, de eu tirar 10% da prova de literatura,

não gosto muito de literatura, aí aconteceu de ficarem a semana inteira me enchendo o saco: ‘como que ele foi tão mal na prova de literatura, logo ele...’

L., 17 anos

Curiosamente, em um dos casos, ter atingido a meta gerou certo desânimo. Chegar ao objetivo traçado ocasionou a abertura de uma lacuna provisória. É como se não houvesse mais nada além. Nesse caso, o jovem teve que aprender a estabelecer novas metas.

No primeiro simulado da escola eu fiquei em primeiro lugar. Aí eu tinha uma meta: ficar em primeiro lugar. Eu atingi o primeiro lugar. Aí, como eu tinha alcançado todas as minhas metas, eu relaxei. A pressão externa de ficar entre os melhores eu atingi, aí não tinha mais pressão, porque eu atingi o topo.

R., 17 anos

Metas traçadas pelos pais são absorvidas intensamente pelos filhos, como nos recortes a seguir. “V” e “D” assumem como seus os compromissos estabelecidos por seus pais. Nesses casos, como em muitos outros, a expectativa gerada pelos pais, materializada em metas traduzidas em notas de provas, foi fator preponderante para gerar no estudante a necessidade de manutenção de elevados desempenhos.

Meus pais são bastante exigentes em relação ao desempenho. Pra eles, nota boa é no mínimo 8. Só querem nove, dez. Eu vejo amigos meus satisfeitos com seis. Se eu tiro oito numa prova, isso não é um grande feito pra mim.

V., 17 anos

Ah, eu não podia aparecer com um 8,5 no boletim, que meu pai diria que aquilo não condizia com o meu potencial, entendeu?

D., 17 anos

Metade dos entrevistados citou o investimento financeiro feito pelos pais para custear sua educação básica. Vale lembrar que o estudo foi realizado em escolas privadas, com mensalidades relativamente altas. Para eles, manter elevados desempenhos escolares é uma contrapartida, uma forma de retribuição de toda a provisão material despendida pelos responsáveis durante o processo de formação em família.

Minha mãe paga o colégio, faz o maior esforço pra pagar, tô tendo essa oportunidade, então eu tenho que fazer o melhor pra aproveitar essa oportunidade.

A associação entre desempenho escolar e investimento material também apareceu de outras formas. Em dois casos, a expectativa da contrapartida financeira (desconto nas mensalidades) ou na forma de bem tangível (automóvel) parecem ter atuado como fortes agentes motivacionais para o estudo.

[E essa recompensa é de que forma?]

Vou te dar um exemplo bem palpável: quando eu estava na 8ª serie, eles ofereceram uma bolsa pra quem fosse os melhores da turma, e eu ganhei essa bolsa pro 1º ano, e se eu mantivesse o desempenho eles me manteriam com a bolsa, e eu consegui manter essa bolsa até hoje.

[Então a ultima vez que você pagou escola foi na 7ª serie?]

Foi. Então pra mim a recompensa é bem mais palpável, e me motiva a continuar estudando.

A., 16 anos

Meu pai me prometeu um carro se eu passar no vestibular da UnB.

E., 17 anos

A imagem expressa pelos entrevistados em relação a seus pais é de acompanhamento da vida escolar. Presença física na escola, perguntas sobre fatos ocorridos ou resultados de provas são eventos freqüentes nos discursos. Percebe-se que, de forma geral, essas questões são postas de forma dialógica (pelo menos na fase atual de escolaridade) porém firme, estabelecendo-se relação de cumplicidade e confiança, com responsabilidades bem definidas.

[E seus pais, que papel tiveram na construção do seu sucesso?]

Meu pai fala muito na UnB. Diz que se eu passar lá vai ser meu mérito, mas que se eu não quiser fazer lá, não vai ser nenhum demérito, que eu tenho que fazer o que eu achar que for o melhor pra mim.

[Eles acompanham?]

Minha mãe sim, meu pai nem tanto. Com o passar dos anos, eles adquiriram confiança, viram que eu não dou problema.

A., 16 anos

[Seus pais acompanham?]

Acompanham. Acho que minha mãe ficou preocupada com isso, mas à medida que eu vou ficando mais velho, meus pais vão me dando mais responsabilidade. É lógico que ele vai cobrar porque eu não tirei boa nota, mas se ele percebe que eu estou estudando pra recuperar, ele não vai me incomodar.

[E como incomodaria?]

Ele é dialogal. Ele conversa, você tem que estudar... Ele já foi mais rigoroso. Mas aí vai ficando mais leve, ganhando confiança. Minha mãe também, mas pra ela é mais inaceitável tirar nota abaixo da média. Mas ela não fala muito, porque ela sabe que eu vou recuperar.

V., 17 anos

Em outro caso, fica clara a busca pela recompensa da liberdade de escolhas. Para “L”, as notas altas serviram também como instrumento de barganha de liberdade para desfrutar de encontros sociais. Houve o estabelecimento de um jogo entre pai e filho. Este último avalia a proposta como adequada. Mais uma vez, como em muitas outras falas, fica clara a relação íntima estabelecida entre “ser bom aluno” e “ter boas notas”.

E meu pai foi importante porque ele sempre falou assim pra mim: ‘se você tiver notas boas na escola, se for um bom aluno, você faz o que você quiser com os seus amigos. Seja um bom aluno, que eu não vou pegar no seu pé’. Acho que isso foi bom.

L., 17 anos

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