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CAPÍTULO 1. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

1.2. LINGUÍSTICA DE CORPUS E O ENSINO-APRENDIZAGEM DE

1.2.3. Aspectos da linguagem e o ensino de idiomas a partir da análise

1.2.3.1. Atividades centradas em concordâncias

No ensino-aprendizagem de línguas, as concordâncias podem ser utilizadas, fundamentalmente, de duas maneiras: com o uso direto do computador (on-line) ou com concordâncias impressas e editadas em atividades didáticas (off-line).

Em vista da dificuldade de muitas instituições possuírem um computador à disposição de cada estudante, optou-se, neste estudo, por preparar as atividades em sistema off-line, de modo que o computador on-line não representasse um óbice à elaboração de atividades com concordâncias.

Considerou-se, também, que o uso de concordâncias exige do estudante um comportamento bastante diferente do que ele está acostumado a assumir em aula; por isso, num primeiro momento, é mais adequado criar situações que o auxiliem a desenvolver a habilidade de pesquisador, controlando a quantidade de dados que terá de analisar.

Como já mencionamos, é fundamental que esse primeiro contato seja positivo; do contrário, o estudante transformará sua primeira experiência em uma barreira à aprendizagem.

Para que haja sucesso desde o início, o professor deve ensinar o estudante a usar as linhas de concordância. Por se tratar de uma lista de orações quase sempre incompletas, não deve ser lida como se lê, comumente, um texto normal.

Tribble e Johns (1990) apresentam sete tipos de atividades para o ensino do inglês, que podem ser preparadas com concordâncias editadas e que auxiliam o estudante a minimizar as dificuldades iniciais:

1) Definir o significado da palavra-chave a partir do contexto;

2) Estudar as características gramaticais de palavras ou estruturas por meio da concordância de grupos de palavras associadas;

3) Estudar homonímia e sinonímia;

4) Discutir, em grupos, diferentes fragmentos de uma concordância; 5) Completar concordâncias com palavras-chave;

6) Combinar o cotexto à esquerda da palavra-chave com o correspondente à direita, em concordâncias previamente embaralhadas;

7) Utilizar a própria produção dos estudantes para preparar exercícios corretivos.

Todas as atividades devem vir acompanhadas de orientações que auxiliem o estudante a entender as estratégias que deve utilizar para a realização de seu trabalho.

As atividades com concordâncias podem ser realizadas pelo estudante individualmente, em pares ou em pequenos grupos, podendo ser propostas pelo professor ou pelos próprios discentes.

As atividades propostas neste estudo estão preparadas off-line, como já mencionado, e podem, a partir de propostas do professor, ser realizadas individualmente ou em grupos.

Como já mencionamos anteriormente, foi a partir dos usos de atividades com concordância no ensino de línguas estrangeiras, sugeridos em Johns e King (1991), que surgiu o DDL.

De acordo com Granger e Tribble (1998), o DDL tem como influência as abordagens que promoviam a conscientização do aprendiz referente à sua aprendizagem. O DDL continua sendo usado até hoje na preparação de materiais de ensino com corpora, com o objetivo de fazer com que os estudantes identifiquem padrões presentes na concordância. Não é necessário que o professor saiba quais são os padrões existentes no instrumento de apoio, mas ele deve ajudar os estudantes a encontrar aqueles que são relevantes e rejeitar os irrelevantes. Lógico que o professor pode analisar e identificar os padrões que deseja ensinar, o que pode ser uma opção melhor para os professores que precisam seguir um conteúdo específico, como por exemplo, o livro didático.

A preparação de atividades de ensino nessa linha precisa levar em conta algumas variáveis (BERBER SARDINHA, 2011):

- Escolha da palavra de busca. A palavra de busca é a sequência de caracteres digitada no campo de busca do concordanciador, que pode ser composta por um ou mais itens. A escolha da palavra de busca é guiada pelos objetivos da atividade, da aula, da unidade e do curso.

- Modo de apresentação: para elaborar uma atividade de DDL é necessário decidir se o professor vai trabalhar com as concordâncias on-line, por exemplo, nos computadores do laboratório, ou off-line, em sala de aula, impressas em papel para serem distribuídas entre os estudantes, ou projetadas.

- Tipo de concordância: a versão mais básica é somente a própria concordância, que pode ser de diversos modos, entre eles: a) integral (com todas as ocorrências do termo de busca); b) selecionada (apenas algumas ocorrências, escolhidas por relevância ou aleatoriamente); c) editada (as linhas são modificadas geralmente para simplificar a linguagem ou limpar o conteúdo, como símbolos, palavras cortadas, etc.); d) preenchida (com a palavra de busca exibida); e) lacunada (com a palavra de busca apagada).

- Quantidade de concordâncias: a atividade pode ser elaborada com uma ou mais concordâncias. Quando são apenas com uma, em geral, os estudantes trabalham no sentido de descobrir os padrões da palavra de busca. Quando são várias, vão um passo além, e comparam os padrões de duas ou mais palavras de busca.

- Exercícios: as concordâncias podem vir sozinhas ou acompanhadas de exercícios, como perguntas, diagramas, ligar colunas, completar frases, etc.

No entanto, é necessário destacar que o primeiro elemento para a preparação de material é o corpus. O professor pode usar seu(s) próprio(s) corpus (corpora) ou recorrer a compilações já existentes.

O segundo elemento é o software para a produção de concordâncias. Entre os programas disponíveis, temos o desktop, que precisa ser instalado no computador, ou on-line (que rodam diretamente da Internet). Como exemplo de programa desktop, destaca-se o WordSmith Tools (SCOTT, 1997), que detalharemos no Capítulo 2; e, entre os on-line, podemos citar as ferramentas

do Centro de Pesquisa, Recursos e Informação em Linguagem da PUC-SP (www.corpuslg.org/tools).

Como também já mencionamos, antes de iniciar as atividades propriamente ditas em sala de aula com os estudantes, o professor deve, inicialmente, indicar-lhes como ler uma concordância, ou seja, que não deve ser lida como um texto normal, iniciando da esquerda à direita, mas, sim, focando-se na área central da concordância, na região ao redor da palavra- nódulo. A seguir, o professor deve explicar aos estudantes o que é um padrão e como pode ser encontrado.

Por outro lado, a produção da concordância pelo professor merece alguns cuidados. Primeiro, deve-se considerar o número de linhas de acordo com o objetivo da atividade. O segundo cuidado é com a seleção das linhas. Em geral, é preciso que o professor selecione quais linhas vão figurar na concordância a ser usada na atividade, pois, na maioria dos corpora, a quantidade de linhas excede o tamanho de uma página impressa. Assim sendo, é recomendável que o professor escolha as linhas mais relevantes, considerando o tipo de padrão para atingir os objetivos propostos. No entanto, Berber Sardinha (2011) destaca que, conforme Johns (1994:298)

[...]the most important principle that has to be borne in mind [...] is that the inevitable process of selection should not distort the evidence – that is to say, the concordance extracts chosen should represent as far as possible the full range of linguistic and communicative features of the raw data8.

Também destaca que há duas fontes principais de distorção. A primeira pode ocorrer se a seleção for feita com base em critérios linguísticos que se esperariam encontrar nos dados em vez daqueles que realmente estão nos dados. A segunda pode ocorrer se a seleção for realizada a partir de critérios pedagógicos que podem, por si só, ser perfeitamente justificáveis (por exemplo, que se deva dar preferência a citações integrais ou autoexplicativas), mas que

8 [...] o princípio mais importante que se deve ter em mente [...]é que o processo de

seleção, embora inevitável, não deve distorcer a evidência, ou seja, as linhas de concordância escolhidas devem representar, na medida do possível, a extensão total das características linguísticas e comunicativas dos dados brutos (tradução de Antonio Berber Sardinha).

podem ter o efeito inesperado de enviesar a amostra em favor de certas formas ou dos sentidos que tais formas expressam.

Outro cuidado refere-se à simplificação das linhas. Alguns professores preferem editá-las para facilitar a compreensão dos estudantes, mas tendo em vista a citação de Johns (1994) acima, é conveniente preservar os dados, pois os estudantes precisam ter em mente que é normal encontrar textos difíceis de entender.

E, finalmente, também é preciso ter cuidado com a dinâmica do trabalho. Tradicionalmente, as atividades de DDL são feitas individualmente, contudo é importante que o professor estimule a interação em grupo para sua realização, já que é na interação que os estudantes podem resolver problemas e internalizar as soluções de maneira mais produtiva (MAGALHÃES, 2010).

Caso as concordâncias sejam produzidas pelos estudantes, há outros cuidados a seguir. Um deles é que estejam preparados a lidar com o software de busca, sabendo formular buscas, ordenar as linhas de concordância, apagar as indesejadas, extrair colocados, comparar resultados, etc. (BERBER SARDINHA, 2011).

Uma atividade básica de DDL consiste em apenas uma concordância e a pergunta geral: Qual(is) padrão(ões) você identifica nessa concordância e o que ele(s) significa(m)? Atividades mais guiadas contêm perguntas e exercícios voltados para aspectos específicos da concordância. Outro tipo de atividade muito comum em DDL é com concordâncias lacunadas, em que a palavra de busca é apagada, devendo o estudante descobrir qual(is) é(são) essa(s) palavra(s).

O DDL pode ter uma orientação indutiva (quando o estudante precisa encontrar evidências de uso e delas formar generalizações sobre formas e sentidos da língua) ou dedutiva (antes de iniciar a análise da concordância, o estudante formula hipóteses sobre a questão em foco na atividade e, em seguida, procura confirmar ou rejeitar essa hipótese com base nos dados).