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ATIVIDADES REALIZADAS PELOS FAMILIARES ACOMPANHANTES JUNTO AO PACIENTE

4. MÉTODO

5.3 ATIVIDADES REALIZADAS PELOS FAMILIARES ACOMPANHANTES JUNTO AO PACIENTE

Este subcapítulo descreve e analisa como os acompanhantes cuidam de seus familiares internados e as atividades que realizam para propiciar bem-estar a eles. Percebeu-se que estes cuidados estão relacionados à atenção física, emocional e de prevenção. Dessa forma, as atividades realizadas pelos familiares acompanhantes envolvem as ações de suporte

emocional, cuidados realizados pelo acompanhante e lazer para o paciente.

A primeira categoria intitulada suporte emocional elucida que o acompanhante, devido ao vínculo e afeto para com o paciente, realiza inúmeras atividades de apoio a este. Nelas, tenta proporcionar acolhimento, afeto, e dignidade à pessoa. Portanto, exerce a função materna que está relacionada ao vínculo, afeto, cuidado, de ser continente e alimentador (ROSSET, 2008).

A relação de apoio em função do vínculo e cuidado estão presentes e divide-se em duas subcategorias intituladas ao paciente e preservação da saúde mental do paciente. Em relação ao suporte emocional ao paciente, P2 diz:

Hoje foi um dia muito triste, que hoje ela soube que [o tumor] está nos ossos agora. Chorei muito com ela, acalentei, deixei ela. Até não quero demorar muito por que ela ta lá [sozinha] (sic). P2

Sobre esse cuidado, percebe-se que o acompanhante realiza com o paciente algo correspondente ao que foi designado como uma tecnologia leve por Merhy (2002). O autor indica acerca dos cuidados em saúde a necessidade do que chama de tecnologias leves, ou aquelas pautadas na relação. E nessa direção o familiar indica que escuta a pessoa, compreende o momento que está vivendo, acolhe, cria vínculo e possibilita que diminua os estressores que a pessoa internada pode apresentar. Tal necessidade de acolhimento pode estar relacionada ao tratamento e prognóstico, medo de sentir dor ou morrer, falta de privacidade e individualidade, medo de ambiente desconhecido, separação social, “medo da perda de amor e aprovação”, “medo da perda de controle de funções adquiridas durante o desenvolvimento infantil” como a fala, marcha, controle do esfíncter, “medo de perda de alguma parte do corpo” e ‘culpa e medo de retaliação” dos profissionais de saúde (PENNA, 1992, p. 367).

Portanto, faz-se necessário que os profissionais estejam atentos a essas dificuldades das pessoas internadas. Diante delas, a presença de um acompanhante pode minimizar esses medos e proporcionar bem–estar, uma vez que potencializado nessa direção. Segundo Merhy (1997), para o usuário, a necessidade de saúde, neste momento, está sendo representada e sentida como um problema que ele está vivenciando como sofrimento, ou risco de sofrimento, e que a pessoa “traduz” como uma questão de saúde a ser enfrentada com a ajuda de alguém.

Nesse sentido, o processo de humanização pode estar sendo realizado pelos familiares, visto que reconhecem a dor e sofrimento expressos pela pessoa internada, garantindo a dignidade deles, bem como quando valorizam os aspectos históricos, subjetivos, culturais e biológicos da pessoa que está sendo assistida (BRASIL, 2000). Condição que, ao ter algum tipo de apoio e potencialização por parte do hospital, por meio das suas equipes de trabalho, poderia trazer novos elementos nas relações estabelecidas nesse espaço.

Outra forma de cuidar da pessoa internada é a partir da preservação da saúde mental do paciente quando são realizadas ações pelo acompanhante para preservar o paciente de estressores, ansiedades e agressões próprias da hospitalização. Isto, por vezes, pode gerar a necessidade do acompanhante se posicionar frente à equipe e às normas hospitalares, como exemplifica P1 diante do pai que está com uma escara na parte escrotal, e provoca ao paciente sentimentos de vergonha e intimidação:

Ainda mais que é uma doença bastante desconhecida, porque tem vezes que tem 5 ali no quarto, 5 meninas ali no quarto, enfermeira, técnico, vem tudo vê, não sei se é pra acompanhar a evolução, sei lá. (...) minha irmã veio e viu 5 meninas dentro do quarto, ela quase teve um treco, ela expulsou todas elas do quarto. A minha irmã mais velha, pois foi uma coisa bem chata, eu nunca tinha percebido isso, toda vez que vinha muita gente ali, ficava todo mundo olhando pra parte escrotal (sic). P1

Foucault (2006) afirma que o hospital é o lugar especializado nas partes do corpo, em que a pessoa é vista fragmentada tanto pela equipe como por ela mesma. Assim, decorre da visão do autor, que pela natureza do hospital, muitas vezes a instituição se coloca em direção inversa à visão integral da pessoa, que abrange dimensões subjetivas. Dessa forma, o hospital, por vezes, desconsidera a pessoa que está ali para ser atendida, colocando-a no papel de objeto de estudo. E como o hospital é um local que exerce poder sobre a pessoa esta pode não conseguir manifestar seus desejos e, nesse sentido, o familiar aparece, neste caso, protegendo o paciente da disciplina divisória imposta pelo hospital.

Percebe-se que, por mais que o hospital tente implementar a PNH, há ainda uma dificuldade da mudança, estando enraizadas no familiar acompanhante, no paciente, e até

entre os profissionais, o conceito de hospital centralizado nas práticas médicas. No tocante à equipe, especificamente, esta centralização se dá por meio da mecanização da relação trabalhador-paciente e preparo inadequado para lidar com as dimensões subjetivas e sociais pela equipe de saúde (BRASIL, 2004). Portanto, a transformação da alteração desse conceito, assim como a implementação da PNH ocorre de uma forma muito tímida.

Segundo Ferrari e Kaloustian (1994) família é o espaço para o desenvolvimento e proteção de seus membros. Ela que propicia a base afetiva e material com o objetivo de promoção de bem estar. Sobre isso P1 afirma que por tantos profissionais ficarem observando e cuidando do ferimento, o paciente fica preocupado e assustado querendo olhar a escara, como diz a fala a seguir:

Eu até tentei pegar um espelho [para ele ver a escara no saco escrotal], mas eu acho melhor que até não, que agora ele está bem, vai que tem uma recaída, não sei se vai ser bom. Acho melhor não. Ele fala assim, se cabem 4 gases lá dentro como é que deve ta. Daí fico assim sem saber o que fazer.

Nota-se a tentativa da acompanhante pela preservação da saúde mental do paciente, mas que apresenta dúvidas sobre a sua atuação. As questões sobre as atitudes do acompanhante quanto sua ação no hospital podem ser comuns, portanto, faz-se necessário que a equipe de saúde esteja preparada para esse tipo de atendimento e suporte, quando destaca- se a necessidade da qualificação do atendimento desses profissionais a fim de desenvolverem habilidades, tais quais, mecanismos de escuta para os pacientes, familiares e trabalhadores, acolhimento aos usuários, grupos de trabalho de humanização e garantir que o paciente tenha visita aberta com a presença de acompanhante e de sua rede social.

Assim, justifica-se a necessidade de psicólogos estarem trabalhando nos espaços hospitalares e capacitando os outros profissionais, viabilizando a educação permanente dos profissionais. A educação vem ao encontro da PNH que, entre os seus princípios, afirma a realização do “Fortalecimento de trabalho em equipe multiprofissional, estimulando a transdisciplinaridade e a grupalidade”, bem como a potenciação do cuidado às pessoas (BRASIL, 2004, p. 10).

A partir da fala dos acompanhantes, compreendeu-se que os cuidados realizados

pelo acompanhante são possibilitados pelo vínculo entre familiar e paciente. Conforme a

fala de P1

Porque o meu pai é uma pessoa assim sempre foi muito independente pras coisas. Tem coisa que ele não aceita muito a ajuda. Ele toma antibiótico, tipo ele ta assim com diarréia, a gente já esperava porque vai matar o microorganismo, mas vai

destruindo a flora intestinal, daí eu já esperava a diarréia dele. Tipo, daí pra eu limpar primeiro ele não queria ajuda, e ia acabar... daí eu disse: olha pai seu curativo está bem complicado, que fica na parte escrotal, não pode deixar contaminar, você tem que me chamar pra você não prejudicar ainda mais a sua saúde, então me chama por favor. Então a mim ele chama. (...) Eu fui dormir na casa de uma amiga minha. Eu cheguei ele já tava todo defecado, ele tava num estado e ele não chamou ninguém pra ajudar ele (...) (sic). P1

Percebe-se que o paciente sente vergonha de ser cuidado na parte genital e para tal precisou sentir segurança, confiança e respeito pela outra pessoa. No entanto, acredita-se que as pessoas, em sua maioria, sentem-se constrangidas, mesmo que diante de profissionais. Assim, há necessidade da criação do vínculo entre paciente e profissional. Dessa forma, os acompanhantes precisam criar estratégias que possibilitem a aproximação do paciente e a minimização da sensação de desconforto e vergonha. Portanto, esse cuidado pode ter ocorrido, visto que foi possibilitado pelo vínculo. No entanto, questiona-se se os acompanhantes têm habilidades ou mesmo se devem realizar esse tipo de cuidado.

Outra forma de cuidar ocorre através do auxílio ao paciente pelo acompanhante. Este auxílio ao paciente ocorre de várias maneiras, tais como ajudar o paciente a se alimentar, tomar banho, trocar de roupa, cobri-lo, levá-lo até o banheiro, caminhar com ele, realizar massagem, atividades de responsabilidades do paciente antes da internação, entre outros. Como relatam os entrevistados:

Eu chego de manhã ela já está esperando pra tomar banho, ai eu levo ela no banheiro, dou banho nela, ai depois eu coloco ela na cama, eu faço uma massagem na perna dela, passo hidratante, lavo a cabeça, penteio o cabelo. Ai se a comida chega ou um lanchezinho dou pra ela. (...) A gente vai caminhar um pouquinho com ela lá no sol, mando ela colocar as mãozinhas no sol e fazer uma massagem que é bom né (sic). P6

Banho, alimentação, levar no banheiro. Todas essas partes. Ela faz tudo sozinha, mas tem que organizar, tem que ajeitar pra ela comer, ir ao banheiro. Ela senta sozinha, mas... tem que levar ela porque ela não tem como caminhar sozinha, ela está fraca assim, dessa forma (sic). P5

Eu vejo que o meu pai fica todo agoniado, pois agora minha mãe cuida de uma farmácia, meu pai cuidava de outra. Os dois são farmacêuticos, então a que ele cuida hoje está fechada e ai ele fica preocupado com as contas que tem pra pagar, daí a gente fica toda aflita também e as contas vão vencendo. (...)Ai meu Deus, tudo complicado pra gente. Então, acho, a parte mais aflita que a gente está sendo em relação a isso. Que eu vejo ele aflito e acabo ficando aflita junto com ele (sic). P1

Percebe-se que todos os entrevistados realizam auxílio ao paciente, mas podem estar contribuindo, ou não, para o bem-estar destes. Fica clara a importância do acompanhante no

hospital, pois sua ausência acarretaria o redimensionamento do número de enfermeiros, auxiliares e técnicos de enfermagem. No entanto, por vezes, a presença de acompanhantes é desconsiderada, questionada, ou indiferente pelo hospital.

Na pesquisa de Moreno (2007) com enfermeiros, estes apontaram que quando a família está junto com o paciente durante o processo de internação, há demonstração pelo paciente de maior adesão ao tratamento, o que aproxima a relação entre paciente-família no tratamento após a alta. Todavia, o “estar junto” do familiar nos cuidados em saúde no hospital para que qualifique ainda mais a adesão do paciente ao cuidado, faz com que, por um lado, o familiar contribua positivamente, mas por outro lado ele pode se sentir sobrecarregado. Sugere-se pesquisas sobre a sensação e sentimentos do paciente em relação à presença de um acompanhante e a contribuição ou não da presença deles. E, também sobre qual a percepção da equipe de saúde em relação a presença de acompanhantes no hospital.

O lazer para o paciente é outra atividade realizada pelos familiares que proporcionam bem-estar ao familiar internado. Entre os entrevistados foram identificados atividades como leitura, crochê, companhia. Apenas um acompanhante referiu realizar nenhuma atividade de lazer para o paciente. Em relação às ações, os entrevistados afirmaram:

A gente conversa bastante, assim, sobre tudo. E agora eu estou estudando também ai... como ele está com muita dificuldade de ler, de vez em quando eu leio pra ele alguma coisa de atualidade (sic). P1

Mais a companhia, que daí as enfermeiras fazem tudo né. Mas a companhia pra gente ficar ao lado dela, vendo o que está acontecendo (sic). P3

Em relação às atividades realizadas junto ao paciente estas se referem àquelas possibilidades possíveis de serem realizadas dentro do hospital, tal quais as próprias atividades que são desenvolvidas pelo acompanhante para si mesmo. Além disso, nota-se que parte da rotina do acompanhante é a de realizar cuidados ao paciente, diante do que há de se ter avanços no sentido de se apoiar tal cuidado, não apenas zelando pela preservação da integridade física dos pacientes atendidos, preparando e informando tais familiares, como dos aspectos psicológicos envolvidos. Assim, há de se ter fortalecidos os vínculos em geral aí desenvolvidos entre paciente equipe e acompanhante. Tal cuidado, uma vez perspectivado pelo hospital, podem ser relacionados àquela função materna na família, e devem ser problematizadas pelo hospital a fim de que possam dar suporte aos familiares acompanhantes. Dessa forma, destaca-se, novamente, a importância da educação permanente aos profissionais

e da atuação dos psicólogos tanto com a equipe e paciente como com o familiar. No entanto, por vezes, há dificuldades do hospital em cumprir essa questão na PNH, entre elas, destacou- se o enraizamento da mecanização da relação trabalhador-familiar e o preparo inadequado para lidar com as questões subjetivas.

5.4 CONDIÇÕES DISPONIBILIZADAS PELO HOSPITAL AOS FAMILIARES