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CAPÍTULO 02 - O CONTEXTO REGIONAL

2.1.2. O Ator Político Segundo Weber

Nessa seção, será apresentada a teoria weberiana da ação social dos agentes, dando foco na ação racional; assim como os tipos ideais do poder, para, posteriormente, fazer-se uma análise do ator político Dante de Oliveira.

Max Weber era um economista, jurista, historiador e sociólogo alemão, nascido em 1864, formou-se na escola de Economia alemã64 e, segundo Collins (2009, p.: 79), “foi o último de uma série de economistas históricos que tentaram mostrar quais os tipos de sistemas econômicos que precedem o capitalismo e mediante quais processos o capitalismo pôde surgir”.

Ao tentar explicar os motivos que levaram ao surgimento do capitalismo na Europa ocidental, aproximou-se da sociologia por tentar compor os instrumentos para tal análise econômica. Sendo assim, seu foco sociológico passou a ser o papel dos “fatores políticos e religiosos” (Collins, 2009).

Weber “foi visto como um defensor da importância das ideias na história”, ainda segundo Collins (2009), e que o principal método das ciências humanas deveria ser o “compreensivo”. Com base nisso, os processos sociais são explicados a partir da visão dos atores que os praticam e, consequentemente, a necessidade de se “ver” como o ator social “viu” para executar tal processo social (ou ato/agir), uma compreensão de suas motivações. Por isso, Weber foi visto como um idealista, pois considerava que o mundo das ideias influenciava o mundo material.

Então, para Weber (1999), os agentes sociais (indivíduos) estão sujeitos à influência das normas sociais, que são formadas pelas instituições sociais. Além disso, toda ação de um agente social (indivíduo) tem um fim que, para chegar até ele, utiliza-se de vários meios. Porém, essas ações também apresentam um motivo, seja racional ou emotivo.

O Motivo Emotivo faz o agente agir impulsivamente, até mesmo irracionalmente, por levar o ator a não refletir sobre sua ação e, simplesmente, executá-la – o que pode ser ilustrado pela expressão “levado pela emoção”.

Já o Motivo Racional – o qual foi usado na teoria e método racionalista compreensivo de Weber (1999) – tem um sentido. Esse sentido é: (I) imaginado pelo agente da ação; (II) ele é carregado da subjetividade do ator;

64 Segundo Collins (2009, p.: 78), a Economia ensinada poderia ser chamada de “institucional” e “histórica”.

(III) e baseia-se, também, na ação de outros agentes que compõem o seu grupo econômico ou de status para executar sua ação. Essa discussão (Teoria de Ação Racional) está resumida na ilustração a seguir:

Figura 03: Ilustração da teoria weberiana de ação racional do agente social65

Fonte: Elaboração própria a partir de Weber (1999).

Collins (2009) diz que Weber enxergava a sociedade como múltiplas esferas que, no interior de cada uma e entre si, lutavam pela dominação66 (uma sobrepondo-se a outra), ou melhor, uma história de conflitos confusos e “multidimensionais”. Sendo a política “outro contexto de luta, que envolve interesses conflitantes entre políticos e classes econômicas”.

Weber (2006, p.: 60-61) diz que “qualquer homem que se entrega à política aspira ao poder”, pois a política é todo um conjunto de esforços, realizados pelo agente social, para que possa participar do poder67 “ou a influenciar a divisão do poder, seja entre Estados, seja no interior de um único

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As cores designadas na figura representam a discussão apresentada no parágrafo anterior. 66

Dominação seria a probabilidade de encontrar obediência a uma determinada ordem, pode ser fundamentada na sociedade civil, por meio de contratos econômicos – o indivíduo se submete a isto por meio do livre arbítrio, por exemplo, por considerações racionais de vantagens e desvantagens; por costume; hábito; afeto.

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Poder é a possibilidade de impor a vontade sobre o comportamento dos outros. Para não ser instável e associado a qualquer tipo de comportamento, restringiu-se o uso do conceito para algumas situações que envolvem a dominação, ou seja, o poder autoritário de comando.

Estado”. Esse agente social e político faz parte de partidos ou grupos de poder, que habitam no Estado (Collins, 2009). Sendo o Estado uma organização que detém o monopólio do poder.

Portanto, as facções políticas possuem seus próprios interesses econômicos: o poder e a riqueza de sua organização, o próprio Estado. O mesmo pode ser aplicado às organizações políticas menores, tais como os partidos políticos: seus membros oficiais passam a ter interesse na propriedade de sua organização, na medida em que é nela que fazem suas carreiras. (COLLINS, 2009, p.: 85).

Segundo Collins (2009, p.: 86), esse monopólio do poder pelo Estado vem pela legitimidade. Essa legitimidade é conseguida por meio de (I) líderes carismáticos, (II) pela tradição das organizações hereditárias e (III) pela a autoridade racional-legal da constituição. A legitimidade não surge por geração espontânea:

Weber era, então, um historicista, um partidário da doutrina segundo o qual não existem leis gerais, mas explicações sem fim de particularidades históricas, com princípios explicativos diferentes para cada era? Muitas vezes, essa parece ser a posição de Weber, especialmente no começo de sua carreira, quando ele estava escrevendo tratados metodológicos. Isso parece tornar a Sociologia algo impossível, ao menos enquanto uma ciência generalizante. Mas Weber encontrou uma saída para isso. Ele subordinou a Sociologia à tarefa de apresentar os elementos com os quais a história é feita. Para esse propósito, ele criou a categoria de tipos ideais, modelos abstratos de burocracia, de classe, de mercado e assim por diante, que poderiam capturar aspectos da complexa realidade histórica, sempre levando em consideração que seria necessário aplicar vários tipos ideais ao mesmo tempo, de modo a captar vários aspectos das coisas. (COLLINS, 2009, p.: 81).

Então, segundo Weber (1999), esses líderes são categorizados mediante tipos ideais de dominação de poder. São três tipos puros de poder legítimo, que serão usados para compreender o ator político Dante Martins de Oliveira:

(I) O primeiro é o poder carismático: nele, o líder ganha legitimidade no poder através do carisma. Tal poder é alicerçado nas qualidades pessoais do chefe e, somente de forma secundária, nas instituições. As pessoas que obedecem a tais líderes são discípulos ou seguidores que acreditam em suas qualidades extraordinárias, mais do que em regras estipuladas. Os funcionários da burocracia são selecionados pela sua devoção ao chefe e não em termos

de suas qualificações especiais (como o funcionário) ou a sua posição (como no estamento) ou na dependência pessoal (como no quadro patriarcal68). Aqui dificilmente solidifica-se uma administração, porque o comando depende sempre das revelações e da tomada de decisão caso a caso. Um exemplo marcante é o líder revolucionário Fidel Castro.

Em geral, amigos e familiares de Dante de Oliveira o descrevem como um líder político carismático, mas ele não se legitimou unicamente por tal mecanismo:

O Dante tinha uma figura característica e eu acho que a primeira vez que eu vi o Dante na vida foi... não, na vida eu não sei, mas uma das primeiras imagens dele que me impressionaram muito foi lá no Colégio dos Padres e nós tínhamos o quê... dez anos de idade ou onze. Estávamos em um evento naquele auditório que tinha lá e o Dante estava lá impossível, ao lado de dona Maria e dona Maria deu um beliscão nele (Adalberto Lebrinha – entrevistado). E ele reclamou e levantou. Aquela figura magricela, porque ele sempre foi muito alto, né! E todo mundo achou engraçado aquilo. Ele era um cara muito carismático, sabe, e ele tinha um carisma muito forte, muito acentuado (Batista Malhado– entrevistado). Ele sempre foi impossível (Aluísio Arruda– entrevistado). (CAMPOS, 2015, p.: 32)

Dante já era uma figura, um expoente nacional. Todos já conheciam quem era o Dante, o homem das Diretas Já, ele que foi Ministro da reforma agraria, conseguiu desenvolver vários projetos no país todo, num momento em que a reforma agraria era uma força muito antagônica do poder contra os que não tinham o poder. Então, o Dante já tinha um nome próprio, uma luz própria e que também transmitia credibilidade, isso foi com o que possibilitou essa inserção. (Aparecido Alves, em entrevista ao autor).

Entretanto, Dante ganha simpatia nacional ao apresentar sua “Emenda Dante de Oliveira”, que expressava um sentimento único da nação: – a volta das eleições diretas. Dessa forma, naquele período das “Diretas Já”, Dante não ganha poder pelo seu carisma, mas acaba ganhando a empatia nacional ao ser considerado “O homem das Diretas Já”69

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Um quadro administrativo do soberano, calcado nas relações de dominação, os súditos estão ligados pelo árbitro do chefe. Racionalização material, próxima das exigências éticas do soberano.

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Uma observação: com a ementa Dante de Oliveira, ele conseguiu captar o sentimento de uma parte da sociedade brasileira pelo fim da ditadura militar e pelo reestabelecimento de eleições diretas para presidente. Dante atuou dentro das regras do jogo, como político eleito e no interior do Congresso Nacional utilizando-se de uma emenda constitucional. Ao fazer isso, conseguiu concentrar a atenção sobre sua figura e sua atuação parlamentar, aí o carisma pode fazer seu papel.

(II) O segundo é o poder Tradicional: este é baseado no respeito às instituições consagradas pela tradição e à pessoa ou às pessoas que detêm o poder, cujo direito de comando é conferido pela tradição; as ordens são legítimas no sentido de que estão de acordo com o costume. A burocracia nesse sistema constitui-se de partidários pessoais – funcionários da casa, parentes, favoritos pessoais, em um regime tipicamente patrimonial, de aliados pessoalmente leais. Os funcionários estão sujeitos a ordens arbitrárias de seu senhor. Nas citações abaixo, personalidades do Mato Grosso comentam sobre Dante como vinculado a uma elite tradicional do estado:

Agora, uma das coisas que aconteceu na nossa juventude é que nós éramos muito unidos e participávamos de tudo na cidade. Éramos

chamados também até pelo lado da direita para participar de todos os eventos. (Grifo do autor) Eles reconheciam a nossa liderança.

Sempre estava pedindo uma coisa. Nós participamos de protestos na Assembléia Legislativa. Nós fizemos festas. Até show à noite no clube Dom Bosco (Adalberto Lebrinha – entrevistado). (CAMPOS, 2015, p.: 36).

Éramos de classe média, média-alta (Grifo do autor); meu pai era

advogado e o pai dele também. Famílias antigas do estado (grifo do autor), a minha e a dele também; enfim, então, tínhamos essa convivência e esse relacionamento (Júlio Müller – entrevistado). (CAMPOS, 2015, p.: 37)

Dante vinha de família tradicional em Mato Grosso, seu pai estava na política. O poder tradicional da família, exercido pelo pai de Dante – enquanto ator político – pode ter influenciado a escolha do filho para se tornar um ator político atuante. Entretanto, Dante não mobilizou os recursos da família, e sim criou uma carreira política de forma autônoma.

(III) O terceiro e último é o poder legal: fundamenta-se na crença de que são legais as normas do regime; estabelecidas propositalmente e de maneira racional, levam ao direito de comando dos que detêm o poder com base nas mesmas normas. As pessoas sujeitas às ordens são iguais perante a lei e prestam obediência a ela, assim, não são as mesmas pessoas que implementam as leis ou normas.

Além disso, a burocracia é racional: os funcionários estão sujeitos a regras que delimitam a sua autoridade e estabelecem controles sobre seu exercício. O funcionário é aquele de formação profissional específica, cujo serviço se baseia em um contrato com um pagamento fixo, graduado de acordo

com a hierarquia do cargo. Sua administração é trabalho profissional em virtude do dever objetivo do cargo, procedendo sem a interferência de paixões pessoais ou caprichos.

A dominação legal está na estrutura do Estado Moderno e da empresa capitalista. Ambos pressupõem um quadro administrativo numeroso e hierarquicamente articulado. O processo de burocratização dominou a empresa capitalista e o Estado moderno.

Podemos examinar Dante de Oliveira como uma liderança do tipo racional legal, conforme definido por Weber. Dante disputou inúmeros cargos políticos durante sua trajetória e convenceu o eleitorado e a sociedade da legitimidade de seus posicionamentos por meio de critérios racionais. A sua atuação política é calcada em grande parte na argumentação e na justificativa de tais argumentos por meio de criação ou renovação de uma ordem legal e jurídica, bem como na crença do sistema político como estrutura racional disponível a todos os atores políticos em competição.

Além de ocupar diversos cargos políticos, o mais importante, talvez, tenha sido o de Deputado Federal durante as “Diretas Já”. Afinal, foi a partir desse cargo que ele assumiu um papel de destaque tanto para sua carreira quanto para o cenário nacional ao propor a “Emenda Dante de Oliveira” e ter se tornado “O homem das Diretas”. Além desse fato, outros relevantes devem ser citados, como o de que ele fez parte da primeira eleição de um presidente civil pós-regime militar (Tancredo Neves). Além disso, podemos citar, inclusive, sua participação no processo de redemocratização do Brasil durante a Assembleia Constituinte. Dessa forma, ele pôde influenciar na criação de novas normas – através da construção do ordenamento jurídico da Constituição. Dante foi também ministro do primeiro governo pós-regime militar, teve a oportunidade de influenciar a burocracia interna estatal. Segue figura para ilustrar a utilização da dominação racional legal segundo a teoria Weberiana:

Figura 04: Ilustração do ator político Dante segundo a teoria Weberiana70.

Fonte: Elaboração própria (2018) a partir de Weber (1999).

Analisando a vida política, a partir da classificação criada por Weber (2006) entre os políticos que vivem “da” e “para” a política, podemos afirmar que Dante ao mesmo tempo em que era um político profissional – a sua

70 Na ilustração, Dante seria essa esfera “verde”, um agente social segundo a teoria Weberiana, e que cresceu sob a influência de normas e do poder tradicional à época. Por ser um ator político em um período importante para a história do Brasil, pode atuar como um agente implementador do ordenamento jurídico, tendo a norma jurídica legal (Poder Legal) para fazê-lo. Esse ordenamento jurídico (Constituição 1988) exercia 3 funções fundamentais para as instituições estatais, segundo Weber (1999), de (I) Conservação; (II) Expansão; e, (III) Execução de fins.

trajetória em diferentes cargos corrobora tal fato – possuía também as características do político vocacionado, aquele que luta por uma causa:

Há duas formas de exercer política. Pode-se viver “para” a política ou pode-se viver “da” política. Nada há de exclusivo nessa dualidade. Até, ao contrário, geralmente se faz uma e outra coisa simultaneamente, tanto na idealidade quanto na prática. Quem vive “para” a política a transforma, no sentido mais profundo do termo, em “objetivo de sua vida”, seja porque encontra forma de gozo na simples posse do poder, seja porque o exercício dessa atividade lhe permite achar o equilíbrio interno e exprimir valor pessoal, colocando-se a serviço de uma “causa” que dá significado a sua vida. Neste sentido profundo, todo homem sério, que vive para uma causa, vive também dela. Portanto, assenta-se nossa distinção num aspecto extremamente importante da condição do homem político, que é o aspecto econômico. Do que vê na política uma permanente fonte de rendas, diremos que “vive da política” e diremos, no caso contrário que “vive para a política”. (WEBER, 2006, p.: 68).

Podemos concluir que Dante M. de Oliveira vivia para a política, além de ter ideais políticos, o que pode ser comprovado por diversos fatores: a liderança de Dante Martins de Oliveira no Congresso Nacional com a emenda das diretas, a sua capacidade de articulação na prefeitura de Cuiabá e no sistema partidário de Mato Grosso, entre outros. Tudo isso comprova que Dante M. de Oliveira vivia para a política. Nisso também podemos ver Dante como um idealista no sentido que Weber traz, ou seja, um líder que vive para a política. Comentando a saída de Dante de Oliveira do PMDB para o PDT, Campos (2015) afirma:

A este respeito, observa-se que Dante se afastou do PMDB, por

acreditar que o partido estava distanciando das propostas iniciais

(grifo do autor). Partido do qual, participava na origem, desde o antigo MDB. A insatisfação foi revelada conforme discurso proferido pelo ex-ministro Dante de Oliveira, ao reassumir o cargo de Prefeito de Cuiabá, em 13 de junho de 1987, p. 9. “Caros líderes Mário Cóvas, Fernando

Henrique (grifo do autor), Luís Henrique, e todos que aqui me honram

com suas presenças- governador Bezerra, deputados estaduais, e federais, vereadores e prefeitos – eis aqui na praça o sentimento do PMDB. Este é o caminho do nosso partido. Aqui está nossa seiva. Aqui está a razão maior da nossa existência, enquanto homens. (CAMPOS, 2015, p.: 47).

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