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Sabe-se que um ponto essencial e característico do Terceiro Setor é sua heterogeneidade, influenciando na falta de consonância no que se refere ao alcance de seu conceito e às terminologias usadas para se referir às organizações que o compõem.

Essa categoria da economia pode ser compreendida como uma mescla de fatores de difícil apreensão total de sua complexidade. Isso porque tem traços públicos e privados entrelaçados na prática de suas atividades. Contornos como esses demonstram como o Terceiro Setor possui semelhanças com o Primeiro Setor, já que sua finalidade de atuação é o espaço público, mas também guarda divergências com o governo, uma vez que se trata de uma iniciativa da própria sociedade. Sob outro ângulo, é possível notar que o Terceiro Setor é diverso da iniciativa privada, marcada pelo Segundo Setor, porque tem uma finalidade, o benefício de toda a sociedade.

Nessa perspectiva, uma configuração frequentemente observada são os campos estatal, privado e público não governamental como diferentes, porém com interpenetrações e sobreposições.

Figura 5 - Setores socioeconômicos

Primeiro Setor ESTADO

Segundo Setor INICITIVA PRIVADA

Terceiro Setor SOCIEDADE

CIVIL

Fonte: Teodósio, 2003, p. 1.

Essa multiplicidade de conceitos aproxima-se, em muitas situações, mais das características da categoria privada do que pública. Esse embate ocorre em diversas empresas, mas não significa que o oposto inexiste.

Há muitas vezes a existência do privado, porém público voltado para

o Estado, como quando os recursos, as metodologias ou as formas de estruturação majoritariamente advêm do setor público.

De fato, dentre o universo do Terceiro Setor existem organizações de diferentes matizes. É possível elencar alguns exemplos a partir de suas iniciativas que se enquadram na definição, como instituições filantrópicas, grupos de igrejas e projetos comunitários.

A compreensão de diversas dimensões das sociedades capitalistas contemporâneas, por meio da divisão entre categorias, a corporativa e a não estatal, sendo este membro do Terceiro Setor, gera a exclusão de um vasto número de organizações profissionais, sindicatos e grupos que se pautam pelo caráter não governamental, a defesa de direitos específicos e a não lucrativa. Essa realidade traz perdas para o setor à medida que os interesses ora convergem em direção aos de outros grupos e atores sociais, ora se contrapõem.

A dicotomia entre esferas da sociedade atual não é tão clara, de modo que existem campos cinzentos de interface entre mercado, estado e sociedade civil. Exemplo disso é o conceito de Quasi Non-Governmental Organizations, também chamado pela sigla QUANGOs.

Essa expressão em inglês pretende designar as organizações que iniciaram a atuar com a reforma estatal no Reino Unido. Elas atuam na área social, especialmente nos setores da saúde e da educação, com recursos regularmente enviados pelo Estado, delineando formato jurídico-contratual com contornos semelhantes a algumas organizações existentes no Brasil (TEODÓSIO, 2001).

É possível imaginar as organizações a partir da ideia de que as dificuldades sociais e econômicas enfrentadas pela população deveriam ser resolvidas a partir da lógica dos atores que compõem o mercado, cabendo ao Estado apenas regular essa esfera. Ocorre que, na prática, as mil facetas existentes nessas entidades promovem muitas formas de sistematização de suas atividades.

Algumas organizações atuam de forma assistencialista, outras focam prioritariamente no desenvolvimento social. Certas instituições atuam diretamente na área de enfoque que realizam seus projetos, outras

são intermediárias que viabilizam a execução de programas sociais. A verdade é que inexiste modo específico e delimitado para atuar nesse setor desde que haja a finalidade social.

É nessa perspectiva que ao pensar em Terceiro Setor é possível observar tanto as organizações formalizadas juridicamente quanto as informais. Existem não só as organizações com uma gestão estruturada e profissionalizada, mas também as sem estrutura e profissionalização. Há organizações de grande porte, de tamanhos médio e pequeno. Encontra-se organizações de caráter nacional ou internacional. Quanto à forma de financiamento, elas podem ter como fontes recursos públicos e repasses privados. Essas transferências podem, ainda, ser fontes regulares de financiamento de suas atividades ou variáveis quando não possuem certa frequência (TEODÓSIO, 2001).

Características comuns dentre diversas organizações que compõem o Terceiro Setor parece ser a falta de lucro, bem como o objetivo maior da execução de suas atividades, que é a promoção de benefícios para toda a comunidade. Diante dos aspectos caracterizadores desses grupos, encontram-se opções não excludentes entre si, como a localização geográfica, a etnia, a ideologia, a condição financeira, a orientação religiosa, a opção sexual, entre outros.

Assim, a definição de Terceiro Setor abarca uma multiplicidade de atores com objetivos diversos. É nesse ponto que ocorrem mesclas, gerando dificuldades na delimitação entre o não governamental de origem comunitária contraposto às origens estatais e de mercado. Esse quadro se apresenta bastante complexo, especialmente na prática, quando tais atores se misturam.

RESUMINDO:

Dentre as acepções estudadas do Terceiro Setor, ressalta-se a multiplicidade de atores, agendas e interesressalta-ses. Os conflitos advindos da modernização constroem a justiça social através da participação popular, da mídia e de estudos acadêmicos. O resultado do confronto entre diferentes participantes dessa categoria traz tanto as possibilidades de mudança social, tão ansiada no país, quanto o constrangimento à uma cidadania integral, gerando um crescimento que ora pode se observar sob a perspectiva conservadora, ora como modernizante por meio de políticas sociais. Ponderar a disposição do Terceiro Setor e seus atores e funções no cenário brasileiro significa avaliar formas estruturais de gestão social, a fim de alcançar meios de garantir a eficiência operacional e expansão da efetividade dos direitos sociais no país. Diversos entraves existem na execução das políticas públicas e que reverbera diante dos múltiplos interesses envolvidos, que se enquadram numa perspectiva não governamental ora influenciada pelo espaço público, ora marcada pelo mercado e ora refletida nas ambições individuais dos atores que compõem as organizações. De toda forma, não se pode negar as conquistas atingidas pelas ONGs nas últimas décadas através da mobilização social e o seu potencial modernizador das relações sociais existentes no Terceiro Setor. Em muitas nações, essas organizações estiveram associadas tanto ao recuo estatal, ao aumento da participação popular. Esse cenário dicotômico do Terceiro Setor é bem retratado no Brasil, visto que a administração pública e a cidadania sempre se apresentaram de modo incompleto.

Ademais, o impasse entre participação e eficiência bastante inerente à relação das ONGs na realidade junto ao poder público pode ser observado internamente. A gestão dessas organizações precisa discutir a noção da percepção entre o capital privado e a sociedade civil em meio aos seus interesses cruzados, ora convergentes, ora divergentes, pelos fatores conjunturais. Assim, o Terceiro Setor e seus múltiplos atores carregam dilemas a serem enfrentados e avanços a serem alcançados à medida que as diversas realidades existentes demandam uma carga extensa de soluções a serem aplicadas.

REFERÊNCIAS

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