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A ATUAÇÃO DA OIT E O DIREITO INTERNACIONAL DO TRABALHO – CLASSIFICAÇÃO DIDÁTICA

TRABALHADOR – O TRABALHO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE E O TRABALHO ESCRAVO

3 AS FUNÇÕES DA ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL DO TRABALHO.

3.1 A ATUAÇÃO DA OIT E O DIREITO INTERNACIONAL DO TRABALHO – CLASSIFICAÇÃO DIDÁTICA

Em regra, o estudo das características e normas da OIT se dá num ramo da ciência jurídica que passou a ser conhecido como Direito Internacional do Trabalho.

Não sustentamos a existência do Direito Internacional do Trabalho como ramo autônomo dentro da ciência jurídica, em que pese reconheçamos que se avolumam, sobretudo na doutrina alienígena, livros e estudos sobre a matéria (muitos deles encomendados ou incentivados pela própria OIT). O crescimento destas obras, sem dúvidas, projeta para um futuro, talvez não tão remoto, um processo de autonomização do Direito Internacional do Trabalho.

Por enquanto, todavia, o Direito Internacional do Trabalho é compreendido como um capítulo do estudo do Direito Internacional, vez que segue seus paradigmas, e se utiliza de seus métodos e de seu arsenal normativo (a regulamentação internacional do trabalho é feita através de tratados internacionais).

A distinção de Ulpiano, consistente na dicotomia direito público e direito privado (Publicum jus est quod ad statum rei romanae spectat, privatum, quod ad singulorum

utilitatem), no que tange ao Direito Internacional do Trabalho é explicado por Francisco de

Assis Ferreira (1969, p.489-490):

O direito internacional do trabalho pode ser de direito público e de direito privado. É exemplo do primeiro caso a celebração de tratados ou convenções entre Estados regulando condições de trabalho. Trata-se de Direito Internacional Privado do Trabalho quando um indivíduo ou um grupo de trabalhadores qualificados contratam com empregador estrangeiro, deixando sua pátria de origem para exercerem sua atividade em outra nação.

O mesmo autor aponta como principal fundamento do direito internacional do trabalho, além daqueles apontados por Arnaldo Sussekind29, o social, concernente à ―universalização dos princípios da Justiça social e da dignificação do trabalhador‖ (SUSSEKIND, 1969, p. 492).

Para nós, em que pese se avulte como de elevada importância o fundamento social (e, de fato, é mesmo o mais importante), é preciso que a doutrina protecionista construa um canal aberto de diálogo com os empregadores.

É certo que a OIT já constitui um espaço para este debate, tendo em vista a sua organização paritária (com representantes dos empregados e dos empregadores), mas não basta que exista um diálogo sob a perspectiva formal (apenas garantindo o direito de voz e voto), mas sim um diálogo que possa trazer resultados materiais (consistentes na dignificação do trabalhador).

É necessário, pois, que nós todos, defensores da classe trabalhadora, construamos um discurso que possa seduzir os empregadores a conceder direitos mínimos aos trabalhadores.

É leviano, quase autista, imaginar que argumentos de ordem humanitária irão seduzir os empregadores neste sentido. A ética empresarial, nem de perto, se aproxima da ética trabalhista. São visões diferentes e objetivos diversos.

Desta forma, o argumento humanitário deve existir e deve ser exposto nas negociações, mas, no diálogo com os empregadores, o argumento de ordem econômica deve prevalecer. Animados por maiores ganhos de capital, é possível que os empregadores possam repensar a maneira de explorar a mão-de-obra e permitir que a classe operária possa viver com mais dignidade.

O argumento econômico, como já salientado, deve ser sustentado com base na melhora da qualidade dos produtos (trabalhadores satisfeitos produzem mais e com mais qualidade), o que aumenta a expectativa de lucro e gera uma maior possibilidade de ingressar com maior competitividade no mercado internacional, alcançando rotas que não existiriam caso o empregador insistisse na utilização de trabalho que não garanta padrões mínimos de respeito à dignidade do trabalhador.

Estabelecidas as premissas iniciais, nos resta enfrentar a seguinte problemática: o que pode fazer a OIT (e até a OMC) para contribuir na luta contra o trabalho degradante?

29 ―[...]motivos de ordem econômica impõem, inquestionavelmente, a necessidade de ser nivelado, tanto quanto possível, no campo internacional, o custo das medidas sociais da proteção ao trabalho, a fim de que os Estados que as tenham adotado, através de sistemas completos e tutelares, não sofram, por esta razão, no comércio mundial, a indesejável concorrência dos países que obtêm produção mais barata pelo fato de não o onerarem com os encargos de caráter social.‖ (SUSSEKIND, 1987, p.)

É sobre esta pergunta que se debruçam os próximos tópicos desta dissertação. Salientamos, contudo, desde logo, que não se vislumbra analisar de forma exaustiva todas as formas de atuação dos citados entes de direito internacional. Isto porque o universo de possibilidades de atuação destes órgãos não pode, nem deve, sofrer um processo de fossilização, tornado estanque os mecanismos de combate ao trabalho degradante. É preciso que as ações destes sujeitos de direito internacional venham a se adequar, analogicamente, ao princípio da não identificação relacionado aos direitos humanos30, ou seja, não se devem criar normas que aprisionem as suas ações a meras hipóteses normativas.

Ademais, é demasiadamente extenso o universo de atuação, principalmente da OIT. Sabe-se que não é recente a atuação da Organização Internacional do Trabalho na esfera internacional, sendo, aliás, apontada como um dos precedentes da internacionalização dos direitos humanos (junto com o direito humanitário e a Liga das Nações), flexibilizando conceito de soberania estatal. Assim, desde 1919 a OIT vem engendrando esforços na proteção do trabalhador, razão pela qual se nos afigura improvável resgatar todos os mecanismos de atuação desta organização.

As funções e a importância da Organização Internacional do Trabalho se avolumam em tempo atuais. A globalização torna mais desafiador o trabalho da OIT, como observa Carmen Camino:

Emerge, nesse contexto, um Direito do Trabalho em completa crise, diante de uma imprecisa ―globalização‖ das relações econômicas, a ditar a feroz concorrência no mercado internacional, sem atentar às profundas desigualdades históricas, filosóficas, culturais e econômicas dos povos. Somem-se a crescente automação as empresas, responsável pela dispensa massiva de milhões de trabalhadores, sem perspectivas de reaproveitamento; a complexidade dos processos de produção, a afastar, do mercado de trabalho, enorme contingente de trabalhadores sem qualificação profissional e sem meios de obtê-la; o desemprego estrutural, como uma resultante de todos esses processos, a espalhar o seu sinistro espectro, inclusive, sobre as nações mais ricas. (CAMINO, 1999, p.32)

O aumento na concorrência pelos mercados internacionais aumenta a sede das empresas, ávidas por multiplicar seu capital. Este desígnio empresarial finda por um objetivo de aumento do lucro e consequente diminuição nas despesas, o que afeta sensivelmente as relações de trabalho. Cada vez mais os empregadores querem pagar cada vez menos aos seus empregados (ou até não pagar, no caso do trabalho escravo), que, compelidos pela

30 O Princípio da não identificação ou da cláusula aberta ou da não tipicidade informa que os direitos humanos não devem ser resumidos em fórmulas normativas estanques, sobretudo porque os direitos humanos são marcados com a nota da historicidade e dinamicidade, com construção ao longo do tempo. Assim, deve-se buscar uma interpretação sempre evolutiva dos direitos humanos, relegando conceitos reducionistas para outras áreas da ciência jurídica.

necessidade de seu sustento e de suas famílias, inserem-se numa rotina de trabalho excessiva, desgastante e, por vezes, letal.

Digno de nota também o comentário do professor Dallegrave Neto (2003, p.17) acerca dos reflexos dos novos valores da sociedade pós-moderna nas relações de trabalho. Aponta o autor três reflexos sensíveis:

a) Aumento do desemprego mundial, antes pontual, agora estrutural; b) Reestruturação do sistema produtivo;

c) Precariedade nas condições de trabalho.

Portanto, nos cabe analisar os principais e mais eficientes métodos utilizados pela Organização Internacional do Trabalho (e pela Organização Mundial de Comércio), o que se inicia nos próximos itens.

3.2 NOTAS HISTÓRICAS SOBRE A ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL DO