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5.2 Elites locais

5.2.4 Augustais

No âmbito religioso, salientamos ainda os augustales. São provenientes de um meio social diverso dos flâmines e das flamínicas, tratando-se de um colégio constituído normalmente por libertos47, geralmente comerciantes ricos ligados ao serviço ao imperador por uma espécie de juramento e cujo colégio intervém na organização de jogos e sacrifícios, apoiando o culto imperial. Em finais do século I d. C. passa a contar com seis membros (VI viri Augustales)(Mangas, 2001, p. 39).

Atendendo a que em princípio não poderiam aceder às magistraturas municipais48 nem aos sacerdócios oficiais, dada a sua origem normalmente servil, encontram aqui o meio de se distinguirem socialmente, contribuindo para a vida da comunidade onde se inserem, tendo inclusivamente um certo papel político.

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Sobre o tema vide González Herrero, 2005, pp. 243-255. Cf. Étienne, 1958, p. 166.

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Sobre a origem dos libertos vide Serrano Delgado (1988, pp. 98-99). Aqui, o autor aponta as opiniões divergentes em certos autores sobre a origem social dos augustais, se seriam apenas libertos, ou também ingenui. Estas diferenças derivam da existência de algumas inscrições, maioritariamente provenientes de municípios do centro e norte da Itália, onde existe uma situação complexa pela juxtaposição de instituições como os Augustales, seuiri Augustales, magistri

Augustales, entre outras, com outras instituições de fundo sociológico diferente como os seuiri municipais. O autor

julga, de todo o modo, que os ingenui com aspirações, contactos sociais e riqueza, tenderiam a enquadrar-se no sistema municipal aristocrático, integrando os cargos que aos libertos estariam vedados, como seja o senado municipal e o desempenho de magistraturas e sacerdócios.

48 Tal como já referido anteriormente, em meados do século I a.C., na Lex Coloniae Genetivae Iuliae (Ursonensis),

105, é previsto que o facto de ser liberto não constitui um caso de indignidade susceptível de impedir o acesso à condição de decurião. Deverá ser com Tibério que os libertos são afastados dos senados locais, através da Lex Visellia de 24 d.C. Cf. Fabre, 1976, pp. 421-422.

Relativamente à sua função cultual, estariam associados ao Genius e Numen Augusti e aos lares Augustorum, sendo variadas as divindades objecto das dedicatórias dos Augustales da Hispania: ao imperador, às virtudes imperiais divinizadas, às divindades do panteão romano, entre outras divindades preferencialmente cultuadas em cada cidade. Em Olisipo, por exemplo, para além das dedicatórias ao Divino Augusto, observamos as dedicatórias efectuadas a Apolo, por M. Iulius Tyrannus (EO 101), a Esculápio, por M. Afranius Euporio e L. Fabius Daphnus (CIL II 175 e EO 103) e a Mercúrio, divindade associada ao comércio, actividade que possivelmente teria permitido o enriquecimento dos libertos, por C. Iulius C [atulinus?] (CIL II 181, EO 78).

No estudo de Serrano Delgado de 1988, Status y promoción social de los libertos en Hispania Romana, este autor considera surpreendente a escassez de dedicatórias ao imperador, que seria o âmago do culto imperial, sendo de compreender que o culto que os augustais lhes prestam o é de forma indirecta, através do culto dos lares Augustorum, do Genius, das virtudes imperiais, etc. (Serrano Delgado, 1988, pp. 106-107).

Os augustais eram nomeados pelo ordo decurionum, sendo o seu cargo igualmente anual. Relativamente à existência de uma idade mínima, alguns autores falam de um mínimo de 25 anos para aceder a este cargo, ainda que tenha sido encontrado registo de um seuir que morre com 23 anos, pelo que pode haver variantes locais. Para além disso, existem igualmente registos de augustais que desempenharam o cargo em várias cidades (Serrano Delgado, 1988, p. 109).

Tal como sucedia na ordo decurionum, haveria igualmente hierarquias entre os augustais. Os libertos com maior poder económico e social e com vontade de se destacarem na vida política do município, procurariam distinguir-se na sociedade em que se inseriam. Tal poderia ser levado a cabo, por exemplo, através da promoção de actos evergéticos de relevo, que adiante veremos em pormenor no capítulo dedicado ao evergetismo, ou da obtenção dos ornamenta decurionalia, atribuídos pelo ordo decurionum, que lhes permitia uma certa equiparação, em termos de dignidade, com este ordo (Melchior, 1999, p. 225). Ainda que apenas uma minoria dos libertos da Hispania os tenham alcançado, sobretudo os Augustais, mais bem posicionados pela sua notoriedade para tal, a sua obtenção permitir-lhes-ia ter os mesmos benefícios dos decuriões, sem pertencer efectivamente ao ordo. Assim, tinham, por exemplo, lugar

entre os decuriões nos espectáculos e banquetes, bem como direito a receber o mesmo que os decuriões nos sportulae (Serrano Delgado, 1988, pp. 207-212).

Tal como para aceder a uma magistratura, haveria lugar ao pagamento de uma summa honoraria, realçando-se aqui uma certa semelhança com as magistraturas e instituições do governo municipal, pois não o sendo, inspiram-se na ordo decurionum. São inclusivamente frequentes as inscrições em que é utilizado o termo ordo (de ordo Augustalium), encontrando-se no entanto entre o povo e o ordo decurionum (Serrano Delgado, 1988, p. 110). Contudo, existem igualmente notícias de que pudessem ser isentados da entrega de uma quantia para entrada no colégio, dado que por exemplo em Lacippo (CIL II 1934), C. Marcius December, sevir49, foi isentado da entrega de quinhentos denários, tendo-se encarregado da erecção de uma estátua a Fortuna Augusta, que por seu turno teria um valor de cerca de setecentos denários (Andreu Pintado, 2004, p. 45). Para além da summa honoraria, e à semelhança do que sucedia no acesso às magistraturas, promoveriam os já referidos actos evergéticos, muitas vezes prometidos para acesso ao cargo ou realizados por ocasião de início de funções (Taylor, 1914, p. 232).

Apresentamos então de seguida os augustais conhecidos em Olisipo até ao momento50, seguindo na medida do possível uma evolução cronológica, seguida das epígrafes sem datação. Os augustais estão igualmente enumerados no anexo 1, constando as epígrafes do anexo 2.

1. C. Arrius Optatus

Deste augustal temos notícia devido à dedicatória que faz, em conjunto com o augustal C. Iulius Eutichus, nº 2, ao Divino Augusto.

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Sobre a distinção entre sevir Augustalis, Augustalis e sevir vide Lily Ross Taylor (1914, pp. 231-253), Carmen Castillo García (2003, pp. 73-89) e Serrano Delgado (1988, pp. 105-106). Aqui é apontada como a tese mais sólida a tese de Von Premerstein, que parte do principio que inicialmente existiria variedade nesta instituição, sendo

Augustales e seuiri Augustales organizações distintas, os augustais mais próximos de um colégio sacro e a segunda

com uma grande semelhança com as magistraturas municipais. Na primeira metade do século II, produz-se uma reforma que regula a situação e estabelece praticamente uma única instituição de carácter colegial, ainda que se conserve a diversidade na titulatura.

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José Cardim Ribeiro (1974-1977, p. 328, nota 196) menciona outro possível augustal no ager Olisiponensis (CIL 265), patente numa inscrição actualmente perdida proveniente da Zona W do município, da qual apenas resta um cópia bastante má. Apesar de Emílio Hübner a ter reconstituído em CIL II 265, Robert Étienne não a incluiu na sua obra, possivelmente pela razão supracitada. Optamos igualmente por não a elencar neste trabalho.

Fotografia 5: CIL II 182 – (in Quinteira e Encarnação, 2009b, p. 145

A inscrição, pedestal de mármore, foi reencontrada em Outubro de 2009 nas obras de requalificação do edifício situado no Largo do Contador-Mor, nº 3 e 4, na freguesia de Santiago, Lisboa (Quinteira e Encarnação, 2009 b, p. 143).

A inscrição é datável de pouco depois da divinização de Augusto, que morreu em 14 d.C., devendo estar colocada em local de destaque, muito possivelmente no templo do forum municipal (Quinteira e Encarnação, 2009b, p. 143). Vieira da Silva (1944, p. 188) coloca igualmente no primeiro quartel do séc. I d. C., Andreu Pintado (2004, p. 136) coloca sob Tibério.

O cognome Optatus é, segundo Mantas (1982, pp. 24-25), romano e frequente na Hispânia não indo-europeia, sobretudo na Bética, sendo que na Lusitânia uma boa parte dos testemunhos epigráficos pertence às elites locais, como é o caso ora em apreço. Kajanto inclui este cognome no grupo associado às circunstâncias de nascimento, com um significado aproximado de agradável, com concentração, na Península Ibérica, na bacia do Guadalquivir e em alguns grandes portos hispânicos, o

que faz realçar uma intervenção em actividades marítimas e comerciais, tradicionalmente apontadas como estando nas mãos de libertos (Mantas, 1982, pp. 24- 25, Kajanto, 1982, p. 73-75).

2. C. Iulius Eutichus

Em conjunto com C. Arrius Optatus, nº 1, C. Iulius Eutichus, é autor de dedicatória ao Divino Augusto abordada supra.

Este augustal apresenta o nomen mais frequente em Olisipo, Iulius, denotando o facto de não só a gens Iulia estar bem representada a nível das magistraturas, mas também a nível da augustalidade.

3. M. Afranius Euporio

Temos igualmente notícia dos augustais M. Afranius Euporio e L. Fabius Daphnus, nº 4, pelo monumento que consagram a Esculápio, possivelmente do tempo de Tibério, 14 a 37 d. C.(Silva, A.V., 1944, p. 217). O augustal apresenta um cognome de origem grega (Martineau, 2003, p. 197) e alguns autores identificam-no, tal como a C. Iulius Firmus, em marcas anfóricas do Testaccio (CIL, XV, 5696, 3894). Cardim Ribeiro contesta, contudo, a identificação de M. Afranius Euporio com o nome patente em ânforas do Testaccio dado que a epígrafe CIL XV 3696 permite outra reconstituição do nomen, nomeadamente como Aemilius. Considera igualmente que a identificação de C. Iulius Firmus com o navicularius patente em CIL XV 3894-3896 assenta de novo apenas em confrontos onomásticos discutíveis (Ribeiro, J, 1994, p. 88).

A epígrafe foi encontrada em 1770 quando se faziam escavações para a construção dos prédios n. 63 a 77 e 79 a 91 da Rua dos Retrozeiros e n. 53 a 65 da Rua da Prata, os quais assentam sobre o criptopórtico, tendo permanecido na parede da loja nº 83 da Rua dos Retrozeiros até 1915, altura em que é levada para o anterior Museu Etnológico (Silva, A.V.,1944, p. 218).

4. L. Fabius Daphnus

No que respeita a L. Fabius Daphnus, que em conjunto com o augustal referido supra consagra a Esculápio, ostenta um cognome que sugere uma relação com Daphne, relevante subúrbio marítimo de Antioquia (Mantas, 1998, p. 214 e 2005, p. 33).

5. C. Heius Primus

Este augustal perpétuo do tempo de Nero sobressai em Olisipo pela sua importante acção evergética. Liberto endinheirado, possivelmente devido às actividades comerciais e marítimas que a importância de Olisipo como centro portuário proporciona, C. Heius Primus é o mecenas da renovação do teatro de Olisipo, oferecendo a renovação do proscenium e da orchestra, e respectiva decoração. Esta oferta, constatada em inscrição dedicada a Nero51, em muito teria contribuído para a notoriedade e destaque do augustal na sociedade olisiponense, lembrando-nos um pouco aqui do liberto Trimalquião, uma das principais figuras do Satyricon de Petrónio.

Esta inscrição foi encontrada no teatro romano de Olisipo52, descoberto em finais de 1798, por ocasião de escavações para a construção de um prédio no local, com porta para o nº 13 da rua da Saudade e os números 2 a 8 da Rua de S. Mamede (Silva, A.V., 1944, p. 175), como referido anteriormente.

Atendendo ao gosto que Nero tinha pelo teatro, tratar-se-á de um gesto de claro significado político, como refere José d’Encarnação (1995, p. 258). Dado o facto de nesse mesmo ano ser inaugurado na capital do Império o anfiteatro de Nero, esta remodelação reveste-se, como realça Lídia Fernandes (2007, p. 25), de uma dupla intencionalidade: por um lado, enaltecer o Imperador e, por outro lado, inserir Olisipo nos ludi romani que decorriam em Roma.

No que respeita ao nomen do augustal, Heius, trata-se de um gentilício itálico pouco presente no mundo romano, encontrando-se em importantes centros portuários. Na Hispânia, onde é igualmente raro, há registo do duúnviro L. Heius Labeo (CIL II 3541, Múrcia) (Fernandes, Luís, 2005, p. 33). Os Heii eram uma poderosa família em Cumae, cerca de 200 a.C., cuja riqueza se deveria muito possivelmente ao comércio marítimo, bem como à produção de cerâmica de construção. É possível que os Heii sicilianos, presentes em Messina e posteriormente em Lylybaeum, cuja riqueza advirá igualmente muito provavelmente do comércio marítimo, derivem desta gens de Cumae (Fernandes, Luís, 2005, p. 33). Para além dos Heii de Cumae, onde se regista o maior

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Andreu Pintado (2004, p. 165) data a epígrafe de 37 d.C.. Por seu turno, Stylow contesta que a inscrição seja dedicada a Nero, parecendo-lhe mais lógico que a titulatura imperial sirva como datação, propondo assim a correcção da leitura de NERONI para um ablativo de datação – NERONE. Cf. Fernandes, Luís, 2005, p. 31.

número de testemunhos, existem poucos testemunhos dos Heii em solo itálico, predominando os Caii Heii fora da Itália. Existem assim registos sobretudo na Sicília e no Mediterrâneo Oriental, onde actuariam como negotiatores e magistrados locais em relevantes portos do Mediterrâneo, sobretudo em época de Augusto. Atendendo à relevância de Olisipo no quadro do comércio marítimo, Luís da Silva Fernandes coloca a possibilidade de ser este augustal agente de um desses negotiatores ou de um dos seus libertos (Fernandes, Luís, 2005, pp. 34-35).

6. M. Iulius Tyrannus

Do augustal M. Iulius Tyrannus temos notícia pela homenagem que faz a Apolo, possivelmente no séc. I (Silva, A.V., 1944, p. 214), dando-nos a conhecer ser liberto de Marco. Trata-se de outro augustal com o nomen Iulius e de cognomen de origem grega (Martineau, 2003, p. 198).

A inscrição foi encontrada em 1935 em escavação para construção de um armazém subterrâneo efectuada na Rua das Canastras, nº 3, tendo sido levada para o anterior Museu Etnológico (Silva, A.V., 1944, p. 215).

7. Iulius Italicus

No ager Olisiponensis, em Loures, registo para monumento funerário que dá conta de outro augustal, Iulius Italicus, liberto de Mún(… ?). Quanto ao nomen, de novo encontramos a relação dos Iulii ao culto imperial. No que respeita ao patrono, poderá ter origem indígena, havendo várias proposta de reconstituição do seu nome, como seja de Munnius, por Cardim Ribeiro (1974-1977, p. 310) e como Munnus, por Luis Fernandes da Silva (2003, p. 43). De acordo com este autor, atendendo à ausência da consagração aos deuses Manes e ao registo do nome do defunto em nominativo será datável do século I d.C. Avança ainda que este augustal poderá ter estado ligado ao comércio fluvial, dada a existência do seu epitáfio em Unhós, onde existiram instalações portuárias antes do assoreamento da área53.

A epígrafe encontra-se actualmente perdida.

52 O augustal surge ainda numa outra inscrição, CIL II 196, EO 71,e recentemente terá sido detectada uma inscrição

incompleta que documenta uma outra doação de C.Heius Primus, inscrição reutilizada num edifício moderno próximo do teatro. Cf. Fernandes, Luís, 2005, p. 32.

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8. C. Iulius C [atulinus?]

C. Iulius C. [atulinus?], dedica um monumento sacro a Mercúrio, tratando-se de novo elemento apresentando o nome Iulius.

A inscrição encontrava-se em meados do século XVII no muro da cerca moura, fora da Porta do Sol, junto de uma janela das casas do Prior de Santiago (Silva, A.V., 1944, p. 188).

9. Nemetius Firmus

De Nemetius Firmus temos notícia através da dedicatória que lhe é feita pelos filhos, mencionando ter vivido 70 anos.

A epígrafe foi encontrada no Castelo de São Jorge em 1940, por ocasião de obras de restauro, tendo sido depositada na ocasião no museu organizado numa sala do Castelo (Silva, A.V., 1944, p. 104).

10 - EO 8, que menciona um augustal na dedicatória de um monumento a Matulla.

A epígrafe foi encontrada no Castelo de São Jorge por ocasião de obras de restauro, em 1940, tendo sido depositada na ocasião no museu organizado numa sala do Castelo (Silva, A.V., 1944, p. 101).

Após a apresentação dos magistrados municipais, sacerdotes e augustais registados em Olisipo, verificamos que os testemunhos epigráficos se concentram no período do Alto Império.

No que respeita aos magistrados municipais, as inscrições são honoríficas e funerárias, pertencentes aparentemente em maioria ao século II. Os magistrados, nove duúnviros e seis edis, apresentam nomes latinos, estando a família Iulia em preponderância, em consonância com o que se passa no município, contando com cinco representantes, seguida da Caecilia, com dois representantes.

Realça-se o facto de não estar atestado nenhum magistrado da gens Cornelia, e escassos a nível da Lusitânia, estando esta bastante presente na Tarraconense e na Bética a nível de magistrados locais (Salinas de Frias e Rodríguez Cortés, 2000, p. 21).

Poderá avançar-se uma possibilidade de relação entre alguns destes magistrados, que desempenhavam as suas funções na cidade, e a sua presença no ager do município.

Essa possibilidade poderá ser colocada relativamente aos Coelii de Dois Portos (CIL II 284), possivelmente proprietário da villa de Dois Portos (Cardoso et alii, 2008, p. 5), a Q. Caecilius Caecilianus, da Serra de São Julião (CIL II 261), bem como ao edil L, Iulius Iustus, cuja inscrição foi encontrada em Bucelas.

Relativamente aos quatro flâmines registados em Olisipo até ao momento, concentram-se aparentemente no século I d.C.. Dos quatro flâmines, dois pertencem à gens Iulia, ainda que um deles, Q. Iulius Plotus, esteja igualmente contabilizado enquanto magistrado municipal. Trata-se de uma situação particularmente interessante, na medida em que nos permite vislumbrar que magistrados municipais e flâmines seriam muito possivelmente da mesma extracção social. Tal como para os magistrados municipais, poder-se-á igualmente supor o relacionamento dos indivíduos que desempenhavam o flaminato com o ager, relacionando a riqueza das elites com a exploração agrária.Este relacionamento é apresentado, por exemplo, por Cardim Ribeiro para o flamen L. Iulius Maelo Caudicus, responsável pela doação de uma fonte em Armês e possivelmente proprietário de uma villa próxima da actual Godigana (Ribeiro, J, 1982-1983, pp. 396-398).

O número de registos epigráficos de mulheres em tarefas rituais é bastante baixo, como observámos, ainda que nos pareça significativo a existência de uma flamínica da província da Lusitânia registada em Olisipo.

Como pudemos observar, alguns dos augustais ostentam cognomes de influência grega, o que poderá denotar uma origem oriental, ainda que o facto de escravos e libertos apresentarem cognomes de influência greco-oriental possa igualmente representar uma devoção religiosa ou uma questão de «moda» (Martineau, 2003, p. 195). Os augustais deveriam assumir uma relevância económica e social importante, não sendo demais relembrar o impacto que o acto evergético de C. Heius Primus deveria ter tido na sociedade olisiponense.

Considerando que o desempenho dos cargos era anual e que no período em que se concentram as epígrafes, nos séculos I e II d.C., em cada ano desempenhando as suas funções duúnviros, edis, flâmines, ainda que possivelmente o mesmo indivíduo pudesse desempenhar vários cargos ao longo do seu cursus honorum, e augustais, o número de registos que conhecemos é ainda reduzido, esperando-se que novas descobertas arqueológicas possam trazer nova luz aos conhecimentos actuais.

Numa análise da vida pública da cidade de Olisipo, denota-se de todo o modo uma plena romanização administrativa, sendo as magistraturas municipais

desempenhadas por membros de famílias indígenas romanizadas, o que se denota pela sua designação para a qual será relevante a boa presença de indivíduos da gens Iulia, bem como indivíduos de origem itálica. Os libertos, augustais, assumem igualmente um papel relevante em termos económico e sociais, em muito beneficiando da posição estratégica de Olisipo.

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