• Nenhum resultado encontrado

A promoção da autorregulação começa a ser, cada vez mais uma preocupação de pais, educadores e professores. As crescentes situações de mau comportamento, indisciplina e bullying que se têm vindo a registar tornaram-se uma grande preocupação nas sociedades ocidentais. Promover as capacidades de autorregulação desde cedo pode ser uma forma de prevenir desajustamentos comportamentais e de fomentar o desenvolvimento de competências sociais positivas. Apesar de existir pouca investigação nesta área, já há evidências de que a intervenção pode estimular o desenvolvimento da regulação e consciência emocional e das funções executivas, ou seja, da autorregulação. (Eisenberg, Spinrad & Eggrum, 2010).

É possível começar a estimular a autorregulação desde o primeiro ano de vida da criança. Uma das estratégias passa por promover o autoconsolo da criança, ou seja, fazer com que esta aprenda a acalmar-se sozinha. Por exemplo, pode ser permitido à criança recorrer a um objeto de conforto, ou até mesmo a chuchar no dedo; ou incentivá-la a desviar o olhar de um estímulo que lhe provoque frustração ou ansiedade (Eisenberg, Spinrad & Eggrum, 2010). Na creche e no jardim-de-infância, o educador deve prestar muita atenção ao ambiente da sala, proporcionando o acesso a materiais diversos, a uma rotina estruturada e a horários de alimentação e sesta regulares, para que as crianças tenham oportunidade de compreender como é que os adultos regulam o seu quotidiano, os seus limites, os seus comportamentos e emoções, assimilando e reproduzindo posteriormente essas aprendizagens (Boyer, 2009). Outro método proposto por Martinez-Pons (1996) assenta em apoiar as atividades das crianças, acompanhando as suas atividades, fazendo sugestões e dando feedback das suas ações; encorajar comportamentos positivos, promovendo o discurso privado como forma de auto monitorização e estimulando a reflexão acerca das ações; agir como um modelo e valorizar verbalmente as ações e comportamentos das crianças. O discurso privado acima referido é uma boa estratégia para fomentar a auto monitorização da criança. Este foi muito defendido por Vygotsky (1978), que mostrou que as crianças do pré-escolar têm necessidade de recorrer ao discurso privado para planear e orientar o seu comportamento e as suas ações, desenvolvendo assim uma aprendizagem autorregulada. Para além destas estratégias, o educador pode também criar momentos de diálogo metacognitivo, ou seja, diálogos que levem a criança a refletir acerca de aspetos da sua aprendizagem. Os educadores devem orientar a conversa, colocando questões relacionadas com os seus planos e objetivos no início de uma atividade, e sobre os resultados das suas ações no final das atividades ou relativamente aos seus comportamentos (Pramling, 1988).

38

Dentro da sala de aula, os educadores podem adotar estratégias proactivas para promover o desenvolvimento da autorregulação, como por exemplo, ao encorajar as crianças a seguir as regras da sala, promovendo assim a inteligência social de cada uma, ao mostrar que esta faz parte de um grupo, e fora da escola, de uma família e de uma comunidade, ou seja, estimulando o desenvolvimento das suas capacidades interpessoais e sociais. Outro dos métodos diz respeito a desafiar a criança a olhar e compreender o mundo de diferentes perspetivas. Com o apoio do adulto, as crianças devem ter tempo e espaço para partilhar as suas ideias, emoções e problemas entre si, tentando resolvê-los e conjunto. Desta forma, as crianças aprendem a respeitar as opiniões e problemas dos outros, bem como a tentar resolver conflitos através do diálogo. Também é importante que o educador faça com que a criança se responsabilize pelos seus atos e pela forma como trata os seus pares. Deste modo as crianças começam a reconhecer o impacto que as suas ações têm sobre as outras pessoas, seja este positivo ou negativo. Uma outra estratégia prende-se com o facto de o educador dever adaptar as tarefas e atividades ao nível de desenvolvimento, às necessidades e aos interesses do grupo e de cada criança. Deste modo, as crianças sentem-se mais valorizadas e ao mesmo tempo, aprendem a aceitar as diferenças dos seus pares. Por fim, o educador deve ter em conta que as regras da sala podem ser delineadas em conjunto com as crianças e posteriormente podem ser alteradas e reajustadas, em atividades e momentos específicos, em função das necessidades e dos interesses do grupo. É mais fácil as crianças cumprirem as regras se estas fizerem sentido para si. (Boyer, 2009).

Têm sido também criados programas de intervenção no contexto escolar, como é o caso do programa de intervenção norte-americano Head Start Research-Based Developmentally Informed Intervention, criado para promover o desenvolvimento da linguagem, da literacia e de competências sociais e emocionais. Este foi aplicado em jardins- de-infância durante um ano letivo e observou-se que as crianças demonstraram mais facilidade em desempenhar tarefas de orientação e tarefas que implicavam inibição de comportamentos, memória e controlo da atenção, face a crianças de salas que não receberam a intervenção (Bierman, Nix, Greenberg, Blair & Domitrovich, 2008).

O Currículo PATHS (Promoting Alternative Thinking Strategies Curriculum) foi criado nos Estados Unidos, para crianças mais velhas e adolescentes. Posteriormente já foi aplicado em jardins-de-infância. As crianças que receberam esta intervenção demonstraram mais consciência emocional, menos tendência para o isolamento e mais competências sociais do que as crianças do grupo de controlo. Contudo, não foram observados efeitos significativos relativamente à inibição de comportamentos e à capacidade de manter atenção (Domitrovich,

39

Cortes & Greenberg, 2007). O Programa EBP (Emotion Based Prevention Program), também de origem norte-americana, inclui tarefas que abordam a consciência emocional e estratégias de controlo. Este programa também envolve as famílias, ao partilhar com estas os resultados das tarefas e pedindo a sua colaboração, com a realização das mesmas, em casa. O programa foi aplicado tanto em meios rurais e cidades pequenas, como em grandes áreas urbanas, tendo sido adaptado para este ultimo caso (Izard et al., 2008). No primeiro caso, as crianças de quatro anos revelaram mais consciência emocional apos a intervenção, o que não aconteceu com as crianças de três anos. As representações dos educadores revelaram menor instabilidade emocional e emoções negativas, menor agressividade e menos sintomas de ansiedade e depressão após a intervenção. No segundo caso, o Programa EBP foi associado a outro programa de intervenção – ICPS (I Can Problem Solve). No final da intervenção foi possível observar nas crianças um grande desenvolvimento da consciência emocional, bem como um aumento das capacidades de autocontrolo e de comportamentos positivos. A promoção da autorregulação pode também ser feita a partir do currículo Tools of Mind, o qual se centra no treino, no desafio e no apoio das funções executivas. Este foi aplicado em salas com crianças provenientes de meios com baixo rendimento, durante períodos de um a dois anos. As crianças revelaram mais precisão nas funções executivas do que as crianças que trabalharam com um currículo regular (Diamond, Barnett, Thomas & Munro, 2007).

Muitas vezes, a formação inicial dos educadores de infância pode deixar as estratégias de promoção de competências pessoais e sociais um pouco de parte. A investigação também tem proposto a aplicação de treino específico nesta área, como é o caso do programa de treino proposto por Perels e os colegas (Perels, Merget-Kullmann, Wende, Schmitz & Buchbinder, 2009). Estes aplicaram um programa que tinha como objetivo ensinar aos educadores estratégias de autorregulação para os seus próprios processos de aprendizagem, para que estes pudessem ser modelos corretos, e ao mesmo tempo, ensinar-lhes estratégias para promover o desenvolvimento da autorregulação das crianças. Este programa assentava em quatro pilares: o educador como modelo, a autonomia e tomada de responsabilidades, atividades relacionadas com a autorregulação e transferência de atividades de um dia para outro. O programa mostrou ser muito eficaz: a autorregulação dos educadores teve um grande aumento, bem como a aprendizagem autorregulada das crianças. Promover a autorregulação dos educadores pode ser uma estratégia importante para o desenvolvimento da autorregulação das crianças.

40