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A autorregulação define-se pelo conjunto de processos mentais que exercem controlo sobre o sujeito, sobre as suas funções, comportamentos, pensamentos, emoções, impulsos e desejos. É o mecanismo que regula o self, tendo em vista os padrões e regras aceites pela sociedade (Baumeister & Vohs, 2004). De uma forma geral, é a autorregulação que transforma o Homem num ser civilizado. O ser humano tem necessidade de agir de forma planeada e controlada com vista a atingir objetivos pessoais (Boekaerts, Pintrich & Zeidner, 2000). Temos como exemplo de processos de autorregulação a capacidade de controlar impulsos e respostas automáticas ou o adiantamento da gratificação (saber aguardar por uma recompensa). De acordo com a perspetiva sociocognitiva, o conceito de autorregulação abrange a interação de processos pessoais, comportamentais e ambientais (Bandura, 1986). Os processos pessoais dizem respeito à monitorização e ao ajustamento cognitivo e afetivo. Por outro lado, autorregulação comportamental refere-se à auto-observação e avaliação e às ações estrategicamente ajustadas e controladas. Já a autorregulação ambiental envolve observações e ajustamentos de fatores ambientais (Boekaerts, Pintrich & Zeidner, 2000). Segundo esta teoria, a autorregulação é, então, considerada um processo cíclico, visto que as suas consequências influenciam posteriores ajustes no comportamento do sujeito. Estes ajustes são necessários porque tanto os fatores pessoais e comportamentais como os fatores ambientais estão em constante mudança durante o processo de desenvolvimento do sujeito (Boekaerts, Pintrich & Zeidner, 2000). A autorregulação constitui, portanto, um processo que inclui

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seleção, modificação e modelação de comportamentos, controlo da atenção e mudanças cognitivas (Eisenberg, Spinrad & Eggrum, 2010).

O desenvolvimento da autorregulação tem por base processos interiores ao sujeito. Eisenberg, Derryberry e Rothbarth, entre outros investigadores, consideraram fundamental distinguir os processos de controlo voluntários dos menos voluntários. Os processos de autorregulação estão presentes no dia-a-dia do indivíduo e começam a verificar-se desde cedo, quando as crianças começam a modelar os seus comportamentos e respostas (Eisenberg, Smith, Sadovsky & Spinrad, 2004). Visto que se exige que o indivíduo pense antes de agir, os processos de autorregulação refletem o seu desenvolvimento motor e cognitivo. A criança tem que começar, desde cedo, a compreender em que situações cada resposta é adequada (Kochanska, Murray & Harlan, 2000). A autorregulação voluntária é frequentemente referida por effortful control. Rothbart definiu-o como “a capacidade de inibir uma resposta dominante para executar uma resposta subdominante” (Rothbart, 1998, p.137) mais especificamente, a capacidade intencional ou voluntária do indivíduo inibir, ativar ou modificar a sua atenção e o seu comportamento sempre que necessário (Eisenberg, Smith, Sadovsky & Spinrad, 2004; Eisenberg, Spinrad & Eggrum, 2010). O effortful control está diretamente relacionado com o comportamento conscientemente planeado, bem como com o controlo voluntário dos pensamentos e sentimentos (Posner & DiGirolamo, 2000; Posner & Rothbart, 1998). Temos como exemplos a capacidade do indivíduo focar a sua atenção da presença de distrações, de saber esperar ou de permanecer sentado ou em silêncio durante um longo período de tempo, de não interromper outros indivíduos ou de realizar uma atividade para si desagradável. É a partir destas capacidades que surgem na infância que a autorregulação se vai desenvolvendo.

A autorregulação voluntária, ou effortful control, corresponde a uma das primeiras componentes da formação do temperamento, o qual diz respeito a um nível de controlo que surge ao longo do desenvolvimento infantil (Eisenberg, Spinrad & Eggrum, 2010). O temperamento é definido pelas características individuais e pelas capacidades de autorregulação e reação, pela afetividade, medos e frustrações, normalmente observadas nos comportamentos e ações, na demonstração de emoções e na capacidade de atenção, orientação e adaptação do sujeito (Rothbart, 2011; Rothbart & Bates, 2006). Este também tem constituído um tema emergente na investigação, devido à preocupação de tentar compreender as capacidades individuais do sujeito controlar as suas emoções mais fortes (Kagan, 2010), mas sobretudo por estar na base do desenvolvimento da personalidade, constituindo uma grande influência no desenvolvimento psicossocial e cognitivo do sujeito. Observou-se até

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então que o temperamento da criança influencia a sua compreensão relativamente às estratégias de autorregulação. Uma criança com um temperamento reativo tem mais oportunidades para experienciar situações e aprender estratégias de autorregulação. Porém, uma criança que seja demasiado reativa pode ter tendência para ter comportamentos mais negativos, perdendo assim oportunidades de aprendizagem (Cole, Dennis, Smith-Simon & Cohen, 2009).

Por outro lado, existem os sistemas de controlo menos voluntários, denominados reactivos ou atencionais (Eisenberg, Spinrad & Eggrum, 2010). Alguns destes, por serem automáticos e involuntários, dificilmente são controlados pelo sujeito, visto que ele nem tem consciência deles (Gross & Thompson, 2007). Outros apenas são controlados numa fase posterior do desenvolvimento, por sistemas de controlo cerebrais mais complexos (Derryberry & Rothbarth, 1997; Posner & Rothbarth, 1998; Rothbarth & Bates, 1998; Bargh & Williams, 2007). De uma forma mais concreta, a regulação emocional envolve as capacidades de gerir a atenção, a motivação e o comportamento de forma mais voluntária. É flexível e deve ser modelada, de forma a que o indivíduo não esteja completamente controlado ou fora de controlo (Eisenberg, 2002). É caracterizada pelo processo de iniciar, inibir, manter ou alterar a ocorrência, a intensidade e a duração de estados emocionais, de processos psicológicos e de comportamentos associados às emoções (Eisenberg, Spinrad & Eggrum, 2010). Já o desenvolvimento do temperamento envolve processos de inibição menos voluntários, como é o caso da impulsividade ou de um elevado nível de inibição (Derryberry & Rothbart, 1997). No geral, um indivíduo regulado deve conseguir agir de forma espontânea, em situações que assim o permitam, bem como ter a capacidade de conter as suas tendências mais involuntárias quando for apropriado (Eisenberg, Smith, Sadovsky & Spinrad, 2004).

O desenvolvimento da autorregulação tem uma grande base biológica, mas também é influenciado, em grande parte, pelo ambiente social. A modelação e a instrução são consideradas os principais veículos de promoção por parte das famílias, dos professores, dos pares e da sociedade em geral, tanto no que concerne às aprendizagens motoras e cognitivas, como às principais capacidades de autorregulação. Os padrões comportamentais que o sujeito vai assimilando são resultado da autoavaliação que este faz dos seus comportamentos, tendo em conta as normas e regras que constituem a sua instrução, a observação de modelos e ainda as respostas sociais a esses comportamentos (Boekaerts, Pintrich & Zeidner, 2000).

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