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1. AVALIAÇÃO EDUCACIONAL E AVALIAÇÃO DA APRENDIZAGEM: PONTOS DE PARTIDA

1.2. A avaliação formativo-reguladora

Em muitas práticas pedagógicas, sejam elas da educação básica ou do ensino superior, são identificadas diferentes posturas dos educadores quando o assunto é avaliação, principalmente quando esta se refere à aprendizagem dos alunos, ao rendimento escolar.

Muitos docentes possuem concepções e atitudes em torno da avaliação advindas de suas experiências anteriores. Alguns seguem o que foi vivenciado por eles, outros buscam o caminho oposto. A maneira como cada um lida com a avaliação não depende apenas da classe em que leciona, da idade de seus alunos, mas das concepções que cada um tem sobre educação, ensino, aprendizagem, sujeito. A forma de perceber cada sujeito, seja no aspecto cognitivo, social, afetivo irá influenciar no modo de avaliar.

A postura do professor demonstra as concepções que adota. Um professor emancipador, segundo uma concepção interacionista, busca perceber nos alunos o modo como cada um aprende, a forma de pensar do aluno, as construções que desenvolve, sem determinar uma única maneira de resolver determinado problema. Já um professor com uma postura autoritária pode exigir que seus alunos tenham as mesmas respostas às situações, sem permitir que expressem seus conhecimentos, considerando errado os que não seguem as regras estabelecidas.

É muito comum ainda hoje encontrarmos posturas autoritárias mesmo tendo na literatura e nos discursos uma crítica às avaliações nestas perspectivas. Uma avaliação numa perspectiva que visa apenas o desempenho final e que responsabiliza o aluno exclusivamente por sua aprendizagem “servia para medir os resultados finais da aprendizagem, com foco maior na certificação das aprendizagens e na seleção dos

estudantes do que na análise e na busca de soluções para os problemas de aprendizagem” (FERREIRA e LEAL, 2006, p. 13).

Isso implica na exclusão social, em que nada é feito por aqueles que muitas vezes demonstram não possuir um bom desempenho e não ter espaço para refletir sobre seu próprio envolvimento com a aprendizagem.

Entender como cada aluno pensa, interage, age, é um passo importante para que os alunos tenham mais possibilidades de acompanhamento e de resolução conjunta dos problemas. Nessa perspectiva interativa, “a avaliação deverá encaminhar-se a um processo dialógico e cooperativo, através do qual educandos e educadores aprendam sobre si mesmo no ato próprio da avaliação” (HOFFMANN, 1992, p. 42).

Nesse sentido, estaremos minimizando manifestações de poder dentro do ambiente escolar, em que muitas vezes os saberes são propriedades dos professores e o modo como o processo avaliativo ocorre não permite a participação efetiva dos alunos. Em uma perspectiva diferenciada, Hoffmann defende que

é urgente encaminhar a avaliação a partir da efetiva relação professor e aluno em benefício à educação do nosso país, contrapondo-se à concepção sentenciva, grande responsável pelo processo de eliminação de crianças e jovens na escola (1992, p. 42).

Sendo assim, a avaliação concebida de outra forma, durante todo o processo de ensino e em diferentes dimensões é importante. Considerando que os alunos deveriam ser os mais beneficiados na escola, segundo perspectivas atuais, a avaliação pode possibilitar uma grande ferramenta de integração entre professor-aluno e os demais participantes da comunidade escolar, favorecendo a coletividade.

Adotar um paradigma como este mencionado acima significa seguir uma perspectiva formativa reguladora que faz a “opção por uma educação que supere a crise do paradigma educacional centrado no ensino, onde a escola apenas se responsabiliza por ensinar de forma linear e uniforme, ficando à sorte dos alunos aprenderem” (SILVA, 2003, p. 8).

Considerando esta perspectiva, assumir uma nova postura sobre o ensino é importante. Este não pode ser concebido como responsabilidade unicamente do professor. Outras pessoas envolvidas no processo educacional também podem contribuir. É o caso dos alunos, pois suas avaliações são importantes ferramentas para uma melhoria do ensino. Assim, se o ensino é destinado a eles, é importante que os

mesmos possam mencionar suas percepções sobre o que é proposto pelo professor e equipe pedagógica. De acordo com Mendéz,

O professor aprende para conhecer e para melhorar a prática docente em sua complexidade, bem como para colaborar na aprendizagem do aluno, conhecendo as dificuldades que deve superar, o modo de resolvê-las e as estratégias que coloca em funcionamento. O aluno aprende sobre e a partir da própria avaliação e da correção, da informação contrastada que o professor oferece-lhe, que será sempre crítica e argumentada, mas nunca desqualificadora, nem punitiva. (2002, p. 14)

No entanto, esta prática não é muito vivenciada no ambiente escolar, o que confirma o caráter linear e autoritário do ensino. Entretanto, se desejamos o bom desempenho dos alunos atrelado a uma maior autonomia, esta postura não condiz, o que faz necessário olhar o ensino de outra forma para que haja uma maior democracia na relação dos sujeitos envolvidos nos processos de ensino e aprendizagem. Dessa forma,

a avaliação cruza o trabalho pedagógico desde seu planejamento até a execução, coletando dados para melhor compreensão da relação entre o planejamento, o ensino e a aprendizagem e poder orientar a intervenção didática para que seja qualitativa e contextualizada (SILVA, 2003, p.14).

Portanto, ver aprendizagem e ensino de forma ampla requer pensar nos objetivos curriculares. Assim, como diz Zabala

quando a formação integral é a finalidade principal do ensino e, portanto, seu objetivo é o desenvolvimento de todas as capacidades da pessoa e não apenas as cognitivas, muitos dos pressupostos da avaliação mudam centrando-se nas possibilidades pessoais dos alunos (1998, p. 197).

Considerar as potencialidades e permitir uma abertura para novas capacidades requer mudança de postura do professor, que irá investir mais nos alunos. Isso repercutirá no modo como concebe a avaliação, que auxiliará no diagnóstico, no acompanhamento e em novas propostas para o desenvolvimento dos alunos, diversificando as estratégias utilizadas para melhorar a aprendizagem.

No paradigma educacional centrado nas aprendizagens significativas, a avaliação é concebida como processo/instrumento de coleta de informações, sistematização e interpretação das informações, julgamento de valor do objeto avaliativo através das informações tratadas e decifradas, e por fim, tomada de decisão (como intervir para promover o desenvolvimento das aprendizagens significativas) (SILVA, 2003, p.12-13).

Essa nova conduta do professor traz uma abertura para os saberes produzidos, considerando que os alunos possuem conhecimentos anteriores e que cada um pensa de

uma forma singular e pode contribuir para a ampliação do que é discutido, através de seus relatos e experiências, em que trocas são feitas num ambiente de interação.

A ação avaliativa abrange justamente a compreensão do processo de cognição, porque o que interessa fundamentalmente ao educador é dinamizar oportunidades do aluno refletir sobre o mundo e de conduzi-lo à construção de um maior número de verdades, numa espiral necessária de formulação e reformulação de hipóteses (abstração reflexiva) (HOFFMANN, 1992, p. 23).

A postura docente passa a ser investigativa, na busca de entender como cada um percebe o que é questionado, possibilitando o confronto de ideias, a construção de vários saberes e não de uma única verdade.

O estabelecimento de uma única verdade do professor acaba impossibilitando perceber novas formas de resolver problemas, de pensar e agir.

O conhecimento do que cada aluno sabe, sabe fazer e como é, é o ponto de partida que deve nos permitir, em relação aos objetivos e conteúdos de aprendizagem previstos, estabelecer os tipos de atividades e tarefas que têm que favorecer a aprendizagem de cada menino e menina (...). O conhecimento de como cada aluno aprende ao longo do processo de ensino/aprendizagem, para se adaptar às novas necessidades que se colocam, é o que podemos denominar de avaliação reguladora (ZABALA, 1998, p. 199 - 200).

Zabala salienta um tipo de avaliação que favorece uma melhor prática pedagógica: a avaliação diagnóstica. Segundo o autor, esta avaliação é necessária para uma melhor regulação do ensino e da aprendizagem. Ela busca o diagnóstico, através da indagação, da investigação do que o aluno já sabe para intervir de maneira adequada sobre o ensino, proporcionando ampliação dos saberes.

O trabalho diagnóstico permite uma ação mais intencional, direta, que indica ao professor o que ele deve fazer para ajudar o aluno a progredir. Esse tipo de avaliação diagnóstica é também importante para o aluno, ao comparar como estava no início e final de ano. Por exemplo, ele percebe seus progressos e passa a ter mais responsabilidade sobre sua aprendizagem, regulando-a. Segundo Silva,

a dinâmica avaliativa é mediadora do processo de desconstrução e reconstrução da práxis pedagógica. A avaliação formativa reguladora é um mecanismo integrativo e regulador do trabalho pedagógico e das aprendizagens. Para tanto, é fonte de informações descritivas e interpretativas dos percursos e dos conteúdos de aprendizagens dos aprendentes e das situações didáticas e da relação entre ambos (2006, p. 35).

Em síntese, Zabala (1998, p. 201) caracteriza uma perspectiva mais emancipatória de avaliação:

a partir de uma opção que contempla como finalidade fundamental do ensino a formação integral da pessoa, e conforme uma concepção construtivista, a avaliação sempre tem que ser formativa, de maneira que o processo avaliador independente de seu objeto de estudo, tem que observar as diferentes fases de uma intervenção que deverá ser estratégica. Quer dizer, que permita conhecer qual é a situação da partida, em função de determinados objetivos gerais bem definidos (avaliação inicial); um planejamento de intervenção fundamentado e, ao mesmo tempo, flexível, entendido como uma hipótese de intervenção; uma atuação na sala de aula, em que as atividades e tarefas e os próprios conteúdos de trabalho se adequarão constantemente (avaliação reguladora) às necessidades que vão se apresentando para chegar a determinados resultados (avaliação final) e a uma compreensão e valoração sobre o processo seguido, que permita estabelecer novas propostas de intervenção (avaliação integradora).

Uma grande preocupação deste tipo de avaliação está relacionada às necessidades dos alunos, e por isso o professor, numa perspectiva emancipadora, deve possuir uma abertura no seu planejamento, nas suas ações, pois suas intervenções são estabelecidas em função da demanda do aluno, necessitando uma maior flexibilidade em sua prática. Nesse sentido, “a confiança mútua entre educador e educando quanto às possibilidades de reorganização conjunta do saber pode transformar o ato avaliativo em um momento prazeroso de descoberta e troca de conhecimento” (HOFFMANN, 1992, p. 80).

Assim, levar em consideração que estamos em constante ampliação na nossa aprendizagem e perceber que em determinado momento nossos erros podem indicar avanços é outra característica da avaliação emancipatória. Hoffmann, no bojo dessa questão, traz para a discussão o papel do erro construtivo. Segundo ela,

o conhecimento produzido pelo educando, num dado momento de sua experiência de vida, é um conhecimento em processo de superação. A criança, o jovem, aprimoram sua forma de pensar o mundo à medida que se deparem com novas situações, novos desafios e formulam e reformulam suas hipóteses (1992, p. 67).

Ampliando um pouco mais as discussões sobre a avaliação formativo- reguladora, Silva (2006) apresenta três características básicas e interrelacionadas: sua natureza processual, a diversidade de instrumentos e a intencionalidade educativa. O caráter processual refere-se ao acompanhamento da relação entre planejamento, ensino e aprendizagem, permitindo um retorno aos sujeitos do processo avaliativo para que possam refletir, superar os limites ou criar possibilidades. Dessa forma, o caráter processual da avaliação “afasta a possibilidade de ser vista e praticada como algo terminal e fragmentado, como ações estanques voltadas para si mesmas numa dinâmica de classificação, de punição e de exclusão” (2006, p. 36).

Em relação à diversidade de instrumentos, Silva destaca que

A diversidade de instrumentos avaliativos precisa estar inserida em uma sistemática, atender a uma metodologia própria da teoria e da prática da avaliação educacional e adequá-la à natureza do objeto avaliado, seja o ensino e a aprendizagem, o currículo, o curso, o programa, a instituição, etc. Diversificar não é simplesmente adotar vários instrumentos aleatoriamente, a avaliação é um campo teórico e prático que possui um caráter metódico e pedagógico que atende a sua especificidade e intencionalidade (SILVA, 2003, p. 15).

Nesse sentido, a variedade de instrumentos avaliativos favorece maiores possibilidades de intervenções didáticas através das informações coletadas.

A terceira característica, intencionalidade educativa, está relacionada tanto ao caráter processual quanto à diversidade de instrumentos. A partir do momento em que a avaliação configura-se como processual e busca uma diversidade de informações, as tomadas de decisões tornam-se mais intencionais, baseadas em variados dados, permitindo um maior aperfeiçoamento do trabalho pedagógico, tanto para o professor, ao organizar sua aula, quanto para o aluno, que passa a acompanhar melhor suas aprendizagens durante todo o processo.

Em relação aos princípios que norteiam a avaliação numa perspectiva formativo- reguladora, o referido autor destaca cinco: a negociação, a pertinência sócio- epistemológico-cognitivo, o formativo, o emancipador e o ético.

A negociação decorre da transparência exigida no processo avaliativo, ampliando os sujeitos participantes na avaliação e os objetos de avaliação, não centrando no aluno, mas no trabalho de toda comunidade escolar. A pertinência sócio- epistemológico-cognitivo refere-se à necessidade do processo e instrumentos avaliativos coerentes com os conteúdos curriculares e os níveis de aprendizagem; o princípio formativo visa uma retro-alimentação do trabalho pedagógico, favorecendo o desenvolvimento integrador do sujeito. O emancipador define que o planejamento e a avaliação precisam ser norteados por um projeto político-pedagógico, visando a libertação dos sujeitos através da crítica e reflexão. Por fim, o princípio ético corresponde a uma prática justa, buscando o desenvolvimento integral do aprendente.

Portanto, as discussões e práticas advindas em tal perspectiva possibilitam uma escola mais democrática, professores mais humanos e alunos mais responsáveis por sua aprendizagem, motivados para aprender. Através da avaliação formativa reguladora e

novas posturas docentes temos motivos prazerosos para ir à escola, percebendo sua grande função: a formação daqueles que a frequentam de forma integradora.

A avaliação é a reflexão transformada em ação. Ação, essa, que nos impulsiona a novas reflexões. Reflexão permanente do educador sobre a realidade, e acompanhamento, passo a passo, do educando, na sua trajetória de construção de conhecimento. Um processo interativo, através do qual educandos e educadores aprendem sobre si mesmos e sobre a realidade escolar no ato próprio da avaliação (HOFFMANN, 1992, p. 18).

Desse modo, além dos aspectos citados acima, refletimos sobre as finalidades que temos quando avaliamos. Segundo Leal, temos diferentes finalidades quando se trata de avaliarmos:

avaliamos para identificar os conhecimentos prévios dos alunos e trabalhar a partir deles; avaliamos para conhecer as dificuldades dos alunos e, assim, planejar atividades adequadas para ajudá-los a superá- las; avaliamos para verificar se eles aprenderam o que nós já ensinamos e, assim decidir se precisamos retomar os conceitos trabalhados naquele momento; avaliamos para verificar se os alunos estão em condições de progredir para um nível escolar mais avançado; avaliamos para verificar se nossas estratégias de ensino estão dando certo ou se precisamos modificá-las. (LEAL, 2003, p. 32)

Dentre as finalidades acima, Ferreira e Leal destacam que

avaliar as próprias estratégias didáticas é fundamental para que possamos redimensionar o ensino, tendo como norte a avaliação do que os alunos fazem e dizem. Ou seja, ouvir o aluno e tentar entender as respostas que eles nos dão a partir dos instrumentos de avaliação é o primeiro passo para pensar sobre os procedimentos didáticos que usamos no nosso cotidiano (2006, p. 14).

Assim, nesta pesquisa estamos buscando saber quais os critérios de avaliação utilizados por crianças sobre as estratégias didáticas adotadas por suas professoras. Para melhor analisarmos seus julgamentos, procuramos analisar também as aulas das docentes que eles estavam avaliando. Procuramos entender tais práticas para compreender o que as crianças falaram nas entrevistas. Como as professoras estavam desenvolvendo uma sequência didática envolvendo o gênero reportagem, sentimos a necessidade de refletir teoricamente sobre como o ensino da língua se organiza através dos gêneros para sabermos como os alunos avaliam e percebem as estratégias adotadas pelas docentes.