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Base do conhecimento para o ensino da diversidade da sala de aula: incertezas e possibilidades

PROFESSORAS EXPERIENTES, INICIANTES E LICENCIANDAS: COMO A BASE DO CONHECIMENTO PARA O ENSINO SE REVELA?

5.2. Base do conhecimento para o ensino da diversidade da sala de aula: incertezas e possibilidades

As transformações pelas quais as sociedades têm passado, principalmente a partir dos séculos XX e XXI, impõem movimentos de reflexão e de urgência de novas formas de responder às diferentes demandas. Essas demandas e as lutas dos movimentos sociais têm influenciado mais as políticas educacionais.

No Brasil, a partir de 1990, as políticas educacionais e os estudos sobre as relações étnico-raciais e educação revelam a necessidade de se repensar a prática educativa e a própria estruturação escolar, com objetivo de propiciar a todos os estudantes uma educação anti-racista e multicultural.

Dessa forma, quando o Ministério da Educação e Cultura, em 1997, propõe os Parâmetros Curriculares Nacionais com um volume voltado à Pluralidade Cultural, indica que na escola ocorrem atos de preconceitos, de discriminação e de racismo - ainda que trate como diferença e não como

desigualdade –, e que cabe à instituição repensar a questão e promover ações para o combate das causas e dos malefícios aos que sofrem discriminações.

Com isso, a problemática das relações étnico-raciais vem se tornando uma preocupação visível nas políticas educacionais, como parte de ações afirmativas, orientadas pela Convenção da UNESCO (1960) e pela Conferência Mundial de Combate ao Racismo, Discriminação Racial, Xenofobia e Discriminações Correlatas de 2001, bem como pela luta dos Movimentos Negros.

Posteriormente, somam-se as lutas dos povos indígenas, que impactaram as políticas sobre diversidade e diferença no Brasil, materializada na Lei 11.645/08 que dispõe sobre o ensino das histórias e das culturas indígenas, africanas e afro-brasileiras nos estabelecimentos de ensino.

Contudo, ainda que tenhamos esses avanços, a educação para este século XXI não se propõe a atender apenas às demandas por políticas públicas. Ela deve responder também ao campo das relações interpessoais, reconhecendo e convivendo com a diversidade e com as diferenças. Serão, então, as instituições de ensino instadas a lidar com toda a complexidade e com as transformações apresentadas por esse novo modelo de sociedade.

Certamente, esse desafio está posto para todas as áreas e, para a formação de professores, representa um caminho repleto de desafios, mas também de possibilidades.

As concepções que permeiam as práticas pedagógicas das professoras experientes, iniciantes e das futuras professoras, não podem ser descoladas dos contextos históricos e sociais dos quais fazem parte.

Dessa forma, a discussão da temática da diversidade enquanto algo que deve fazer parte do currículo escolar é recente. Moreira (2001) aponta que as temáticas antes silenciadas tanto no campo da formação de professores, quanto no campo do currículo, começam a ganhar força após os anos 2000. Assim, como exigir que professoras formadas antes desse tempo tivessem acesso, em sua formação inicial, a essas discussões?

É preciso lembrar que a temática da diversidade se constitui enquanto parte da política educacional recentemente, no final dos anos 90 e início dos anos 2000, principalmente, a partir da participação do Brasil nos acordos e conferências mundiais. Dessa participação são construídas políticas de

formação continuada que abordassem esses temas. Os PCNs (Parâmetros Curriculares Nacionais) se constituem enquanto marco histórico dessa política ao apresentar diretrizes para abordar em sala de aula todo um leque de temas que antes estavam fora dos currículos.

Como parte das políticas formativas sobre o tema mencionado, o Ministério da Educação e Cultura, em 2006, lançou o material "Educar na Diversidade: material de formação docente". Esse livro foi entregue a todas as escolas do Brasil, com o intuito de ser um material para estudo e consulta dos professores a respeito da diversidade. Nessa publicação a ênfase era a questão da inclusão.

Em 2007, foi lançada a coletânea "Indagações sobre o Currículo", na

qual se discute o currículo e sua relação com diferentes temáticas, incluindo a diversidade.

Propostas de formação docente voltadas à temática da diversidade ganham corpo em 2009, sendo o curso Gênero e Diversidade na Escola (GDE) uma das grandes apostas dessa política. Por seu caráter de reunir várias discussões a respeito da diversidade cultural, de gênero, de sexualidade e étnico-racial, por meio de formação online para todo o Brasil, O GDE difundiu para diferentes localidades do Brasil a perspectiva de formar professores para a diversidade. Sua última edição data do ano de 2014. A agenda internacional e nacional dos séculos XX e XXI buscam regular e governar as diferenças culturais, bem como de reconhecimento das identidades étnico-raciais,

culturais, de gênero e de sexualidade34.

Ortiz (2007) argumenta que o final do século XX e o início do XXI são marcados pela apologia à diversidade, ao plural e às diferenças. Contudo, segundo ele, essa diversidade não se manifesta apenas pelo fato de o mundo ser multicultural, mas pela força do mercado, que tem nessa diversidade uma grande força propulsora para seu avanço. O mercado “longe de ser

34 Ainda que a Base Nacional Comum Curricular (BNCC), lançada ao final de 2018, apresente os marcos legais para a discussão sobre a temática da diversidade, os temas referentes às relações étnico-raciais, gênero, diversidade sexual estão presentes, de forma suscinta, nas áreas das Ciências Humanas e no Ensino Religioso para os anos iniciais do Ensino Fundamental. Representa um retrocesso nos avanços promulgados pelas diretrizes anteriores. Com a BNCC os Projetos Pedagógicos das Licenciaturas também deverão sofrer alterações, bem como impactará a Política de Formação Docente para todo a Educação Básica.

homogêneo, como pensavam os teóricos da comunicação de massa, (...) é atravessado por uma miríade de diferenças”. (ORTIZ, 2007, p. 14).

Assim sendo, verificamos que a temática da diversidade está há algum tempo na agenda das políticas educacionais. Contudo, como essas políticas chegam às escolas e aos professores? Que impactos elas têm sobre os currículos praticados por eles?

Destacamos o fato de que, o avanço dessas políticas se deu como forma de atender às demandas dos movimentos sociais, notadamente, dos Movimentos Negro, Indígena, Feminista, LGBT e da Inclusão. Entretanto, para que essas políticas se materializem como práticas pedagógicas há um caminho longo e nem sempre tranquilo. Diferentemente dos conteúdos relacionados às várias áreas do conhecimento, a temática da diversidade requer não somente conhecimentos teóricos, mas exige uma sensibilidade para ser tomada como algo a ser tratado pedagogicamente. Nesse aspecto, revela-se a ideia de iceberg das culturas:

[...] as dificuldades parecem, pois transformar a temática da diversidade em conteúdo pedagógico requer mergulhar no mar das incertezas para ver o que está submerso neste iceberg. Assim, temos um desafio para a formação inicial e continuada de professores: fazer emergir as concepções sobre diversidade, refletir sobre ela e torná-la um conhecimento que perpasse todas as áreas do conhecimento materializadas no currículo escolar. (CANDAU, 2002, p. 65).

A ideia acima, junta-se com o apontado por Mizukami (2010) ao defender que as concepções e as crenças dos professores se constituem como desafio permanente para a formação docente, pois exigem um processo reflexivo apurado que promovam desestabilizações na base do conhecimento.

Nesta pesquisa valemo-nos da acepção de diversidade empregada por

Sacristán (2003), relacionada à variedade, pluralidade, diferença,

heterogeneidade.

5.1.1. Conversando sobre Diferenças: entre o perceptível e o silenciado

Ao analisarmos os dados do Módulo Diversidade e Inclusão, verificamos dois movimentos: um no qual a discussão sobre as diferenças seriam fundamentais para a abordagem da diversidade e outro no qual

identificaríamos como e se a base de conhecimento para o ensino das professoras experientes se apresentava a esse respeito.

Sendo assim, analisamos as narrativas construídas no fórum de discussão a respeito do caso de ensino proposto. Primeiramente, analisamos como as diferenças eram percebidas pelas participantes, a partir da seguinte situação: