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Camila era uma menina de 10 anos. Sempre muito quieta, não tinha amigos, vivia a solidão em meio a tantas pessoas de sua aula de aula.

Ela não era a menina que a turma considerava bonita. Também não era tida como uma das melhores alunas e nem era engraçada. Camila era diferente.

Um dia, na sala de aula, a professora propôs à turma que formassem grupos para realizarem uma atividade. Os estudantes escolheram os parceiros e começaram o trabalho.

Camila pergunta a uma das meninas se pode fazer parte do grupo e recebe um não, com a justificativa de que “não há lugar para ela”.

Então, a menina procura a professora e conta o que aconteceu. A docente pede aos estudantes de um outro grupo para que deixem a menina participar.

Posto isto, indicamos a seguinte atividade: Olá, pessoal! Tudo bem?

Iniciaremos nossa conversa sobre diversidade e inclusão refletindo sobre as diferenças.

Para isso, leia o caso “A menina diferente” e o finalize respondendo às seguintes questões no fórum:

1. Se você fosse a professora o que faria? 2. Se estivesse no grupo o que faria? 3. E se você fosse a menina, faria o quê?

Após responder às questões, indique qual seria a “diferença” da menina.

Apresentamos a situação citada de forma ampla, sem muitos detalhes, para não direcionar a resposta de qual seria a diferença da menina,

justamente, para analisarmos quais diferenças eram percebidas pelas professoras e licenciandas como motivo para uma exclusão.

Por tratar-se de uma temática ainda pouco abordada nos cursos de formação inicial e continuada e que também encontra resistência na escola, procuramos proporcionar o posicionamento das participantes a partir do movimento de olhar a mesma situação por três ângulos diferentes: pelo viés da professora, de quem estivesse no grupo e da menina.

Nesse fórum tivemos 24 participantes, distribuídas em dois grupos, totalizando 118 postagens sobre a atividade proposta.

Com relação à primeira questão (o que fariam se fossem a professora do caso relatado), a maioria das participantes dos dois grupos indicaram que conversariam com o grupo que não aceitou a menina para acolhê-la e entender o que houve. Algumas professoras afirmaram que conversariam com a menina para saber sua opinião e para acalmá-la, como indicado no seguinte excerto:

Diante da resposta da outra aluna de que “não há lugar para ela”, no momento eu colocaria Camila em outro grupo, mas chamaria essa outra aluna em particular conversaria com ela sobre “se colocar no lugar do outro”. Em outro momento conversaria com a turma toda, a respeito de exclusão, inclusão, bullying, diversidade. Entraria nesse assunto com roda de conversa, livros, vídeos, relatos. (Professora Iniciante Sabrina, Fórum de discussão, Módulo Diversidade e Inclusão, outubro de 2016).

Muitas professoras e licenciandas apontaram que, infelizmente, a situação relatada no fórum se faz presente no cotidiano escolar. Para a maioria, as estratégias pedagógicas deveriam estar pautadas no diálogo e uma forma de evitar essas situações seria a professora formar os grupos. Pedagogicamente falando, a maioria dos grupos apontou que agiria como a professora do caso relatado. Outras indicaram que é preciso planejamento para organizar grupo e que conversar sobre a exclusão ocorrida também é importante.

Contudo, sabemos que, em sala de aula, as respostas que professoras e professores precisam dar às muitas demandas nem sempre são analisadas. A urgência desse ambiente é uma questão que necessita ser discutida, principalmente quando envolve situações de discriminação, racismo e exclusão. Professores/as podem errar em suas respostas muitas vezes, mas perceber o ocorrido, mesmo que tempos depois, é um grande passo. Para isso, atua fortemente o papel da reflexão.

O fato das participantes apontarem que se tratava de uma situação comum nas escolas, indica uma contradição: se a escola tem um discurso inclusivo, por que algumas crianças são excluídas por seus pares?

Para responderem ao modo como agiriam se estivessem no grupo que excluiu a menina e como reagiriam se fossem Camila, a maioria recorreu às suas vivências escolares, enquanto estudantes, como indicado:

Se eu fosse a menina, com certeza daria uma de durona e se percebesse rejeição, talvez eu nem me oferecesse para participar do grupo, sou uma pessoa muito insegura, mas as pessoas dizem que pareço ser justamente o contrário. Já tive problemas com preconceito e rejeição e acabei desenvolvendo uma “pseudo” arrogância por conta disso. Ao menor sinal de rejeição eu me defendo, não sofro, mas sei que quando era criança eu não era assim, sofria muito e acredito que toda criança quer ser aceita no grupo, por isso fica difícil responder qual atitude adotaria. (Licencianda Renata, Fórum de discussão, Módulo Diversidade e Inclusão, outubro de 2016).

O depoimento apresentado demonstra as marcas de exclusões e discriminações sofridas na escola e como aquele que é excluído sente-se. Depreendemos, a partir do exemplo dessa futura professora, que as diferenças podem ser constantemente transformadas em desigualdades. Mas de que diferenças estamos falando?

Na discussão ocorrida nos dois grupos de fórum, ao responder sobre qual seria a "diferença" apresentada pela menina, tivemos as seguintes recorrências: 30 apontaram se tratar de timidez, 27 de deficiência e 04 indicaram se tratar de cor/raça ou etnia. Destacamos que o início da discussão dos dois grupos demonstrou que as participantes apostaram em uma diferença relacionada a um comportamento (ser tímida). Depois de alguns posicionamentos, boa parte indicou que a diferença estava relacionada à deficiência, como exposto a seguir:

Pelo que percebi a menina parece ser tímida e não se enquadrar aos padrões mais populares no que tange a beleza e ao comportamento que é valorizado pelas crianças, por esse motivo não atrai o interesse de aproximação dos demais colegas. (Licencianda Renata, Fórum de discussão, Módulo Diversidade e Inclusão, outubro de 2016).

Acredito que a “diferença” da menina não deva ser apenas timidez. Há algo que vai além desta timidez, talvez a menina seja autista, devido ao comprometimento da interação social na sala de aula. (Professora Iniciante Fabiana, Fórum de discussão, Módulo Diversidade e Inclusão, outubro de 2016).

Esses apontamentos foram questionadas por uma das tutoras da ReAD, colocando o seguinte:

Olá, pessoal!!!

Algumas apontaram que Camila é tímida, somente. Outras estão cogitando sobre a possibilidade de possuir alguma deficiência intelectual. Será que apenas uma deficiência nos torna diferentes dos demais? Vamos continuar pensando... (Tutora Adriana, Fórum de discussão, Módulo Diversidade e Inclusão, outubro de 2016).

A partir do questionamento da tutora, a discussão começou a tomar outros caminhos e novas percepções sobre diferenças vieram à tona:

Ser diferente pode ser uma criança de outra etnia (uma criança negra, por exemplo), de origem de outra localidade (migrante ou imigrante, com outra cultura diferente da maioria das crianças). (Professora Iniciante Rute, Fórum de discussão, Módulo Diversidade e Inclusão, outubro de 2016).

Pensando sobre a menina do caso e qual a "diferença" que ela poderia ter, de acordo com minha vivência como professora, acredito que poderia ser uma deficiência física ou intelectual, ser uma aluna com dificuldade de aprendizagem, uma aluna que veio de outra escola ou de outro estado, por exemplo, e que apresenta diferenças no modo de vestir e de falar das outras crianças. (Professora Olívia, Fórum de discussão, Módulo Diversidade e Inclusão, outubro de 2016).

A discussão seguiu, com novos olhares sobre as diferenças e algumas professoras indicaram que observariam suas salas de aula e depois retornariam ao fórum. Pairavam dúvidas sobre o porquê a diferença não havia sido explicitada no caso. Como parte do processo formativo, as participantes foram instigadas a observarem outros marcadores de diferença, como apontado por mim, na atuação como tutora:

Vocês apresentaram alguns marcadores de diferença que dentro e fora da escola têm impacto direto no modo como somos tratados e como tratamos os outros, quais sejam: cultura, tipo de cabelo, comportamentos (ser tímido), ser gordo, o não aprender conteúdos, idade, não "ser popular", inteligência. Acrescento outros marcadores: cor de pele, classe social, religião, gênero, orientação sexual. Todos esses marcadores de diferença estão presentes em todas as nossas relações sociais e aprendemos por meio da família, da escola, da mídia como devemos responder a essas diferenças. (Tutora Eliana, Fórum de discussão, Módulo Diversidade e Inclusão, outubro de 2016).

A partir da postagem da professora iniciante e da intervenção das tutoras, algumas cursistas indicaram outras diferenças, incluindo aquelas relacionadas à cultura, cor ou etnia, como demonstrado a seguir:

Quanto a que diferença a menina poderia ter, concordo com a (...) , quando ela coloca que diferença pode ser uma etnia, provavelmente, pelo relato esta menina deve ser uma criança negra e está sendo discriminada pela sala pela sua cor. (Licencianda Franciele, Fórum de discussão, Módulo Diversidade e Inclusão, outubro de 2016).