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2 O QUE DETERMINA O SIGNIFICADO NA TEORIA DOS ATOS DE

2.6 Base dos Atos de Fala: Phone, Pheme e Rheme

Nesta parte, Austin reitera os conceitos dos atos. Em seu ponto de vista, o simples fato de produzir alguns ruídos é denominado de ato fonético e o proferimento sendo um phone.33 Seriam assim quaisquer ruídos sem necessariamente um significado ou sentido e referência ou uma construção gramatical. Já o ato fático consiste em um proferimento na produção de determinados ruídos pertencentes a um vocábulo e em conformidade com uma certa gramática. Para sermos mais específicos, ele afirma o ato fático consiste no ato de proferir certas palavras, pertencentes a um determinado vocabulário, em uma determinada construção, em conformidade com uma determinada gramática, e também com uma determinada entonação. E o proferimento que dele resulta é chamado de “pheme”.

O ato rético consiste na emissão desses vocábulos com um certo sentido e referência. Normalmente, expõe-nos Austin, realizar o ato de usar esse pheme ou suas partes constituintes com um certo sentido e uma referência mais ou menos definidos é realizar o ato que ele chama de rético. O proferimento resultante desse ato é denominado de rheme.

Como bem nos fala Marcondes, em uma nota de rodapé no livro por ele traduzido, os termos acima cunhados de forma técnica por Austin têm sua origem na língua grega clássica.34 Temos ‘phone” vindo do substantivo grego “phoné” que significa som, voz. O termo “fático” vem do substantivo “phatis” que significa “aquilo que é dito”. Já o termo

33 Não todos os tipos de ruídos? Poderia ser sim, embora Austin esteja interessado em apenas um tipo de ruído. 34 Cf. AUSTIN, 1990, p.83.

“pheme” vem do substantivo “pheme” que significa também “algo que é dito”, no entanto, o verbo “phemé” significa “dizer”, “afirmar”, “declarar”, etc. O termo “rético” (rhetic) vem do substantivo “rhema” que significa “aquilo que é dito”.

A princípio não se sabe bem o que ele quis dizer com um sentido e referência mais ou menos definidos. Isso se referiria aos casos de falta de referência e de nonsense? Ou simplesmente ele expõe dessa forma para deixar posto que o ato rético ainda assim não é um ato de fala? Mas se ele ainda assim não é um ato de fala, então qual seria a relação entre esses atos e os atos locucionários até se formarem os atos ilocucionários? Eu iria dizer que a força ilocucionária seria um aspecto que talvez faltasse nos atos réticos, entretanto, se assim o fosse, os atos réticos seriam equivalentes aos atos locucionários (algo que não parece que sejam). Tendo isso em vista, o que diferenciaria o ato rético do ato locucionário? O ato locucionário seria uma proposição sem força ilocucionária? E se eles forem uma proposição, então o que seriam os atos réticos?

Os pontos acima são, de certa forma, respondidos como se segue. É importante tomar nota dos seguintes pontos postos por Austin. Ele afirma (1) que para realizar um ato fático deve-se realizar um ato fonético ou que ao realizar um está se realizando o outro, deixando explícito que os atos fáticos não são uma subclasse dos atos fonéticos. Conta-nos por meio do exemplo de um macaco emitindo um ruído que se pareça com a palavra “vou”, que não consiste em um ato fático, e que a afirmação inversa não é verdadeira. Também (2) na definição do ato fático há a mescla do vocabulário e da gramática, se, por exemplo, alguém diz “gato inteiramente o se”. Além da gramática e do vocabulário a entonação também conta. Aqui ele fala da sintaxe, isto é, é preciso ter em mente que há uma sequência que as palavras devem seguir.

E (3) assim como o ato fonético, o ato fático é imitável, através da entonação, de caretas, de gestos, entre outros. Ele exemplifica como imitar um proferimento entre as aspas, tal como “Ela tem um lindo cabelo” e “Ela tem um lindo cabelo” juntamente com uma careta como parte da imitação. Como nós havíamos pensado anteriormente, Austin distingue os tipos de atos em discurso direto e indireto, no caso, o discurso direto seria referente ao ato fático e o discurso indireto referente ao ato rético. Tenho em mente que talvez seja uma tentativa de elucidar as diferenças quanto ao uso da referência e do sentido e a menção à referência e ao

sentido, ou seja, ao falar que o discurso direto seria a emissão de um ato fático, tal como “Ele disse: - O gato está sobre o tapete.”.

O pheme é posto como unidade da linguagem e a deficiência dele é carecer de sentido. O rheme é visto como unidade da fala, a deficiência dele é ser impreciso, vago ou obscuro. O mesmo pheme pode ser utilizado em ocasiões diferentes de proferimentos com diferente referência e sentido, isso pode ser visto como atos reticamente equivalentes, apesar de não poder falar do mesmo rheme ou dos mesmos atos réticos.

Aqui não importa muito a questão sobre quando um “pheme” ou um “rheme” é o mesmo que outro, seja enquanto “tipo” ou enquanto instância particular, nem a questão sobre no que consiste um único “pheme” ou “rheme”. Mas, naturalmente, é importante lembrar que o mesmo “pheme” (instância do mesmo tipo) pode ser utilizado em diferentes ocasiões de proferimento com diferentes sentidos ou referências, e assim constituir-se num “rheme” distinto. Quando diferentes “phemes” são usados com o mesmo sentido e referência, podemos falar de atos reticamente equivalentes (em certo sentido, “a mesma declaração”) mas não podemos falar do mesmo “rheme” ou dos mesmos atos réticos (que constituem a mesma declaração em outro sentido que envolve o uso das mesmas palavras). (AUSTIN, 1990, p.87-8)

Ao falar desse problema, Austin expõe os conceitos de pheme e rheme, isto é, o mesmo pheme pode aparecer com diferentes sentidos e/ou referências, deste modo seria um rheme diferente. Por outro lado, diferentes phemes podem ser usados com o mesmo sentido e referência, podendo-se falar de atos reticamente equivalentes, embora não se possa falar do mesmo rheme ou do mesmo ato rético. Ele aborda de forma bastante elucidativa os termos postos da base dos atos de fala, inclusive, tratando da questão tradicional do type and token. Veremos a seguir como exatamente se encaixam os termos apresentados e se eles, realmente, são relevantes para uma teoria dos atos de fala.