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Concluimos que a ética e a moral não são aspectos cruciais nas práticas linguísticas como parece supor Austin, a partir disso, podemos concluir também que nas práticas linguísticas nem sempre os pensamentos e sentimentos são verdadeiramente expostos na enunciação. Isso quer dizer que, nas práticas linguísticas, os usos insinceros dos atos de fala são bastante comuns e isso também deveria ser levado em consideração. Essas são questões que merecem uma análise e discussão mais profundas, mas nossa proposta não é bem explanar essas questões neste trabalho, mas apenas fazer uma crítica geral das teorias dos atos de fala de Austin e de Searle.

É certo que não é uma necessidade que a significação dos enunciados tenha como base fundamental os estados Intencionais. Não é nem uma necessidade lógica e nem uma necessidade metafísica, não obstante, os estados Intencionais e outros aspectos extralinguísticos92 são condições de adequação, condições suficientes e condições de satisfação para que possamos entender como funciona a significação no âmbito das práticas linguísticas. O trabalho seguido por nós teve como principal característica demonstrar de que modo, a partir das duas principais teorias dos atos de fala, alguns elementos subjacentes são cruciais na significação. Julgamos que o nosso objetivo foi alcançado com êxito, pois seguimos as exposições dos dois autores como forma de demonstrar os elementos extralinguísticos fundamentais na significação de um proferimento. Embora haja diferenças no objetivo, no método e na concepção dos atos de fala, pudemos perceber que os elementos subjacentes nas práticas linguísticas são fundamentais nos dois filósofos. Não há dúvidas de que há muito ainda a ser investigado. Conforme tentamos explicitar, por exemplo, há categorias da análise da significação que precisam ser devidamente discutidas de forma ampla e exaustiva. Um exemplo a ser visto seriam os nomes de objetos naturais, tendo em vista que podemos designar, pelo menos aparentemente, objetos naturais sem um estado psicológico como quis demonstrar Putnam em “The Meaning of Meaning”. Por mais que

92 Embora tenhamos feito a separação entre linguístico e extralinguístico, essa separação não é tão nítida quanto

parece. Algumas questões que possam parecer extralinguísticas poderiam muito bem ser enquadrada como linguístico, por exemplo, a influência do Background no entendimento das ocorrências do verbo “cortar” são entendidas juntamente com um Background de capacidades ou habilidades. A linha entre linguístico e extralinguístico é muito tênue, mas não nos coube explorar essa questão neste trabalho.

tenhamos citado Putnam e nos referido ao significado na cabeça, não nos coube aqui fazer uma discussão aprofundada no assunto. Porém, pudemos notar que as cabeças são extremamente importantes no que concerne às práticas linguísticas. A teoria da intencionalidade nos mostra bem que em contexto de enunciação, crenças, desejos, intenções, pressuposições são fundamentais para o significado na teoria dos atos de fala.93 Além do mais, no que concerne ao significado de frases não-literais, demonstra mais explicitamente a importância da intencionalidade e do Background na significação.

Embora Searle e Austin tenham métodos diferentes e objetivos diferentes, as duas concepções de atos de fala são bastante ricas no que concerne ao esclarecimento e desenvolvimento do entendimento das práticas linguísticas. Por um lado, acreditamos que o método austiniano (e dos filósofos de Oxford) de buscar no uso o significado dos termos auxilia bastante na compreensão de problemas filosóficos e põe as grandes questões filosóficas no âmbito das interações sociais. Por outro lado, acreditamos que a teoria dos atos de fala posta no âmbito das discussões tradicionais da filosofia da linguagem, proporciona- nos um entendimento e uma riqueza na discussão com teorias discutidas pelos filósofos chamados de formalistas.

Mas, então, o que determina o significado de um proferimento performativo? Bem, diríamos que há muitas coisas que precisamos levar em consideração para que possamos entender o significado de um proferimento performativo. Deixando um pouco de lado muitas outras questões que merecem ser discutidas tal como o sentido e a referência, extensão e intensão, predicação, entre outras. O que objetivamos discutir neste trabalho foram justamente aspectos extralinguísticos que precisam ser levados em consideração para que possamos desenvolver uma discussão mais acurada sobre esses outros problemas da filosofia da linguagem. Isso será feito em um trabalho posterior. O nosso propósito consistiu em, além de mostrar os aspectos que influenciam o entendimento de enunciados, tais como as circunstâncias, os procedimentos, os estados Intencionais, o Background, mostrar também que a linguagem ordinária, embora possa trazer vagueza, ambiguidade, falta de sentido, do mesmo modo possibilita uma riqueza contigente de formas de significações com recursos linguísticos em enunciados literais e também em formas mais complexas, tais como a ironia, a metáfora, o humor, entre outros. Para alguns, esses recursos podem ser vistos como um grande problema,

se acaso pensarmos em adequá-los a uma teoria idealizada, porém, de modo inverso, se buscarmos adequar uma teoria ao funcionamento das práticas linguísticas, podemos compreender os processos cognitivos que permitem uma gama de possibilidade que um falante tem nas práticas linguísticas.

No capítulo dedicado a Austin, decidimos seguir o caminho percorrido no livro “Quando Dizer É Fazer” porque julgamos que o método de exposição do autor continha elementos importantes em sua concepção dos atos de fala como também a riqueza da discussão proporcionada por esse recurso, além de podermos introduzir e desenvolver a discussão do tema. O fato de Austin ter enfatizado a dicotomia performativo/constativo nos proporcionou, além da explicitação do método austiniano e introduzir o tema, analisar a concepção tradicional formalista e mostrar as nuanças dos aspectos circunstanciais de uma enunciação. No capítulo 2, decidimos mostrar e discutir a base da sistematização de Searle que consiste na sua teoria da mente, que envolve conceitos centrais para a sua teoria dos atos de fala como a Intencionalidade, função de status, o Background e a Rede.

O terceiro capítulo consistiu em apresentar os aspectos gerais da teoria dos atos de fala na concepção searleana para, no quarto capítulo, fazermos uma comparação das distinções entre as duas concepções dos atos de fala. Isso nos proporcionou demonstrar no decorrer da discussão, por meio de uma explanação geral das duas teorias, como os aspectos extralinguísticos são fundamentais no entendimento de um proferimento performativo. Acreditamos que conseguimos demonstrar a tese que defendemos que são (i) o contexto como aspecto crucial para as teorias dos atos de fala, (ii) a primeira tese nos conduz a defender os aspectos extralinguístico como fundamentais na compreensão do significado nas teorias dos atos de fala (tais como crenças, desejos, pressuposições, intenções, status dos participantes, entre outros) e (iii) a teoria dos atos de fala é uma concepção pragmática essencial para compreendermos o funcionamento das práticas linguísticas.

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