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BASE LEGAL DA COOPERAÇÃO INTERNACIONAL E O PROGRAMA DAS NAÇÕES UNIDAS PNUD

CAPÍTULO 2 COOPERAÇÃO TÉCNICA INTERNACIONAL, PRIVILÉGIOS E IMUNIDADE DE JURISDIÇÃO

2.1 BASE LEGAL DA COOPERAÇÃO INTERNACIONAL E O PROGRAMA DAS NAÇÕES UNIDAS PNUD

A Cooperação Técnica Internacional prestada pelos organismos internacionais tem como base legal o 'Acordo Básico de Assistência Técnica entre o Governo dos Estados Unidos do Brasil e a Organização das Nações Unidas', promulgado pelo Decreto nº 59.308, de 23/09/6638, e a 'Convenção sobre Privilégios e Imunidades das Agências Especializadas das Nações Unidas', promulgada pelo Decreto nº 52.288, de 24/07/6339.

Na 'Convenção sobre Privilégios e Imunidades' é estabelecido que os organismos internacionais, incluídas as 'Agencias Especializadas', possuem personalidade jurídica própria, a qual se situa no campo do direito internacional.

A esses organismos é atribuída inviolabilidade de suas instalações, arquivos e documentos sendo isentos de impostos diretos e direitos alfandegários. Em matéria de comunicações oficiais, o tratamento à eles destinados deve ser o mesmo dispensado às missões diplomáticas dos governos estrangeiros. Os funcionários destas Agências gozam de isenção de impostos quanto aos salários e vencimentos dela recebidos.

No 'Acordo Básico de Assistência Técnica entre o Brasil e a ONU', consta que a prestação de assistência técnica se condiciona à existência de fundos e se baseia em pedidos apresentados pelo Governo e aprovados pelos organismos. Prevê o 'Acordo' que a assistência técnica poderá incluir serviços de peritos e qualquer outra forma de assistência técnica que venha a ser acordada entre o país e os organismos. Para os fins do 'Acordo' a expressão 'perito' compreende qualquer pessoal de assistência técnica designado pelos organismos.

O Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento - PNUD tem por objetivo principal auxiliar os países de baixo rendimento a adquirirem conhecimentos técnicos científicos, contribuindo desta forma para a utilização, cada vez mais eficaz, dos elementos do crescimento econômico (capitais, mão-de-obra, tecnologia, etc.). A cooperação do PNUD, normalmente, é fornecida a pedido dos governos e de acordo com a urgência de suas necessidades.

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BRASIL. Ministério das Relações Exteriores. Agência Brasileira de Cooperação. Cooperação Técnica Internacional: projetos de destaque. Disponível em: < http://www.abc.gov.br/ct/projetos_destaque.asp>. Acesso em: 27 jan. 2006.

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O trabalho se desenvolve na medida em que se constata que a utilização dos acordos internacionais pelos órgãos da Administração Pública, que tem se utilizado destes Organismos como meio de contratação de pessoal para o desempenho de tarefas típicas das Unidades/Entidades, sem necessidade da realização de concurso público, exigência essa prevista na nossa Carta Magna.

A justificativa freqüente para a realização dos acordos de cooperação técnica tem sido a necessidade de acesso a consultorias especializadas, com padrões de qualidade mais elevados, não disponíveis no serviço público.

Todavia, tais argumentos ficam desprovidos de qualquer consistência, visto que, além das contratações não se restringirem a especialistas, são raros os consultores estrangeiros contratados, e os nacionais, em sua maioria, são oriundos de instituições públicas das diversas esferas, ou aposentados pela própria Administração Pública que retornam, muitas vezes, aos seus órgãos de origem por intermédio das agências externas.

Conforme já demonstrado, cada órgão internacional dispõe de normas e procedimentos que regulam essas contratações, não havendo, portanto, uniformidade nos critérios utilizados, o que de certa forma, contribui para a inobservância dessas disposições por parte dos órgãos executores (Administração), que contam, inclusive, com a anuência dos próprios organismos.

A ausência de critérios desses procedimentos revela a necessidade de se estabelecer padrões mais claros e objetivos para orientar a ação de Diretores e Coordenadores, dando-se, inclusive, maior publicidade quando da seleção de pessoal necessário à execução desses projetos, conciliando as regras estabelecidas pelos organismos internacionais com as normas internas do País.

O que se observa é uso deste mecanismo para suprir ausência de servidores, tendo como via, os organismos internacionais, sem as exigências legais impostas pela Constituição Brasileira e com salários acima do mercado e com tarefas que estão fora dos acordos de cooperação técnica assinado pelo Governo Brasileiro.

Não obstante, há uma necessidade de maior conscientização, por parte dos órgãos de governo, de que a situação se agrava e se torna mais preocupante, quando se sabe que essa prática vem sendo adotada pela Administração Pública, de forma generalizada, privilegiando a contratação de profissionais, mediante Acordos Internacionais, selecionados com critérios mais flexíveis e salários mais elevados, em detrimento da classe de servidores públicos, não respeitando a Constituição Federal, normas de direito administrativo, tributário e trabalhista.

O maior contratante de serviços no Brasil é o PNUD – Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento, que tem como objetivo principal o combate a pobreza e o desenvolvimento entre os Países que buscam uma maior integração com os Países do Norte, na busca de promoção da governabilidade democrática e apóia a implantação de políticas públicas.

Como instituição multilateral e uma rede global presente hoje em 166 países, está então consciente de que nenhuma nação pode gerir sozinha a crescente agenda de temas do desenvolvimento. Advogado das mudanças necessárias para a sustentabilidade do planeta e melhores condições de vida dos povos, o PNUD conecta países a conhecimentos, experiências e recursos, ajudando pessoas a construir uma vida mais digna e trabalhando conjuntamente nas soluções traçadas pelos países membros, para fortalecer as capacidades locais e proporcionar acesso tanto aos recursos humanos, técnicos e financeiros do PNUD e da cooperação externa quanto à sua ampla rede de parceiros: governos nacionais e locais, terceiro setor, universidades e centros de excelência, setor privado, outros organismos internacionais.

Suas ações estão focadas em meio ambiente e a modernização do Estado Brasileiro e foram estes Acordos de Cooperação Técnica Internacional que se transformaram em objetos de investigação dos órgãos fiscalizadores do Governo Brasileiro, matéria versada nesta dissertação, tendo o PNUD como interlocutor e articulador junto a países, organizações públicas e privadas, agências de fomento e instituições financeiras, contribuindo para a transferência de conhecimentos entre os variados atores do desenvolvimento.

A atuação junto ao Governo Brasileiro não é de forma pontual, pois é realizado um conjunto de ações preparatórias para identificar os objetivos e oportunidades dentro de uma visão integrada para o cumprimento de metas que visam atingir níveis de desenvolvimento em setores, considerados críticos, pela Agência e o Governo Brasileiro.

A parceria PNUD / Governo brasileiro é viabilizada por meio de um documento de projeto - conhecido como PRODOC, que descreve a mudança desejada em termos de produtos, resultados específicos e atividades, com seus respectivos orçamentos e cronogramas. O compromisso do PNUD é com a transparência das ações e a mensuração de resultados: cada projeto é idealizado com os mecanismos de gestão apropriados, incluindo a prestação de contas, e os cenários desejados ao final de sua execução40.

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PROGRAMA DAS NAÇÕES UNIDAS PARA O DESENVOLVIMENTO – PNUD BRASIL. Conheça o PNUD: projetos. Disponível em: < http://www.pnud.org.br/projetos/>. Acesso em: 27 jan. 2007.

A realização dos Acordos é norteada por equipes do PNUD e a Instituição Requisitante que elabora o projeto, conforme as Diretrizes da Agência Brasileira de Cooperação Técnica Internacional, que após várias etapas de preparação são findados com a assinatura do PRODOC, sendo um documento que expressa os objetivos da cooperação, mas que deve ser sempre ajustado ou complementado como necessário.

Existem órgãos de controle dentro do PNUD e paralelo a ele no Governo Brasileiro através da ABC, setor ligado ao Ministério das Relações Exteriores, que fiscalizam a implantação do objeto da Cooperação.

Atualmente o PNUD desenvolve inúmeros projetos, porém possui um histórico de trabalho junto ao Governo Brasileiro, que são organizados da seguinte forma:

a) Projetos de desenvolvimento local já foram implantados em 58 municípios, 720 organizações foram incentivadas e 13.908 produtores capacitados, graças ao trabalho conjunto de 150 parceiros identificados e coordenados pelo PNUD. Trata-se de iniciativas para expandir as condições de cidadania plena e estimular a abertura de novas oportunidades sócio-econômicas e políticas nas localidades com baixo IDH.

b) Em parceria com o SEBRAE (Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas), foi implementado o EMPRETEC (Programa de Desenvolvimento de Empreendedores), que já orientou mais de 50 mil pessoas a montar e administrar negócios próprios.

c) Em parceria com o Ministério da Educação, o PNUD apoiou a implantação do Programa Pró-formação, que emprega ensino à distância e presencial para certificação de professores leigos do ensino fundamental. Nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste, até 2002, cerca de 23 mil professores das escolas públicas de 1,4 mil municípios já concluíram o curso.

d) O projeto INTERLEGIS, feito em parceria com o Congresso Nacional, atua para integrar o Legislativo e torná-lo mais transparente e próximo da sociedade. Os meios utilizados são Internet, videoconferência e transmissão de dados. Mais de 1.100 Câmaras Municipais já receberam computadores e impressoras do INTERLEGIS para se conectarem a Internet, usarem correio eletrônico e colocarem suas informações à disposição dos cidadãos. A meta é integrar 2.500 casas legislativas.

e) Em parceria com o Ministério da Fazenda, o PNUD implementou em 23 estados brasileiros o PNAFE (Programa Nacional de Apoio à Administração Fiscal para os Estados brasileiros), planejado para aumentar a arrecadação por meio da racionalização do sistema, combate a fraudes e sonegações e melhorar o serviço prestado aos contribuintes.

f) Experiências bem-sucedidas do Brasil no campo da prevenção e do combate ao vírus HIV foram repassadas, com a ajuda do PNUD, ao governo de Botswana - país com maior índice de pessoas infectadas pelo vírus no mundo. Uma das ações promove a capacitação à distância de professores, tornando-os agentes sociais na prevenção do HIV41.

Como a Cooperação Técnica Internacional é regida pelas regras internacionais, o tema privilégios e imunidades de jurisdição se tornam fator fundamental para compreensão e delimitação e compreensão do problema de pesquisa, pois o Estado Brasileiro, ao firmar diversos acordos com os Organismos Internacionais, acabou trazendo o tema para ser discutido em virtude dos efeitos jurídicos que essas relações resultaram.

No plano das Relações Internacionais o tema não pacífico e a doutrina debate exaustivamente os critérios para definição das Imunidades a partir dos casos concretos que vão surgindo para nortear os Agentes internos e externos. Foi esclarecido que as imunidades tiveram uma primeira formulação através de costumes, que consagraram a regra par in parem non habet judicium, regra essa que teria sua reformulação nos séculos posteriores, nas formas das imunidades absolutas e das imunidades relativas42. (grifo nosso)

Então, deve-se promover uma discussão se os organismos internacionais devem responder pelas contratações irregulares em conjunto com a União, parceira da Cooperação e se as imunidades reconhecidas em Convenções e em Tratados devem se sobrepor ao ordenamento jurídico interno.

É inquestionável a importância da Imunidade de Jurisdição, já que os Estados tendem a se aproximar cada vez mais e é importante estabelecer critérios para atividade do Estado, tanto no plano interno e internacional.

O desenvolvimento das relações internacionais, a crescente realidade dos processos de integração e a inexorável interdependência das nações são fatores que informam permanente atualização de conceitos e práticas na consecução da atividade jurisdicional dos Estados. A adequação e a busca do equilíbrio na aplicação da regra par in parem non habet judicium, com a solução de conflitos decorrentes da atividade estatal, continuam a desafiar a reflexão dos operadores do Direito43. (grifo nosso)

Diante do fenômeno de aproximação dos países em desenvolvimento e os Organismos Internacionais, o Direito Internacional Público é o regulador destas relações e dos conflitos que surgem, e discutem os efeitos das imunidades.

Colocando as coisas em termos já de início, considerando que há, hoje, um assentamento da idéia da imunidade e das suas conseqüências, no que se refere ao Estado estrangeiro e à sua presença diante da jurisdição local, procurando

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PROGRAMA DAS NAÇÕES UNIDAS PARA O DESENVOLVIMENTO – PNUD BRASIL. Conheça o PNUD: projetos. Disponível em: < http://www.pnud.org.br/projetos/>. Acesso em: 27 jan. 2007.

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SOARES, F. S. G. Origens e justificativas da imunidade de jurisdição. Brasília: CEDI, 2002. p. 25.

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BASTOS, C. E. C.; MADRUGA FILHO, A. P. A prática da imunidade dos Estados: perspectiva brasileira. Brasília: CEDI, 2002. p. 9

estabelecer o confronto entre a situação do Estado estrangeiro e aquela da organização internacional, a pergunta é esta: no que se refere às organizações, há uma tendência a que as coisas se definam de modo uniforme e se estabilizem dessa maneira, como acontece com o Estado estrangeiro?44

As missões diplomáticas e as Repartições consulares é que se encontravam acobertados pelas Convenções de Viena de 1961 e 1963, a aplicação destas não ensejou maiores problemas45.

Na verdade, o tema da presença do Estado estrangeiro perante a Justiça nacional tem sido tratado, no Brasil, de forma inadequada, os doutrinadores apegando-se a distinções acta jure imperii e acta jure gestionis, mas a Jurisprudência, aferrando-se à teoria da imunidade absoluta, por considerar o Estado estrangeiro totalmente imune aos Poderes Judiciários brasileiro (e sempre, partindo da assunção de que são atos regidos por aquelas Convenções de Viena):

a) a de inadimplência de contratos passados entre uma Missão diplomática em Brasília ou uma Repartição consular e um particular brasileiro ou estrangeiro mas domiciliado em território nacional, sendo os mais freqüentes, os relativos a construção de edifícios e a locação de imóveis; b) responsabilidade civil por danos causados em acidentes de automóveis, veículos oficiais de Governos estrangeiros e/ou a seu serviço e c) um sem número de questões trabalhistas, suscitadas por contratos de trabalho entre pessoas domiciliadas no Brasil e que se encontravam empregadas a serviço de embaixadas ou Repartições consulares de Governos estrangeiros no Brasil, para trabalho a ser prestado em território nacional46. (

O Supremo Tribunal Federal no caso Geny de Oliveira tendo como relator do Recurso Extraordinário, o Ministro Francisco Rezek, traduz os fundamentos transcritos:

c) o fundamento da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, em relação às imunidades do próprio Estado (como no caso sub judice, nas relações trabalhistas), se tinha firmado numa regra costumeira então vigente, das imunidades absolutas do Estado estrangeiro perante os tribunais brasileiros, regra essa que deixou de existir a partir de 1972, com a edição da Convenção Européia da Basiléia sobre as imunidades do Estado, reafirmada com as leis dos EUA e do Reino Unido, que introduziram temperamentos na teoria da imunidade absoluta do Estado estrangeiro47.

A regra costumeira que fundamentava a jurisprudência do Supremo Tribunal deixou de existir e houve a necessidade de reorientar os novos entendimentos, pois não se encontra mais fundamento. O Caso Geny de Oliveira serviu de precedente para o Superior Tribunal de Justiça, a Apelação Cível nº 2 (89.8751-7), apelante, a Embaixada dos EUA em Brasília e apelados, Paulo da Silva Valente e outro. Transcrevemos o acórdão:

Imunidades de Jurisdição. Reclamação Trabalhista intentada contra Estado estrangeiro. Sofrendo o princípio da imunidade absoluta de jurisdição certos temperamentos, em face da evolução do direito consuetudinário internacional, não é ela aplicável a determinados litígios decorrentes de relações rotineiras entre Estado estrangeiro e os súditos do país em que o mesmo atua, de que é exemplo a

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REZEK, F.A imunidade das organizações internacionais no século XXI. Brasília: CEDI, 2002. p. 13.

45

SOARES, F. S. G. Origens e justificativas da imunidade de jurisdição. Brasília: CEDI, 2002. p. 61

46

Ibid.

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reclamação trabalhista. Precedentes do STF e do STJ. Apelo a que se nega provimento48.

O mau uso da imunidade e ingerência indevida do Estado em negócios particulares, o crescimento do Estado empresário parece que resultou em prejuízo para o instituto, no entanto tudo indica, que deve voltar a ser adotada, quando se utilizar critérios e leis internas que adotem o direito internacional e seus princípios diante do fenômeno da união dos países e necessidade de igualar os desiguais.

A imunidade à jurisdição e execução locais e seus consectários processuais que contemplam Estados estrangeiros, organizações internacionais governamentais, incluindo seus agentes políticos e demais operadores oficiais, é, a nosso juízo, em toda sua essencialidade, tema flagrante e eminente de direito internacional público49.

Com o costume que o Estado não erra, forja-se a concepção da imunidade absoluta de qualquer funcionário perante o ordenamento jurídico interno.

A imunidade não pode ser invocada quando houver prejuízo a particulares e desobediência às normas internas o país, o serviço público, ao que demonstra a pesquisa acabou sendo utilizado de forma inadequada aos interesses da União e aos Organismos Internacionais que, por sua vez, acabaram sendo demandados pelos tribunais trabalhistas e aos instrumentos de controle do Estado Brasileiro.