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Benefícios da adoção do procedimento de manifestação de interesse

2 O PROCEDIMENTO DE MANIFESTAÇÃO DE INTERESSE

2.3 Benefícios da adoção do procedimento de manifestação de interesse

Durante a fase de planejamento de uma contratação, a administração pública pode buscar ideias e soluções da iniciativa privada para formatação do projeto por meio do procedimento de manifestação de interesse.

Por iniciativa própria ou do setor privado, o Estado pode publicar chamamento público oportunizando aos interessados a apresentação de estudos, investigações, levantamentos e projetos acerca de determinado objeto definido pela administração. Posteriormente, as propostas apresentadas são analisadas e o administrador público seleciona os estudos considerados relevantes para embasar a modelagem da licitação, caso se entenda pela sua viabilidade e conveniência. As propostas selecionadas serão remuneradas, caso efetivamente utilizadas pela administração, pelo vencedor da eventual licitação.

Como dito, pressupõe-se que a interação da administração pública com o setor privado para o planejamento de futuras contratações pode contribuir para melhoria da atuação administrativa na medida em que possibilita que o Estado utilize as informações do setor privado na sua tomada de decisão. Augustín Gordillo afirma que a preparação unilateral dos editais pela administração traz, entre outros problemas, o desconhecimento da realidade comercial, o que pode encarecer a contratação.125

Observa-se que os espaços de inconformismo do contratado, durante a execução do contrato, acerca das soluções e opções adotadas no projeto são reduzidos na medida em que, com essa abertura procedimental, ele pode “influenciar e conhecer o processo decisório que resultou no objeto final”. 126

124 DAL POZZO, Augusto Neves. Procedimento de manifestação de interesse e o planejamento estatal de infraestrutura. Fórum de Contratação e Gestão Pública – FCGP, Belo Horizonte, ano 13, n. 150, jun. 2014. Disponível em: <http://bid.editorafor.com.br/bid/PDI0006.aspx?pdiCntd=119928>. Acesso em: 28 abr. 2015.

125GORDILLO, Augustín. Tratado de derecho administrativo. Tomo 2. La defensa del usuário y del

administrado. Belo Horizonte: Del Rey,2003. p. XII-21.

126 GARCIA, Flávio Amaral. A mutabilidade e incompletude na regulação por contrato e a função integrativa das Agências. Revista de Contratos Públicos – RCP, Belo Horizonte, ano 3, n. 5,

mar./ago. 2014. Disponível em: <http://bid.editoraforum.com.br/bid/PDI0006.aspx?pdiCntd=181532>. Acesso em: 30 jan. 2015.

Ainda que o participante do PMI não seja o contratado ao final da licitação, há vantagens na interação entre a administração e o setor privado, uma vez que um diálogo prévio referente à viabilidade do projeto, às melhores técnicas e soluções para os problemas detectados, permite o amadurecer da decisão administrativa.

Ademais, ao se ter em consideração o modelo atual de contratação por desempenho das Parcerias Público-Privadas (Lei nº 11.079/04)127 e do Regime Diferenciado de Contratações Públicas - RDC (Lei 12.462/11)128 é relevante a contribuição privada acerca dos sistemas remuneratórios e dos demais parâmetros adotados, criando uma colaboração recíproca, que coloque “em prática a premissa de que, se bem executado, o contrato produz vantagens e benefícios para todos os interessados”129.

Ao escreverem sobre a necessidade de reforma da Lei de Licitações e Contratos, Carlos Ari Sundfeld e Floriano de Azevedo Marques Neto sugerem como diretrizes:

A outorga às autoridades de poderes para buscar soluções negociadas com particulares, em procedimentos passíveis de controle, é positiva para que se alcance um índice mais elevado de cumprimento de obrigações, para diminuir incertezas e para eliminar ou abreviar conflitos. É viável produzir, em lei, uma disciplina desses poderes que seja capaz de conciliar a flexibilidade de que a autoridade precisa para poder negociar com as limitações indispensáveis à proteção do interesse geral.130131

127

A Lei nº 11.079/04 determina a indicação dos critérios objetivos de avaliação do desempenho do

parceiro privado como elemento indispensável do instrumento de contrato (art. 5º, VII) e prevê a possibilidade de que a remuneração do parceiro privado seja variável, vinculada ao seu desempenho (art. 6º, parágrafo único) (BRASIL, 2004).

128 Art. 10. Na contratação das obras e serviços, inclusive de engenharia, poderá ser estabelecida remuneração variável vinculada ao desempenho da contratada, com base em metas, padrões de qualidade, critérios de sustentabilidade ambiental e prazo de entrega definidos no instrumento convocatório e no contrato. (BRASIL, 2011).

129 GARCIA, Flávio Amaral. A mutabilidade e incompletude na regulação por contrato e a função integrativa das Agências. Revista de Contratos Públicos – RCP, Belo Horizonte, ano 3, n. 5,

mar./ago. 2014. Disponível em: <http://bid.editoraforum.com.br/bid/PDI0006.aspx?pdiCntd=181532>. Acesso em: 30 jan. 2015.

130 SUNDFELD, Carlos Ari; MARQUES NETO, Floriano de Azevedo. Uma nova lei para aumentar a qualidade jurídica das decisões públicas e seu controle. In: SUNDFELD, Carlos Ari. Contratações

públicas e seu controle. São Paulo: Malheiros, 2013. p. 279.

131 Também reconhecendo a eficiência da atuação do setor privado na modelagem dos projetos, foi vetado o inciso II do artigo 11 da Lei de Parcerias Público-Privadas que permitia apenas a elaboração do projeto executivo pelo parceiro privado, ficando a administração encarregada pelo projeto básico das obras, ao argumento de que “As parceiras público-privadas só se justificam se o parceiro privado puder prestar os serviços contratados de forma mais eficiente que a administração pública. Este ganho de eficiência pode advir de diversas fontes, uma das quais vem merecendo especial destaque na experiência internacional: a elaboração dos projetos básico e executivo da obra pelo parceiro privado. Contratos de parcerias público-privadas realizados em diversos países já comprovaram que

2.3.1 Benefícios para a administração pública

Além da eficiência na modelagem da licitação, mediante a utilização da

expertise do setor privado, no procedimento de manifestação de interesse a

administração não remunera diretamente o particular pelos estudos realizados. Conforme expressão utilizada por Carlos Pinto Coelho Motta, trata-se de um expediente de “desorçamentação”132.

Obviamente que o vencedor da licitação precifica o pagamento dos estudos no valor oferecido pela outorga, o que no final do processo faz com que o valor dos estudos seja suportado pelo poder público. No entanto, não é preciso um comprometimento prévio orçamentário para elaboração dos projetos.

Assim, a administração utiliza as ideias provenientes do setor privado na modelagem da licitação e a remuneração é devida apenas quando e se for firmado o contrato, não havendo ônus direto a ser suportado pelo Estado, o que tende a incentivar e acelerar os projetos administrativos.

O propósito é homenagear a eficiência por meio da contribuição privada, com a transferência ao eventual contratado dos custos de elaboração dos estudos e o reembolso apenas das informações e projetos efetivamente utilizados. Há, pois, distinção quando comparado com os procedimentos licitatórios regidos pela Lei 8.666/93, nos quais a administração remunera por todo o trabalho de consultoria, elaboração de projetos, e outros, realizados, que servirão para construir a licitação.

É possível, ainda, que por meio do PMI se promova análise prévia do mercado, facilitando perceber os interesses envolvidos no futuro projeto bem como as aspirações e necessidades dos particulares que desejam a contratação. Isso porque as empresas interessadas na licitação procuram interagir desde a fase de planejamento, apresentando ideias e demonstrando seu interesse.

o custo dos serviços contratados diminui sensivelmente se o próprio prestador do serviço ficar responsável pela elaboração dos projetos. Isso porque o parceiro privado, na maioria dos casos, dispõe da técnica necessária e da capacidade de inovar na definição de soluções eficientes em relação ao custo do investimento, sem perda de qualidade, refletindo no menor custo do serviço a ser remunerado pela Administração ou pelo usuário.” (BRASIL, 2004).

132 MOTTA, Carlos Pinto Coelho. As Leis de Licitação e de Responsabilidade Fiscal em seus aspectos de transparência, controle e fiscalização. Revista Eletrônica sobre a Reforma do Estado, Salvador, n° 8, dezembro 2006./ Janeiro/fevereiro 2007. Disponível em: <http://www.direitodoestado. com/revista/RERE-8-DEZEMBRO-2006-CARLOS%20MOTTA.pdf>. Acesso em: 17 mar. 2015.

A percepção do interesse do mercado no projeto é relevante para que o poder público elabore modelagem de licitação e contratação que, além de buscar a realização do interesse público, seja atrativa para o setor privado.

2.3.2 Vantagens para o particular

Percebidas as vantagens para a administração, é necessário destacar quais são os benefícios colhidos pela iniciativa privada na participação do PMI, uma vez que o emprego do instrumento está condicionado à existência de interesse privado em contribuir com a elaboração de estudos, investigações, levantamentos e projetos. Por meio do PMI, a iniciativa privada, além de poder contribuir com a tomada de decisão estatal, tem a oportunidade de conhecer melhor a demanda, apresentar suas ideias e soluções.

A empresa que objetiva contratar com a administração possui uma visão prévia do projeto, conhece seus detalhes, opina para que seja formatado da melhor forma possível a satisfazer os interesses da administração e do mercado e ainda, em razão do amplo conhecimento do projeto, pode oferecer um preço melhor na futura licitação.

O interesse do setor privado em apresentar estudos, investigações, levantamentos, projetos depende do nível de desenvolvimento e segurança jurídica da legislação sobre o tema. Os proponentes devem ter confiança de que seus projetos serão avaliados pelos seus méritos, de forma imparcial e dentro de um prazo específico. Outro elemento a atrair o interesse do mercado é a previsão de alguma forma de recompensa ou o reembolso de custos de desenvolvimento do projeto e pagamento de direitos de propriedade intelectual.133 Entre as desvantagens estão a possibilidade de que os estudos realizados não sejam remunerados e de que sejam utilizados indevidamente por demais particulares, em razão da publicidade dada ao procedimento. Neste caso:

A depender do seu aproveitamento por terceiros, a apropriação desses estudos poderá de alguma forma acarretar prejuízo patrimonial aos seus

133 PUBLIC PRIVATE INFRASTRUCTURE ADVISORY FACILITY. Unsolicited Proposals – An Exception to Public Initiation of Infrastructure PPPs. 2014. Disponível em: <http://www.ppiaf. org/sites/ppiaf.org/files/publication/UnsolicitedProposals_PPIAF.pdf>. Acesso em: 25 fev. 2015.

autores ou aos proprietários de seus direitos patrimoniais autorais, que eventualmente poderiam aproveitá-los comercialmente, por outras vias134.

Observa-se que todos os benefícios citados apenas serão obtidos, tanto pela administração quanto pelo setor privado, com a utilização correta do procedimento.

Apesar de constituir ferramenta importante de diálogo entre o setor público e o setor privado, a adoção do procedimento de manifestação de interesse pode torná-lo um instrumento contrário aos seus objetivos, contribuindo para legitimar comportamentos imorais, de permitir que o setor privado influa nas decisões administrativas de modo a garantir exclusivamente seus interesses em detrimento dos interesses da coletividade. O principal objetivo do presente trabalho é abordar as balizas necessárias à utilização do procedimento de manifestação de interesse para que os potenciais benefícios sejam colhidos e os riscos mitigados.