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Ulhôa 102 adverte para o fato de que o emprego da biotecnologia na produção de sementes mais resistentes repercute, de imediato e positivamente, na questão agrícola (já que

mais alimentos poderão ser oferecidos ao mercado, tendencialmente, a preços menores, em

comparação com os correspondentes convencionais), mas pode repercutir, mediata e

negativamente, na questão agrária, se a política governamental para o setor não promover a

integração da agricultura familiar ao agronegócio biotecnológico.

Diz ele que somente os estudos científicos podem ser levados em conta na operacionalização das normas jurídicas relacionadas à questão da segurança alimentar; bem como que a ciência tem condições, atualmente, de estabelecer métodos confiáveis para teste dos alimentos transgênicos, antes de sua introdução no mercado, mas a realidade nos mostra fatos diferentes.103

102 Ver p. 20 – inversão perversa de valores: os esfomeados pagariam pela informação do interesse de elites alimentadas e não há justificativa para que os primeiros paguem por informações de interesse apenas desses últimos, mormente no nosso país, com desigualdades econômicas e sociais acentuadas.

103 Caso do complemento alimentar triptofano L, que a empresa japonesa Showa-Denko produzia com emprego de bactérias geneticamente modificadas. Suplementos alimentares, como aminoácidos, geralmente são fabricados por processos fermentativos, nos quais grandes quantidades de bactérias são cultivadas em tonéis, e o suplemento alimentar é extraído das bactérias e purificado. O aminoácido triptofano tem sido produzido desse modo por muitos anos. No final dos anos 80, a companhia Showa Denko K.K. decidiu usar a engenharia genética para acelerar e aumentar a eficiência da produção de triptofano. Através da engenharia genética, eles inseriram vários genes que alteraram a bactéria e fizeram-na expressar certas enzimas em níveis muito acima do normal e, também, expressar outras enzimas que normalmente não estariam presentes na bactéria original. As enzimas expressas nessa bactéria modificada por engenharia genética alteraram substancialmente o metabolismo celular, levando a um grande aumento da produção de triptofano. Essa bactéria alterada pela engenharia genética foi imediatamente utilizada na produção comercial do triptofano e o produto posto no mercado norte-americano em 1988. De acordo com a lei dos Estados Unidos, a Showa Denko pode vender o triptofano produzido pela bactéria modificada pela engenharia genética, sem ter que fazer testes de segurança, porque ela, e outras companhias, já vendiam o triptofano produzido por bactérias normais (não alteradas pela engenharia genética) há muitos anos sem que causassem danos à saúde das pessoas. Foi considerado que o método de produção (quer via

Segurança alimentar:

Questão quantitativa da produção de alimentos – food security:

logo, adotar tecnologias e medidas econômicas capazes de garantir a produção de alimentos em quantidade suficiente para alimentar a população do mundo. *aqui, o emprego da tecnologia OGM pode ser fator decisivo no enfrentamento das questões nacionais.

Segurança alimentar:

Inexistência de riscos à saúde ou vida dos consumidores – food safety: logo, controlar a qualidade dos produtos alimentícios.

Sobre o direito à informação na rotulagem do produto: CDC, art. 6º, III, Ulhôa comenta que: “Sempre que a lei assegura ao consumidor um direito, isso representa para o empresário fornecedor do bem ou serviço correspondente, um aumento de custos que, cedo ou tarde, é repassado ao preço”.104

natural, quer através de uma bactéria alterada pela engenharia genética) era irrelevante e, já que o triptofano provou ser saudável, o novo material não necessitava de testes. De fato, eles o consideraram substancialmente equivalente ao triptofano que estava sendo vendido havia anos. Esse produto foi posto no mercado e em poucos meses ele causou a morte de 37 pessoas e 1.500 ou mais incapacitações permanentes – Mayeno, A.N. e Gleich, G.J., Eosinophilia-myalgia syndrome and tryptophan production: a cautionary tale, Tibtech, 12, 346-352, 1994. Levaram-se meses para descobrir que o envenenamento se devia a uma toxina presente no triptofano produzido pela bactéria, da Showa Denko, modificada pela engenharia genética. Um fator que contribuiu para a demora foi o fato de que o produto não tinha no rótulo qualquer informação que o diferenciasse do triptofano produzido pelos métodos convencionais. A doença causada por essa toxina, foi chamada de EMS (eosinophilia myalgia syndrome) porque os sintomas iniciais da doença eram aumento do número das células sanguíneas chamadas eosinófilos e mialgia (dores musculares). Com o tempo, outros sintomas apareceram nos pacientes que levaram, em alguns casos, à morte e, em muitos outros, à incapacitações permanentes. Estes sintomas incluíam: paralisia e problemas neurológicos, dolorosos inchaços e rachaduras na pele, deficiência cognitiva e de memória, dores de cabeça, alta sensibilidade à luz, fadiga e doenças cardíacas. Mais tarde mostrou-se que o triptofano produzido pelas bactérias modificadas por engenharia genética continha um ou mais contaminantes tóxicos. O mais importante deles, chamado EBT, foi identificado como um produto da dimerização do triptofano. Ele representava menos de 0.1% do peso total do produto, mas ainda assim foi suficiente para matar pessoas. Baseados na química fundamental e nos princípios da bioquímica, os cientistas deduziram que esse composto, provavelmente, foi gerado quando o nível de triptofano dentro da bactéria alcançou níveis tão altos que as moléculas de triptofano, ou seus precursores, começaram a reagir umas com as outras. Assim, parece que a manipulação genética para aumentar a biossintese do triptofano levou a um aumento dos níveis celulares do triptofano e de seus precursores. Nesses altos níveis, esses compostos reagiram com eles próprios gerando uma toxina mortal. Sendo quimicamente muito parecida com o triptofano, essa toxina não poderia ter sido facilmente separada do triptofano e contaminou o produto comercial final em níveis que foram altamente tóxicos para os consumidores. Áreas de incertezas significantes, relativas a esse incidente, permanecem até os dias de hoje. A Showa Denko nunca liberou a cepa da bactéria modificada por engenharia genética usada para produzir o triptofano tóxico. Assim, nunca foi possível que cientistas independentes pudessem estudar suas características e compreender precisamente a fonte da toxina. A Showa Denko alega que todos os estoques da bactéria foram destruídos assim que os problemas começaram a aparecer. Tal pesquisa não somente forneceria dados úteis para a avaliação dos riscos dos organismos geneticamente modificados, mas também seria útil para as vítimas do triptofano envenenado e suas famílias, que acionaram judicialmente a companhia num total de 2 bilhões de dólares.

104 Comenta Ulhôa, na obra retrocitada, que: “Aparentemente, a inserção de uma informação nos rótulos dos produtos alimentícios não deveria impactar de modo significativo os custos de sua produção e comercialização. Mas só aparentemente; diversos fatores tornam a rotulagem dos alimentos transgênicos, hoje, bastante custosa. O mais importante deles diz respeito à inexistência de canais de escoamento segregados: nos campos de cultivo, nos meios de transporte (caminhões, trens, navios), armazenagem e industrialização, os alimentos convencionais e os geneticamente modificados se misturam. Proceder, por outro lado, a exame de DNA nas sementes e grãos apresenta dificuldades operacionais incontornáveis e custos proibitivos; se feito por amostragem, o exame não

CAPÍTULO III – DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO E