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As incursões do século

12. Bonimento e Colina, antes de 992?

O tombo do mosteiro galego de Sobrado dos Monges contém um documento datado da Era 1030, que corresponde ao ano de 992, e que abre com uma longa narrativa sobre as origens e detentores de uma propriedade e igreja de Santa Maria de Bonimento (García de Valdeavellano 1976, 163-5, doc. 130).

A primeira dificuldade é localizar o topónimo. O documento refere-se a uma ecclesia vocabulo Sancte Marie que est fundata in villa Bonimenti et Colina, territorio Presares et Aviancos, numa indicação geográfica cuja interpretação não tem sido

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unânime. Paulo Martínez Lema vê nela uma referência possível à actual Cuíña, uma aldeia na freguesia de Santo André de Boimente, em Viveiro (2010, 167), enquanto López Alsina indica a zona de Aveancos, próxima do Mosteiro de Sobrado (2004, 60, n. 12). Ambas as hipóteses têm interesse: a acreditar na primeira, estaríamos perante um indício de actividade vikingue numa região da Galiza para qual não há mais nenhuma referência; se se preferir a segunda possibilidade, talvez se possa relacionar o sucedido com o saque e destruição da igreja Santa Eulalia de Curtis, localizada perto de Sobrados e da qual falaremos de seguida.

No entanto, não só não é fácil perceber o que aconteceu ao certo, como também não é indicada nenhuma data em concreto. Estamos, uma vez mais, perante um documento onde os vikingues são um elemento secundário, parte de uma narrativa que põe em contexto o verdadeiro objectivo do texto. Podemos estabelecer o terminus ante quem de 992, mas pouco mais. Os contornos da actividade vikingue naquele local – seja ele qual for ao certo – também não são seguros. O texto faz uma lista das pessoas que tiveram autoridade sobre aquela igreja em concreto, inserindo, a dada altura, os “dias dos Normandos” como um marco cronológico (post mortem domni Gutier adimplevit inde servitium et obedientiam ad filium suum domnum Munionem usque ad dies Lormanorum), mas não explicita a que equivaleu esse período. Terão os vikingues atacado a igreja de Santa Maria do Bonimento ou a área em redor? Ou será apenas uma referência genérica a um momento da História da Galiza, marcado por uma presença intensa dos nórdicos no território, mas não necessariamente na zona exacta daquele templo? O documento indicia alguma forma de ruptura devido aos dies Lormanorum, dado que a frase seguinte começa por falar do erigir do edifício por outros parentes e de contendas entre eles (Et ab ipsis diebus erexerunt alios parentes et miserunt ipsa kasa in contentione). Talvez tenha havido uma reconstrução da igreja ou de edifícios próximos ou, em alternativa, apenas um restauro e expansão motivado por novos tempos. Em qualquer dos casos, trata-se de uma ruptura introduzida pelos vikingues.

É possível que a actividade nórdica a que o texto se refere seja a da expedição de Gunderedo, que terá certamente deixado a sua marca no território galego, directa ou indirectamente. Mas a informação é demasiado escassa para permitir uma conclusão segura.

159 13. Santa Eulalia de Curtis, antes de 995

Num documento actualmente datado de 1 de Julho de 995, mas para qual têm sido propostas outras datas, surge a notícia de um ataque vikingue à igreja de Santa Eulalia de Curtis, a sul da Corunha. A investida levou à destruição do templo e à captura ou morte dos seus clérigos (Sáez & González de la Peña 2004, 7-17, doc. 130).

Uma vez mais, temos apenas um terminus ante quem, mas a cronologia tem variado desde que o texto começou a ser referido por estudiosos. Um dos primeiros senão mesmo o primeiro – foi Huerta y Veja no século XVIII (1736, 361), que datou o documento de 867 e viu nele uma referência ao ataque de 844 na região da Corunha, de tal forma que ligou os dois numa narrativa algo imaginativa. O trabalho de Huerta y Veja foi citado acriticamente por Chao Espina (1965, 35) e seguido por Mayán Fernandez (1955, 22). Mais recentemente, julgando tratar-se de um documento do século X, Ferreiro Alemparte atribui o saque de Santa Eulalia de Curtis ao exército de Gunderedo (1999, 434), tal como Izquierdo Díaz (2009, 91).

A disparidade cronológica torna-se compreensível se tomarmos em conta os problemas de conservação do documento. Existem apenas duas cópias, ambas provavelmente baseadas num original comum, datadas do final do século XII, e a que é tida como a melhor, a do Mosteiro de Sobrado dos Monges, contém a data de 867. Huerta y Veja limitou-se, por isso, a seguir o que estaria no próprio documento. Mas o ano está escrito numa parte raspada (Sáez & González de la Peña 2004, 7) e existe um problema de discrepância cronológica com os signatários. Por esse motivo, Flórez propôs, em alternativa, a data de 995, fazendo coincidir o documento com o período de vida do rei e bispos que o confirmaram (Sáez & González de la Peña 2004, 8).

À luz da teoria actualmente dominante, o terminus ante quem será, por isso, o ano de 995, o que torna possível a atribuição do saque à incursão de Gunderedo, mas também não impossibilita que a igreja ter sido atacada por vikingues noutra altura. Precisamos de olhar para os detalhes do texto se queremos tentar uma redução da janela temporal. A narrativa começa por falar da fundação da igreja por Placentio, trisavô de Pedro Mezonzo, à época Bispo de Iria-Compostela (fundata a Placentio bisavo Martini, cuius filius est Petrus episcopus). O templo estava ocupado por uma comunidade religiosa até à chegada dos nórdicos, cuja vinda é entendida como um castigo pelos pecados dos habitantes nativos (usquequo peccato prepediente venerunt

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gentes lotimanorum in ipsam terram) e demonstrando, assim, que a perspectiva teocêntrica da História manifesta-se até em pequenos documentos legais. O ataque vikingue teve como consequência o saque da igreja e das outras em redor (vastaverunt sic ipsam ecclesiam, sicut et alias convicinas) e a captura ou morte dos seus clérigos. Desconhece-se o destino dos que foram feitos prisioneiros, se resgatados, mortos ou se engrossaram os mercados de escravos em que alguns nórdicos faziam fortuna, nomeadamente na Irlanda. Mas a frase seguinte do texto chama a nossa atenção por, ao que parece, colocar Pedro Mezonzo, assim como o seu pai e o seu irmão, no rescaldo do ataque: Remansit autem ab ipso incendio Martinus confessor, nepos ipsius Placentii cum filiis suis Aldelfio presbitero et Petrus. Tomadas à letra, as palavras do documento dão a entender que Martinho, Adelfio e Pedro, à época abade e não bispo, foram contemporâneos do ataque vikingue, porque presenciaram o incêndio ou o seu rescaldo. E, sabendo-se que o último presidiu à Diocese de Iria-Compostela a partir de 985, teríamos que colocar a investida nórdica na geração imediatamente anterior, isto é, em meados do século X.

A hipótese de a igreja de Santa Eulalia ter sido vítima da expedição de Gunderedo ganha, por isso, força, embora não se possa excluir por completo a possibilidade de o saque se ter ficado a dever à incursão que chegou a Alcácer do Sal em 966 ou a outra pouco posterior à que levou à morte de Sisnando.

É impossível analisar os episódios de 968 em diante sem deixar de pensar se estão ou não relacionados com a expedição de Gunderedo. O ter sido um ataque prolongado cujo trajecto não se conhece com precisão, a juntar às lacunas informativas nos documentos, impede que se responda à questão com certeza. E é prudente evitar a tentação dos nomes sonantes, algo que também será válido no capítulo seguinte.

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Capítulo 9

As incursões do século XI

A fase final da Idade Vikingue, pelo menos enquanto fenómeno maior na Europa e mais além, é marcada pelas lutas pelo trono inglês, pela crescente afirmação do poder régio na Escandinávia e pelo avanço da cristianização. Há ainda um decréscimo acentuado do tráfego de prata oriental, levando alguns Suecos a virarem a sua atenção para ocidente, onde os ataques a Inglaterra rendiam avultadas somas de danegeld. Em meados do século XI, ainda se tenta uma reabertura da rota oriental, mas a expedição fracassa e as viagens de nórdicos para leste passam a resumir-se, essencialmente, aos mercenários que integravam a Guarda Varanga do imperador bizantino.

Quando Óláfr Tryggvason foi agraciado por Æthelred de Inglaterra, em 995, e partiu para a Noruega para se fazer rei, o outro líder da expedição vikingue, Sveinn tjúguskegg (Barba Forcada), acabou por segui-lo. Os dois envolveram-se num conflito de vários anos pelo domínio do território norueguês, sobre o qual os monarcas dinamarqueses reclamavam soberania há quase duzentos anos. Conforme vimos, isso não impediu que as incursões nórdicas contra a costa inglesa continuassem durante o resto do século X, estendendo-se até à centúria seguinte. No ano 1000, segundo a Crónica Anglo-Saxónica, um grupo vikingue refugia-se na Normandia, mas parece estar de volta em 1001, quando há notícia de novos ataques ao sul de Inglaterra. Pilharam a costa, avançaram até ao interior e acabaram por se fixar na Ilha de Wight, de onde os Ingleses não parecem ter sido capazes de os expulsar. Em vez disso, Æthelred oferece- lhes dinheiro e mantimentos a troco de paz e acaba a pagar vinte e quatro mil libras aos nórdicos. Não foi o primeiro pagamento do género, dado que, conforme referimos, também os houve no século anterior, mas é a estas somas que se viria a dar o nome de danegeld ou o dinheiro dos Dinamarqueses: subornos a troco de paz que acabava sempre por ser temporária.

Em 1002, diz a Crónica Anglo-Saxónica que, por temer uma conspiração e atentado contra a sua vida, Æthelred ordena a morte dos habitantes nórdicos de Inglaterra, naquilo que ficaria conhecido como o Massacre do Dia de São Bricio, a 13

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de Novembro. O episódio antecede uma escalada dos ataques em 1003, quando Sveinn tjúguskegg regressa a território inglês e pilha Wilton e Salisbury. No ano seguinte, põe Norwich e Thetford a saque e enfrenta um exército inglês, numa batalha onde parecem ter morrido os principais homens da Anglia Oriental. O ímpeto dos nórdicos só foi quebrado por uma fome generalizada que originou o seu regresso à Dinamarca, em 1005. Mas estão de volta em 1006 e, após pilharem Kent, estabelecem uma base na Ilha de Wight, de onde levam a cabo incursões até ao interior do sul inglês. Em 1007, os Ingleses pagam aos nórdicos trinta mil libras, o que lhes vale dois anos de paz.

Æthelred tenta aproveitar a oportunidade para organizar as defesas do seu reino, ordenando a construção de uma frota, mas o projecto falha no meio de acusações de traição e de confrontos entre aristocratas ingleses. A força naval perde- se e, diz a Crónica Anglo-Saxónica, os nórdicos regressam no Verão de 1009, instalando-se novamente na Ilha de Wight depois de receberem um suborno de três mil libras em Kent. O líder do grupo teria o nome de Þorkell e foi responsável por três anos de actividade vikingue: regiões como Sussex, Essex, Kent, Surrey e Anglia Oriental foram postas a saques e foram atacadas cidades como Hampshire, Londres, Thetford, Cambridge e Northampton. Foi uma pilhagem quase generalizada de Inglaterra, com um custo elevado em vidas e bens, mas que só terminou quando Æthelred entregou aos nórdicos quarenta e oito mil libras, em 1012. Desta feita, no entanto, o danegeld veio com uma mais-valia, dado que o próprio Þorkell e quarenta e cinco navios passaram a integrar o exército inglês na condição de receberem mantimentos.

O recrutamento de nórdicos de pouco serviu. As fragilidades políticas e militares de Inglaterra tinham sido expostas pelos anos de saque e, talvez por ter consciência disso, Sveinn tjúguskegg está de regresso em 1013 para uma campanha de conquista do reino inglês. Após desembarcar em Sandwich, navega para norte, onde é aceite como rei na Northumbria. Recebido o apoio da Inglaterra setentrional, diz a Crónica Anglo-Saxónica que Sveinn ordenou a recolha de mantimentos e cavalos antes de rumar com o seu exército para sul, deixando a frota nórdica ao cargo do seu filho Knútr. O monarca dinamarquês tomou Oxford e depois Winchester, mas falhou no ataque a Londres, defendida pelo próprio Þorkell e por Æthelred. Seria um sucesso breve para o rei inglês, dado que Sveinn avançou depois para oeste e submeteu as

163 regiões ocidentais de Inglaterra. De regresso a norte, tem sob o seu domínio quase todo o território com a grande excepção da urbe londrina que, no entanto, não tardará a render-se, diz a Crónica Anglo-Saxónica que por receio da destruição da cidade. Sem reino, abandonado pelos seus súbditos, Æthelred passa o Natal de 1013 na Ilha de Wight antes de rumar para o exílio na Normandia, onde já se encontrava a sua mulher e irmã do duque Ricardo II.

A fuga do monarca inglês confirmou a conquista de Inglaterra, que passava a ser governada por um soberano dinamarquês que reclamava também autoridade sobre a Noruega e, pelo menos, parte da Suécia. Mas o sucesso durou pouco mais de um mês quando, em Fevereiro de 1014, Sveinn tjúguskegg morre e o seu filho Knútr, que podia ter herdado um império, vê-se sem nada em muito pouco tempo: a Dinamarca passa para o seu irmão Haraldr e Æthelred regressa do exílio para voltar a ser Rei de Inglaterra, expulsando o exército nórdico; enquanto isso, o monarca sueco aproveita a oportunidade para afirmar a sua independência e, na Noruega, Óláfr Haraldsson, a seu tempo São Óláfr, derrota os antigos vassalos de Sveinn e faz-se coroar rei (Lund 2008, 665). Knútr vê-se forçado a começar quase do zero. E quase porque, não obstante a perda de território, sobravam-lhe ainda tropas do seu pai, assim como fama e fortuna que investe no recrutamento de mais homens. Entre os novos apoios, a seu tempo, viria a estar Þorkell, o mesmo que defendeu Londres contra Sveinn e que, segundo a Crónica Anglo-Saxónica, recebeu mais vinte e uma mil libras de Æthelred em 1014.

Em 1015, Knútr regressa a Inglaterra. Tal como o pai, começa por desembarcar em Sandwich, mas ruma a ocidente para atacar Wessex, penetrar no interior até Wiltshire e submeter o sudoeste inglês. No ano seguinte, marcha para norte, pilha a Mercia e submete a Northumbria, antes de voltar a rumar para sul, em direcção a Londres, onde Æthelred morre em Abril. É sucedido pelo seu filho Edmundo, que organiza uma resistência inglesa e enfrenta militarmente os nórdicos, até ser derrotado em Ashington nesse mesmo ano de 1016. Refugiado em Gloucestershire, o rei inglês é forçado a ceder a Knútr toda a Inglaterra excepto Wessex, mas, numa reviravolta irónica, Edmundo morre poucas semanas depois e, desta feita, é o filho de Sveinn quem herda a totalidade do reino. Bastaram dois anos para Knútr passar de deserdado a detentor do trono inglês, mas iria ainda recuperar outros territórios em

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tempos controlados pelo seu pai. Em 1019, após a morte do seu irmão Haraldr, assume o poder na Dinamarca e, em 1028, invade a Noruega, onde é aceite como rei. O futuro São Óláfr é obrigado a fugir para um exílio que durou até 1030, altura em que regressa a território norueguês e acaba morto na Batalha de Stiklestad. Já quanto à Suécia, a autoridade de Knútr resumir-se-ia, provavelmente, à influência sob alguns magnatas suecos, por ventura combatentes na sua campanha de conquista de Inglaterra (Lund 2008, 667).

Knútr tentou criar um sistema monetário dinamarquês à imagem do existente em Inglaterra, recrutou clérigos ingleses para funções na Dinamarca (Lund 2008, 666) e usou ainda os meios fiscais ao seu dispor para manter uma frota, algo útil quando se tem um império rasgado pelo Mar do Norte. Mas, apesar disso, nunca criou instituições que lhe sobrevivessem: o seu império era pessoal e morreu com ele, em 1035. Aliás, já estava em desagregação pouco antes da sua morte, dado que a Noruega tinha recuperado a sua independência por volta de 1034, quando Magnús, o filho mais novo de Óláfr Haraldsson, regressou do exílio. Na Dinamarca, Knútr foi sucedido pelo seu filho Hörða-Knútr que, em 1039, passaria a ser também rei de Inglaterra. A união só terminou em 1042, quando Hörða-Knútr faleceu e a coroa inglesa foi entregue Eduardo, outro filho de Æthelred.

A presença de Suecos nos exércitos de Knútr não é deduzida da influência que ele terá tido sobre a Suécia, mas está registada em inscrições rúnicas do período. É o caso da U 194, erguida por Áli em memória dele mesmo e que faz referência a ter recebido dinheiro de Knútr em Inglaterra. Ou a U 344, que refere que Úlfr recebeu três pagamentos em Inglaterra, primeiro de Tosti, depois de Þorkell e, por fim, de Knútr. Outro exemplo é a U 241, erguida em memória de Ulfríkr, que recebeu dois pagamentos em Inglaterra. Estas três inscrições encontram-se em pedras na região de Uppland, na Suécia central, pelo que não se tratam de casos de recrutamento por via da proximidade geográfica com a Dinamarca. Para os Suecos, dada a sua localização, seria de esperar que a sua expansão se fizesse para oriente, através do Báltico e pelos rios russos, principalmente quando as rotas fluviais passaram a trazer para norte grandes quantidades de prata árabe. O que, de facto, terá sucedido até o tráfego desse metal precioso entrar em queda desde a segunda metade do século X e ter chegado quase a zero por volta de 1015 (Mikkelsen 2008, 546). Não é de espantar, por isso, que

165 tenha havido Suecos que passaram a olhar para ocidente e para as quantidades de danegeld que eram entregues a grupos de vikingues. Por volta de 1036, a viagem de Yngvarr víðförli (O que viajou longe) ainda tentou reabrir as rotas orientais dos nórdicos que o antecederam, mas sem sucesso. A expedição terá chegado ao Mar Cáspio, apenas para se perder e dela ficaram relatos épicos ou referências em dezenas de inscrições rúnicas. É o caso da Sö 9, erguida por um casal em memória de Úlfr, o seu filho, que morreu com Yngvarr. Esgotada a prata árabe e terminada a expansão nórdica, a presença de escandinavos no leste europeu passa a resumir-se essencialmente às elites como a do Reino de Kiev, entretanto em processo de assimilação cultural eslava, e aos mercenários que desciam os rios russos rumo a Constantinopla, onde podiam integrar a guarda do imperador.

Desde o início do século X que havia guerreiros nórdicos entre as tropas bizantinas, nomeadamente a Guarda Varanga, e o tratado de 945 entre Kiev e Bizâncio incluía disposições para o envio de mercenários escandinavos (Noonan 1997, 154-5). Era uma possibilidade de carreira com vantagens para ambas as partes: para os nórdicos, porque permitia-lhes lutar por um bom preço e de uma forma instituída (trabalho seguro, por outras palavras); para Bizâncio, dava acesso a homens de valor militar reconhecido. Um deles foi Haraldr harðráði, meio-irmão de Óláfr Haraldsson. Quando a Noruega foi tomada por Knútr, Haraldr exilou-se na Europa oriental, estando ao serviço de Jaroslav de Kiev durante cinco anos antes de integrar a Guarda Varanga, em Constantinopla, por volta de 1035 (Noonan 1997, 155). A estadia em Bizâncio não terá durado uma década, mas valeu-lhe fama e fortuna que levou consigo para a Escandinávia, onde, em 1046, está de volta à Noruega e a partilhar a coroa do país com Magnús. No ano seguinte, a morte do co-monarca fez de Haraldr harðráði o único ocupante do trono norueguês.

Em 1066, a morte de Eduardo de Wessex abre uma crise de sucessão em Inglaterra, na qual se apresentam três candidatos: o anglo-saxão Harold Godwinsson, Guilherme da Normandia e o próprio Haraldr harðráði, que invade o território inglês nesse mesmo ano para fazer valer a sua posição. Depois de tomar York, é derrotado e morto na Batalha de Stamford Bridge pelas tropas de Harold Godwinsson, que logo marcha para sul e acaba também ele morto e vencido na Batalha de Hastings, ainda em 1066. Em pouco tempo, dos três candidatos originais ao trono, Guilherme da

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Normandia era não só vitorioso, como o único sobrevivente. E este episódio anuncia o crepúsculo da Idade Vikingue, que tem o seu longo epílogo em mais cem anos de pirataria nórdica nas Ilhas Britânicas e nas derradeiras tentativas dinamarquesas de conquista de Inglaterra. Em 1069, Guilherme teve que fazer face a uma revolta inglesa apoiada por uma força vinda da Dinamarca, episódio que quase se repetiu em 1075, mas ambas as rebeliões fracassaram (Lund 1997, 177-8). A última ameaça para o Duque da Normandia foi uma expedição dinamarquesa que nunca chegou ao destino, em 1086, a mesma que também serve de marco simbólico para o fim da Idade Vikingue no presente trabalho.

No ocidente da Península Ibérica, o cenário no início do século XI é de