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CAPÍTULO I Línguas e Culturas nas Comunicações de Exportação

5. A Situação Portuguesa

5.1. Breve Caracterização

Não existe em Portugal qualquer programa de implantação nacional, regional ou sectorial de apoio a empresas exportadoras no domínio das línguas e culturas.

Não existe qualquer programa que permita às empresas a avaliação ou criação de uma estratégia de comunicação para a exportação.

Mais, não só se constata a ausência de qualquer programa nacional e subsidiado que apoie as empresas neste domínio, como também se verifica a inexistência de qualquer instituição particular que ofereça esse serviço, mesmo mediante pagamento.

Também não é conhecida qualquer tentativa de adequação, minimamente credível, das necessidades das empresas com os currículos, com a diversidade de línguas no ensino ou com metodologias.

Como alguns estudos anteriores comprovam, nomeadamente os resultantes dos Projectos SELECT, REFLECT, ou INTERCOMM, as instituições mais influentes neste domínio também não dispõem de informação ou de formação disponível sobre línguas e culturas no âmbito da exportação, nem parecem muito sensíveis à criação desse tipo de conhecimentos, seja apoiando iniciativas que identifiquem as necessidades, seja apoiando qualquer entidade que se proponha a intervir neste domínio, investigando ou oferecendo

especialidade (negócios, exportação, etc.), cursos de natureza funcional (telefonistas, etc.), a cursos ou brífingues de culturas, específicos para negócios, visando determinados países ou regiões.

Até à presente data, o apoio existente às empresas exportadoras restringe-se ao domínio económico ou legal, oferecendo-se às empresas informação neste domínio referente aos países ou regiões, assim como informação, igualmente económica e jurídica, para a exportação.

Naturalmente, existem também diversas formas de apoio financeiro à exportação, nomeadamente fiscais, mas nenhuma incide sobre a língua ou a cultura dos mercados-alvo.

Está desta forma traçado um panorama de ausência de informação e de apoio no domínio referido. Pior, um panorama da ausência de sensibilização ao papel que as Línguas e Culturas desempenham no contexto geral da internacionalização, ou especificamente, da exportação.

No entanto, é consensual a necessidade e a importância do conhecimento da língua e da cultura do cliente ou do mercado-alvo.

Demonstrando as necessidades em línguas e culturas e a sua importância para as empresas, poderão ser apontados os resultados do inquérito realizado junto de PME exportadoras no âmbito do Projecto REFLECT e que comprovam uma sensibilidade evidente da parte dos exportadores portugueses, uma vez que sensivelmente metade dos respondentes (48,8%) declararam ter uma estratégia linguística formalmente definida, caracterizando- a da forma que a Tabela 1 explicita:

Tabela 1 - Estratégias linguísticas por categoria

Estratégia % da amostra

Responde na língua do cliente 81,2% Informação escrita sobre a

empresa/vendas na língua do cliente

58,7%

Conhecimento de línguas como critério de contratação

48,4%

Usa agentes locais e/ou distribuidores

38,5%

Emprega falantes nativos dessa língua

Uso de tradutores/intérpretes externos

12,2%

Paga aos empregados para aprenderem línguas

9,4%

Da análise da Tabela 1 pode constatar-se que 81,2% das empresas exportadoras portuguesas afirma que “responde na língua do cliente”.

No entanto, considerando os principais mercados dos produtos portugueses (Figura 2) e conhecendo-se o peso específico das exportações para Espanha, Alemanha e outros países não francófonos ou anglófonos, existem razões para duvidar que seja realmente usada a língua do cliente.

Comparando os mercados principais com a informação da mesma fonte relativamente às línguas mais utilizadas pelas empresas, constatamos que os principais mercados portugueses usam o castelhano e o alemão, contando este último apenas com 23% dos recursos existentes nas empresas. O mesmo se passa com outras línguas igualmente pertinentes nas exportações portuguesas, como o holandês, o sueco, o árabe, etc.

Pode-se, pelo menos, concluir ser geralmente aceite que a empresa deve usar a língua do cliente, apesar de provavelmente não ser essa a realidade.

Não será perigoso afirmar que as empresas respondem noutra língua, mas não necessariamente na língua do cliente, tendo em consideração a escassez, ou mesmo inexistência de recursos de outras línguas europeias ou outras. A própria frequência do Alemão, relativamente baixa em relação ao efectivo volume das nossas exportações para esse país, nos leva a pensar na utilização do Inglês ou do Francês nessas comunicações.

Seria natural pensar que a consagração do Inglês como língua franca dos negócios internacionais diluísse a importância das outras línguas, mas como o próprio exemplo da Grã-Bretanha demonstra, trata-se de um erro por diversas razões, a primeira das quais se prende com a cultura e a implicação desta na adaptação, ou localização, dos produtos aos mercados.

Propriamente no domínio da língua, e, para além do conhecimento de saudações e de outros pequenos actos de fala que sempre constituem excelentes oportunidades de empatia no seio das negociações, sobreleva a utilização da língua para a produção da necessária literatura comercial, do rótulo ao manual e à publicidade, ou mesmo do contracto, áreas sujeitas a uma fortíssima componente cultural.

"The production of foreign-language promotional literature is perhaps the most challenging, and certainly the most subjective and therefore controversial area of commercial language work." (Simpkin & Jones, 1976:53).

Existe, assim, um claro anacronismo entre as necessidades dos exportadores, e, num contexto mais geral, da internacionalização, simbolizado pela unanimidade em torno da utilização da língua do cliente, por um lado, e, por outro, a ausência de estratégias, seja a nível nacional, partindo da economia ou da educação, seja a nível associativo, empresarial, sectorial ou regional.

Se há um panorama em que a expressão “de costas voltadas” parece ter propriedade, este poderia bem ser o seu exemplo.

Naturalmente, como em todas as batalhas, as grandes vítimas estão na frente, e a nossa frente de batalha são realmente as PME exportadoras, uma

vez que têm de ultrapassar as mesmas barreiras que todos os outros competidores internacionais, mas sem os mecanismos de apoio e os recursos de que dispõem alguns deles.

Há porém mais indicadores que obrigam a encarar a necessidade de intervenção urgente no sentido de aprofundar este contínuo estabelecido entre o exportador português, as línguas e culturas, e o cliente estrangeiro.

Se atentarmos nos resultados do estudo, junto dos gestores estrangeiros a trabalhar em Portugal, realizado pela Ad Capita International Search, P., e pela Cranfield University School of Management, a questão é real e mais profunda:

"As empresas e os negócios portugueses não são essencialmente orientados para o serviço ao cliente, de acordo com 75%, e 72% acredita que a gestão não se dedica à excelência do serviço ao cliente. Como resultado, os gestores não analisam cuidadosamente as necessidades dos seus clientes (é a opinião de 50%, com apenas 8% contra) e provavelmente não compreendem bem os mercados concorrentes (opinião de 41%, com 16% contra, e 43% neutros). Tal como seria de esperar, as boas relações com clientes são essenciais para a cultura empresarial portuguesa e esta afirmação é confirmada por 74% do grupo alvo." (Ad Capita International Search & Cranfield University School of Management, 2002:9-10).

Precisando depois:

"Apesar de uma cultura de receber calorosamente os estrangeiros, os gestores Portugueses não são bons a compreender ou a se adaptar a diferentes culturas empresariais e nem a lidar com clientes e colegas estrangeiros." (Ad Capita International Search & Cranfield University School of Management, 2002:14)

Um outro testemunho, parece confirmar que muito há a fazer na relação com o cliente: “É fundamental que os exportadores portugueses (só contabilizando aqueles que participam anualmente nas feiras realizadas n os recintos de Hannover, Frankfurt, Dusseldorf e Berlim, temos cerca de 700 empresas participantes e mais de 10.000 visitantes portugueses/ano), aproveitassem a estadia na Alemanha para mais regularmente visitarem

Sem pretender germanizar os agentes económicos portugueses, parece- me que a análise dos diferentes contextos culturais e empresariais, deveria levar a uma mais exaustiva procura de sucesso na Alemanha.” (R. B. Marques, 2002:71)

Estamos assim perante um quadro deficitário, caracterizado pela ausência de enquadramentos políticos ou programáticos, sem iniciativas para aumentar a sensibilidade às Línguas e Culturas dos clientes, num quadro marcado pelas correspondentes deficiências no universo da educação/formação.