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Em busca das fontes de conhecimento sobre Ciências e seu ensino pelos professores dos

CAPÍTULO 3 – DESENVOLVIMENTO METODOLÓGICO DA PESQUISA

3.1. Em busca das fontes de conhecimento sobre Ciências e seu ensino pelos professores dos

A investigação da trajetória profissional de professores que ensinam Ciências, nos anos iniciais, necessita de uma análise particular e interpretações em contexto. O contexto diz respeito aos aspectos singulares e subjetivos relacionados à experiência individual de cada professor com o Ensino de Ciências, enquanto aluno e professor. Para Tardif (2000), os saberes profissionais são personalizados e situados, já que é difícil dissociá-los das pessoas, de suas experiências e situações particulares de trabalho. Nesta pesquisa, o interesse reside em conhecer as fontes de aquisição de conhecimentos sobre Ciências e seu ensino, mobilizadas ao longo da trajetória profissional de cada professor, diante dos desafios postos pela reconhecida deficiência, na formação de professores dos anos iniciais de escolarização de conhecimentos sobre Ciências e seu ensino. Paralelamente, busca compreender “como” e “com quais finalidades” os professores escolhem determinadas fontes de aprendizado sobre Ciências e seu ensino e, por meio delas, mobilizam que tipos de conhecimentos.

Desta forma, a pesquisa assume o caráter de estudo de caso, tipo de pesquisa descritiva associado à abordagem qualitativa em educação e que possibilita a interpretação em contexto (LÜDKE e ANDRÉ, 1986) e o estudo de um “fenômeno contemporâneo inserido em algum contexto da vida real” (YIN, 2005). Nesta pesquisa, o fenômeno contemporâneo analisado se referiu à formação de professores para os anos iniciais de escolarização, com foco (contexto) na formação desses professores nos saberes sobre Ciências e seu ensino.

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Para Yin, (2005), a escolha deste tipo de metodologia de pesquisa se justifica quando se quer lidar com condições contextuais, acreditando que elas são altamente pertinentes ao fenômeno de estudo. Assim, entender como os professores desenvolvem o Ensino de Ciências, em sala de aula, e como se relacionam com as diferentes fontes de aprendizado desses conhecimentos, aproximou a pesquisa da formação de professores para o Ensino de Ciências e suas possíveis influências para a prática pedagógica dos professores. O estudo das fontes de aprendizado dos professores contribuiu, assim, para que fosse analisada a prática pedagógica desses professores em Ciências, “uma instância em ação” (ANDRÉ, 2005, p.15).

Caracteristicamente, o estudo de caso “procura clarificar e interpretar os aspectos educacionais como eles se apresentam na atualidade” (CHARLES, 1988). Ele envolve a investigação de um ou poucos indivíduos ou organizações educacionais (um grupo, uma comunidade, uma classe, uma escola) para a obtenção de uma descrição de uma realidade mais ampla. Para isso, é considerado um grande número de dimensões e variáveis a serem observadas e inter-relacionadas19, não pretendendo qualquer espécie de intervenção intencional do pesquisador sobre a realidade investigada (LÜDKE e ANDRÉ, 1986; SOARES, 1989; FRACALANZA, 1993).

Com o intuito de aproximar os resultados da pesquisa de uma realidade mais ampla da formação de professores que ensinam Ciências, nos anos iniciais e do Ensino de Ciências desenvolvido por eles, foi escolhido o “estudo de casos múltiplos” (BOGDAN e BIKLEN, 1994). Esta escolha não teve por intenção comparar os diferentes casos investigados, mas, como afirmam Bogdan e Biklen (1994, p.97), “demonstrar a possibilidade de generalização e da diversidade” dos processos formativos desenvolvidos nos diferentes espaços institucionais, bem como das particularidades encontradas nas relações individuais, entre cada professor, e a sua formação para o Ensino de Ciências.

Esta pesquisa pode também ser caracterizada como um microestudo. Segundo André (2009, p.47), nas pesquisas atuais, o estudo de caso pode ser diferenciado de um microestudo, pois o primeiro, na maioria das vezes, é caracterizado como tipo etnográfico, enquanto o segundo

19 Nesta pesquisa foi realizado um estudo que se assemelha a um estudo de caso, porém não se constitui um estudo de caso “genuíno” do ponto de vista da investigação das múltiplas variáveis intervenientes no processo. Ou seja, o estudo realizado guarda muitas características de um estudo de caso, mas essa característica, em particular, o estudo não guarda.

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aborda “uma situação muito específica, com um pequeno número de sujeitos e pouca variedade nos procedimentos de coleta de dados”. Desta forma, foi feita a seguinte correlação: a situação específica a que se referiu esta pesquisa é o estudo da formação dos saberes sobre Ciências e seu ensino de três professores dos anos iniciais do ensino fundamental. Para tal, foram utilizadas apenas três fontes de coletas de dados: a entrevista aos professores e seus formadores, a

observação de aulas dos professores e os documentos escritos (planos de ensino, roteiros de

aulas, textos de apoio didático etc.) que complementaram os dados obtidos das entrevistas e da observação direta das aulas dos professores.

A entrevista foi o instrumento privilegiado, na identificação das origens sociais do aprendizado dos conhecimentos sobre Ciências e seu ensino pelos professores, pois o saber profissional é originado de fontes e naturezas sociais distintas (TARDIF, 2002). Segundo o autor, os diferentes saberes dos professores, por mais que sejam edificados no próprio ofício, provêm de lugares sociais anteriores à carreira e/ou fora do trabalho cotidiano (família, escola, universidade, programas, regras, princípios pedagógico etc.). Este instrumento possibilitou também analisar, com mais afinco, uma dessas origens sociais dos saberes sobre Ciências e seu ensino dos professores: a formação inicial em nível superior, mais especificamente a disciplina relacionada ao Ensino de Ciências no curso de Pedagogia. A entrevista possibilitou, ainda, comparar a

formação em Ensino de Ciências desenvolvida na disciplina relacionada ao Ensino de Ciências

do curso de Pedagogia, segundo os formadores dos professores, com as influências da disciplina

percebidas pelos professores no Ensino de Ciências praticado por eles em sala de aula.

Para isso, foi utilizado um modelo de entrevista semiestruturada para os professores e outro para seus formadores (Apêndices 1 e 2), alternando entre questões abertas e fechadas, onde os depoentes tiveram a possibilidade de discorrer sobre o tema proposto, sem condições prefixadas pelo pesquisador (MINAYO, 2000). A opção por esse modelo de entrevista foi baseada em Szymanski (2004). Para a autora, uma entrevista estruturada não possibilita a investigação dos significados subjetivos do fenômeno estudado, e uma entrevista aberta pode mascarar “pressupostos, agendas e expectativas” (p.19). Dentre as possíveis vantagens de se utilizar a entrevista semiestruturada, foi destacado, por um lado, o fato de delimitar o volume das informações sobre a trajetória profissional dos professores e direcionar suas falas para o aprendizado de Ciências e se ensino. Por outro, a liberdade dada aos professores, para extrapolarem o próprio roteiro de entrevistas, possibilitou o surgimento de questões inesperadas e

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o aprofundamento de outras, como também contribuiu singularmente para a análise dos resultados encontrados na pesquisa.

O objetivo da entrevista com os professores foi conhecer as fontes de aquisição dos conhecimentos sobre Ciências e sobre Ensino de Ciências e suas contribuições para a prática da docência dos professores nos anos iniciais do ensino fundamental. Tais contribuições estão relacionadas aos conhecimentos do conteúdo específico (conceitos específicos de uma área específica de conhecimento) e aos conhecimentos pedagógicos do conteúdo (como ensinar e o significado de ensinar) (SHULMAN, 1986). No caso dos professores estudados, esses conhecimentos foram apropriados no processo de aprendizado dos conhecimentos de Ciências e de seu ensino, durante sua formação inicial e continuada e utilizados, na sua prática pedagógica, em sala de aula. Já com os formadores dos professores, nos respectivos cursos de Pedagogia, o objetivo principal das entrevistas foi o de conhecer e analisar a forma como a disciplina relacionada ao Ensino de Ciências foi ali desenvolvida e como ela contribuiu para o aprendizado dos conhecimentos de Ciências e dos processos de ensino e aprendizagem de Ciências pelos professores.

As entrevistas com os professores e seus formadores foram transcritas integralmente, sendo identificado cada entrevistado por letras do alfabeto, indicando o gênero dos professores e de seus formadores (masculino ou feminino): professora A e formadora A; professora B e formador B; e professor C e formador C. Após a transcrição, as entrevistas foram devolvidas para cada depoente para que avaliasse o conteúdo da entrevista e propusesse alguma alteração se necessário. Todos os professores e os formadores fizeram alterações, no texto de transcrição das entrevistas correspondentes, sendo que a professora A, a professora B e o formador C solicitaram a supressão de alguns trechos da transcrição.

Outra fonte de dados utilizada foi a observação não participante (RICHARDSON, 1999) de aulas de Ciências dos professores estudados. Ao todo, acompanhei cinco aulas de Ciências da professora A e da professora B, sendo que essas aulas de Ciências ocorreram na frequência de uma vez por semana. No caso do professor C, por motivos circunstanciais, como explicarei mais adiante, acompanhei apenas uma aula. A observação de aulas, como afirmam Lüdke e André (1986), possibilitou um contato mais estreito com o fenômeno estudado e aproximou a pesquisa da perspectiva dos professores estudados. Este instrumento de coleta de dados trouxe elementos que permitiram identificar as fontes de aquisição dos conhecimentos e os saberes sobre Ciência, e

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seu ensino utilizado pelos professores em sua prática pedagógica. Além disso, observar as aulas dos professores trouxe subsídios para confrontar as “práticas declaradas” (AUGUSTO, 2010) pelos professores com o que realmente praticam em sala de aula.

A observação das aulas dos professores foi acompanhada de um registro em caderno de

campo. Esses registros estavam relacionados à descrição da estrutura da escola, da sala de aula,

dos professores e, principalmente, do Ensino de Ciências praticado em sala de aula, representado pelos assuntos e temas de Ciências Naturais e suas formas de ensino pelos professores. Além disso, atenção especial foi dada às fontes de aquisição dos conhecimentos sobre Ciências e seu ensino baseadas em Tardif (2002). Essas fontes foram mais bem detalhadas na descrição da análise dos dados. Assim, a observação não participante possibilitou uma “descrição narrativa” (RICHARDSON, 1999. p.274) do Ensino de Ciências praticado pelos professores, com atenção para a influência das fontes de conhecimentos declaradas por eles na entrevista, quanto uma melhor contribuição do fenômeno observado, considerando a subjetividade da pesquisadora inerente ao processo de pesquisa em educação.

Com essas observações, foram empreendidas relações entre: “os conhecimentos sobre assuntos e temas e processo das Ciências Naturais oriundos das diferentes fontes de aquisição utilizadas pelos professores” com “os conhecimentos de Ciências ensinados por eles a seus alunos”. Nesse sentido, procurei verificar quais e como foram as contribuições das diferentes fontes, principalmente da formação inicial, para a construção dos conhecimentos de Ciências e de seu ensino pelos professores.

Os documentos utilizados como terceira fonte de coleta de dados para a pesquisa foram documentos que exemplificaram ou complementaram as falas dos professores e dos seus formadores nas entrevistas. Dentre estes documentos, houve registros escritos dos professores quanto a alunos de cursos de formação inicial e continuada para o Ensino de Ciências, nos anos iniciais, textos de livros didáticos e textos retirados (ou elaborados pelos professores através) da internet utilizados por eles durante o acompanhamento de aulas.

Para os formadores dos professores, os documentos estavam relacionados à ementa e ao plano de curso da disciplina e, quando possível, aos registros e roteiros das aulas da disciplina. Nesta etapa da pesquisa, todas as informações e documentos coletados se relacionaram ao(s) semestre(s) cursado(s) de maneira individual, pelo professor estudado, enquanto aluno da instituição de ensino superior, em disciplinas da área de Didática de Ciências da Natureza ou

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Metodologia de Ensino de Ciências. De uma forma geral, os materiais escritos foram uma fonte estável e rica para a pesquisa, pois retirou e valorizou evidências de informações de outras fontes (LUDKE e ANDRÉ, 1986; YIN, 2005).