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CAPÍTULO 1 – ASPECTOS HISTÓRICOS E EPISTEMOLÓGICOS DA FORMAÇÃO DE

1.7. A formação do professor no século XXI

O desenvolvimento acelerado da sociedade, os impactos da sociedade de informação e do mundo científico e tecnológico, bem como a crescente internacionalização da economia possibilitaram um olhar renovado para a formação de professores. Da forma como era visto, o professor não se sentia responsável e capaz de educar seus alunos, cabendo-lhe apenas transmitir os conhecimentos socialmente aceitos. Não se compreendia que o ato de educar envolve quem educa e quem é educado em suas diferentes dimensões: a pessoal e subjetiva (o professor e o

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aluno e suas histórias de vida), a social, a cultural, a filosófica e a política. Além disso, não se compreendia que, para educar seus alunos, o professor, como sujeito que carrega consigo aprendizados de sua história de vida pessoal e profissional, também necessita diariamente mobilizar os conhecimentos oriundos destes aprendizados e fazê-los interagir para resultar em processos de ensino em sala de aula.

Por último, faltava a compreensão de que o ato de educar tem, pelo menos, dois componentes: aquele interno ao professor (sujeito de aprendizados, vontades e experiências) e aquele externo ao professor, referente à sua profissão, à prática docente e às condições de trabalho. Ou seja, a atividade docente é realizada numa rede de interações (TARDIF e LESSARD, 2005) com outras pessoas, redes estas que se desenvolvem na instituição escolar, um meio social constituído de relações sociais, normas, e hierarquias (TARDIF, LESSARD e LAHAYE, 1991).

Nos dias atuais, o professor é visto como sujeito com uma bagagem sociocultural que participa ativamente dos processos de ensino e de aprendizagem de seus alunos. Ao mesmo tempo, a educação não é mais vista como patrimônio exclusivo do docente, uma vez que, na sociedade atual, os conhecimentos produzidos estão facilmente disponíveis aos indivíduos por intermédio das novas tecnologias de informação e comunicação. Além disso, o professor enfrenta mudanças no sistema escolar derivadas de novas concepções de educação e de variações inerentes ao trabalho escolar, como aumento das exigências em relação ao professor (ele precisa ser motivador, lutar contra a exclusão social, relacionar-se com as estruturas sociais e com a comunidade), desresponsabilização da educação familiar, ruptura do consenso social sobre a educação, mudanças de expectativas em relação ao sistema escolar, menor valorização social do professor e de suas condições de trabalho, mudanças nos conteúdos curriculares e nas relações professor-aluno (ESTEVE, 1995; IMBERNÓN, 2004; CHARLOT, 2005).

Dessa forma, ser professor na sociedade contemporânea é enfrentar diariamente o desafio de mostrar o valor da educação escolar, em meio a tantas transformações sociais e culturais, refletidas em seus alunos e na própria instituição escolar. Assim, um novo modelo escolar foi criado a partir da redemocratização do ensino em alguns países por influências do movimento internacional de “educação para todos” na década de 1980. Esse modelo mostrou-se contraditório, pois, se por um lado a educação é resultado de um esforço social para criação de oportunidades e flexível a mudanças, por outro, o modelo exige que os professores acolham a

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heterogeneidade social e cultural dos alunos e também façam com que todos os alunos tenham sucesso, nos aprendizados escolares, de modo a garantir um emprego correspondente ao nível de seus estudos (CAVACO, 1995; CHARLOT, 2005).

O professor da escola do século XXI, embora compartilhe do mesmo prestígio de formar e de transformar a sociedade que um professor dos séculos anteriores, deveria estar aberto às mudanças e contribuir para a recriação e o redimensionamento da escola na sociedade atual. É necessário, portanto, um professor que atue coletivamente e deseje se aperfeiçoar, cada vez mais, buscando a emancipação de seus alunos. Diante das mudanças de expectativas em relação ao sistema educativo e do desenvolvimento de fontes de informações alternativas à escola, o professor precisa desenvolver competências e mudar algumas tradições que o acompanham na profissão, a fim de criar novos sentidos da educação escolar. O perfil que se deseja para este professor é o de ter conhecimentos para conduzir práticas docentes e criar processos de aprendizado, em sala de aula, além de saber lidar com a diversidade cultural para intervir nos espaços públicos da educação. É também o de um profissional que compreende os sentidos da instituição escolar na sociedade atual e se sente integrado a ela (NÓVOA, 2009).

Assim, diante das novas funções do professor e das transformações ocorridas na escola, a formação de professores torna-se relevante e necessita de valorização. Nesse novo cenário, ela ganha amplitude e múltiplas perspectivas, que vão desde a formação do professor como indivíduo a uma formação para a prática profissional embutida de valores, técnicas e responsabilidades. Para García (1999, p.11), “todos exigimos e reconhecemos a necessidade de formação, sobretudo num mundo em que a informação nos chega cada vez mais com mais facilidade e, portanto, nos faz ver o quanto desconhecemos ou gostaríamos de saber”.

Nesse contexto, a formação de professores nos dias atuais deveria contemplar, além dos saberes disciplinares, que formam para “o quê” e “como ensinar”, também aqueles relacionados à sua capacitação para o trabalho profissional, já que “o trabalho docente se constitui uma das chaves para a compreensão das transformações sociais das sociedades do trabalho” (TARDIF e LESSARD, 2005, p. 17). Para isto, a formação de professores não deveria estar mais centrada numa formação em que predominam os conteúdos disciplinares, muitas vezes distantes da prática pedagógica e do contexto escolar, mas sim baseada em alguns princípios. Dentre eles, os princípios de continuidade (o desenvolvimento profissional é um processo); de integração em processos de mudanças, inovações e desenvolvimento curricular; de relação com o

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desenvolvimento organizacional da escola; de relação entre os conteúdos acadêmicos e disciplinares com a formação pedagógica; de integração teoria-prática e de individualização (ensinar é entender a heterogeneidade) (GARCÍA, 1999; CHARLOT, 2005).

Portanto, na atualidade, a formação de professores deveria criar sentidos para a profissionalização e identidade docentes. Ao longo da formação do professor, num processo contínuo de participação ativa do mesmo, os sentidos da profissão docente poderiam surgir se fossem desenvolvidos espaços de participação, reflexão compartilhada entre os pares na escola como parte da cultura profissional e de formação na mudança e para a mudança com forte responsabilidade social. Além disso, a formação de professores deveria focalizar a prática docente e os saberes construídos a partir dela, sem desconsiderar a dimensão pessoal do docente em formação. Com esta formação construída dentro da profissão, os professores poderiam se desenvolver profissionalmente, combinando conhecimentos científicos, pedagógicos, técnicos e experienciais, bem como capacidades reflexivas e de autonomia profissional, com o objetivo de alcançar uma educação democrática de futuros cidadãos (IMBERNÓN, 2004; NÓVOA, 2009).