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As organizações integram necessariamente um ambiente institucional nacional. E para modificar alguns aspectos referentes à efetiva aplicação das práticas de governança corporativa, se faz necessária a alteração da legislação, o que é extremamente difícil, por envolver interesses de diversos agentes. Em razão disso, diversos órgãos e instituições viram como uma alternativa a criação de manuais de boas práticas de governança corporativa (ROSSONI; MACHADO-DA-SILVA, 2010).

A implementação de boas práticas de Governança Corporativa em uma organização, tem como objetivo alinhar o interesse dos componentes do sistema (proprietário, executivos e stakeholders), conferindo, dessa forma, maior eficiência e legitimidade à instituição (IBGC, 2009).

Segundo La Porta et al (1998), países que apostaram na implantação de um sistema de governança mais adequado aos padrões exigidos pelas instituições dominantes, que conferiam maior participação dos conselheiros, ampliação dos direitos dos acionistas e maior transparência em suas ações, tornaram-se mais atrativos para os investidores (nacionais e estrangeiros).

Como já fora visto, o fator que precipitou o avanço e a disseminação dos códigos de boas práticas de governança corporativa foi uma série de escândalos de corrupção envolvendo grandes e tradicionais organizações americanas e europeias. Para impedir a proliferação de tais práticas nocivas e recuperar a credibilidade dos investidores, foram publicados alguns documentos importantes como o Cadbury Report, intitulado originalmente

“The Financial Aspects of Corporate Governance”, em dezembro de 1992, e a Lei Sarbanes-

Oxley, publicada em julho de 2002, que além de impor medidas mais rígidas contra os atos contábeis fraudulentos nas organizações, fomentava a disseminação dos códigos de boas práticas de governança corporativa (IBGC, 2006). Tais códigos foram amplamente publicados em vários países, demonstrando a preocupação do mercado em encontrar uma saída para a crise de legitimidade em que se encontrava imerso (ROSSONI; MACHADO-DA-SILVA, 2010).

Embora a grande difusão dos códigos de boas práticas de Governança Corporativa tenha ocorrido de forma mais intensa a partir da segunda metade da década de 1990, os primeiros documentos instituídos com este fim datam do final dos anos de 1970. Em um ambiente institucional caracterizado pelo predomínio dos executivos, com pouca intervenção regulatória, onde os investidores desempenhavam um papel de menor importância, foi que surgiu o primeiro documento de boas práticas voltadas à Governança Corporativa nos

Estados Unidos. O documento era um relatório denominado The Role and Composition of the

Board of Directors of the Large Publicly Owned Corporations. Este documento era uma

resposta às tomadas hostis de controle de algumas organizações (hostile takeovers), que ocorriam naquele período, assim como alguns comportamentos considerados criminosos (ENRIONE, MAZZA, ZERBONI, 2005).

Nos anos de 1990, como já destacado, com os escândalos de corrupção envolvendo grandes corporações, iniciaram uma resposta à emergente demanda por prestação de contas dos agentes das corporações. A desinstitucionalização das configurações institucionais existentes ocorreu também neste período, principalmente em razão da ascendência de novos atores envolvidos diretamente na formulação de novas regras de governança corporativa (ENRIONE, MAZZA, ZERBONI, 2005). Segundo Enrione, Mazza e Zerboni (2005), importantes debates ocorreram também durante o final dos anos de 1980 e início dos anos de 1990 com o objetivo de promover a governança corporativa e a discussão de novas regras para ampliar o compromisso das organizações em elementos como a transparência e a prestação de contas.

Este estágio do processo de mudança institucional diz respeito à pré- institucionalização, momento no qual as novas regras são propostas, analisadas e debatidas. O fim desse estágio foi marcado pelos esforços de teorização. Esta etapa fora deflagrada por meio do relatório emitido pelo Cadbury Committee, em 1992. O relatório, conhecido como Cadbury

Report, decretou o fim das experimentações e suas regras inspiraram a criação vários códigos

de boas práticas de Governança Corporativa e a disseminação desses códigos se deu de forma rápida pelo mundo (ENRIONE, MAZZA, ZERBONI, 2005).

No estágio seguinte, a difusão, vários atores importantes da área da Governança Corporativa desempenharam papel decisivo, como as empresas de consultoria, que difundiram essas ideias através da elaboração dos códigos de boas práticas, bem como do poder de influência que dispunham para fazer com que os diversos atores envolvidos no processo pusessem estes códigos em prática. As Universidades também passaram a incorporar em seus programas de ensino os códigos de Governança e a prestação de contas. O código de boas práticas da OCDE foi publicado pela primeira vez em 1999 e amplamente adotado, inclusive por países não membros da entidade. (ENRIONE, MAZZA, ZERBONI, 2005).

A partir do momento em que demonstravam os resultados positivos nas performances financeiras de organizações que faziam uso das novas regras de governança, estes códigos foram adquirindo legitimidade cognitiva. Isso pode ser comprovado pelo fato de que,

mesmo não sendo obrigatória a adesão aos códigos, grande parte das organizações os seguiam fielmente. Seguindo a abordagem da NIS - New institutional theory of organizations, ou Neo- institucionalismo, à medida que os novos códigos eram amplamente aceitos por todos os atores, as organizações se legitimavam, uma vez que se encontravam plenamente imersas nessas novas regras. E com a adesão de um número cada vez maior de organizações, os códigos de Governança Corporativa se tornaram plenamente institucionalizados (ENRIONE, MAZZA, ZERBONI, 2005). Em outras palavras, os sistemas de Governança Corporativa passaram a ser institucionalizados e socialmente aceitos, portanto, legitimados. (MEYER; ROWAN, 1977).

O mercado brasileiro teve seu primeiro código de governança editado somente em 1999, quase uma década após o Cadbury Report. A organização responsável pela cartilha foi o Instituto Brasileiro de Governança Corporativa – IBGC, uma organização sem fins lucrativos criada para promover tais práticas em território nacional (IBGC, 2006). Mais tarde, objetivando regular o mercado de ações brasileiro, a Comissão de Valores Mobiliários – CVM, também editou a sua cartilha de boas práticas de Governança para empresas de capital aberto (BRASIL, 2002). Contudo, ambos códigos de boas práticas não entram em conflito, uma vez que o foco de ambos são: a transparência nas informações, a equidade no tratamento às partes interessadas, a prestação de contas e a responsabilidade corporativa (OLIVEIRA, 2015).

Em dezembro do ano 2000, a Bolsa de Valores de São Paulo – BOVESPA, criou os Níveis Diferenciados de Governança Corporativa. Essa iniciativa da Bovespa tinha como principal objetivo estimular o mercado de capital, criando assim um ambiente de negociação que despertasse maior interesse dos investidores e a valorização das empresas (OLIVEIRA, 2015). Para isso, este novo sistema estabelecia níveis diferenciados de Governança Corporativa, além de impor padrões rígidos para as empresas que tivessem interesse em cadastrar na BOVESPA. Neste contexto, a adesão das empresas passou a ocorrer mediante assinatura de contrato formal entre representantes da empresa (Conselheiros de Administração, executivo principal, conselheiros fiscais e sócios controladores) e a BOVESPA (OLIVEIRA, 2015).

Este contrato obriga as partes a respeitar o Regulamento de Listagem ou Regulamento de Práticas diferenciadas de Governança Corporativa, que estabelece padrões de governança para dois níveis de empresas que podem ter suas ações negociadas na BOVESPA: empresas de Nível 1 e empresas de Nível 2 (OLIVEIRA, 2015).

Como já visto anteriormente, os compromissos assumidos pelas empresas do Nível 1 dizem respeito ao aprimoramento na divulgação de informações ao mercado, facilitando dessa forma o acompanhamento e a fiscalização dos atos da administração, assim como otimizar

a dispersão acionária, promovendo a equidade dos direitos dos acionistas (controladores e minoritários) (OLIVEIRA, 2015). Nas empresas do Nível 2, os compromissos assumidos, além de abranger o cumprimento de todas as regras aplicáveis às empresas do Nível 1, obriga a empresa a aderir à Câmara de Arbitragem, um órgão criado pela BOVESPA com o objetivo de mediar conflitos societários (BM&FBOVESPA, 2011).

Existem ainda, além dos dois níveis diferenciados estruturados pela BOVESPA de Governança Corporativa, outros dois níveis: o nível do Mercado Tradicional, que é aquele no qual as operações ocorriam antes da reestruturação efetivada pela BOVESPA, e o nível Mercado Novo, cujas exigências para a aceitação de empresas é basicamente o mesmo do Nível 2, exceto que para serem aceitas no Mercado Novo, a empresa deve ter o seu capital social composto apenas por ações ordinárias, ou seja, aquelas que dão direito a voto nas assembleias gerais, ao passo que no Nível 2 são aceitas ações preferenciais, ou seja, aquelas que dão prioridade ao investidor na distribuição de dividendos e no reembolso de capital (ROSSONI; MACHADO-DA-SILVA, 2010).

A adesão das empresas aos Níveis Diferenciados de Governança Corporativa propicia aos seus investidores maior acuracidade na fixação dos preços das ações, maior facilidade no acompanhamento e fiscalização das atividades das empresas, e consequentemente maior segurança e redução dos riscos de investimentos. As empresas participantes, por outro lado, consolidam uma boa imagem institucional, agregam maior valor às suas ações e como consequência, despertam o interesse de investidores (NARDI; NAKAO, 2008).

No quadro 1 é possível observar alguns dos códigos de boas práticas de Governança Corporativa, que foram amplamente disseminados por organizações ao redor do mundo, desde o final dos anos 1970. Estes documentos inspiraram a criação de inúmeros outros códigos de boas práticas, e também foram adaptados para atender às necessidades de Governança Corporativa em outros setores além do setor privado.

Quadro 1: Códigos de boas práticas de Governança Corporativa

Fonte: Adaptado de Rossoni e Machado-da-Silva (2010, p.187).

DOCUMENTO ANO LOCAL ORIGEM

The Role and Composition of The Board of Directors of The Large Publicly Owned Corporation

1978 EUA

Surge como resposta a uma onda de tomadas hostis de controle de algumas organizações (hostile takeovers ).

Cadbury Report (The Financial Aspects of

Corporate Governance) 1992 Reino Unido

Surge da necessidade de aprimorar a confiabilidade dos relatórios financeiros das companhias inglesas de capital aberto, bem como de promover práticas de transparência na gestão e maior participação dos acionistas na gestão

Governance and Development (World Bank ) 1992 EUA

Documento elaborado com o objetivo de promover a boa Governança Corporativa na administração do setor público, através da promoção da participação social, Accountability e transparência nas informações.

OECD Principles of Corporate Governance. 1999 França

Este documento tem sua importância destacada pela busca de um diálogo com organismos internacionais objetivando uma compreensão comum sobre os elementos que compõem a boa Governança Corporativa.

Código de Melhores práticas de Governança

Corporativa (IBGC) 1999 Brasil

A primeira edição do documento de boas práticas do IBGC trazia algumas reflexões sobre a Lei de sociedades Anônimas então vigente no país, e também sobre outros documentos de boas práticas de Governança Corportiva. O código já possui 5 edições, sendo a última publicada em 2015.

Níveis Diferenciados de Governança Corporativa

(BOVESPA) 2000 Brasil

O objetivo da BOVESPA com a criação dos Níveis

Diferenciados de Governança Corporativa era proporcionar um ambiente de negociação que

estimulasse o interesse dos investidores e a valorização das companhias. O mercado de ações nacional sofria com a fuga crônica de investidores e, diante deste cenário, várias empresas fechavam o seu capital.

Governance in the public sector: A governing

body perspective (IFAC) 2001 EUA

A International Federation of Accoutants (IFAC), busca através deste documento trazer as boas práticas de governança corporativa para o setor público.

Cartilha de Governança: Recomendações da CVM

sobre governança corporativa 2002 Brasil

Em 2002 a Comissão de Valores Mobiliários (CVM), órgão responsável pela regulamentação do mercado de ações brasileiro lança a sua cartilha de boas práticas de Governança Corporativa para empresas de capital aberto.

Sarbanes Oxley Act Law 2002 EUA

A Lei Sarbanes Oxley Act é um grande marco na Governança Corporativa mundial. Essa lei foi redigida com o objetivo de evitar o esvaziamento dos investimentos financeiros e a fuga dos investidores causada por uma série de escândalos de fraude envolvendo grandes corporações de capital aberto americanas. Essa lei buscava promover práticas que promovessem segurança dos investidores com relação às práticas de Governança Corporativa adotadas pelas empresas.

Guidance on Good Pratices in Coporate

Governance Disclosure (United Nations) 2006 EUA/Suíça

Documento desenvolvido com o objetivo de servir como ferramenta para a promoção de boas práticas de Governança Corporativa por empresas de todo o mundo.

G20/OECD Principles of Corporate Governance 2015 Turquia

Trata-se de uma revisão das boas práticas apontadas pela OECD em 1999 (revisada em 2004). A atual revisão, porém, é baseada nas demandas apresentadas por Ministros de Finanças e pelos gestores de Bancos Centrais presentes no Fórum G20, ocorrido na Turquia.