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CAPÍTULO II O tráfico de drogas pela lente da produção jornalística 2.1 Moralidade no discurso

2.1.2 Códigos deontológicos de Portugal, Brasil e Paraguai em comparação

O estudo dos dos códigos de ética dos países que abrangem esse trabalho é necessário para tentar compreender o padrão de comportamento dos profissionais em relação à pro- fissão. Também é importante para tomar conhecimento sobre a maneira que esse enten- dimento se manifesta no relato do jornalista. Por estar debrubruçado sobre três experiên- cias diferentes há expectatia de que práticas jornalísticas resultantes de também diferen- tes acúmulos de cultura, tradições e formas de produção. De qualquer maneira, as dife- renças culturais não superam a prática jornalística, regida pela obediência à ética regula- da por meio de códigos. Porfírio (2011) define códigos de ética como constelação de cri- térios, princípios, normas e regras sistematizados para um determinado grupo profissio- nal e representam requisito primário para o desempenho da atividade. Voltatado para a prática jornalística, o autor explica que o código de ética:

Implica uma interpretação dos princípios gerais do profissão jornalística e atividades profissionais, isto é, implica a cristalização dos princípios a seguir para obter um comportamento correto e ade- quado para o bom trabalho do jornalista ou profissional de informação e comunicação. Com rela- ção aos códigos deontológicos da profissão jornalística, podemos defini-los como um conjunto de “princípios e normas de conduta profissional dos jornalistas em relação aos seus direitos, deveres e responsabilidades”. Um código de ética jornalístico faz referência ao estabelecimento de princí- pios éticos destinados a servir de guias no exercício da profissão jornalística, adotados e controla- dos por A profissão em si (Porfírio, 2012, p. 141)

Conforme Tranquina (2002), começaram no fim do século XIX as preocupações deonto- lógicas no jornalismo, mas a consolidação da discussão ocorreu no século XX. Como explica Cristofoletti (2012a), o “jornalismo é uma atividade social que revela dados da realidade e interliga fatos desconexos para uma maior compreensão humana”. A oferta desses dados, contudo, não pode ser feita ao sabor da percepção individual do profissio- nal, mas a partir de contratos de mediação, ou seja, da ética (Abramo, 1999). Nesse pon- to, Karan (2014), revela que a “informação implica ser medida por ética”. A ética é um dos princípios básicos de orientação da prática jornalística para assegurar o direito à in- formação (Abramo, 1988, Cazzamata, 2015). Em atenção à ética está a necessidade de separação entre o fato e a opinião (Traquina, 2004). É a ética que assegura que a mídia deve ser independente, informar os cidadãos e agir como vigilante do poder (Karam, 1997; Traquina, 2004). Sobre a ética na atividade jornalístia, Karam ainda afirma que:

“É preciso reconhecer no jornalismo potencialmente uma forma de reconstrução diária do movi- mento humano para si mesmo, no qual os homens se tornam não somente reflexo, mas também projeção. O jornalismo não é só moralmente defensável. Ele é moralmente imprescindível (Ka- ram, 1997, p.38-39).

Em contrapartida, o jornalista deve primar por uma cobertura comprometida com a ver- dade arcar com as consequências desse dever. Esse comprometimento, contudo, não é pessoal, ou seja, não são os indivíduos os responsáveis por seus próprios atos, mas o co- letivo (Cazzamatta, 2015). Na esfera coletiva, a responsabilidade jornalística é regulada por critérios e normas necessárias ao cumprimento do compromisso com a veracidade dos fatos, a qualidade da informação, a liberdade de expressão e a regulação da profissão (Fidalgo, 2000). Essas normas são agrupadas em conselhos, códigos de conduta e códi- gos de ética.

De acordo com Traquina (2012), foi registrado nos Estados Unidos em 1889 o primeiro artigo de jornalismo em que constava a palavra ética já no título. Aparece, então, em

1890, um código de conduta para jornalistas, alguns anos após a publicação das 24 regras de conduta jornalística, no Philadelphia Public Ledger, em 1840.

No entanto, o primeiro código deontológico escrito data de 1900 e é sueco, mas seria apenas ado- tado em 1920. Em 1918, o Sidicato Nacional de Jornalistas francês aprova o primeiro código den- tológico. A nível internacional, a Federação Internacional de Jornalistas adota um código de honra profissional em 1939 (Traquina, 2012, p.71).

O movimento de agrupar normas com códigos de conduta ocorre durante todo o século 20 (Porfírio, 2012), havendo registros como um documento adotado por um jornal do Kansas em 1910 e cujo modelo foi seguido durante a primeira conferência de imprensa ocorrida em 1926 em Washington (Fortner, 2011; Cazzamatta, 2015). O modelo foi con- firmado em 1950 pela IAPA (Inter-American Press Association) em um movimento que marcou várias tentativas de implantação por outros órgãos de imprensa norte-americanos, como a International Federation of Journalists e a International Union of Press Internati- onal até que, a partir de 1945, recebe apoio da UNESCO (Fortner, 2011). O início das investidas em códigos de ética marca, ainda, a consolidação da credibilidade e disciplina da profissão nessa fase da história, quando o jornalismo passa a questionar critérios sen- sacionalistas e passa a se estabelecer como sensor da sociedade em uma nova dinâmica (Bivins, 2014).

Os códigos de ética jornalística têm como função garantir a democracia, proteger a inte- gridade profissional contra ingerências externas, conflitos de interesses e demonstrar a responsabilidade com a informação e o público (Cristofoletti, 2012b; Karam, 2004; Fi- galdo, 2007; Ijuim, 2009). Estavam nos primeiros códigos noções e atenção à necessida- de de atenção à ética, mas também à objetividade e independência do aparelho estatal (Fortner, 2011; Bivins, 2014).

Todo código deontológico é resultado de um processo de discussão coletiva, de definição de limi- tes para o grupo ao qual é dirigido, e de sinalização dessas balizas para os demais agrupamentos sociais com os quais se têm relação. Assim, nenhuma regra de conduta ética é fruto de uma única cabeça. A comunidade identifica um papel social para sua atuação; projeta boas práticas; pontua atitudes condenáveis; demarca limites; observa prioridades; elenca valores que sustentem suas to- madas de decisão em situações de dilema ético; enfim, negocia um conjunto que ajudará a compor um modelo de atuação na área de sua competência. Esse processo de discussão coletiva tem sua própria dinâmica, mas suas etapas costumam se repetir independentemente dos grupos profissio- nais que o liderem (Cristofoletti, 2012; 94).

A construção dos códigos de ética de jornalismo engloba princípios que suportam a li- berdade de expressão, a privacidade, a justiça, a preservação de fontes em texto e ima- gens, os conflitos de interesse comum, o direito à informação, a preservação da democra- cia e de indivíduos fragilizados em observação à responsabilidade social (Ijuim, 2009; Karan, 2014). Sobre a responsabilidade social, Ijuim (2009), lembra que:

A questão da responsabilidade social parece ser algo consagrado no meio jornalístico. A expres- são, que carrega força e impacto, é comumente usada como bordão de campanhas institucionais e/ou mercadológicas de empresas de comunicação. Tal consagração talvez advenha do papel his- tórico da imprensa de ser tribuna para debates e instrumento de movimentos decisivos que culmi- naram em conquistas expressivas para a sociedade (Ijuim, 2009; p.32).

Dentro dos preceitos éticos devem ser enquadrados os objetivos do jornalismo, que histo- ricamente incluem a interpretação de eventos, a vigilância do poder, a manutenção da informação ao público (Ijuim, 2009). Ou seja, a base ética do jornalismo está no argu- mento de que a informação é condição para ação social. Nessa perspectiva, Karam (2004) pontua que:

A formação e a produção jornalísticas exigem fundamentos epistemológicos, incluindo reflexões de ordem ética, técnica e estética. Os princípios morais da atividade reúnem, como síntese, um de- ver ser (deontologia) ancorado na busca pela realização profissional e pela resolução de fatos- problemas aos quais a humanidade reconhece como tais, de um acidente a um desvio de verbas públicas, de um atentando às razões dele ou sobre os interesses envolvidos em quaisquer conflitos ou guerras. A escolha técnica é também moral e vice-versa. Por isso, é na especificidade da temá- tica ética que se dá a ponte para a universalidade das questões sociais. Esta é a razão de existir có- digos que, em última instância, revelam as bases teóricas e os marcos teleológicos os quais se bus- ca em uma profissão, na sociedade ou em todo o sistema midiático (Karam, 2004, p.124).