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4.1 O início dos anos 2000

4.1.1 Cúpula Mundial sobre a Sociedade da Informação

Na conferência de 1998 da ITU, em Minneapolis, o governo da Tunísia apresentou uma proposta para que fosse promovido um encontro para debater sobre medidas possíveis para diminuir a diferença de acesso entre países ricos e pobres à tecnologias da informação. Com base nesta proposta, em 2001, durante a assembleia geral da ONU foi acordado que seria desenvolvido um encontro para debater questões da Sociedade da Informação. A União Internacional de Telecomunicações(ITU) ficou responsável pela organização do evento e decidiu executá-lo através de dois encontros: o primeiro no ano de 2003 em Genebra, e o segundo no ano de 2005 em Túnis. O evento foi chamado de Cúpula Mundial sobre a Sociedade da Informação (World Summit on the Information Society - WSIS) e teria como objetivo central aproximar o debate sobre as tecnologias da informação e comunicação das propostas apresentadas na Declaração do Milênio da ONU.

A primeira fase do WSIS, em 2003, teve a participação de 175 países e conseguiu apontar para dois compromissos principais: aumentar o acesso à Internet, fazendo com que em 2015 metade da população mundial estivesse conectada, e promover o desenvolvi- mento das redes baseada em modelos de acessibilidade e livre conhecimento. Destas duas metas acreditamos que a que mais avançou foi a relacionada à acessibilidade graças a projetos como a distribuição de Internet wireless em centros metropolitanos, a expansão do número de projetos baseados em Linux, o crescente número de línguas disponíveis para sistemas operacionais Linux, o desenvolvimento de computadores de baixo custo como a

RaspberryPi, e os padrões de acessibilidade para sites com narração de textos6. Por sua

vez a expansão da rede é ainda muito tímida nas regiões mais pobres do planeta, pode- mos apontar, por exemplo, que no continente africano apenas 26,5% da população tinha

acesso à Internet em 20147, e que a ampliação do acesso foi de 6,5% entre os anos 2000 e

2014. Apesar de dados mais otimistas apontarem que 42,3% da população mundial têm acesso à Internet, enquanto regiões como a América do Norte, a Oceania e a Europa têm penetração acima de 70%; a penetração está abaixo de 50% no Oriente Médio, Ásia e Africa.

Uma tendência que foi lançada neste evento foi a representação multistakeholder, de forma que o setor privado e ONGs (representando aqui a sociedade civil) também estiveram presentes nos debates de 2003. Neste primeiro encontro foram produzidos três

documentos: uma Declaração de Princípios (WSIS,2003a) que alinhava o debate sobre as

TICs à Declaração do Milênio e apontava os próximos passos para o desenvolvimento da

Sociedade da Informação, um Plano de Ação (WSIS, 2003b) apontando as responsabili-

6 ℎ𝑡𝑡𝑝: //𝑢𝑛𝑐𝑡𝑎𝑑.𝑜𝑟𝑔/𝑒𝑛/𝑑𝑜𝑐𝑠/𝑎64𝑑64

𝑒𝑛.𝑝𝑑𝑓 Acessado pela última vez em fevereiro de 2017.

dades de cada stakeholder na conquista dos objetivos de universalização das tecnologias e ampliação de sua penetração com base em uma ‘Agenda Solidária’, e uma Declaração

da Sociedade Civil (WSIS,2003c) e intitulado “Shaping Information Societies for Human

Needs”, representada por ONGs e entidades como a Electronic Frontier Foundation(EFF)

em que eram levantados pontos sobre a defesa de direitos humanos e regulação de comu- nicação.

No que diz respeito à Governança da Internet o evento não trouxe avanços profun- dos, mas teve efeitos muito interessantes. Durante o evento de Genebra a União Europeia apresentou uma proposta de que os Estados Unidos abrissem mão de seu poder sobre a ICANN. A questão surgiu graças ao incomodo gerado pela predominância dos Estados Unidos na geração de políticas para governança. Os EUA se recusaram a ceder seus po- deres e apresentaram um documento justificando seu posicionamento com o argumento de que seriam os defensores do desenvolvimento da Internet baseada no setor privado e com três pilares de sustentação: a criação de um ambiente legal para atrair empresas que desenvolvam infraestrutura, o consumo de conteúdo para a Internet com respeito à pro- priedade intelectual, a segurança na Internet contra ciberataques, spam e vírus. Graças a esta discordância entre a UE e os EUA foi criado o Grupo de Trabalho sobre Governança da Internet(Working Group on Internet Governance - WGIG), que entregou seu relatório na WSIS em 2005.

Essa defesa apresentada pelo governo do EUA com três pilares apontada de forma bastante coesa para a estratégia do país para a manutenção de sua hegemonia. Garantir a segurança e resiliência da rede é importante pois a fragilidade em pontos específicos da rede aumenta a fragilidade da rede como um todo. Além disso, se a sensação de segurança aumenta entre os usuários da rede, eles então ficam mais a vontade para usar serviços que exigem sigilo e confiança, como governo eletrônico e transações bancárias. Assim esse pilar tem importância para o setor privado pois exige a criação de empresas de segurança e abre espaço para novos serviços.

Por sua vez o consumo de conteúdo – como vídeos e textos – para a Internet in- centiva setores econômicos importantes para o EUA: o de entretenimento e o de estrutura para Internet – como motores de busca, redes sociais, email e armazenamento de conteúdo na nuvem. O setor de entretenimento cresceu nos últimos ano com novos modelos de dis- tribuição sob demanda, bem como pelo crescimento do setor de jogos digitais. Plataformas como o Youtube e o Vimeo abriram espaço para produtores amadores. A mesma lógica se aplica para escritores, músicos, ilustradores e programadores, todos grupos que passaram a ter com a Internet e pequenas plataformas de distribuição espaço para publicação de conteúdo sem a necessidade de intermediários, gerando com isso fonte de renda capilari- zada. Por fim todo esse novo volume de conteúdo e informação gerado com a Internet por sua vez demanda estrutura de servidores e para hospedar o que é produzido, demandando

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equipamento e pessoas capazes de manter esses servidores.

Esse posicionamento do governo norte americano nos mostra quais os três pontos centrais, segundo sua perspectiva: segurança técnica, segurança legal e o desenvolvimento do mercado, o que por sua vez não passa de garantir um ambiente para que negócios possam se expandir. Tal postura foi completamente apoiada institucionalmente uma vez que o braço governamental que supervisiona a ICANN até 2016 era o Departamento de Comércio dos EUA, e mesmo depois da transição da IANA já havia se criado uma forte base institucional para que se mantivesse o suporte do Governo para as empresas. As implicações diretas dessa postura é que as populações se relacionariam com a Internet não por meio dos direitos humanos, mas sim por meio dos direitos dos consumidores, e consequência lógica é que quem não consome não tem direito à Internet.

O WGIG apresentou uma reação à esse posicionamento do Estados Unidos com o

relatório de 2005 que influenciou o Compromisso de Tunis (2005) ao tomar por base as

Metas de Desenvolvimento do Milênio e à apontar a Internet como um direito humano. Apesar desse compromisso não afetar a hegemonia norte-americana ela fundamenta a ar- gumentação em favor da disseminação da Internet em regiões mais pobres, e por tanto aumenta a importância de movimentos multissetoriais que abram espaço para que re- presentantes de regiões com pequeno impacto na Internet também possam participar do debate sobre ampliação da rede.

Na véspera da WSIS de 2005 um grupo de organizações ligados pelos trabalhos com bancos de dados das Nações Unidas, a Associação por uma Comunicação Progressiva (APC), apresentou um documento com propostas para o evento que se iniciava, algumas das quais surtiram efeitos reais durante os debates da Cúpula. A proposta da criação do Fórum de Governança da Internet (Internet Governance Forum - IGF) foi aceita pela comunidade internacional, e o IGF começou a promover encontros frequentes da comuni- dade ligada à Governança da Internet. O Fórum se organiza por meio de representação multistakeholder para alinhar as diretrizes para o desenvolvimento da Governança da In- ternet com a lei internacional e a Declaração Universal de Direitos Humanos, mas esta implementação nunca foi totalmente desenvolvida. Os debates entre uma perspectiva de direitos humanos e uma perspectiva de regulação da Internet vem se intensificando, o desenvolvimento da Internet visando o aumento da capilarização e da acessibilidade acon- teceu, mas com falhas, como dito acima, o apoio para desenvolvimento de países e regiões pobres ainda é pequeno, e a transformação da ICANN em um órgão global – com com- pleto controle sobre o DNS – e um sistema de prestação de contas claro e transparente foi, novamente, negada pelos EUA.

A pressão sobre o governo Norte Americano para que abrisse mão do controle sobre a ICANN continuou no WSIS-05 e quase foi motivo para o fim prematuro da conferência (MUELLER HANS KLEIN; COGBURN, 2005). Os EUA via na transferência do con-

trole sobre os poderes da IANA como um risco ao desenvolvimento da rede com base na liberdade de mercado.

Como resultado deste segundo encontro, além da criação do IGF, foram produzi- dos dois documentos que pautaram muitos debates sobre o desenvolvimento da Internet, bem como sua governança. O “Compromisso de Túnis” e a “Agenda de Túnis” foram importantes, pois até o NETMundial foram o últimos eventos em que atenderam em massa representantes de alto escalão de governos. Os documentos de 2005 foram tomados como um marco entre governos, como é possível ver em declarações de representantes

governamentais em suas manifestações no NETMundial8.

A diminuição do volume de representantes de alto escalão nos eventos sobre Go- vernança da Internet indica que essa pauta não teve centralidade na década de 2000. Isso passa a mudar nos anos que se seguem, e a Conferência de 2012, bem como as denuncias de Snowden são os principais indícios.

O WSIS se repetiu todos os anos desde então em Genebra, geralmente em meados de maio, mas sem a mesma projeção dos dois primeiros, e em 2014 aconteceu o WSIS+10 onde foram revisitadas as proposições de 2003 e 2005, avaliados os avanços e desenvol-

vimentos, os balizando com a Agenda de 20039. Neste evento foram produzidos novos

documentos com compromissos para além de 201510.

Desde sua criação o IGF teve um papel de arena pública. a Atuação do Fórum, com seus encontros anuais e iniciativas paralelas tem como objetivo abrir espaço para o debate das questões relacionadas à Internet e tecnologias da informação, mas principal- mente trazer a tona e para o debate com um público mais amplo questões que tenderiam a se manter em pequenos silos. Os temas debatidos nos encontros mudaram pouco com o tempo, mantendo certa temática, mas ganhando alguma complexidade. Podemos acom- panhar como a complexidade do debate veio aumentando ano a anos:

∙ 2006: Abertura, Segurança, Diversidade e Acessibilidade

∙ 2007: Abertura, Segurança, Diversidade, Acessibilidade e Recursos Críticos da In-

ternet

∙ 2009 - 2012: Governança da Internet para o desenvolvimento, Novas Temáticas,

Administrando Recursos críticos da Internet, Segurança, Abertura e Privacidade, Acessibilidade e diversidade e O caminho para o futuro

8 É possível que s diferentes percepções entre os dois resultados venha dos diferentes modelos de repre- sentação multissetorial. Enquanto em Túnis o modelos era multistakeholder respeitando ‘respective

roles and responsabilities’, e com isso era mantida a ordem e certa hierarquia entre governos, empresas

e o terceiro setor, em São Paulo o modelo multistakeholder ‘on equal footing’ forçava um nivelamento e dava o mesmo direito de fala e participação para cada representante de cada um dos quatro setores representados no evento.

9 O documento pode ser encontrado em: ℎ𝑡𝑡𝑝 : //𝑏𝑖𝑡.𝑙𝑦/1𝐺𝑈𝑡𝐼𝑠4 10 O documento pode ser encontrado em: ℎ𝑡𝑡𝑝 : //𝑏𝑖𝑡.𝑙𝑦/29𝑔𝑔𝑁𝑟𝑄

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∙ 2013: Acessibilidade e Diversidade - Internet como uma ferramenta para o cresci-

mento e o desenvolvimento sustentável, Abertura - Direitos Humanos, Liberdade de Expressão e livre circulação de informação na Internet, Segurança - Direito e ou- tras configurações: SPAM, Hacking e crime cibernéticos, Cooperação aprimorada, Princípios de cooperação multissetorial e Princípios de Governança da Internet

∙ 2014: Politicas para Garantir o Acesso, Criação de conteúdo, Disseminação e uso, In-

ternet como uma ferramenta para o crescimento e desenvolvimento sustentável, IGF o futuro do ecossistema da Internet, Estimulando a Confiança no Digital, Internet e Direitos Humanos, Recursos Críticos da Internet e novas questões

∙ 2015: Cibersegurança e Confiança, Economia da Internet, Inclusividade e Diversi-

dade, Abertura, Estimulando Cooperação Multissetorial, Internet e Direitos Huma- nos, Recursos Críticos da Internet, Novas Questões

Apesar de aumentar a complexidade da abordagem dada aos diversos temas ainda é possível ver como os tópicos nos levam a interagir com a temática forçando o contato entre a técnica, a gestão de recursos e as implicações sociais, levando o debate a ter sempre um caráter multidisciplinar e um tom que chama a uma postura multisetorial. Esse caráter multissetorial que se torna em alguma medida referência para tantos eventos de governança não é usado na Conferência Mundial de Telecomunicações Internacionais, mas a partir do momento em que se passa a debater sobre governança da internet neste evento, essa postura passa a ser exigida por parte dos setores que usualmente participam no debate sobre a rede.

No próximo Capítulo vamos abordar algumas das contribuições e dos debates levantados na WCIT-12, e codo o contexto que tentamos levantar até então se torna fundamental para compreendermos os posicionamentos que debateremos abaixo.

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5 Conferência Mundial de Telecomunicações

Internacionais - WCIT 12

Neste capítulo temos como objetivo central analisar os documentos produzidos

na Conferência Mundial de Telecomunicações Internacionais1 (WCIT-12) mostrando sua

aproximação com o debate sobre a governança internacional da Internet. Iremos apresentar a disputa que surgiu no evento graças à proposta do grupo liderado pela Rússia de incluir a regulação da Internet nas Regulações Internacionais de Telecomunicações (ITRs), e em seguida mostrar como o governo Brasil se posicionou no Conferência. Essa análise deve nos ajudar a demonstrar os motivos para considerar 2012 como um ano chave para o campo da Governança da Internet, bem como a contextualizar o posicionamento do governo brasileiro frente às disputas sobre a governança internacional da Internet.

Em dezembro de 2012 a União Internacional de Telecomunicações (ITU) promoveu em Dubai a WCIT-12 para debater a situação atual do setor de telecomunicações e deli- berar sobre uma atualização das Regulações Internacionais de Telecomunicação (ITRs), criadas em 1988. O evento recebeu uma série de críticas, especialmente por parte de inte- lectuais e especialistas ligados ao EUA, no sentido de que o objetivo final dos países que apoiaram a proposta de regular elementos da Internet por meio das ITRs seria entregar aos governos o controle da Internet. Em nossa opinião essa é um posicionamento bastante simplista.

No evento estavam presentes representantes de 144 países com direito de assinar a nova proposta, mas destes apenas 89 (62% dos possíveis signatários) foram a favor das mudanças. Parte deste grupo apresentou suas justificativas, especialmente no tocante à atualizações voltadas para o controle estatal da Internet, em um documento conjunto, cuja liderança estava nas mãos da Rússia e da China. Os outros 55 países – dos quais fazem parte os EUA, os países da União Europeia e o Japão – se recusaram a assinar o documento afirmando que ele feria os princípios de inovação e liberdade intrínsecos à rede. A recusa destes países a assinar as ITRs não invalida o documento, mas faz com que ele fique muito fraco, e sem capacidade de implementação, de forma que na prática as antigas regras seguem valendo.

Como podemos ver na Figura 12 há entre os países da Europa, Estados Unidos, Japão, Austrália e Índia, países todos com uma significativa presença no campo de tecno- logia da informação e comunicação e todos contra as mudanças das ITRs. Mesmo com um número maior de países que assinaram o documento da convenção – países assinalados em preto no gráfico – os não signatários – países em vermelho – são países mais ricos e

com um empresas mais representativas no setor. Dessa forma tem maior capacidade de mobilizar o setor por meio de negócios e para além das pressões exercidas pelo documento da conferência.

Figura 11: Posicionamento dos países frente à proposta para ITRs na WCIT-12

O principal ponto de contato entre a conferência e a Governança da Internet foi a tentativa de aproximar a regulação dos recursos críticos da Internet da regulação da área de telecomunicações como um todo. A justificativa apresentada para esta tentativa de aproximação é a de que a Internet é um serviço que foi desenvolvido sobre a estrutura de telecomunicações, e que hoje concorre com uma série de serviços de telecomunicações, e assim sendo deveria ser regulada juntamente a este setor. Mencionar a Internet em um documento que dá norte para a regulação da rede de telefonia poderia ser de fato benéfico para alguns países – especialmente aqueles cuja regulação do setor está mais próxima do Estado.

Graças à polarização do evento em dois grupos liderados de um lado pelo EUA e do outro por Rússia e China surgiu o argumento de que a conferência de Dubai iniciou

a guerra fria da Internet2. O argumento é endossado pelo debate sobre a fragmentação

da Internet que abordamos anteriormente, mas como Milton Mueller apontou em um

texto de seu blog3 a comparação entre o cenário do pós Segunda Guerra e nosso cenário

atual é alarmista. É importante entender o que levou os comentadores a postularem a ideia de uma guerra fria digital, entender quais os interesses dos atores sociais atrás dos direcionamentos impulsionados com as propostas na conferência, e em que medida essas

2 Matéria do The Economist acessada pela última vez em novembro de 2016: http://www.economist.com/blogs/babbage/2012/12/Internet-regulation

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suas propostas foram levadas para a Conferência e a relação destes com o documento final.

Diferente da WSIS este evento não se organizou com a participação de vários setores da sociedade (multistakeholder); era permitido que representantes de empresas e de algumas entidades da sociedade civil acompanhassem do evento como ouvintes. Todas entidades e empresas seriam representadas no encontro na figura dos representantes oficiais dos Estados. Com a presença dessas entidades sem direito de voz, mas que têm presença em outros espaços deliberativos sobre Governança da Internet acabou se montando uma situação em que se aproximaram dois modelos administrativos e deliberativos distintos: o multilateral da ONU e o multissetorial do IGF. Encontros multilaterais como estes, muito comuns na tomada de decisões de diversas questões internacionais, não são comuns em debates relacionados à Internet. Este posicionamento da ITU foi o primeiro ponto criticado neste evento que gerou tantas controvérsias, justamente pelo pressuposto assumido pela organização de que seria possível tomar alguma posição oficial em relação à Internet sem a consulta com atores fora dos governos. Os dois principais polos de críticas foram interesses ligadas ao setor empresarial, e grupos da sociedade civil relacionados com a defesa da liberdade de expressão. Em uma série de textos em sites e blogs passamos a

encontrar afirmações como “a ITU está tentando tomar a Internet para ela”4. Uma das

principais demonstrações de descontentamento a organização multilateral do evento foi a

criação do site WCITLeaks5, cujo objetivo era “trazer transparência para a ITU” com a

divulgação de documentos oficiais.

Os documentos usados na dissertação e que foram conseguidos no WCITLeaks podem ser encontrados neste trabalho nos Apêndices. Esses Apêndices no trabalho servem tanto como ponto de análise deste Capítulo, quanto como espaço de registro para uma documentação que não é facilmente encontrada e que poderia ser apagada dos servidores em que se encontram agora.

Para além da questão da representação no evento a ideia de que um grupo de paí- ses liderados por Rússia e China estaria tentando tomar o controle da Internet por meio de alterações nas ITRs. Segundo críticos este grupo de países tomaria o controle sobre a Internet transferindo os poderes da IANA da ICANN para a ITU. A declaração desta tentativa de tomada de poder seria um documento preparado para a WCIT, segundo o qual que a Governança da Internet deveria ser dividida entre os países signatários das Na- ções Unidas. Este movimento foi amplamente criticado pela imprensa norte-americana, da união europeia e brasileira sob o argumento de que os países signatários do documento tem um grande histórico de controle sobre a liberdade de expressão em seus territórios; e que dar-lhes maior controle sobre a Internet seria um malefício à população do mundo.

4 Podemos ver exemplos nos textos da Internet Infrastructure Coalition ℎ𝑡𝑡𝑝 : //𝑏𝑖𝑡.𝑙𝑦/29𝑔𝑤𝑘𝑤𝑔 ou do site Digital Trends ℎ𝑡𝑡𝑝 : //𝑏𝑖𝑡.𝑙𝑦/29𝑜𝐴𝑓8𝑉 . Sites acessados em novembro de 2016

Permitir que este países tivessem maior influencia sobre a governança global da Internet, e sobre o processo de comunicação como um todo afetaria negativamente todos ligados à rede, pelo menos segundo os que subscrevem ao modelo hoje hegemônico de um desenvol-