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As camadas redacionais em Amós 3—

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3 As palavras de Amós de Técua (Amós 3-6)

3.1 O debate em torno das camadas redacionais em Amós 3-

3.1.4 As camadas redacionais em Amós 3—

É inegável a contribuição de Hans Walter Wolff para o estudo redacional de Amós. Para o autor, esta seção central do livro de Amós teria passado por algumas etapas redacionais, tais como a contribuição da antiga escola de Amós, a interpretação de Betel, a camada deuteronomista e a re-leitura da escatologia salvífica.

3.1.4.1 A atuação da antiga escola de Amós

Em sua monumental obra, Hans Walter Wolff tratou, de modo quase apaixonado, da “antiga escola de Amós” 340, que, ao que tudo indica, teria iniciado sua atividade literária somente depois do terremoto com cujo anúncio Amós havia

337 MAYS, Amos: a Commentary, p.13-14. 338 MAYS, loc. cit.

339 Ibid., p. 14.

ameaçado Israel. O cumprimento da palavra profética talvez tenha dado ensejo a que as duas coleções já existentes se combinassem (cf. Am 1,1; 2,13; 9,1).341

A escola de Amós teria realizado sua tarefa, provavelmente, entre os anos 760 a.C. e 730 a.C.; é possível que o ápice de sua atividade literária tenha coincidido com o surgimento da crise assíria para o Reino do Norte em torno de 735 a.C. Quanto ao lugar de sua atividade, ele deveria ser procurado em Judá, pátria de Amós.342 Caso contrário, pergunta Hans Walter Wolff, teria sido necessário chamar Jeroboão “rei de Israel” em 7,10? O contexto histórico de Am 6,2 e 6,6b, passagens atribuídas à antiga de escola de Amós, será apresentado no terceiro capítulo desta tese.

Além dessa terminologia encontrada somente na obra da escola, haveria ainda a conexão com a menção do santuário em Bersabéia (cf. 5,5), também encontrado somente nesta camada literária do livro de Amós. Bersabéia pode ter sido um antigo lugar de culto, destinado aos peregrinos israelitas e edomitas, que veneravam Isaac como seu patriarca tribal comum (cf. Nm 20,14; Dt 23,8). Mas são apenas conjecturas, uma vez que os círculos sapienciais, em torno de Amós, teriam tido também um interesse especial por tais associações e designações.343 Com base nisso, poder-se-ia concluir que somente a escola de Amós parece ter feito contato com os peregrinos de Bersabéia, provenientes do Reino do Norte e ter discutido com eles as palavras do mestre. Pressupõe-se que, provavelmente, através de tais peregrinos, a palavra profética, explicada naquele contexto, poderia ter sido transmitida, de novo, numa hora em que o Reino do Norte atravessava por uma crise. Considerando este tipo de audiência, seria compreensível que um grande interesse por temas cultuais fosse mostrado mais pela escola do que pelo próprio Amós. Nesse caso, a escola teria tido interesse também na exortação sacerdotal (cf. Am 5,14b) e na menção do nome de Javé (cf. 6,10). Além do mais, a questão se uma parte do Reino do Norte poderia sobreviver (cf. 5,14-15; 6,2.6b; 9,10) passou a ganhar uma importância relevante diante dos avanços imperialistas de Teglat-Falasar III.

Ainda no que se refere à parte central de 3-6, além das passagens analisadas acima, Hans Walter Wolff atribuiu à antiga escola de Amós, o texto em 5,13.14-15,

341 WOLFF, Joel and Amos, p. 110.

342 Seguindo Hans Walter Wolff, Schwantes concorda com a localização dessa data e do lugar da

atividade da escola como sendo em Judá (cf. SCHWANTES, A terra não pode suportar suas palavras, p. 142).

342 WOLFF, op. cit., p. 110.

alguns elementos presentes em 5,5 e, eventualmente, em 5,25-26. Entretanto, com razão, o autor reconheceu que, em determinados casos, é muito difícil distinguir entre as ipsissima verba do profeta e as novas formulações suplementares dos discípulos.344 Seria possível ocorrer até mesmo certas expansões feitas pela escola de Amós no conjunto das palavras do profeta, embora reconhecê-las em todos os casos seria uma tarefa praticamente impossível. Sem se dar totalmente por vencido, Hans Walter Wolff atribuiu, com alto grau de probabilidade, algumas passagens à escola de Amós. Mas reconheceu também que tais passagens apresentariam problemas de continuidade crítico-literária com seu contexto.345 O autor observou ainda que 5,14-

15, junto com 5,13, rompe a continuidade entre 5,12.16-17. O autor chamou a atenção para o uso da partícula “por isso”,

!kel'

, em 5,16346, concluindo que 5,14-15 seria mais bem compreendido como uma interpretação tardia de 5,4, ligada ás palavras de Amós concernentes ao comportamento “na porta“ (cf. 5,15; 5,10,12).347 No entanto, admoestações fundamentais teriam substituído reprovações concretas. A oração final de 5,4, “então vocês viverão”, agora se torna “para que possais viver” (5,14a). Segundo Hans Walter Wolff, não se trataria de uma ameaça de juízo, como em 5,5b, que motivaria a exortação, mas de uma discussão sobre uma possível libertação de “um resto de José”. A incerteza do “talvez”, em 5,15b, corresponderia muito mais ao estilo dos discípulos do que à mensagem inequívoca de juízo do mestre. Além disso, Hans Walter Wolff viu, em 5,13, um indício de que a escola de Amós teria compartilhado com o mestre o background cultural da sabedoria.348 Por outro lado, a advertência acrescentada, em 5,5a, “e não passeis por Bersabéia” poderia ser reconhecida como uma adição tardia às advertências precedentes contra Betel e Guilgal pelo fato de que nenhuma ameaça correspondente seguiria em 5,5b. Tratar-se-ia, portanto, de um acréscimo da escola de Amós. 349 Tal como no caso já analisado, em 2,10-12, o autor perguntou se também a passagem em 5,25-26 não deveria pertencer ao objetivo da velha escola de Amós em decorrência da suspeita de estar fora de seu contexto, devido a seu estilo interrogativo de disputa (cf. 5,25) e à

344 WOLFF, Joel and Amos, p. 109.

345 With a high degree of probability, however, the following passages should be attributed to the

school, since they lack, in any event, literary-critical continuity with their context (WOLFF, loc. cit.).

346 Ibid., p. 109, nota 116. 347 Ibid., p. 109.

348 WOLFF, loc. cit.

349 Além de ser citada ainda em Am 8,14, a ocorrência Bersabéia ajudaria ainda a explicar as

situação da época, que pode vir transparecida no texto (cf. 5,26 com 2 Rs 17,30).350 Quanto às demais passagens atribuídas pelo autor em estudo à escola de Amós serão tratadas na seção de Am 7-9.

Hans Walter Wolff afirmou que não se poderia deixar de suspeitar que os oráculos mais antigos de Amós, ou nos ciclos ou nas “palavras”, teriam recebido sua atual formulação, intencionalmente política, somente por mãos da antiga escola de Amós. Por outro lado, ele reconheceu que isso seria muito improvável, devido à sutileza, provavelmente original, do material mais antigo.351

3.1.4.2 A interpretação de Betel352

De acordo com Hans Walter Wolff, algumas passagens (ou partes) do livro de Amós constituiriam releituras, supostamente feitas no santuário de Betel durante o reinado de Josias no terceiro quartel do século VII a.C. Vão mencionadas, aqui, aquelas passagens consideradas deuteronomísticas presentes em Am 3-6.353

Percebida, claramente, a partir de uma análise crítico-literária, como acréscimo tardio, a passagem em 3,14bα, “no dia em que eu castigar os crimes de Israel, castigarei os altares de Betel; os chifres do altar serão cortados e cairão por terra”, constituiria, segundo Hans Walter Wolff, uma interpretação generalizada do oráculo contra os “altares de Betel”. Contudo, o mesmo autor fez remontar ao próprio Amós a ameaça explícita contra Betel:

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,“Betel se tornará uma iniqüidade” (5,5bβ). A destruição do santuário de Betel, como medida político- cultual tomada por Josias (cf. 2Rs 23,15), ocorre relacionada com a menção do “homem de Deus que veio de Judá” (2Rs 23,17). Segundo Hans Walter Wolff, aquela medida drástica teria sido entendida como cumprimento da ameaça contra o altar de Betel (cf. 1Rs 13). Bem lembrada por Hans Walter Wolff, a hipótese de Otto Eissfeldt354 é que a história deuteronomística teria, provavelmente, utilizado as tradições populares sobre Amós. A partir dessa hipótese, o acréscimo, em 3,14bα,

350 WOLFF, Joel and Amos, p. 110. 351 Ibid., p. 110-111.

352 Ibid., p. 111-112.

353 Os fragmentos hínicos, em Am 1,2 e 9,5-6, estão apresentados nas respectivas partes deste

trabalho.

assim como outras alusões diretas a Betel, seriam expressões das tradições da era josiânica no livro de Amós.355

Hans Walter Wolff abordou, primeiramente, Am 5,6, pelo fato de que esta declaração siga, imediatamente, 5,5bβ, considerada, acima, como uma autêntica ameaça de Amós contra Betel. Am 5,6 seria um oráculo independente, que retoma, verbalmente, a exortação em 5,4b, “Procurai-me e vivereis”. Sendo correta a suposição, teria havido uma transposição da exortação, passando a mesma de estilo de mensageiro (“Porque assim falou Yahweh à casa de Israel”) para estilo de disputa. Diversamente da linguagem elegante do profeta, em 5,5, a exortação é articulada, de modo pesado, com uma oração final negativa, introduzida pela conjunção

!P

,, “para que não”. Por três vezes, muda-se o sujeito. A designação “casa de José” recorda “o resto de José” (cf. 5,15) e “a ruína de José” (cf. 6,6b). Hans Walter Wolff observou bem que, no final de 5,6, o oráculo de advertência menciona somente Betel, certamente uma retomada de 5,5b. A ausência da menção de Guilgal, no acréscimo suplementar, explicar-se-ia pela finalidade de se ressaltar apenas a destruição de Betel por Josias. Entretanto, Hans Walter Wolff parece ter suposto que a destruição do santuário por Josias teria sido mencionada, ao menos, pela adição de

lae(-tybe(l.

(“a respeito de Betel”) como uma declaração da escola de Amós.356

A política de Josias, relativa ao culto, deveria ser aceita, para que se evitasse o pior para a casa de José. A peça hínica, em 5,8-9, soleniza a aceitação do julgamento divino sobre Betel. Supõe-se que, provavelmente, por meio de um erro do copista, a peça hínica, em 5,8-9, teria sido separada de 5,6 pelo v.7, que, por sua vez, pertenceria à seção 5,10-11.357 Em 4,13, ocorre a primeira peça hínica.358 Em 4,4-5, bem antes do fragmento hínico, já existe uma reprovação a Betel. “Embora 4,4-5 não seja uma ameaça, além de 5,5, é a única declaração dirigida contra Betel que, com certeza, deriva do próprio Amós.”359 Am 4,4-5 é seguido por um oráculo de acusação, composto de cinco estrofes (cf. 4,6-11), obviamente ligadas

355 WOLFF, Joel and Amos, p. 111. 356 Ibid., p.111, nota 131.

357 HORST, Friedrich. Die Doxologien im Amosbuch. Zeitschrift für die alttestamentliche Wissenschaft, Berlin, v. 47, p. 45-54, 1929, apud WOLFF, op. cit., p. 111.

358 É digna de nota a reconstrução completa deste hino no excursus sobre as passagens hínicas no

livro de Amós (cf. WOLFF, op. cit., p. 215-217).

359 “While 4,4-5 is not a threat, apart from 5,5 it is the only utterance directed against Betel which

secundariamente a 4,5 por um pronome enfático

ynIa]-~g:w

>, “eu mesmo” (cf. 4,6). Hans Walter Wolff afirmou, enfaticamente, a respeito destes versículos que “não há nada comparável a esta acusação nos próprios oráculos de Amós; tematicamente, isso é uma reminiscência de liturgias de maldição (cf. Lv 26)”.360 Não se trataria, aqui, de um conselho positivo para se buscar Javé (cf. Am 5,6), mas de uma ênfase à recusa de Israel em se converter a Javé apesar dos repetidos castigos.

Quanto à acusação seguinte, em 4,12, Hans Walter Wolff percebeu, com razão, que é caracterizada por uma construção complicada, semelhante àquela de Am 5,6, deixando transparecer um “incômodo efeito prosaico”.361 Trata-se de uma única e generalizada ação punitiva de Javé. Não há detalhes concretos. Qualquer esforço para se resolver esta questão tem sido insatisfatório.

A proposta de Hans Walter Wolff é que o “assim”,

hKoï

e “isto”,

tazOæ

, do anúncio indefinido de punição (cf. 4,12), poderiam ser mais bem compreendidos se aludissem às medidas tomadas por Josias contra Betel. A ordem imposta a Israel, que se preparasse para o encontro com seu Deus, poderia ser compreendida como um apelo ao reconhecimento do julgamento justo de Javé. De modo apropriado, esta ordem introduziria a primeira estrofe do hino em honra de Javé (cf. 4,13). Nos Salmos, não há nada que corresponda a este hino. O motivo poderia ser a associação que o hino faz entre Javé e o material de culto sincrético proveniente do santuário de Betel no séc. VII.362 Posto isto, Hans Walter Wolff considerou as passagens, em 4,6- 12 e 5,6, como homilias introduzindo a primeira ou as duas primeiras estrofes do hino composto por 4,13; 5,8-9; cf. 9,5.6. Estas homilias visariam relacionar os oráculos de Amós contra Betel (cf. 4,4-5; 5,4-5) com a destruição do santuário por Josias. Assim, “as medidas efetivadas por Josias deveriam ser reconhecidas, de acordo com 2Rs 23,15-20, como cumprimento da profecia do ‘homem de Deus de Judá’ (1Rs 13) e, portanto, como ato de Javé”.363

Quanto à terceira estrofe do hino (cf. Am 9,5-6), a ligação com o santuário de Betel será apresentada na parte referente ao processo redacional de Am 7-9.

360 WOLFF, Joel and Amos, p. 111. 361 Ibid., p. 112.

362 WOLFF, loc. cit. 363 WOLFF, loc. cit.

3.1.4.3 A camada deuteronomística

Presume-se que os deuteronomistas teriam atuado na Palestina no período exílico364. Segundo Hans Walter Wolff365, se Israel era visto por Amós como alvo da vontade punitiva de Javé, e se Betel, sobretudo para os pregadores e os liturgos da época de Josias, era visto em situação semelhante, a preocupação inicial dos deuteronomistas era apontar para o julgamento justo de Javé contra Judá e Jerusalém. Segundo o autor, a redação deuteronomística teria acrescentado 3,1b, “contra toda a família que eu fiz subir da terra do Egito”. Na essência, este meio versículo expande seu objetivo de “contra vós” (

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), em 3,2b, para abranger “todas as famílias”, incluindo Judá, libertado do Egito por Javé.366 Por ora, basta lembrar que o autor atribuiu também à redação deuteronomística367 as passagens “Ai daqueles que estão tranqüilos em Sião” (6,1aα) e “a quem a casa de Israel acorre” (6,1bβ), passagens que serão mais bem analisadas na terceira parte desta tese.

Segundo Hans Walter Wolff368, a redação deuteronomística acrescentou uma dura crítica de Amós ao culto, através da qual a legitimidade da adoração sacrifical é posta à prova em oposição ao período de “quarenta anos” de peregrinação pelo deserto, um tema de destaque na história deuteronomística, usando o estilo exortativo de perguntas, ampliando a declaração com material extraído da obra histórica deuteronomística.369

Quanto a 3,7, seguramente, é uma adição literária tardia.370 De fato, uma oração puramente declarativa ocorre no meio de perguntas retóricas, interpondo uma linguagem típica dos escritos deuteronomísticos, a uma construção poética em paralelismo.371 O autor afirmou que Am 3,7 precisaria ser analisado em relação ao que o precede (cf. 3,6b) e o segue (cf. 3,8b). Esta análise poderia esclarecer a relação entre a palavra profética e o evento histórico (cf. 3,7). Javé desvela seu plano aos seus servos, os profetas, antes de colocá-lo em ação. Aqui um princípio-guia da

364 SCHWANTES, A terra não pode suportar suas palavras, p. 142. 365 WOLFF, Joel and Amos, p. 112.

366 WOLFF, loc. cit. 367 Ibid., p. 112 e 269 et seq. 368 Ibid., p. 112.

369 am'(yvia]-ta, Wfï[' tm'Þx] yveîn>a;w> lg:+r.nE)-ta, Wfß[' tWkê-yven>a;w> tAnëB. tAKåsu-ta, ‘Wf[' lb,ªb' yveän>a;w> (2Rs 17,30). 370 WOLFF, op. cit., p. 181.

371 WOLFF, loc. cit. O autor cita as seguintes passagens em que ocorre a terminologia de profetas

como servos de Javé: cf. 2 Rs 17,13.23; 21,10; 24,2; Jr 7,25; 25,4; etc. Para a expressão, “não faz nada”, rbDhf[, cf. 2Rs 20,9; (17,12). Para “conselho de Javé”, cf. Jr 23,18.22; Pr 20,19a.

apresentação deuteronomística da história emergiu no curso da exegese de profecia. De acordo com Hans Walter Wolff, enquanto “o texto original de Amós se interessa pela relação da palavra profética com o oráculo precedente de Javé, o deuteronomista se preocupa com a relação da palavra proclamada com a subseqüente ação e Javé”.372 Nosso autor suspeitou que o deuteronomista, baseando-se em textos mais antigos, tivesse ajuntado o v.6b ao v.8b, por meio da partícula “de fato”,

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, para efeito de síntese literária.373 Portanto, o objetivo do deuteronomista teria sido expor a interligação entre os eventos da história (

rbD

) e a palavra de Javé previamente proclamada.374 Nesse sentido, valem aqui as palavras de Gerhard von Rad, quando afirmou que “a DtrH procura demonstrar a correspondência entre a palavra pronunciada e seu cumprimento histórico, através de numerosas profecias que incorpora à sua obra”.375 Gerhard von Rad traçou as diversas linhas da teologia deuteronomística da história. Sua redação se deu no exílio, quando Israel se perguntou pelo motivo de sua rejeição por parte de Javé. O deuteronomista defendeu a fidelidade de Javé em contraste com o pecado de Israel, único responsável pela destruição de sua salvação.376

3.1.4.4 A re-leitura da escatologia da salvação

Em sua renomada obra, Hans Walter Wolff tratou da escatologia de salvação no pós-exílio.377 Segundo ele, depois do período inicial do pós-exílio, quando se

verificou uma proeminência da profecia da salvação, sentiu-se a necessidade de se acrescentar uma nova palavra de salvação (cf. 9,11-15), para que a transmissão e a aceitação de uma severa proclamação profética de juízo como aquela de Amós se tornassem possíveis.378 Com isso, uma redação do próprio julgamento de Amós podia ser assumida, agora em uma perspectiva positiva: “construístes casas de cantaria, mas não as habitareis; plantastes vinhas esplêndidas, mas não bebereis o seu vinho” (5,11b).

372 WOLFF, Joel and Amos, p. 181. 373 WOLFF, loc. cit.

374 Ibid, p. 187.

375 RAD, Teologia do Antigo Testamento, p. 327. 376 Ibid., p. 329.

377 WOLFF, op. cit., p. 113. 378 WOLFF, loc. cit.

A passagem em 5,22aα,

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, “Porque, se me ofereceis holocaustos [...]”, é vista como uma adição, isentando holocaustos da rejeição aplicada a outras oferendas. Supõe-se que o julgamento de Amós (aqui restringido) teria se tornado incompreensível diante da exigência pós-exílica de adoração. O autor comparou a restrição ao julgamento de Amós como aquela ocorrida no Sl 51, em que os v.18-19 são modificados pelos v. 20-21:

51 18 Pois tu não queres sacrifício e um holocausto não te agrada.

51 19 Sacrifício a Deus é um espírito contrito, coração contrito e esmagado,

ó Deus, tu não desprezas” (Sl 51,18-19). 51 20 Faze o bem a Sião, por teu favor,

reconstrói as muralhas de Jerusalém.

51 21 Então te agradarás dos sacrifícios de justiça – holocaustos e ofertas totais

e em teu altar se oferecerão novilhos.

Na parte central do livro de Amós, Hans Walter Wolff considera a expressão “como Davi”,

dywI¨d'K.

, em 6,5, um acréscimo, que contrariaria a intenção do profeta e constituindo-se uma “apologia para a invenção de instrumentos musicais, de acordo com a sensibilidade litúrgica do Cronista”.379 Se, por um lado, como o autor observou, as palavras de Amós foram novamente reconhecidas pela interpretação de Betel e pela redação deuteronomística como relevantes para a situação histórica nos séculos sétimo e sexto, por outro lado, para a teologia pós-exílica houve a necessidade de se atualizar a mensagem do profeta, acrescentando-se que a sentença de morte proferida por Javé não constitui sua última palavra.380

3.1.5 – Do discurso oral do profeta às palavras dos discípulos

Jörg Jeremias observou que os capítulos 3-6 passaram por, ao menos, duas diferentes edições.381 Levando-se em conta também a parte conclusiva em 9,7-17, seriam, ao menos, três. Se, por razões de sua linguagem, alguém tomasse os versos deuteronomísticos, que poderiam ser isolados facilmente, como indícios de uma

379 WOLFF, Joel and Amos, p.113. 380 WOLFF, loc. cit.

381 JEREMIAS, Amos 3-6: Beobachtungen zur Entstehungsgeschichte eines Prophetenbuches, p.

edição posterior, já seriam quatro edições. Neste seu estudo, Jörg Jeremias é convicto de que as doxologias e a liturgia penitencial conexa a elas, em 4,7-12, pressupõem a queda de Jerusalém.382 Como hipótese de trabalho, o autor toma, conjuntamente, as doxologias e a redação deuteronomística do livro de Amós como partes componentes de uma edição comum exílica do livro de Amós. Desta edição, deveriam ser distinguidas a edição final pós-exílica do livro e a coleção mais antiga das “Palavras de Amós” (1,1) por meio dos discípulos do profeta.383

O autor parece convicto de que a última edição pós-exílica do livro de Amós teria inserido, na essência, apenas o apêndice em 9,7-15 e, de resto, não teria interferido quase em nada na forma dos capítulos 3-6. Também, para ele, não é certo que a coleção mais antiga das “Palavras de Amós” possa, de certa maneira, ser reconstituída claramente. Contudo, a edição exílica pode certamente ter interferido na ordem daquela coleção. De um lado, existiriam indícios claros da coleção mais antiga, de outro lado, haveria pontos de vista, segundo os quais, na edição exílica, as palavras teriam sido reordenadas, presumivelmente um século e meio depois da primeira edição escrita.384 O autor reconhece que, em dois campos textuais, uma nova edição exílica das Palavras de Amós teria interferido numa suposta ordem mais antiga, e não apenas adições explicativas de um texto presente. O primeiro campo textual diria respeito a 4,4-5:

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