• Nenhum resultado encontrado

3. Os cargos-mores da Casa Real Portuguesa no século XVII

3.12 A Capela Real

É conhecido o cuidado e o empenho que D. João IV dedicou à Capela Real tornando-a símbolo de representação do poder régio, reputação e esplendor336. Tratou não só de

melhorar o espaço físico, que se degradara durante o período filipino, como também a dotou de recursos e privilegiou a parte musical337. O objetivo era o de tornar a Capela Real o

«coração da casa Real, como também o da própria governação»338.

334 Ver a 3ª parte do nosso trabalho.

335 A ordem que aqui seguimos é a que é adotada nas obras posteriores, nomeadamente na já citada

FREIRE, António de Oliveira – Descrição corográfica do reino de Portugal, edição de 1755, ou seja, capelão- mor, deão, sumilher e esmoler.

336 CASTRO, João Baptista de – Mapa de Portugal Antigo e Moderno, tomo 3º, parte 5ª, pp. 175-182. É

possível verificar que o autor integra no seu texto partes do Regimento da Casa Real.

337 NERY, Rui Vieira – The Music Manuscripts in the Library of King D. Joao IV of Portugal (1604-1656): A

Study of Iberian Music Repertoire in the Sixteenth and Seventeenth Centuries. Texas: Universidade do Texas,

1990. Dissertação de Doutoramento.

338 COSTA, Leonor Freire e CUNHA, Mafalda Soares da – D. João IV. Lisboa: Círculo de Leitores, 2006, pp. 97-

Desde logo, a Capela foi alvo de importantes alvarás para que «se pratique, e observe» «com melhor acerto, e direção das coisas tocantes ao ministério da minha Capela». Assim, foram mandadas fazer obras ao edifício e mandou-se vir da casa alentejana muito mobiliário e peças decorativas, mas note-se que somente a título de empréstimo. Anos depois, contudo, encontramos as queixas do deão da capela de Vila Viçosa de que as peças não tinham ainda sido devolvidas empobrecendo a magnificência daquele lugar.

Em 1653, o monarca mandou executar a cruz-relicário do Santo Lenho, ao ourives Filipe Valejo. A difícil conjuntura económica do reino levou a que se usassem diversas joias, pedraria, ouro de guarnições de vestidos e outros objetos. Por outro lado, na aquisição de obras musicais em toda a Europa, o monarca rompeu com a criteriosa gestão de recursos, dignificando, sem dúvida, a Casa Real339. Uma coleção que adquiriu grandes proporções

como é possível constatar através do catálogo de 521 páginas, o único que foi dado à estampa, não representando, por isso, a totalidade da mesma.

Costuma-se atribuir ao colecionismo régio uma intenção propagandística do poder. Não obstante, no caso português, tal tem vindo a ser colocado em questão ao ser identificado, de acordo com estudo recente, que muitas das mais valiosas e ricas peças, como tapeçarias, relíquias, ourivesaria ou objetos exóticos, estavam em câmaras privadas, ou seja, em áreas de acesso limitado e não em exposição em locais de passagem comum340.

Quando D. João IV faleceu, a reforma da Capela não se encontrava concluída. Assim não é de surpreender que o rei restaurador deixasse no seu testamento indicações no sentido da conclusão das obras para que o espaço ficasse capaz de acolher a celebração dos ofícios divinos. O sacrário, painéis, santuário de relíquias ou o sepulcro para a Semana Santa faziam parte do que faltava terminar, dos quais encarregou António Cavide de as finalizar341. Para a Livraria da Música deixou quarenta mil rs. de renda perpétua em cada ano para que se dispusesse «com a limpeza, e perfeição, que convém» o que faltava.

339 COSTA, Leonor Freire e CUNHA, Mafalda Soares da – D. João IV, pp. 168-171.

340 Para tudo isto ver, SILVA, Nuno Vassallo e – As Coleções de D. João IV no Paço da Ribeira. Lisboa: Livros

Horizonte, 2003, em particular pp. 57-82.

341 Testamento de D. João IV. In SOUSA, António Caetano de – Provas da História Genealógica da Casa Real

A 12 de março de 1642, D. João IV promulgava um alvará segundo o qual o esmoler- mor «semaneiro» poderia fazer o ofício de capelão-mor na ausência deste e do deão. Teria autoridade para «aquelas coisas do governo e serviço ordinário da Capela como lançar água benta» e outras coisas semelhantes, pelo que este alvará passava a estar apenso ao «Regimento do Capelão-Mor», por nós não localizado, «e se cumprirá inteiramente posto que seu ofício haja de durar mais de um ano», não sendo necessário passar pela chancelaria, sem embargo da ordenação do Livro 2º, Títulos 39 e 40 que dispunham o contrário342.

Sentia-se a necessidade de estipular algumas normas como a de que as despesas da capela343, que eram feitas pelo recebedor da mesma capela por ordens do capelão-mor,

passassem a ser feitas pelo escrivão da sua receita.

Para registo das ajudas de custo «e outras coisas que se costumavam fazer», destinava-se um livro onde seriam registados «todos os mandados e portarias» dos capelães-mor, o qual ficava fechado juntamente com o Livro da Receita e despesa do Recebimento da Capela.

As despesas correriam pela Alfândega, obrigando-se, por isso, a fazer o rebate do valor do pagamento das suas ordinárias nestes escritos, e não pela Fazenda Real. Aliás, caso o Recebedor da Capela344 não cumprisse com esta regra, «se lhe não correm com o ordenado

pela primeira vez, até com efeito arrecadar tudo à sua custa». À segunda vez, seria privado do ofício, fazendo-se diligência por um Prebendeiro «pessoa de cabedal, e confiança» que recebendo as rendas da capela as pagasse aos quartéis consoante a porção «que parecer justo».

Em 1652 saía o Regimento para a Capela Real, que fez o Senhor Rei D. João 4º345 que, de acordo com Félix Labrador Arroyo, vinha confirmar o Regimento da Capela Real datado de 1592346.

342 ANTT, Coleção de São Vicente, vol. 23, fls. 133v-134, 12 de Março de 1642. 343 ANTT, Coleção de São Vicente, vol. 23, fls. 134-134v, 17 de Agosto de 1645. 344 Servia João Ribeiro da Costa pelo escrivão do cargo.

345 ANTT, Coleção de São Vicente, vol. 23, fls. 136-

346 LABRADOR ARROYO, Félix – La Casa Real Portuguesa de Felipe II y Felipe III, volume 1, p. 63. No 2º

volume, Labrador Arroyo transcreve-o com base na cópia do século XVIII existente na Biblioteca Nacional de Portugal, cód. 10981.

Estabeleciam-se os «dias de recreação» para os capelães e porteiros da guarda – 50 dias –, e para os moços da capela, estes com direito a 30, contanto que não as gozassem em alturas específicas de grande importância religiosa com a época Pascal ou a quadra natalícia.

Quanto à licença dos dias do estatuto, era obrigatório informar o apontador pois não se poderia dar licença de ausência a mais de 5 capelães, 1 porteiro da grade e 4 moços da capela, ao mesmo tempo.

Estatuíam-se ainda princípios básicos como a forma como os capelães deviam assistir ao ofício divino no coro, «com muita gravidade e cada um em seu lugar»347, conforme as

suas antiguidades, «e com muito silêncio, sem falar um com outro». Recomendava-se «muita compostura» na sacristia, no antecoro e nos mais lugares da capela.

Quanto à forma, aconselhava-se o capelão que fosse rezar ou cantar, no coro ou estante, a preparar-se antes para que não se cometessem erros.

Regulava-se também as missas que os capelães haviam de dizer na Capela Real pelas suas antiguidades. Assim, os mais antigos diriam primeiro e «os mais tenros» em segundo lugar, salvo se tivessem perdido as matinas ou passado o seu lugar. Prevenia-se ao mesmo tempo um cenário hipotético em que sendo necessário completar o coro, fossem chamados os que tivessem melhores vozes, podendo estes ser quem ia celebrar a missa, situação que obrigaria a uma alteração desta “calendarização”.

Tudo ao que aos capelães, porteiro da grade e moços da capela dizia respeito, como por exemplo períodos de doença ou a morte de algum familiar, era obrigatoriamente transmitido ao Apontador ou, na ausência deste, ao Contador.

Este local contava com um apontador das moradias da Capela Real348, bem como com

um tesoureiro-mor. Com D. João IV sabemos ter desempenhado tal função o padre Tomé Álvares349 e com D. Afonso VI e D. Pedro, temos notícia de Estevão Franco de Carvalho ter

ocupado o lugar, entre 17 de abril de 1664 e 18 de outubro de 1681.

347 ANTT, Coleção de São Vicente, vol. 23, fls. 136-

348 Um deles foi João Freire Machado, Lisboa 7 de Novembro de 1675. ANTT, Casa de Cadaval, nº 11,

Juramentos prestados na chancelaria-mor do reino para o desempenho de cargos públicos, 7 de Novembro de 1675, fl. 52v

Como os restantes oficiais da casa, o tesoureiro-mor da Capela Real tinha que prestar contas do que tinha em sua posse ao contador, Luís Pereira de Araújo. Em 1681, o sobrinho e herdeiro de Estevão Franco de Carvalho apresentou 2 lâmpadas de prata e 2 baixelas, 1 bago de bispo, 2 custódias de prata douradas, 1 cofre do sacrário, 2 caixas dos santos óleos, 15 castiçais grandes, 90 castiçais de [bojo?] pequenos, 8 cruzes grandes e pequenas, 7 castiçais, 2 caldeirens [?], 1 descanso, 1 estante do altar, 1 palmatória, 8 galhetas, 4 pratos, 1 prato e gomil de credência, 6 imagens de prata, 2 navetas, 3 salvas, 1 turibulo, 9 tocheiras, 9 vasos de purificação, 6 varas do pálio, «tudo de prata e pesou 2 mil cento e dezanove marcos quatro onças e uma oitava», mais 14 vestimentas, 48 almofadas, 63 capas de asperger, 59 cortinas, 16 ornamentos de várias cores, telas, sedas, brocados e chaparia e dois dossel, 5 frontais, 6 mitras, 4 palcos, 7 pavilhões e um relógio de latão, entre muitas outras coisas350.

Um pormenor a salientar era o facto de se recorrer aos tesouros da Casa de Bragança em ocasiões especiais, tais como o batismo de infantes. Com efeito, é comum encontrarmos pedidos de empréstimo ao guarda-joias da Casa de Bragança, Nicolau de Oliveira, de peças como a cruz rica do Santo Lenho da casa de Bragança. O tesoureiro-mor da Capela Real ficava responsável por estas peças que depois devolvia. Durante estes tempos, a separação entre o que é da Casa de Bragança e o que é da Casa Real é, pois, notória351.

Note-se ainda que os oficiais da Capela Real recebiam ajudas de custo e dinheiro por participarem nas celebrações especiais, em particular para os vestidos que se mandavam fazer de propósito.

Em 1685, o italiano Gregório Leti referia-se na sua obra à Corte de Portugal, destacando que a Capela Real ao tempo de D. Pedro II era «superbíssima» e que tinha «molti cappellani, e Musici»352. Sabemos que dois anos depois, por ocasião do Te Deum

350 ANTT, Chancelaria de D. Pedro II, livro 17, fls. 32-v.

351 ANTT, Ministério dos Negócios Estrangeiros, Formulário e Protocolo, livro 632, fl. 149.

352 LETI, Gregorio – Il ceremoniale histórico, e politico, parte quinta dedicata agli Eccelentissimi Signori

laudamus na receção à rainha D. Maria Sofia de Neoburgo, a Capela Real tinha 24 capelães,

20 moços de sobrepeliz, 20 cantores, 2 porteiros da grade e 1 prestes353.

Neste espaço, os ministros eram vários, desde capelão-mor, deão, pregadores354, auditores da Capela, capelães, mestre da capela355, mestre-de-cerimónias, moços da capela a cantores, organistas e charamelas, entre outros.

O acesso ao lugar do rei na Capela Real era, naturalmente, limitado. Em todo o caso, tal não significava que não se conseguisse chegar perto do monarca. Exemplo disso, numa Quinta-feira, dia 22 de março de 1673, estando D. Pedro na tribuna da Capela Real assistindo aos ofícios divinos, se lhe deitou aos pés a mulher de Fernando Mascarenhas, comendador de Alcácer do Sal, D. Antónia Luísa de Bourbon, irmã do 4º conde dos Arcos, D. Marcos de Noronha, pedindo perdão para seu marido, preso por cúmplice na conjuração contra o regente356.

De acordo com o autor de Monstruosidades alguns dos presentes, temendo que a instância de D. Antónia vencesse – o que não interessava a quem queria a comenda de Alcácer do Sal que ficaria vaga com a morte de Fernando Mascarenhas –, retiraram-na da presença de D. Pedro. D. Fernando Mascarenhas acabou por ser perdoado e enviado para a Índia, mas a comenda foi-lhe retirada e atribuída ao conde da Atalaia.

353 BNP, cód. 309, Anais das Cousas mais notáveis que sucederam neste Reino e fora dele desde que veio a

Rainha de Portugal D. Maria Sofia Isabel de Baviera escritos por João da Costa, fl. 5.

354 Apenas para destacar alguns dos pregadores da Capela Real com D. Pedro: fr. Baltasar dos reis, religioso

da ordem de S. Francisco da província dos algarves; frei Álvaro Leitão religioso da ordem dos pregadores que foi pregador supranumerário até entrar na vaga de D. Próspero dos Mártires; frei António dos Arcanjos religioso de S. Francisco na província dos algarves. Ver ANTT, Registo Geral de Mercês, Matrículas dos

Moradores da Casa Real, nº 3.

355 Examinava, por exemplo, os charamelas para saber se poderiam ingressar no serviço da Capela Real. 356 PAIXÃO, Alexandre da – Monstruosidades do Tempo e da Fortuna. Edição literária de Damião Peres, 4

3.12.1 Capelão-mor

A definição que encontramos no copiador do 1º marquês de Fronteira357 refere que o

capelão-mor governava a Capela Real com o prelado dela, com jurisdição episcopal isento do ordinário e imediata ao Pontífice.

Era um cargo apetecido como veremos pela nomeação de 1669. De facto, note-se que era uma posição que conferia prestígio e proximidade à figura régia, sendo possível por exemplo encontrá-lo a assistir às audiências do príncipe358.

Começando a missa, o capelão-mor dizia a Confissão, o Glória e o Credo, estando o rei dentro da cortina. Em sua ausência, o ofício divino seria celebrado pelo deão da capela.

Em dias específicos, como da Cinza e da Palma de dia de Ramos, era o bispo quem dava a vela ao rei, benzendo-a. No dia de Nossa Senhora das Candeias e da Páscoa, o monarca recebia a vela dentro da cortina da mão do mordomo-mor que, por sua vez, lhe era entregue pelo capelão-mor.

Quando o rei comungava, o capelão-mor dava-lhe o lavatório. A este oficial da Capela competia todo o governo deste espaço, despachava tudo com o monarca, mas também com o deão e com o esmoler. O capelão-mor participava com as suas consultas na provisão de todas as igrejas do Padroado Real, mandando examinar os oponentes a elas. Cabia-lhe ainda benzer a mesa régia, assistindo-lhe dois capelães. Em sua ausência era o bispo da capela com o sumilher da cortina da semana359.

3.12.2 Deão

Definido por Bluteau como primeira dignidade nas Igrejas, ao deão competia assessorar o capelão-mor e substituí-lo em caso de ausência ou impedimento. Note-se que o

357 ANTT, Miscelânea Manuscrita 548, fl. 15v.

358 NA, SP 89/12, Francis Parry to Lord Arlington, June 25/July 5, 1672, Lisbon, fl. 98.

359 Regimento dos Ofícios da Casa Real d’el rei Dom João IV. In SOUSA, António Caetano de – Provas da

bispo deão dava juramento na chancelaria-mor do reino pelo «lugar na Capela Real de Sua Alteza», tal como um juiz de fora o fazia, ou o correio-mor do reino360.

Durante alguns anos, a Capela Real não teve capelão-mor tendo sido o bispo deão, D. Francisco de Sottomayor a assumir as funções daquele.

3.12.3 Sumilher da cortina

Os sumilheres da cortina não tinham número certo e eram imediatos ao capelão-mor nas funções da capela, de acordo com a sucinta descrição do copiador do marquês de Fronteira.

Na Capela Real, o sumilher da cortina da semana tinha lugar junto ao canto da cortina, da banda de baixo. Era sua função abrir a cortina da tribuna do rei, de maneira que de dentro o rei conseguisse ver o púlpito e a tribuna da rainha361 e era da sua responsabilidade

tirar o tafetá do sitial e o pano da pia, limpar o Evangelho e o porta-paz antes que o rei os beijasse.

Os sumilheres desempenhavam o ofício à semana, sendo que, por vezes, por força das circunstâncias havia um ajustamento necessário, como sucedia na Casa Real362.

3.13 Esmoler-mor

De acordo com o novo regimento da Casa Real, o cargo de esmoler-mor ficou de fora daqueles identificados como oficial-mor. Isto suscitou o descontentamento do esmoler-mor, fr. Luís de Sousa – futuro bispo de Porto e que, a partir de 1669, passou a desempenhar a

360 ANTT, Casa de Cadaval, nº 11, Juramentos prestados na chancelaria-mor do reino para o desempenho

de cargos públicos, 2 de Março de 1673, fl. 32.

361 Regimento dos Ofícios da Casa Real d’el rei Dom João IV. In SOUSA, António Caetano de – Provas da

História Genealógica da Casa Real Portuguesa. Tomo IV, p. 741.

função de capelão-mor363 –, pelo que apresentou a D. João IV, por escrito, os motivos pelos quais o cargo de esmoler-mor era um ofício mor.

Era costume imemorial considerar-se o ofício de esmoler-mor como cargo mor da Casa Real, com título e preeminências «porque, Senhor, ninguém pode negar que na casa de qualquer Rei, Príncipe ou Prelado tenha lugar entre os ministros e oficiais da Casa o esmoler, por cujas mãos […] despendem a fazenda aplicada às esmolas e obras pias».

Neste sentido, assim como o mordomo-mor e o vedor «aplicavam cabedal» para aumentação da casa, igual obrigação era a do príncipe cristão ter quem distribuísse as esmolas aos pobres e necessitados. De facto, não ficava «bem reputada» a casa do príncipe que não incluísse o esmoler.

A formalidade de oficial da casa consistia em ter exercício do seu ministério dentro dela e ministros subordinados com obrigação de lhe assistir e tal, sem dúvida, acontecia com o esmoler-mor, advogava o autor deste texto364.

O esmoler-mor tinha obrigação de distribuir no Paço Real e na Casa do monarca a esmola pública na Semana Santa, no que era assistido pelo sargento da guarda e pelos soldados necessários.

Nos restantes dias do ano distribuía-as fora do Paço e da Casa Real, porque o esmoler- mor não vivia naquele espaço, ainda que se reputasse «moralmente residente». Não obstante, acrescentava, mesmo fora da Casa real distribuía a esmola como se ali estivesse. Neste passo, uma vez mais, recorria ao exemplo dos outros ministros da casa que dispunham da fazenda régia para outros gastos da casa dando ordens a partir das suas próprias casas «sem perderem o nome de oficiais de Vossa Majestade».

Por outro lado, quando se solicitava esmola ao rei no Paço, o monarca chamava o esmoler, que, como veremos, podia ser pessoa escolhida pelo próprio esmoler-mor, e mandava que lha desse.

Exercitava ainda o esmoler-mor o seu ofício na Capela Real. Nos dias de Nossa Senhora da Conceição, da Anunciação, da Adoração da Cruz, Missas Novas, aniversários da família real, e em todas as ocasiões especiais, nas ofertas que fazia era-lhe subordinado o Prestes da

363 ANTT, Manuscritos da Livraria, lv. 170, 169, carta de D. Afonso VI para o cabido de Évora para ser

restituído fr. Luís de Sousa, esmoler-mor eleito bispo do porto, ao governo daquele arcebispado. 1662.

364 BA, 50-V-36, fl. 287. Papel sobre o ofício de esmoler-mor que ele deu a el rei D. João 4º. Original. Sem

Capela, dando-lhe recado para sair – como fazia ao sumilher para avisar o rei que a missa ia começar – indo-o acompanhando diante. Três moços da capela ministravam nestes atos o que era necessário, levando-lhes as ofertas para ele as dar ao rei ou para ele próprio as oferecer na ausência do monarca. Quando era o monarca a dar pessoalmente as esmolas, o esmoler-mor ficava à direita do rei, um pouco recuado365.

No lava-pés, o esmoler-mor tinha obrigação de pôr a toalha ao rei ou ao príncipe por ser ação em ordem de piedade e esmola, a qual lhe era oferecida por um moço da câmara numa salva de onde ele a tomava e cingia ao rei. Era ainda da sua responsabilidade dar ao rei os vestidos dos pobres, tomando-os dos pratos que os moços fidalgos traziam com a esmola, que o monarca distribuía em tal ocasião.

Havia também um reposteiro que lhe preparava a bacia para o lavatório dos pés.

Quando o rei não estava presente, o esmoler-mor fazia tudo tal como se o rei

Documentos relacionados