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CAPITALISMO E EDUCAÇÃO: reflexos no campo

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CAPITAL, TRABALHO E EDUCAÇÃO: pontos e contrapontos

2.2 CAPITALISMO E EDUCAÇÃO: reflexos no campo

Antes de prosseguir nesta reflexão, cabe fazer um recorte no processo de desenvolvimento do capitalismo no campo, indicando o início do trabalho assalariado, que se inaugura com o pós abolição da escravatura, em 1888.

A expansão do sistema capitalista no Brasil nos diversos setores de produção provocou em todas as áreas ocupadas a “proletarização e expropriação do trabalhador dos seus meios de produção. A expropriação do trabalhador rural se dá pelas mais variadas formas, tais como: pela destruição do artesanato doméstico, pela subordinação ao capital comercial, industrial e financeiro”. (CARNEIRO, 1988, p.14). Tudo em nome da economia moderna, que conduzia o trabalhador livre a vender sua força de trabalho ao capitalista, recebendo em troca o salário, caracterizando assim, a relação social de reprodução da mais-valia, o que contribuiu para acentuar as desigualdades sócio-econômica, cultural e política no setor rural.

Portanto, no contexto da relação capitalista, o camponês21, assim como o operário se vêem envolvidos por uma ilusão de que todos são iguais e de que têm as mesmas oportunidades de crescimento, pois são livres. Na visão de Carneiro (1988, p. 16) neste processo de alienação, o camponês

[...] pensa que ao ter um pedaço de terra, a riqueza por ele produzida a ele pertencerá, quando na verdade, ele apenas consegue repor os seus instrumentos de trabalho e garantir sua precária subsistência. O camponês não consegue perceber com clareza a sua situação de subordinação às diversas frações do capital, que se apropriam do excedente por ele gerado.

Neste sentido, submetido ao capital, o camponês se encontra desprovido das riquezas que produziu, além de encontrar dificuldades para manter-se em decorrência principalmente das trocas desiguais entre os custos dos produtos fruto do seu trabalho e o baixo valor pago pelo seu produto no mercado.

Vários são os agravantes neste cenário, pois o valor fixado pelo mercado capitalista não contabiliza a perda da fertilidade da terra, o que faz com que o camponês seja inviabilizado de continuar explorando-a e busque outros meios de sobrevivência, como forma de quebrar o ciclo de fracasso gerado pelo interesse infinito do capitalista de aumentar o lucro e desvalorizar o salário. Em resumo, tal como observa Carneiro (1988, p. 30) “a inviabilidade de continuar explorando a sua terra e os baixos salários na agricultura obrigam os camponeses e os trabalhadores rurais a migrarem, isto é, a buscarem novas alternativas de sobrevivência”.

As novas alternativas de sobrevivência levam o camponês a migrar para o centro urbano ou para as áreas de fronteira agrícola na esperança de fugir da proletarização. Carneiro (1988, p. 30), ao analisar a alternativa do trabalhador excluído migrar, reconhece sua inviabilidade e explica por que:

A primeira alternativa revela-se pouco viável devido à incapacidade dos centros urbanos em absorverem toda a população oriunda do campo, em decorrência do super dimensionamento do exército industrial de reserva. Embora o exército de reserva seja uma necessidade em qualquer país capitalista, nos países subdesenvolvidos, como o Brasil, ele se vê engrossado face ao caráter retardatário da industrialização, cuja tecnologia importada dos países desenvolvidos é altamente poupadora de mão-de-obra. Portanto, resta às populações expulsas do campo, a busca de alternativas de sobrevivência fora da fronteira econômica. Essa segunda alternativa – a migração para fora da fronteira econômica – se constitui numa solução provisória já que, com o avanço do capitalismo, o posseiro de hoje será provavelmente o migrante de amanhã.

21 A expressão camponês, de acordo com Carneiro (1998, p. 55) se refere ao “modo de vida” correspondente a

Assim, pode-se compreender que, por mais que o camponês tente sair do atual estado de exploração e submissão em que se encontra, ele apenas consegue, e mal, suprir sua subsistência, vez que a lógica do sistema capitalista é de sempre angariar mais terra para assim obter mais lucro. Por fim, Carneiro (1988, p. 31) conclui acerca do caráter de exploração absoluta do capital assim: “o modo de produção capitalista é um sistema de exploração que explora a todos os trabalhadores, quer sejam eles trabalhadores urbanos, rurais ou camponeses”.

Como se pode observar então, o fenômeno de dominação e exploração do sistema capitalista é histórico agregador de novas formas que se manifestam em cada época. Nele, a essência permanece na obtenção do lucro, tanto na zona rural como na zona urbana, gerando sempre exploração e proletarização. Mas há que ressaltar que, ao lado deste processo, também existe a resistência contra esta forma de exploração.

No campo ou na cidade, a resistência a esta nova estrutura de organização do trabalho floresceu contra a exploração e a sujeição do camponês ao trabalho assalariado e a exclusão dos direitos trabalhistas, pois a situação emergente à qual eram submetidos passa a demandar mais trabalho temporário do que trabalho permanente. Uma demonstração dessa resistência generalizada é evidenciada por Castelli e Villani (2002, p.20) quando citam o artigo de jornal publicado em 1929, sobre o Manifesto Camponês de Tendência Comunista no Rio de Janeiro, que se expressa assim:

Fundemos o Sindicato dos Operários Agrícolas!

A aliança dos trabalhadores de Campo e o Centro Político Proletário, os dois únicos organismos que lutam verdadeiramente pelos interesses dos explorados e oprimidos da região, dirigem-se a todos os operários, mulheres e jovens trabalhadores das usinas e fazendas e a todos os lavradores pobres, chamando-os à organização de suas fileiras, pois só assim, poderão diminuir o roubo e a escravização de que são vítimas, por parte dos fazendeiros e usineiros....

Reivindiquemos para o campo as seguintes melhorias: Aumento de salários e diminuição das horas de trabalho. Pagamento em moeda corrente, abolição dos cartões-vales.

Liberdade de locomover-se! Liberdade de trabalhar para quem entender! Liberdade de voto!

Lei de férias e direito de greve!

Este documento, além de demonstrar claramente as condições de vida e de trabalho do trabalhador rural à época, faz referência às transformações nas relações sociais de produção que se expandiam no Brasil. É nestecontexto que eclodem no Brasil, no final do século XIX, os primeiros movimentos sociais do campo, com o objetivo de propiciar ao trabalhador o primeiro acesso à terra, à reforma agrária e resistir ao modelo desenvolvimentista que se expandiu pelo país.

A partir de 1960, sob o efeito do “milagre brasileiro” ou “desenvolvimentista”, a agricultura brasileira teve um crescimento decisivo impulsionado pela modernização das técnicas de produção e das modificações nas relações sociais, assim descritos por Graziano Neto (apud. PESSOA, 1998, p. 50):

Ao mesmo tempo em que vai ocorrendo aquele progresso técnico na agricultura, vai-se modificando também a organização da produção, que diz respeito às relações sociais (e não técnicas) de produção. A composição e a utilização do trabalho modificam-se, intensificando-se o uso de “bóia-fria” ou trabalhador volante; a forma de pagamento da mão-de-obra é cada vez mais assalariada; os pequenos produtores, sejam proprietários, parceiros ou posseiros, vão sendo expropriados, dando lugar, em certas regiões, à organização da produção em moldes empresariais.

Os problemas sociais no campo, todavia, continuam crescendo nesta direção. Por um lado, a população camponesa cada vez mais marginalizada, e por outro lado, a insistência do Governo em instituir políticas públicas frágeis que em nada contribuem para as soluções dos problemas do campo. Ao contrário, eles os agravavam cada vez mais, desde que não estimulam o desenvolvimento no meio rural, onde a modernização do campo trouxe a expansão do capital sem, contudo, aumentar as frentes de trabalho para o camponês. É o que Wanderley (apud. PESSOA, 1998, p. 51) confirma acerca das influências do desenvolvimento: “um modelo modernizante de tipo produtivista sobre uma estrutura anterior, reacionária do ponto de vista técnico, predatório dos recursos naturais e criadoras de exclusão social.”

Todavia, da década de 1970 aos dias atuais, o processo predatório do sistema capitalista tem se intensificado. Com a Terceira Revolução Industrial, uma nova lógica do capital com base na evolução científica e tecnológica para o meio de produção na agropecuária, for implementada no Brasil, com repercussões diretas da produção e na relação do mundo do trabalho rural, tal como demonstra Maia (1982, p. 6), assim:

Assistimos, nas últimas duas décadas, à ruptura no sistema oligárquico-rural e à implantação da estrutura econômica industrial capitalista. Isto não significou, necessariamente, melhoria das condições de vida e trabalho para o lavrador. As transformações nas relações sociais de produção fazem surgir trabalhadores como os bóias-frias e os volantes. Segundo dados do INCRA, em 1972, trabalhavam no campo 1,2 milhão de assalariados permanentes, 6 milhões de assalariados temporários, aproximadamente 500.000 posseiros e 2,4 milhões de mini-fundistas. O aumento considerável de mão de obra volante caracteriza a situação de subemprego no campo.

Em decorrência disso, surgem dois fatos: o primeiro deles diz respeito à intensificação das migrações para as periferias das grandes cidades de contingentes de trabalhadores rurais

mal-empregados, subempregados e desempregados que, conforme Carneiro (1988), contribuíram ainda mais para o aprofundamento das desigualdades; o segundo se refere à própria resistência dos trabalhadores à expropriação e à exploração, o que resultou em violentas disputas pela terra.

Com este cenário, a década de 1990 apresenta-se com um quadro nada animador no sentido de reverter situação implementada nos anos 1970, para que, segundo Garcia (2003, p.31), nenhuma intervenção nos postos de trabalho no campo será suficiente para contrapor as atuais tendências vigentes e reverter à situação, quando escreve:

[...] emigração do equivalente a mais de 210 mil famílias rurais por ano; desaparecimento anual de quase cem mil estabelecimentos rurais pequenos; destruição média anual de 550 mil postos de trabalho na agropecuária. Quando muito, a atuação governamental teria permitido que em cinco anos (1995 a 1999) tivessem sido criados 373.220 novos e precários estabelecimentos rurais, pouco mais de um terço dos que desapareceram; gerado 1,2 milhão de ocupações, 22% dos empregos agrícolas destruídos; e retido no meio rural o equivalente a 18% do contingente que emigrou.

O cenário acima descrito vem ao encontro da intensificação do capitalismo no campo com a introdução das tecnologias e de outros fatores como: o uso de adubos, tratores, insumos, o uso das imagens via satélite para planejamento da produção, o uso da engenharia genética e da biotecnologia, etc., processo este que invadiu o mundo agrário, provocando mudanças radicais nas condições de vida e de trabalho, dos camponeses, reduzindo drasticamente o contingente de trabalhadores rurais, agravando a desigualdade social, ao mesmo tempo em que, exigem-se cada vez mais trabalhadores preparados e treinados. Esta estrutura sócio-econômica em transformação, portanto, mantém o setor rural permanece fora das vistas das políticas públicas inclusive, a escola rural.

Assim, como na zona urbana, a escola rural surge como meio de adaptar o/a trabalhador/a do campo à nova ordem capitalista, ou seja, submete-o (a) à domesticação para o trabalho, talvez, de forma menos conflituosa e consentida. A escola, então, torna-se o meio propício para criar nos educandos condutas de aceitação da estrutura econômica capitalista, mas também pode se conduzir instrumento de enfrentamento das questões sociais geradas pela mercantilização do trabalho.

Martins (1975, p.100) ao descrever os propósitos do sistema capitalista para a escola, confirma a primeira das funções acima descritas, assim:

Ao mesmo tempo a noção de trabalho aí se redefine nos tempos do espírito capitalista: o trabalho contumaz como expressão da ética da acumulação de capital e com meio de mobilidade social. Assim, a escola, ainda que concebida em termos

de trabalho pelo trabalho, constitui uma forma de adestramento pela qual o imaturo adquire hábitos e incorpora concepções compatíveis com as representações dominantes e sustentadoras da sociedade.

Este modelo de organização da escola para o meio rural no Brasil desde então, seguiu as mesmas orientações dadas às escolas da sociedade urbano-industrial, no que se refere aos conteúdos transmitidos, à centralidade da escola e às relações pedagógicas (entre professor e aluno, professor e professor, professor e administração), com o objetivo de aumentar a produção para o sistema capitalista.

No final do século XIX e início do século XX, com a ameaça crescente do êxodo rural, a educação no Brasil assumiu um discurso nacionalista contra o analfabetismo e as melhores condições de vida para a população rural. Porém, o que estava em jogo não era o que se proclamava, mas sim, o interesse das forças capitalistas que queriam fixar o homem ao campo, sem, contudo, descuidar-se do controle. Tal objetivo está atrelado ao fato de que o centro urbano não conseguia absorver grande contingente de mão-de-obra vindas do campo para as indústrias na cidade.

Por isso, a educação para o meio rural, não significou qualidade educacional nem diminuição das diferenças sociais no campo, muito menos a valorização da cultura camponesa, pois as escolas rurais sempre estiveram à margem das políticas educacionais, porque o que conta são os estudos realizados na cidade e não os realizados no campo, tal como descreve Arroyo (2004, p. 80), assim:

[...] as políticas educacionais, os currículos são pensados para a cidade, para a produção industrial urbana, e apenas se lembram do campo quando se lembram de situações ‘anormais’, das minorias, e recomendam adaptar as propostas, a escola, os currículos, os calendários a essas ‘anomalias’. Não reconhecem a especificidade do campo.

Então, as políticas educacionais para o meio rural se materializam em propostas e conteúdos ministrados nas escolas pensadas para um “aluno universal”, segundo denominação de Azevedo e Gomes (1991), com a finalidade de habilitar tanto os alunos da zona rural quanto os da zona urbana para a produção e para o mercado.

A eficácia da escola, pois, segundo Martins (1975, p. 88) consiste em adestrar o aluno tal como descreve:

[...] a escola é admitida como forma de ocupação do tempo da criança, na população rural, ela é, acima de tudo, como “equivalente” de trabalho. A aceitação da escola é amparada pela valorização do trabalho [...]. Os objetivos ou as funções manifestas, tal como concebidos pelos educadores ou pelos que elaboram a política educacional, não são necessariamente compreendidos pela população rural [...].

Essa constatação implica reconsiderar as bases das funções socializadoras da escola [...]. A escola concorre para essa socialização na medida em que a atividade escolar constitui uma forma de adestramento pelo trabalho em si.

Azevedo e Gomes (1991, p. 34 e 35), concordando com Martins (1975), destacam efeitos socializadores diferenciados da ação da escola no meio rural, assim:

A organização escolar na área rural tem como padrão a organização da escola urbana e não considera um aspecto fundamental: o fato de que, na verdade, o aluno da escola rural é, sobretudo, um trabalhador, inserido no processo de trabalho desde a mais tenra idade [...]. A organização do trabalho na sociedade industrializada e o tipo de produção cultural aí existente, por um lado torna possível, em especial para certos grupos sociais, um “adestramento” mais precoce das crianças para as tarefas escolares propriamente ditas, anterior ao próprio ingresso na escola, através da aquisição de hábitos e aprendizagens necessários ao estudo, inculcados pela família, e através de outras experiências concretas de vividas neste tipo de sociedade. Por outro lado, alonga o período de entrada do jovem no “mundo adulto”, entendido como o mundo do trabalho, fazendo da infância e da adolescência um período de menores responsabilidades e maior dependência dos pais. Situação inversa ocorre na área rural; de uma parte, o “adestramento” para as tarefas escolares anterior ao ingresso do menino na escola não é parte constitutiva dos hábitos e da vida social das comunidades rurais [...].

Todavia, as políticas direcionadas às escolas do meio rural identificam estas situações, ao transferirem para as escolas da área rural o mesmo padrão organizativo das escolas urbanas, no que se refere: ao conteúdo curricular a ser desenvolvido na escola, o tempo previsto para a aprendizagem dos conteúdos, o próprio padrão do disciplinamento de corpo e da mente e o descompasso entre as atividades escolares e o ciclo do trabalho agrícola, o que confirma a presença do padrão de aluno universal.

Com relação a este descompasso entre as atividades escolares e o ciclo do trabalho agrícola, Martins (1975, p. 89) denuncia: “o desajustamento entre o ciclo da atividade escolar e o ciclo do trabalho agrícola é um dos indícios mais importantes da imposição da escola pelo Estado com base numa ordem de concepções que atende prioritariamente a burocracia escolar”.

Essa especificidade, que as políticas educacionais para a educação do meio rural impõem às crianças, aos jovens e adultos da zona rural em termos de organização escolar, muitas vezes os leva a fracassar nos estudos e, ainda, serem culpabilizados por tal fracasso. Por outro lado, os conhecimentos transmitidos nestas escolas são descontextualizados da sua realidade, porque são conhecimentos produzidos no meio urbano que não consideram os saberes do camponês. Dito de outra forma, o saber do camponês é negado pela escola.

qualificados, que concorrem aos postos mecanizados de trabalho, as empresas, além de optarem pelo menor custo para a produção, põem em xeque a formação do trabalhador rural em termos da diversidade cultural e social e de competitividade.

Contrariamente a essa lógica, é importante frisar que o campo requer novas políticas públicas para a educação mediante o avanço tecnológico e científico invade o meio rural, sobretudo no que se refere à formação de trabalhadores e técnicos mais qualificados. Arroyo (2004, p. 95), no entanto, alerta para o seguinte:

Atribuir a expansão da escolaridade ao aumento das pressões do mercado já foi uma crença hoje desconstruída por pesquisadores. O mercado nunca foi demasiado exigente quanto à educação dos setores populares, nem sequer quanto à escolarização dos trabalhadores. As formas como está se dando a modernização da agricultura, o modelo de agronegócio não indicam que demandarão a elevação dos níveis de educação dos povos do campo. Estudos mostram que trazem a expulsão do campo. Um campo sem gente, sem crianças e jovens dispensará a sua educação e estimulará a destruição da pobre estrutura e rede de escolas rurais.

Em suma, a desqualificação das escolas rurais nega aos trabalhadores e jovens do meio rural o acesso aos níveis mais elevados do saber, tal como prescreve a ideologia dominante. E quando pensada a educação, é reduzida idéia de uma escola de formação de mão-de-obra que tem como objetivo exclusivo a formação técnica. Isto explica a atual proposta do ensino técnico-profissional focada na ótica do capital, como forma de ajustar à nova ordem mundial, atrelando a educação a uma perspectiva produtivista e mercadológica.

Esta foi a proposta de educação para o trabalho construída sob a influência dos ideários dominantes, ao longo da história, como se sabe a perspectiva de formação idealizada para a educação da classe popular desde os anos 1960 e 1970 tinha como objetivo integrar aqueles que tinham competências para o mercado, desde que prevalecesse, a seletividade e a desigualdade sociais. Daí o caráter dualista da educação, que ainda hoje cultiva a separação entre educação e profissionalização.

Para Silva (1998, p. 280) este dualismo da educação brasileira representa a manutenção de “escolas para os pobres e escolas para os ricos”, ou ainda “escolas para os pobres e escolas para os nossos filhos”. Este dualismo, no que se refere à escola profissionalizante (normal, industrial, comercial e agrícola), em especial, a ligada ao trabalho manual se constituiu como a escola para os pobres, enquanto que a escola para nossos filhos, é aquela que prepara para o trabalho intelectual (conhecimento científico e clássico), ou seja, prepara para níveis mais elevados do ensino, como o nível superior.

Para Frigotto (1996, p. 9) tal postura representa um retrocesso nas reformas educacionais brasileiras, como política de ajuste a modelo de globalização excludente, que está aí, quando escreve que:

A opção em curso no Brasil de um ajuste conservador em termos político-social econômicos tem como resultado no campo educativo e na formação técnica- profissional um claro retrocesso. Trata-se de um recuo talvez pior do imposto pelas políticas do golpe civil militar explicitadas na reforma Universitária de 1968 e na reforma do ensino de 1º e 2º graus, Lei 5692/71. O resultado lastimável é a continuidade de um tipo de educação e formação que tem como horizonte preparar mão-de-obra, no limite, para se ajustar a entender e consumir subordinadamente a ciência e a técnica embutida nos processos de trabalho, nunca para criar ciência e tecnologia.

E, ainda, Frigotto (1996, p. 36) deixa seu alerta através da expressão usada por Florestan Fernandes (1991) quando denuncia o seguinte:

Na expressão de Florestan Fernandes, uma política que decreta a continuidade de um Brasil gigante de pés de barro. Nação com história. Mas determinada lá fora.

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