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MOVIMENTOS SOCIAIS DO CAMPO: contestação, resistência e luta Os primeiros Movimentos Sociais do Campo surgem no Brasil no final do século

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CAPITAL, TRABALHO E EDUCAÇÃO: pontos e contrapontos

2.3 MOVIMENTOS SOCIAIS DO CAMPO: contestação, resistência e luta Os primeiros Movimentos Sociais do Campo surgem no Brasil no final do século

e início do século XX, e têm como principal bandeira a luta pela terra, como parte integrante das reivindicações. A resistência política e social frente ao aprofundamento da expropriação e da exploração do camponês com a implantação da modernização agropecuária, colocou em pauta a necessidade de reforma agrária como forma de combater os grandes latifúndios no país. Neste aspecto, a luta pela terra representa um meio para garantir o trabalho do trabalhador rural.

Entre as décadas de 1960 e 1970 surge no Brasil o chamado “milagre econômico” ou desenvolvimentismo, fruto da intensificação da entrada do capital internacional no país, visando à adequação das políticas econômicas e sociais ao novo modo de acumulação do capital. Este período é marcado também, pelo desenvolvimento do capitalismo no campo, conforme Bastos (1985, p. 125) argumenta:

Um dos marcos principais do desenvolvimento do capitalismo no campo é a crescente subordinação da terra ao capital, o que provoca fenômenos aparentemente diversos, mas indicativos de um único processo: a expulsão de camponeses, cujas terras são ocupadas pela produção capitalista; a destruição das condições de vida; a extinção dos contratos de parceria; a submissão da produção do pequeno proprietário. Nesse processo de transformação, o capitalismo produz tensões manifestadas na eclosão de movimentos sociais, que são expressões de luta pela terra.

Como se pode observar, historicamente a terra foi a principal reivindicação dos movimentos sociais do campo, mostrando-se capaz de unir diversas bandeiras de luta dos assalariados, a do pequeno produtor e do sem-terra, como forma de resistência à expansão do capitalismo no campo e à proletarização do trabalhador rural. Isso porque o desenvolvimento do capitalismo no campo traz em seu bojo a expropriação da maioria da população camponesa, transformando-os num contingente de força de trabalho assalariado subordinado ao capital, além de, colocar o camponês à margem das políticas econômicas e sociais.

Vale assinalar que, no período de 1962 a 1964, sob o Governo de João Goulart, as questões do campo avançaram mais na busca de soluções para os problemas de conflitos sociais que se acumulavam no campo desde a década de 1960. A Superintendência da Reforma Agrária - SUPRA, criada em 1962, que tinha como finalidade desencadear o processo de distribuição de terras e implementar a Reforma Agrária, não concretiza seu

objetivo devido ao Golpe Militar de 31 de março de 1964, e a destituição de João Goulart do poder.

Nascimento (2005, p.134) ao descrever a política do regime militar mostra o golpe dado nos Movimentos Sociais, assim:

No regime da Ditadura Militar terá a duração de 20 (vinte) anos, ou seja, de 1964 a 1984. Foram 20 anos de amordaçamento da questão agrária. Os governos militares estimularam o desenvolvimento da agricultura capitalista incentivando as grandes propriedades privadas e a formação de latifúndios, bem como, a implantação de políticas de privilégios ao capital financeiro internacional. Para os camponeses/as que sonhavam com a Reforma Agrária e um pedaço de terra para plantar e sobreviver, os governos militares apresentaram duas propostas: a migração para os grandes centros urbanos ou a migração para áreas de desenvolvimento como a Região Norte. Os movimentos sociais do campo e a luta pela terra foram desarticulados pelas perseguições dos Atos Inconstitucionais promulgados pela Ditadura Militar, fazendo com que as organizações e as lideranças ficassem proibidas de articular e organizar o movimento.

Com esse acontecimento, muitos dos articuladores dos movimentos sociais do campo foram exilados, presos, assassinados ou dados como desaparecidos, como é o caso do líder comunitário José Porfírio (líder da Revolta de Trombas e Formoso em Goiás).

Marcado pela criação do Estatuto da Terra, o governo militar sob as orientações dos Estados Unidos da América, tinha como objetivo desarticular qualquer luta camponesa. Neste período foram criados ainda, o Instituto Nacional de Desenvolvimento Agrário – INDA, que substituiu o SUPRA, e posteriormente, tornou-se que hoje se conhece como Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA).

Nos anos 80, os movimentos sociais do campo se tornam duplamente resistentes tanto em relação às políticas de ordem social, que os excluía contra as organizações formais de representação social que não os acolhia.

O pós-ditadura militar, de 1984 aos dias atuais, caracteriza-se como um período de retomada da luta, assim descrito por Nascimento (2005, p. 135)

O período de 1984 até nossos dias, onde se retoma a luta pela Reforma Agrária por meio da criação de movimentos sociais do campo como o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra – MST, com a retomada da democratização política do país e com o fim da ditadura militar, ressurgem os debates acerca da Reforma Agrária nos ambientes sociais, políticos e acadêmicos. Mesmo assim, com 20 anos após a retomada do processo de democratização da sociedade, ainda existem fortes resistências por parte de políticos e de grandes proprietários de terra, descendentes dos velhos coronéis da oligarquia rural, que pretendem manter o

status quo de uma burguesia que manipula e mantêm o poder de controle social via

Neste contexto, o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST24), com objetivo de retomar a resistência e promover a reforma agrária, foi fundado entre os dias 29 e 31 de janeiro de 1985, em Cascavel - PR, por ocasião do I Congresso Nacional dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra. Este evento representou a culminância de vários grupos de resistência e de luta pela terra, como, por exemplo, aos agricultores desalojados pela construção da barragem de Itaipu, entre outros.

A questão fundamental para o MST, então, era a luta pela terra como um processo social, político e econômico voltado à transformação no campo, como forma de redistribuir a propriedade da terra e o poder, redirecionar e democratizar a participação da população do campo no conjunto da sociedade brasileira. Este fato ganha significado justamente por viver no Brasil uma população rural de 31,8 milhões de habitantes (IBGE/2000), considerada a maior do mundo e, em péssimas condições de vida, cujas causas para Garcia (2003, p. 14) residem na:

[...] elevada concentração na distribuição da terra e da renda rurais; deficiente rede de infra-estrutura física; deficiente oferta de serviços sociais básicos à população rural; inadequação dos instrumentos da política governamental (creditícia, assistência técnica e extensão rural, comercialização, ciência e tecnologia, etc.) às características dos agricultores familiares e assentados pela reforma agrária; insuficiente cobertura e baixa qualidade dos programas de apoio à agricultura familiar e de reforma agrária.

Neste contexto ganha significado a reivindicação dos movimentos sociais do campo por uma política educacional, que atenda às necessidades desta população cheia de carências.

Na década de 1990, os Movimentos Sociais se articularam através de conferências, manifestações populares, com objetivo de se contrapor às propostas da denominada educação rural no Brasil. E nesta direção, que em 1997, um novo repensar sobre a educação para o meio rural, nasce sob a denominação de Educação do Campo. O cenário era o Encontro Nacional de Educadores e Educadoras da Reforma Agrária (ENERA), na Universidade de Brasília – UNB, promovido pelo Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem–Terra (MST), em parceria com a UNB e o Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF), a Organização das Nações Unidas para Educação, Ciência e Cultura (UNESCO) e a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB).

24O MST configura-se como um movimento social cujo horizonte de ações não visam somente as necessidades

imediatas. Tais necessidades são responsáveis pela organização e atuação mais direta do movimento. Por outro lado, se o movimento social estiver voltado somente para satisfazer as necessidades imediatas, corre o risco de cercar suas possibilidades de ação, tornando-se um movimento que se encerra na luta específica. (SANTOS, 2006, p. 74)

Dois foram os momentos de criação da chamada Educação do Campo, a 1ª Conferência Nacional por uma Educação Básica do Campo, em Luziânia–GO (1998), que aprofunda as discussões sobre o conceito de Educação do Campo, e a II Conferência Nacional por uma Educação do Campo, realizada também em Luziânia – GO, no período de 2 a 6 de agosto de 2004, que faz a declaração final do conceito.

A instituição das Diretrizes Operacionais para a Educação Básica das Escolas do Campo, pela Resolução CNE/CEB nº 1, de 3 de abril de 2002, representa um marco histórico da conquista dos movimentos sociais do campo para a educação do meio rural, dentre elas a de Henriques et al. (2007, p.17), que destacam o seguinte:

o reconhecimento e a valorização da diversidade dos povos do campo, a formação diferenciada de professores, a possibilidade de diferentes formas de organização da escola, a adequação dos conteúdos às peculiaridades locais, o uso de práticas pedagógicas contextualizadas, a gestão democrática, a consideração dos tempos pedagógicos diferenciados, a promoção, através da escola, do desenvolvimento sustentável e do acesso aos bens econômicos, sociais e culturais.

Além disso, reconhece o papel estratégico da educação no desenvolvimento rural dos estados e municípios; assim, reafirma a prioridade que a educação para o meio rural deve ocupar no Plano Nacional de Desenvolvimento Rural.

A aprovação das Diretrizes Operacionais para a Educação Básica das Escolas do Campo tem, pois, um significado político muito importante no cenário educacional brasileiro, por ser fruto de um longo processo de reivindicações dos movimentos sociais para a Educação do Campo e por se tratar do primeiro documento a ser elaborado com políticas específicas para as escolas do campo em nossa história.

É oportuno, pois, destacar que entre os objetivos estabelecidos dessas Diretrizes está à formação específica do professor da zona rural concebida a partir dele e para ele, como forma de romper a visão denominada por Whitaker e Antuniassi (1992) de urbanocêntrica que tem como característica a predominância de conteúdos formados e informados no processo de urbanização e industrialização, com ponto de partida e chegada na cidade, enquanto representativa da modernidade, ao contrário do rural, que é considerado atrasado e sem chances de progresso.

Em síntese, procurou-se contextualizar e demonstrar as influências exercidas no complexo mundo do trabalho e da escola, a participação dos movimentos sociais na teia das relações sociais e econômicas do sistema capitalista.

Com base nesta realidade contraditória da relação capital e trabalho, é possível dar mais um passo na compreensão das influências do sistema capitalista nas políticas

educacionais, preconizadas pelo neoliberalismo, através de uma economia globalizada, na busca de melhor compreensão do trabalho do/a professor/a rural e seu reflexo na prática pedagógica.

2.4 TRABALHO E FORMAÇÃO DO PROFESSOR DA EDUCAÇÃO

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