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ESQUEMA E ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO

II. INTERVENÇÃO PSICOLÓGICA E SOCIAL NA INFECÇÃO PELO HIV/SIDA

2.3 MODELOS ADOPTADOS PARA O HIV/SIDA

2.3.1 Características das Teorias e Modelos mais Utilizados

Em termos gerais, as teorias e os modelos aplicados à compreensão do comportamento de prevenção do HIV/SIDA envolveram propostas conceptuais desenvolvidas antes do surgimento da SIDA, com propósitos outros que não a compreensão da prevenção da infecção pelo HIV, sejam eles a previsão do comportamento em geral ou a previsão do comportamento face à saúde, em particular.

Os modelos partilham várias semelhanças, quer em termos das asserções fundamentais, quer em termos das componentes principais que determinam o comportamento (Weinstein, 1993). Importa indicar e descrevê-las, uma vez que nelas residem muitas das limitações apontadas à investigação seguidora destes modelos e que as novas propostas se devem propor ultrapassar. Prendem-se estas semelhanças com (a) a racionalidade subjacente às decisões tomadas pelos indivíduos, (b) os motivos da auto-protecção, (c) a ênfase no individualismo das acções e (d) em determinadas variáveis cognitivas e com (e) a ausência de especificidade à infecção dos modelos utilizados no estudo desta doença (Abraham e Sheeran, 1993; Adler e Rosengard, 1996; Campenhoudt et al., 1997; Cleary, 1987; Conner e Norman, 1996; Fee e Krieger, 1993; Fisher et al., 1994; Flowers et al., 1997; Friedman, DesJarlais e Ward, 1994; Kelly e Kalichman, 1995; Weinstein, 1993).

Todos estes modelos enfatizam o facto dos comportamentos de prevenção serem considerados o resultado final de um processo racional de tomada de decisão baseado na análise sistemática e deliberada da informação disponível. Na perspectiva partilhada pela maioria dos modelos privilegia-se a conceptualização do comportamento sexual de risco como um comportamento de tomada de risco, envolvendo uma decisão realizada consciente e deliberadamente. Partilha-se, ainda, a asserção de que os indivíduos contemplam ou podem contemplar os custos e benefícios de se envolverem num determinado comportamento, baseados nas estimativas objectivas e subjectivas da probabilidade das várias consequências ocorrerem. Assume-se que os indivíduos são capazes de estimar a seriedade do risco, pesar os custos e os benefícios das várias opções em aberto e escolher aquela que apresenta a melhor relação entre os dois. As decisões são realizadas com base na expectativa de determinados resultados decorrentes do valor subjectivo que o indivíduo lhes atribui e da expectativa ou probabilidade subjectiva de que uma

considerados, por isso, modelos de expectativa de valor. A teoria subjacente é normativa e prescritiva, ou seja, espelha uma preocupação com a melhor forma de tomar decisões para que as escolhas possam ser as mais adequadas. Pressupõe-se que as pessoas têm competência para tomarem decisões de uma forma racional e a explicação para as decisões deficientes reside apenas em dificuldades ao nível do desempenho. As teorias normativas em que os modelos se inspiram constituem, de acordo com eles, bons descritores do comportamento humano e acredita-se que os desvios e as perdas de racionalidade podem ser corrigidos (Adler e Rosengard, 1996; Conner e Norman, 1996; Linville et al., 1993; van der Pligt, 1998).

Assume-se também nestes modelos que a antecipação de uma consequência negativa para a saúde e o desejo de evitar esta consequência ou reduzir o seu impacte criam a motivação para a auto-protecção (Weinstein, 1993). A asserção subjacente é a de que os indivíduos são capazes de fazer sacrifícios e de agir racionalmente de forma a viver com saúde o mais tempo possível, ignorando necessidades ou renunciando a prazeres se estes se mostrarem detrimentosos para a saúde (Campenhoudt et al., 1997). Variáveis relacionadas com factores que não se prendem directamente com a saúde, mas mais com o romantismo ou intimidade do relacionamento, por exemplo, são excluídos das concepções teóricas do comportamento do indivíduo face ao sexo e não constituem motivadores do comportamento de protecção ou de risco sexual (Flowers et al., 1997).

Estes modelos reflectem igualmente um comprometimento ideológico com o individualismo, centrando-se no indivíduo e sugerindo acções preventivas que devem ser implementadas individualmente (Fee e Krieger, 1993). Esta preferência não é alheia a certos valores que perpassam o século XX, incentivadores do auto-controlo, da auto-disciplina e da força de vontade pessoal, pilares de uma filosofia individualista enraizada na cultura ocidental contemporânea (Ingham e van Zessen, 1997). As crenças individuais relacionadas com a saúde são propostas como preditores principais da acção preventiva e não se contempla a exploração de variáveis ou factores relacionados com a natureza interpessoal dos comportamentos sexuais (Abraham e Sheeran, 1993; Friedman et al., 1994).

Uma outra semelhança entre os vários modelos refere-se às variáveis neles exploradas, predominantemente de natureza cognitiva e relacionadas com as atitudes, a

informação, a percepção de vulnerabilidade, as normas subjectivas, a percepção de auto-eficácia e as intenções comportamentais para referir as mais salientes. Estes modelos raramente exploram factores contextuais39 ou analisam as variáveis cognitivas à luz destes factores, como o tipo de relacionamento e respectivo afecto entre os parceiros, a atracção exercida pelo parceiro, os estados de espírito, o nível de activação ou excitação sexual, a ingestão de álcool e a disponibilidade do preservativo, nem incluem novas variáveis cognitivas como os guiões sexuais e a gestão das relações e percepções interpessoais na avaliação do risco envolvido, para referir as mais importantes (Cleary, 1987; Kelly e Kalichman, 1995).

O conjunto dos modelos apresenta ainda em comum o facto de não ter sido desenvolvido especificamente para o HIV/SIDA, mas constituir uma importação de estudos realizados sobre outros comportamentos preventivos (Fisher et al., 1994). Por exemplo, o modelo de crenças sobre a saúde foi inicialmente estudado na prevenção da doença cardiovascular e a teoria da acção ponderada constitui um modelo geral do comportamento que só mais tarde foi aplicado a uma série de comportamentos de prevenção da doença.

Proceder-se-á a uma descrição e análise de cada um dos principais modelos utilizados no estudo da prevenção do HIV/SIDA, tomando em consideração as áreas a que foi aplicado e os resultados obtidos, bem como os resultados encontrados na sua aplicação ao HIV/SIDA. Serão referidos os principais problemas de que enfermam e tecer-se-ão algumas críticas com base nas asserções em que se apoiam e cuja descrição acaba de ser feita, não sem antes se apresentarem alguns dos principais modelos desenvolvidos especificamente para a infecção pelo HIV/SIDA.

2.3.1.1 O Modelo de Crenças sobre a Saúde

Um dos modelos a que se recorreu para compreender os determinantes do comportamento de risco face ao HIV/SIDA foi o modelo mais utilizado para explicar e

predizer a dificuldade das pessoas participarem em programas de saúde para prevenir ou detectar doenças: o modelo de crenças sobre a saúde desenvolvido nos anos 50 por um grupo de psicólogos sociais (Becker, 1974; Janz e Becker, 1984; Rosenstock, et al., 1994). Inicialmente aplicado à vacinação, ao rastreio da tuberculose e a problemas cardiovasculares foi alargado à compreensão e prevenção de comportamentos tão variados quanto a utilização do cinto de segurança, o controlo de peso, o exames dos seios nas mulheres e o controlo da diabetes. Abarcou, deste modo, comportamentos preventivos e protectores (promotores da saúde e evitadores do risco de doença), sendo mais tarde igualmente aplicado à resposta aos sintomas como o cumprimento de prescrições médicas (comportamentos no papel de doente) e à utilização dos serviços de saúde (consultas médicas) (Gochman, 1988; Janz e Becker, 1984; Strecher e Rosenstock, 1997). Nos últimos anos, o modelo tem vindo a ser menos utilizado na previsão de comportamentos determinados medicamente e a alargar-se a um espectro de comportamentos que, embora relevantes para a saúde, não são especificamente médicos, como o exercício físico, a ingestão de vitaminas, os hábitos tabágicos e, mais recentemente, ao estudo dos comportamentos de protecção sexual (Gochman, 1988).

O modelo de crenças sobre a saúde pretende explicar o comportamento dos indivíduos face à saúde e baseia-se nas teorias normativas da decisão, constituindo um modelo de expectativa de valor em que se enfatizam variáveis cognitivas. De acordo com o modelo, o comportamento é função do valor subjectivo que o indivíduo atribui a um resultado ou objectivo e da probabilidade subjectiva ou expectativa de que uma determinada acção venha a alcançar o resultado pretendido. O indivíduo avalia a sensação de ameaça pessoal à doença e a gravidade desta, bem como os benefícios e as barreiras à acção preventiva e reage a pistas desencadeadoras da acção, principais factores causais das acções de prevenção. Assim, o indivíduo envolve-se num processo de tomada de decisão onde são considerados todos estes factores e as alternativas resultantes, pesando-os de forma deliberada e consciente e, é nesta medida, que o modelo espelha essencialmente uma abordagem cognitiva e racional dos comportamentos de saúde (Gochman, 1988; Rosenstock et al., 1994).

Em termos mais específicos, este modelo distingue cinco factores (inicialmente quatro)40 que influenciam a adopção de práticas preventivas, ou seja, de comportamentos de redução do risco de doença e de práticas remediativas (Becker, 1974; Rosenstock et al., 1994) (Figura 2.1). Estes factores referem-se à vulnerabilidade reconhecida pelo indivíduo em si próprio para poder desenvolver o problema de saúde, à percepção da gravidade do problema, aos benefícios percebidos da mudança do seu comportamento e à percepção de barreiras e/ou possíveis consequências negativas desta mudança de comportamento e, por fim, às pistas específicas para a acção que podem resultar, por exemplo, da detecção de um sintoma ou do visionamento de um programa televisivo sobre o assunto. Depois de ter avaliado

Figura 2.1 Modelo de Crenças sobre a Saúde (Adaptado de Rosenstock, Strecher e Becker, 1994)

* variável mais tarde acrescentada ao modelo

40 Ainda que o modelo tenha introduzido mais tarde um sexto factor relacionado com a motivação para

a saúde, definido como uma preocupação geral pela saúde, são raros os estudos que o exploram pelas dificuldades surgidas com a validade discriminante do constructo (Sheeran e Abraham, 1996).

Ameaça Percepção de vulnerabilidade Gravidade percebida Expectativas Benefícios percebidos Barreiras percebidas Percepção de auto- eficácia*

Sinais para Acção Detecção de um

sintoma

Programa televisivo

Comportamento Protector ou de Risco

a gravidade do acontecimento e a sua vulnerabilidade a ele, o indivíduo pesará os benefícios de determinadas acções específicas ou comportamentos preventivos contra as potenciais barreiras de se envolver nestas acções e na presença de pistas de acção específicas desenvolverá o comportamento protector ou de risco correspondente. Apesar das relações entre estes factores não se encontrarem suficientemente especificadas, postula-se que estas variáveis determinam uma propensão psicológica para agir, a qual, ultrapassado um determinado limiar, desencadeia o comportamento preventivo (Kirscht, 1988).

No seu conjunto, os estudos sobre a prevenção de comportamentos médicos (e.g., vacinação, checkup, vigilância de doenças cardiovasculares, rastreio da turberculose) corroboram a utilidade das variáveis do modelo para o comportamento preventivo (Cleary, 1987; Janz e Becker, 1984; Kirscht, 1988). No entanto, a maioria das análises realizadas exige algum cuidado na sua interpretação e, quando se tomam em consideração algumas das suas limitações metodológicas (em particular o excesso de estudos retrospectivos e a definição das variáveis), o efeito preditor das variáveis no comportamento mantém-se significativo, mas pequeno (Harrison, Mullen e Green, 1992; Sheeran e Abraham, 1996). Em particular, no estudo de comportamentos relacionados com hábitos pessoais, estilos de vida e características associadas ao desenvolvimento de condições crónicas de saúde, ou seja, em situações que requerem uma resposta comportamental complexa, o valor preditor das crenças modifica-se (Kirscht, 1988; Montgomery et al., 1989). A título de exemplo, refira-se o facto do valor para a saúde de deixar de fumar não se revelar um preditor da mudança deste comportamento (Bauman e Chenoweth, 1984), quando tal constitui uma das expectativas mais importantes deste modelo. Alguns comportamentos contrários à saúde parecem depender de certas condições mais imediatas, como a aprovação social, ao invés de serem resultado da preocupação do efeito que podem ter na saúde futura. O modelo parece ser bastante mais útil na previsão do comportamento em situações em que a acção preventiva é pontual, como no caso da vacinação, do que em situações em que as acções se repetem e não são orientadas medicamente, como é o caso de características associadas aos estilos de vida como fumar, controlar o peso, práticas seguras e consumo de álcool, por exemplo. (Kirscht, 1988; Montgomery et al., 1989).

Se a precariedade da relação entre crenças sobre a saúde e comportamento subsequente foi identificada em comportamentos que parecem estar sob a influência de condições mais imediatas e relativamente distantes de resultados nefastos futuros noutros domínios para além da SIDA, é neste último que o poder dos constructos individuais deste modelo na previsão do comportamento preventivo se mostra mais contraditório (Cleary, 1987; Fisher et al., 1994). Ainda que as variáveis do modelo sejam, por vezes, operacionalizadas de diferente forma e se comparem distintos tipos de estudos sem tomar em consideração a sua singularidade (estudos prospectivos, retrospectivos e transversais), mais recentemente tem-se questionado o suporte empírico de algumas das suas variáveis para o comportamento de prevenção do HIV/SIDA (Abraham, Sheeran, Spears e Abrams, 1992; Brunswick e Banaszak-Holl, 1996; Catania et al., 1990b; Gerrard et al., 1993; Gerrard et al., 1996; Lollis, Johnson e Antoni, 1997; Maticka-Tyndale, 1991; Montgomery et al., 1989; Sheeran e Abraham, 1996; Sheeran e Taylor, 1999). Dada a especificidade dos estudos realizados com este modelo, os resultados encontrados serão discriminados por variável, uma vez que o valor preditor de cada uma se revelou diferente.

A variável deste modelo que mais atenção suscitou, relaciona-se com a vulnerabilidade que o indivíduo percepciona em si próprio, a qual em conjunto com a gravidade do problema contribui para a estimativa da ameaça envolvida na situação. Como tem sido considerada um pré-requisito ou motivação primária para as acções sequentes, trata-se de uma variável importante na maioria dos modelos utilizados na prevenção dos comportamentos de risco face à saúde e tem sido alvo de investigação considerável (Gerrard et. al., 1993; Kirscht, 1988; Weinstein, 1993).

Em geral, as pessoas tendem a subestimar a sua vulnerabilidade a acontecimentos negativos, incluindo os de saúde (e a sobrestimar a probabilidade de se virem a deparar com acontecimentos positivos) (Weinstein, 1980). Consideram-se, em particular, menos vulneráveis do que os outros e este optimismo irrealista ou ilusão de invulnerabilidade foi igualmente identificado para a infecção pelo HIV/SIDA (Bauman e Siegel, 1987; van der Pligt, Otten, Richard e van der Velde, 1993). Há, no entanto, indicações de que se tende a sobrestimar o risco dos outros e não tanto a subestimar o

seu41(Linville et al., 1993), tendo as pessoas percepções relativamente adequadas do risco que correm face ao HIV quando se envolvem em situações em que o risco é maior (van der Velde, van der Pligt e Hooykaas, 1994). Assim, apesar das pessoas tenderem a um enviesamento comparativo, possuem uma percepção de vulnerabilidade pessoal relativamente adequada, quando se envolvem em situações com elevado risco.

A percepção de vulnerabilidade revelou-se em muitos estudos, em particular nos estudos anteriores a 1974, o melhor preditor singular dos comportamentos de prevenção (Janz e Becker, 1984). Contudo, a sua relação com o comportamento de prevenção do HIV/SIDA não podia ser mais inconsistente, ora encontrando-se relações tanto positivas como negativas, ora não se encontrando qualquer relação entre as duas variáveis (Baldwin e Baldwin, 1988; Fisher et al., 1994; Gerrard et. al., 1993; Gerrard et al., 1996; Goldman e Harlow, 1993; Joseph et al., 1987; Maticka-Tyndale, 1991; Montgomery et al., 1989; Schaalma, Kok e Peters, 1993; Sheeran et al., 1999; Thompson et al., 1996; Wulfert e Wan, 1993), resultado, aliás, já detectado noutros domínios (Janz e Becker, 1984).

A maior percepção de vulnerabilidade encontrou-se associada um maior número de parceiros sexuais, resultado inicialmente considerado um contra-senso e mais tarde indicador do papel que pode ter o comportamento na percepção de vulnerabilidade pessoal (Baldwin e Baldwin, 1988; Gerrard et al., 1993; Joseph et al., 1987). Num estudo de meta-análise sobre os factores relacionados com o uso de preservativos em adultos heterossexuais, Sheeran e colaboradores (1999) encontraram uma correlação muito pequena entre a percepção de vulnerabilidade e a utilização do preservativo, corroborada noutro estudo de meta-análise sobre preditores da intenção de utilizar preservativo, com amostras de adultos heterossexuais e homossexuais (Sheeran e Taylor, 1999). A inexistência desta relação não deixa de ser surpreendente, uma vez que a adopção de medidas protectoras trata-se da resposta mais rápida e

profunda a uma ameaça para a saúde que alguma vez foi documentada (Becker e

Joseph, 1988, p.407), sendo possível que a relação entre percepção de vulnerabilidade

41 No caso do HIV, a estimativa da probabilidade do risco envolvido é relativamente mais elevada do

que a probabilidade objectiva, fruto da tendência para se sobrestimarem acontecimentos de baixa probabilidade que envolvem grandes consequências (Slovic, Fischhoff e Lichtenstein, 1987).

e comportamento preventivo exista e seja moderada por outras variáveis ainda por determinar ou se trate de uma relação não linear (Gerrard et. al., 1996).

Têm sido apontadas diversas razões para a diversidade de resultados encontrados. Uma das mais plausíveis envolve questões metodológicas e sugere-se que, ao invés de se estarem a avaliar relações de causalidade nalguns estudos, como por exemplo nos estudos transversais, os resultados possam reflectir a exactidão da percepção de risco do indivíduo (para maior aprofundamento do assunto consultar Gerrard et al., 1993; Poppen e Reisen, 1997; Ronis, 1992 e Weinstein e Nicolich, 1993).

Outra explicação apela para o menor papel desempenhado pelos factores cognitivos no comportamento quando este envolve preocupações fortes de natureza emocional, física e de apresentação pessoal. Em estado não activado, o indivíduo poderá envolver-se numa análise cognitiva racional conducente à intenção de utilizar preservativo, a qual só será agida se as intenções estiverem muito bem estabelecidas e as crenças associadas forem salientes (Bryan et al., 1997; Poppen e Reisen, 1997). Acrescente-se a possibilidade do envolvimento em sexo não seguro poder resultar não da ausência de crenças salientes, mas do surgimento de novos pensamentos, que só se desenvolvem ou ganham significado no próprio contexto sexual (Gold, 1993).

Os objectivos com que o preservativo é utilizado são igualmente considerados na explicação das relações inconsistentes entre percepção de vulnerabilidade e comportamento protector. Sabe-se que as duas razões principais para a utilização do preservativo se relacionam com a prevenção da gravidez e com a prevenção de infecções sexualmente transmissíveis, sendo a primeira razão, de longe, a mais apontada pelos indivíduos (Cooper et al., 1999; Goodrich et al., 1998; Maticka- Tyndale, 1991). Caso a percepção de vulnerabilidade co-varie com os comportamentos protectores, esta relação só se verificará quando o preservativo for utilizado para prevenir a infecção e não ocorrerá caso seja utilizado para prevenir a gravidez. Quer dizer, só quando o comportamento (uso do preservativo) é codificado em termos relevantes para a ameaça (HIV) é que se encontrará uma relação, de outra maneira ela não se manifestará (Cooper et al., 1999).

HIV/SIDA, uma das conclusões que se pode retirar é a de que as características deste comportamento sexual de prevenção afectam o poder da percepção de vulnerabilidade na alteração do comportamento. No actual estado de conhecimento, a relação sistemática mais encontrada revela uma influência do comportamento de risco e preventivo na estimativa de vulnerabilidade, mas não o contrário. Quem se envolveu em mais comportamentos de risco tende a fazer estimativas mais elevadas da probabilidade de contrair o vírus do que quem se envolveu em menos comportamentos de risco (Gerrard et al., 1996).

A variável do modelo que se tem revelado menos interessante prende-se com a gravidade percebida, pois tomando valores quase sempre muito elevados no que respeita ao HIV/SIDA, perde muito do seu valor preditor (Gochman, 1988; Maticka- Tyndale, 1991; Sheeran e Taylor, 1999; Thompson et al., 1996). É importante salientar que o efeito desta variável no comportamento de prevenção mostrou-se, por vezes, negativo (Janz e Becker, 1984; Kirshct, 1988), sendo indicador de que a presença de uma ameaça muito forte pode levar a que se ignore ou distorça a ameaça em vez de modificar o comportamento. Estas reacções comportamentais revelam, mais uma vez, a possibilidade de singularidades no comportamento de prevenção do HIV/SIDA.

Numa revisão de literatura de estudos publicados entre 1974 e 1984, a variável que isoladamente se mostrou a mais poderosa enquanto preditor do comportamento preventivo disse respeito à percepção de obstáculos ou barreiras percebidas (Janz e Becker, 1984). Contudo, a percepção de obstáculos e a relação da percepção de custos e benefícios com o comportamento preventivo face ao HIV/SIDA não está livre de algumas inconsistências (Buunk et al., 1998; Fisher et al., 1994; Montgomery et al., 1989). Rosenstock e colaboradores (1994) sugerem a existência de uma variação na capacidade preditora da relação custos/benefícios dependente da ameaça percebida. Quando esta é elevada, estas variáveis teriam um efeito preditor, mas no caso da ameaça ser pequena o seu valor preditor desapareceria. Outros autores justificam o baixo poder preditor dos obstáculos pela deficiente operacionalização de que a variável tem sido alvo nos seus estudos (Buunk et al., 1998). O baixo valor preditor destas variáveis encontrado no estudo de Thompson e colaboradores (1996) e na meta- análise de Sheeran e Taylor (1999) pode resultar da pouca variância nos factores

relacionados com os custos/benefícios, caso a amostra percepcione quase